Francisco Celso Calmon
Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral - E o PT com isso?; Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula.
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Luvas de ferro e luvas de veludo?, por Francisco Celso Calmon

Lula já passou fome, já foi preso, já foi mordido pelas cobras que indicou para o Judiciário, e, mesmo assim, se arrisca novamente

Ricardo Stuckert

Luvas de ferro e luvas de veludo?

por Francisco Celso Calmon

“O Brasil deve desculpas à presidenta Dilma, porque ela foi cassada de forma leviana”, destacou Lula.

Quem é o Brasil que deve desculpas à ex-presidenta Dilma?

Não é a sociedade que deve desculpas, é o Estado brasileiro que tem essa obrigação ética, moral e política de reparar a ela, ao seu governo e aos seus eleitores, perante à história.

Dilma e o povo são credores!

Não basta um pedido formal de desculpas em nome do Estado, como fazia a Comissão de Anistia, é necessário ir mais longe, fincar estacas e raízes para que nunca mais aconteça.

O simbolismo é importante, porém não é suficiente.

Os autores do golpe, começando pelos subscritores da peça, mal produzida mas bem remunerada, Janaina Pascal, Miguel Reale Júnior e Hélio Bicudo, em seguida pelo Eduardo Cunha, presidente da Câmara, que acolheu a peça por razões pessoais, bem como àqueles que votaram a favor do impeachment, com declarações vexaminosas e odientas, tornando àquela sessão um ato macabro e vergonhoso para a história do Brasil, devem desculpas e reparações.

Reparação moral, ética, política e pecuniária, a Dilma, ao seu governo e ao coletivo de 54,5 milhões de eleitores cassados em seus direitos de escolha para a presidência da República do Brasil.

O MPF acusava Dilma e os demais integrantes do governo por improbidade administrativa, pelo suposto uso dos bancos públicos num jogo contábil, sem prejuízo ao erário, fato que ficou conhecido como “pedaladas fiscais”.

A ação do MPF, à época, pedia a perda da função pública dos envolvidos, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa de até 100 vezes o valor da remuneração de cada ente público, além de proibição de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais por três anos e indenização por danos morais coletivos.

A tramitação dessa ação resultou na exclusão tanto de Dilma, Mantega e demais acusados, por falta de fundamentação das acusações.

Em dezembro de 2022, publiquei neste espaço alguns trechos que os reproduzo abaixo.

Reparação política ao governo Dilma

Seis anos de ilegitimidade democrática. Período em que o Brasil andou que nem caranguejo.

Jango teve o seu mandato simbolicamente devolvido quase 50 anos depois.

Dilma deveria ter passado a faixa presidencial, como a legítima governanta!

Seu governo foi interrompido por um golpe, com STF e tudo mais, em maio de 2016. E daí em diante o processo golpista seguiu sem interrupção, com a lava jato, com Temer e sua ponte para o futuro (teto de gastos, reformas contra os interesses dos trabalhadores), prisão [ilegal] de Lula, derrota de Haddad numa eleição repleta de irregularidades (fakenews e intimidações), vitória do Bolsonaro e do seu projeto de neoliberalismo extremado, antipatriótico, antipovo e de natureza ideológica nazifascista.

Doenças, mortes, fome, miséria, desemprego recorde, pobreza estremada, concentração de renda aumentada, sequestro do Estado pelo capital financeiro, fomento do ódio gerando violências e assassinatos, foram os resultados do golpe de 2016.

O Estado democrático de direito foi esquartejado, com um governo genocida e entreguista, instituições amedrontadas e acovardadas, corrupção institucionalizada no governo, nas Forças Armadas e no Congresso [emenda do relator Arthur Lira] e o Brasil tornou-se pária internacional.  

Lula já passou fome, já foi preso, já foi mordido pelas cobras que indicou para o Judiciário, e, mesmo assim, se arrisca novamente, cercado de alguns perigosos inimigos da democracia.

Sim, porque quem participou do golpe ao governo Dilma é inimigo da democracia.

A eleição da Dilma simbolizou a vitória da nossa resistência à ditadura militar. A constituição da Comissão Nacional da Verdade no seu governo significou o início da implementação da Justiça de transição.   

Tornou-se alvo dos militares e de seus parceiros golpistas.

Era uma questão de tempo o golpe. Mais uma vez não foi preparada a resistência.

Quando ela se deu conta dos erros, trocou o ministro da fazenda e também nomeou Eugênio Aragão para o Ministério da Justiça, numa última tentativa de resistir. Porém, o timing estava vencido.

O golpe a Dilma foi anunciado previamente pelo candidato derrotado Aécio Neves: Ao final do seu governo, que eu não sei quando ocorrerá, talvez mais breve do que alguns imaginam, …”, vaticinou ele logo após a sua derrota.

E teve ainda a oposição sistemática do presidente da Câmara, o famigerado Eduardo Cunha, preparador do golpe, que viria também pela traição mais ignóbil do seu próprio vice, Michael Temer.

Após criar a Comissão Nacional da Verdade, Dilma passou a ser alvo, mais uma vez, das Forças Armadas, que estiveram presentes no golpe de 64, no de 2016, na prisão do Lula e na ascensão do genocida-canibal-pedófilo, o serial killer Messias Bolsonaro.

Durante um tempo não distante, pragmáticos sem princípios, queriam esconder a Dilma da campanha eleitoral, mas não se esconde quem a história bendiz, por sua coerência e coragem.

Fiel ao nosso lema na Var-Palmares, ousar lutar, ousar vencer, Dilma é paradigma de nossa geração 68.

O sofisma das pedalas fiscais, se antes já tinham caído nas galhofas políticas, agora cairam perante o TRF1.

Nesta mesma quadra política, os protagonistas da lava jato estão técnica e politicamente a nu, nem mesmo a folha de adão da mídia corporativa os protege das vergonhas que foram como artífices da corrupção, do enriquecimento ilícito, do punitivismo fascista e da traição à pátria, em conluios com agentes dos EUA, ocasionando severos prejuízos à economia e à soberania do Brasil.

A corrupção na Petrobrás foi real, mas menor diante da destruição produzida pela lava jato. Destruição de empresas, de reputações, corrupções nas delações premiadas e delitos de lesa-pátria.

Não somos nós da esquerda que estamos a diagnosticar os malfeitos dos meliantes da república de Curitiba, já o fizemos antes, agora são os órgãos do Judiciário.

No xadrez da Política, com o P maiúsculo, o ministro Dias Toffoli, após anos de desacertos, alguns cruéis, fez uma jogada estratégica, audaciosa, por ora, parece perto de um xeque-mate aos golpistas de ontem e de hoje. 

O cerco vai acuando dois dos três êmes (mídia, militares, mercado), responsáveis históricos pelos golpes no país.

Emparedada, a Globo recorre ao expediente de sempre, por meio de jornalistas do ponto eletrônico e do seu já gasto Merval Pereira, o de classificar de excessos o que é essência e imanente dos golpes e ditaduras.

Durante 50 anos foi sujeita e defensora do golpe de 64, plantonista do golpe de 2016, suporte logístico da lava jato e do bolsonarismo, e foi pálida na atuação de repúdio ao 8 de janeiro de 2023. 

Acusou o golpe do alcance da decisão do Toffoli, esperneia sem bem saber para onde, a não ser atacar o Lula e seu governo, que em 8 meses fez pelo Brasil, o que o seu outrora candidato não fez em 4 anos.

Foi responsável pela polarização entre a extrema direita e as forças democráticas lideradas pelo Lula, e agora ressuscita Aécio Neves, na vã tentativa de uma terceira via.

São os fatos históricos que, no campo internacional, condena os EUA como o mal maior da humanidade e no campo nacional a Globo e demais mídias golpistas e vassalas do imperialismo econômico.

Contudo, a história para eles não conta, atuam com platitudes, eufemismos, sofismas e com despudorado jornalismo ideológico, a serviço do capitalismo imperialista, causador da miséria moral e material da humanidade e predatório do planeta. 

As FFAA estão moralmente encurraladas, a mídia golpista vem se esgueirando da responsabilidade dolosa perante a história.

Se o STF não quiser ficar doente do mesmo mal do ex-juiz ladrão, o da parcialidade, a dosimetria dos mentores e mandantes da linha de comando da intentona bolsonarista terá que ser maior, sob pena de desmoralização perante à sociedade de à história.

Achei pesadas as penas, contudo, usando de coerência e simetria, as penas dos mentores e mandantes devem ser superiores aos 30 anos.

Não é aceitável usar luvas de ferro contra os bagrinhos e luvas de veludo com os oficiais das Forças Armadas e policiais de alta patente e especialmente com o capitão-mor, Jair Messias Bolsonaro, sem o qual o plano golpista não teria avançado tanto.  

E só foi solapado por um lampejo de clarividência, quando, sugerido pelo Ministro da Defesa acionar a GLO, o presidente Lula descartou. Felizmente!

A participação dos militares na intentona de 8 de janeiro pode equivaler para a implementação da justiça de transição no Brasil, ao mesmo que a derrota dos militares argentinos na guerra das Malvinas significou para a criminalização dos ditadores e colaboradores da ditadura na Argentina.

No Brasil, a criminalização dos militares e policiais responsáreis pelo plano e operação do golpe fracassado de 8 de janeiro, pode ser o início da justiça de transição reversa, começando com os atuais e chegando aos agentes de Estado, autores das graves violações dos Direitos Humanos na ditadura militar, muitos já nomeados nos relatórios da Comissão Nacional da Verdade. 

A justiça de transição não se esgota com a reparação aos atingidos e a responsabilização dos algozes, é vital as reformas no sistema, para que nunca mais aconteça golpes e ditaduras no nosso amado Brasil.

Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral – E o PT com isso?, Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula. Coordenador do canal Pororoca e um dos organizadores da RBMVJ.

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