Procurador que contrariou Gonet para salvar ex-Lava Jato recua após reportagem do GGN; PGR recebe pedido de suspeição

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

O que está em jogo é a demissão de Diogo Castor de Mattos, que foi blindado por membro da PGR que afrontou Gonet

O procurador regional da República, Elton Venturi, avisou ao Tribunal Regional Federal da 4º Região que cometeu um “equívoco” ao protocolar uma petição classificando-a como “embargos de declaração”, e não como “manifestação” da Procuradoria-Geral da República, onde defendeu que não há recursos cabíveis contra a demissão de Diogo Castor de Mattos, procurador da extinta força-tarefa da Lava Jato em Curitiba que contratou um outdoor para exaltar a chamada República de Curitiba.

O recuo ocorreu após a reportagem do GGN publicar em primeira mão, em 13 de dezembro, trecho de um áudio onde um servidor do gabinete de Venturi afirma que ele avisou ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, que não iria recorrer da demissão de Castor de Mattos e que é para o doutor Gonet nomear outro procurador ou ele mesmo fazer o recurso.” Ouça:

Além de contrariar Gonet abrindo mão do recurso na ação civil pública que mira a demissão de Castor de Mattos, Venturi classificou no sistema a ação como “embargos de declaração”, fazendo o prazo do processo tramitar sob risco de que o caso fosse encerrado rapidamente, eliminando a possibilidade de Gonet trocar de procurador e apresentar novo recurso.

O desembargador Luiz Antonio Bonat assinou despacho em 18 de dezembro avisando que recebeu o pedido de retificação de Venturi. O magistrado manteve o prazo final de apresentação de recurso do Ministério Público Federal em 30 de janeiro de 2025.

PGR recebe suspeição de Venturi

Após a afronta de Venturi à PGR, o coletivo Advogadas e Advogados Pela Democracia, que tem sido vigilante no caso envolvendo Castor de Mattos, apresentou um pedido de declaração de suspeição de Venturi. A ação foi recebida pela PGR em 18 de dezembro. Dois dias depois, em 20 de dezembro, a chefia de gabinete da PGR encaminhou o pedido para Venturi se manifestar “tão logo seja possível”.

O objetivo do coletivo é obter “a declaração da suspeição do Procurador Regional Elton Venturi, com a ordem expressa de que protocole desistência imediata da descaracterizada manifestação protocolada como embargos de declaração e a designação de outro PRR [procurador regional da República] que cumpra as ordens designadas pela PGR na fiscalização do cumprimento da lei, zelando pela execução da Constituição Federal.”

Venturi, que já foi procurador do estado do Paraná, é apoiador da Lava Jato e não esconde isso de ninguém. Em março de 2016, assinou um manifesto de procuradores e professores universitários – ele dá aula na UFPR – em apoio à operação então comandada por Sergio Moro.

Em defesa de Castor de Mattos

Para defender que não cabe recursos contra a manutenção do cargo de Castor de Mattos, Venturi agarrou-se à discussão em torno da lei 14.230/2021, que estabeleceu um rol taxativo de condutas consideradas ímprobas por violação aos princípios da administração pública.

Embora o outdoor tenha sido contratado em 2019, e Castor tenha sido condenado pelo CNMP em 2021, a ação civil pública que pediu a execução da sentença só passou a tramitar em 2022, ou seja, após a mudança na lei. Dessa forma, defesa de Castor argumentou que, no caso do outdoor, à luz da atualização da lei, só seria improbidade se ele tivesse usado recursos públicos para pagar pela publicidade, o que ele alega que não ocorreu.

O caso, no entanto, não é tão simples quanto parece. Segundo o coletivo Advogadas e Advogados Pela Democracia, que acompanha o caso desde a origem, somente a palavra do procurador de Curitiba consta como prova de como se deu o pagamento, visto que ele não anexou nenhum comprovante nos autos.

Além disso, e ainda mais grave, Diogo Castor teria feito a contratação do outdoor usando o nome de uma terceira pessoa, João Carlos Queiroz Barbosa, um cidadão comum que nada tem a ver com a Lava Jato. Barbosa aguarda o desfecho do caso de Castor na Justiça para pedir reparação por ter sido vítima de possível estelionato ou fraude ideológica.

Um inquérito policial foi aberto para apurar os supostos crimes. Ele tramitava na 5ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, mas foi enviado à PGR a pedido de Castor de Mattos, e desapareceu do radar do coletivo, “a despeito das inúmeras tentativas dos peticionários em obter informações”.

Relembre o caso

Castor de Mattos foi sancionado à pena de demissão pelo Conselho Nacional de Ministério Público no julgamento do Processo Administrativo Disciplinar nº 1.00997/2020-21. A demissão, no entanto, não é automática: nestes casos, o CNMP precisa acionar o MPF na primeira instância para instaurar a ação que executaria a sanção. Foi neste percurso que a decisão do CNMP sofreu um revés.

O procurador Peterson de Paula Pereira ajuizou ação civil pública de perda de cargo, mas a 1º Vara Federal de Curitiba negou a demissão. O caso subiu de instância, assumido pelo procurador Mauro Cichowski, mas a 12ª Turma do TRF-4 – composta por desembargadores que são lavajatistas – também decidiu poupar Diogo Castor da perda de cargo. É contra essa decisão que a PGR pode recorrer com prazo até o final de janeiro de 2025.

O coletivo de Advogadas e Advogados pela Democracia também já apresentou incidente de suspeição em relação a todos os integrantes da 12ª Turma do TRF4 para julgar apelação em ação popular envolvendo Castor de Mattos.

O procurador Elton Venturi foi procurado pela reportagem através de seu gabinete, mas não houve resposta até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto.

Leia também:

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Parabéns Nassif, continue neste caminho. Temos que mostrar as vísceras das injustiças e engodo que é a republiqueta de Curitiba, que venham mais furos jornalísticos como este, para mostrar a verdade.

  2. Concursos que selecionam gente sem as mínimas condições pra ocupar cargos que demandam não só a decoreba de concurseiros ambiciosos, mas senso ético e higidez de caráter. Dá até medo de tentar especular uma estatítica do percentual de beócios sem a mínima noção de como exercer suas funções, que não pra benefício próprio, “selecionados” por critérios sem transparência para o público pagante e jamais devidamente sujeitos ao crivo de uma fiscalização imparcial. Leiam Appio.

    1. Se concurso fosse o método mais adequado para selecionar a burocracia estatal, ainda mais nessas funções, todos países chamados desenvolvidos fariam dessa forma…

      Não fazem…

      Agora tem piorado mais.

      A indústria dos concursos por algoritmos permite esquadrinhar os bancos de questões das bancas de concursos, entregando as perguntas que serão usadas por elas a quem paga pelo serviço, com um nível de acerto que corresponde ao valor investido…

      Ou seja: além de elitizar o acesso, ainda permitem que boçais decoradores de conteúdo entrem no serviço público.

      Está aí a explicação para um juiz do Paraná não saber articular três frases com sentido.

      Na minha área, segurança pública, tenho o dissabor de sentir isso de perto.

      O nível de cognição e linguagem dos recém nomeados dá vontade de chorar…

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador