…A vida é repleta de mistérios! LENINE

 

ENTREVISTA EXCLUSIVA

Imagens inéditas sob a perspectiva da fotográfica Vivian Psilva

Por Antonio Nelson*

 “Isso É Só o Começo”, canta Lenine ao som do canário belga Frederico Segundo, atrás do palco. De imediato nota-se o frenesi do público! De forma não linear, onde as caixas de som estão distribuídas numa métrica racional na Concha Acústica do TCA, – Teatro Castro Alves -, overdubs, riffs, tons, subtons e contratempos, mesclados à onomatopeia da natureza, através da música seguinte, – Chão -, que produz o similar eco do bambu, até as posteriores canções, como Amor É Pra Quem Ama, com mais uma participação do pássaro belga. 

O show apenas começou! E as cigarras compõem o universo de Chão, em que Jr. Tostoi (guitarra e overdubs), e o filho Bruno Giorgi (guitarra, contrabaixo, overdubs e co-produtor de Chão) partilham o processo criativo. Nesta tríade, sob três lâmpadas de mercúrio, que também obedecem a uma divisão matemática, Lenine, Bruno e Tostoi tocam sobre um tapete vermelho, em que a luminosidade das luminárias, adicionadas principalmente à tecnologia de iluminação, com o objetivo de remeter nas tonalidades do solo árido do barro, derramam luzes, cuja plasticidade convida mais de 5000 mil pessoas na realização da experiência sensorial através dos relevos sonoros do artista no palco. Além dos passos e compassos, Lenine utiliza sua linguagem corporal e o magnetismo pessoal para envolver os fãs. E em alguns instantes, da simetria do Frevo à música híbrida, ritmos e gêneros da música de Pernambuco, como Leão do Norte, insistentemente pedida por parte do público, e tocada e cantada pelo cantor, também contagia todos. 

Mas ao retornar ao palco, após o término do espetáculo, com cantos de sucessos, algumas com novas roupagens adaptadas a Chão, é que Lenine conseguiu o coro através de Paciência, Lá e Cá, – com letra em homenagem ao Rio e à Bahia -, É Só o Que Me Interessa (CD Labiata), e Do It (CD In Cité). Já Envergo Mas Não Quebro, Amor é Pra Quem Ama e, Se não for Amor Eu Cegue, todas do último CD, também conseguiram evolver o púbico.

Lenine autoconceitua  como cantautor, numa entrevista exclusiva à revista Caros Amigos, depois da passagem de som, onde realizamos imagens inéditas, através da fotógrafa Vivian Silva, o intérprete e compositor recifense-carioca, conforme está no seu site, numa rápida conversa coloquial, fala sobre medo da morte, intuição, Freud e Jung, o processo criativo, crítica musical no Brasil, literatura, a ditadura dos meios de comunicação de massa, seu sonho para o Brasil, as parcerias nas construções das canções. Tudo isso, seis dias antes de iniciar o mês de dezembro, na cidade do Salvador, Bahia! Confira.

Antonio Nelson – Como é sua relação com o vernáculo, com a Língua Portuguesa? Sobre Chão você declara paixão pelo som nasal ÃO. Já o título do CD Labiata tem origem no latim. Como é o processo de criação? Intuição, fixações com palavra e imagens?

Lenine – As palavras exercem um fascínio em mim. Minhas composições têm a ver com a importância da palavra. Meu trabalho é todo intuitivo. É uma mecânica. As composições não têm um método linear. Não sou um músico acadêmico. Eu sou muito exigente com o que faço.

Antonio Nelson – Quanto às parcerias? Lula Queiroga, Carlos Renó, Braulio Tavares!

Lenine – Mais de 50% das minhas composições e canções são coletivas. Não me pertencem. Tenho uma relação peculiar e promíscua com Lula Queiroga, Carlos Renó, Bráulio Tavares, Paulo César Pinheiro, Ivan Santos etc. São importantes parceiros que estão sempre comigo nesse compartilhamento. 

Antonio Nelson – Existe crítica musical no Brasil? Quem são os críticos?

Lenine – A crítica está pulverizada na internet. É o que eu sempre digo cara! Hoje não é mais os milhões, e sim os milhares. A distribuição está mais democrática.
Antonio Nelson – É verdade que você declarou que deveria ter nascido no Rio de Janeiro? No seu site, em sua biografia, tem Recifense-carioca.

Lenine – Não. Quem disse isso? 

Antonio Nelson – Estão dizendo por aí.

Lenine – Pernambuco está no meu coração. Agora, minha família está no Rio, meus filhos e minha mulher. Eu moro na Urca, um bairro com ar interiorano. 

Antonio Nelson – O que é ser brasileiro para Lenine com 53 anos?

Lenine – Eu sou internacional. 

Antonio Nelson – O que você sonha para o Brasil?

Lenine – Meu sonho para o Brasil! Almejo que possamos entender a Nação como mistura. E (re) descobrimos este universo riquíssimo que temos na cultura. O Brasil de Darcy Ribeiro, por exemplo.

Antonio Nelson – Tratando de literatura, quais escritores preferidos?

Lenine – Sou um reincidente. Aprendi com papai. Reler João Cabral de Melo Neto, Augusto dos Anjos, Jorge Luís Borges…

Antonio Nelson – Qual a sua análise sobre os meios de comunicação de massa? Existe ditadura midiática?

Lenine – Todo veículo tem seu editor-chefe e obedece aos critérios editoriais. 

Antonio Nelson – O que você sonha em deixar para o Brasil?

Lenine – Além das minhas músicas, minhas orquídeas.

Antonio Nelson – Você me declarou que é mais junganio do que freudiano. Como foi essa descoberta? O quê representa Jung e Freud para você?

Lenine – Sabe aquela passagem que o Jung descreve sobre uma determinada paciente, que começa a contar um sonho vívido que teve na noite anterior com um escaravelho, que ela passa a descrever minuciosamente… Durante toda a seção eles ouvem um barulho na janela, persistente, contínuo, incomodando… Até que Jung se levanta, vai até a janela, e descobre que o barulho estava sendo feito por um escaravelho igual ao descrito pela paciente durante a seção… A vida é repleta de mistérios!

Antonio Nelson – Jung e Freud estão presentes nas composições de “Chão”?

Lenine – Depende de quem escuta… Podem estar.

Antonio Nelson – Você tem medo da morte?

Lenine – Eu tenho medo é de avião… Tenho raiva da morte porque vou deixar tudo aqui. Uma vez eu chamei papai, vem cá cara! E conversamos sobre a morte… Ele me disse que tem raiva da morte porque vai deixar tudo aqui (risos). Aprendi com papai.

Antonio Nelson – Quais as expectativas para o Carnaval Multicultural do Recife 2013?

Lenine – A cada ano a festa fica mais bacana… As expectativas são as melhores. Ainda não estamos ensaiando os shows de carnaval, vem novidade por aí. Tocar no Recife é sempre muito especial pra mim por motivos óbvios…

Antonio Nelson – Além do CD Chão, qual o seu olhar psicanalítico sobre a música Olho de Peixe, onde você canta: “a mente é como um baú e o homem decide o que nele guardar”, “na cabeça do homem tem um porão, onde moram o instinto e a repressão”, “o que tem no sótão”?

Lenine – Eu sou músico, e acho que o olhar psicanalítico cabe mais a alguém da área. “Olho de Peixe” deixa a pergunta, e que cada um responda à sua maneira…

Antonio Nelson – Há um deslumbramento seu com a utilização das tecnologias?

Lenine – Eu diria um encantamento com as descobertas… Especialmente as que o disco Chão nos proporcionou, com a quadrifonia e os elementos orgânicos “tocados” em cena.

Antonio Nelson – “Chão” tem overdubs que possibilitam a ampliação dos sentidos num contato sensorial seu e do público, exige reflexão?

Lenine – A proposta de Chão foi justamente criar outro tipo de experiência, subverter o “ver-ouvir” para o “ouvir-ver”. Neste show a música é a grande vedete…

Antonio Nelson – Quem são os “Seres Estranhos” da sua cidade?

Lenine – São apenas personagens, figuras emblemáticas com as quais os seres da cidade podem se identificar…

*Antonio Nelson é jornalista. 
Imagens: Vivian Psilva

 (40 fotos)

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