A obsessão dos colunistas da “grande mídia” quando o assunto é economia

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

Por Marco Piva

A grande empulhação dos colunistas econômicos

Na Carta Maior

Grande parte dos colunistas de economia da imprensa comercial brasileira, autodenominada “grande imprensa”, comete uma fraude contra os cidadãos que acompanham as notícias no dia a dia. Eles têm uma verdadeira obsessão quando tratam de assuntos da sua área: a obsessão de acreditar que falam ou escrevem sem ideologia nenhuma, que seus comentários são isentos, práticos e objetivos, e que só mesmo a cegueira política não é capaz de enxergá-los como grandes pensadores críticos do país. Ora, ter uma visão ideológica e não assumi-la é a pior forma de cinismo e de empulhação. Essa gente não fez nem TCC no ensino médio para saber que qualquer coisa que se diga, se fala desde um lugar, desde uma teoria de interpretação sobre a realidade que se vê. E acreditar nos pilares do liberalismo sem freio, na aposta que a mão invisível do mercado pode tudo, forma um conceito tão atrasado quanto aquela regra do futebol que permitia ao goleiro segurar a bola com a mão por quanto tempo quisesse.

Pois bem. Um dos esportes prediletos desses colunistas de uma só forma de ver a economia é criticar os governos ditos bolivarianos como a Venezuela, o Equador, a Bolívia e a Argentina, não faltando tremendos esforços para incluir o Brasil na lista. A tese vale para todos: são governos gastões, populistas, anti-iniciativa privada, inimigos dos Estados Unidos e por aí vai. Dizem os guardiões do pensamento do mercado que a situação nesses países vai de mal a pior por obra e culpa dos governantes de plantão, casualmente todos eles de esquerda.

Não é que as previsões para os demais países latino-americanos também não são nada animadoras para 2015? Vamos pegar o exemplo de nações governadas pela direita para que a análise não seja entorpecida. O México terá um de seus piores anos. Indústrias norte-americanas instaladas em território mexicano estão demitindo e fechando suas portas. As chamadas “fábricas maquiladoras”, eixo central da integração do Nafta, estão indo se instalar em outras freguesias. O petróleo, principal receita do país, está com a produção em baixa e preços achatados no mercado internacional. Como entrou de sócio menor no acordo comercial com Estados Unidos e Canadá, os mexicanos correm o risco de voltar a níveis produtivos anteriores a 1980. O PIB deste ano está previsto para 1,0%. A pobreza e a violência só crescem.

A Colômbia, outra menina dos olhos dos colunistas econômicos brasileiros, teve forte queda de produção e mal ultrapassou o 1% do PIB em 2014. As previsões para esse ano são ainda mais sombrias. Aberto desde sempre ao capital estrangeiro especulativo, o país começa a assistir a saída desses capitais numa escala sem precedente. Pesa ainda a desvantagem de não ter muito para onde correr, já que a produção agrícola do país depende de commodities, cujos preços estão em baixa no mercado internacional, sem falar do problema da violência política, ainda sem solução definitiva.

O Peru, depois de três anos seguidos de crescimento, viu uma marcha à ré em 2014. Sua principal riqueza, as jazidas de minério, perdeu espaço para novos centros de produção na África e Ásia. Sem uma indústria forte, pouco terá a oferecer para garantir emprego e renda aos seus cidadãos.

Vamos colocar o Chile no rol dos países mais abertos economicamente, embora tenha um governo de inspiração esquerdista moderada. O cobre, de longe a grande cartada do país, está com preços em queda. Os investimentos externos estão caindo para os piores níveis da história e, o que é pior, iniciam um movimento de fuga, o que levou a presidente Michelle Bachelet a decretar apressadamente uma nova lei de “inversiones extranjeras”, mais liberal e sem grandes contrapartidas como a anterior.

Nesse cenário, o Banco Mundial destaca que a América Latina cresceu 1,0% em 2014, a média mais baixa dos últimos 12 anos. A projeção de crescimento do PIB é de 2,4% para este ano, um verdadeiro risco para a continuidade dos programas sociais que diminuíram em 24% a pobreza no continente. Nenhum país latino-americano ou caribenho crescerá vigorosamente, com a única exceção da Bolívia, que ainda colhe os frutos da nacionalização do setor de gás e energia. Então, onde está escrito que os únicos países que estão em difícil situação econômica são aqueles cujos governos tem ideias de esquerda? Em qual manual ficou provado que a melhor maneira de levar a economia de uma nação é abrindo todos os flancos para o investimento estrangeiro e para a total privatização dos setores estratégicos? Quem disse que desenvolvimento não combina com justiça social?

Sem dúvida, falta muito para que famosos colunistas econômicos tenham a humildade de reconhecer que, sim, falam em nome de uma ideologia a qual devotam crença inabalável e que prestam um desserviço aos consumidores de notícia quando emitem opiniões baseados em só um lado da moeda. A América Latina vive uma crise econômica que é resultado da queda brutal das commodities de matérias primas, do rearranjo do poder econômico mundial baseado na financeirização dos ativos, da precarização de seu parque industrial, da histórica falta de investimento em inovação e tecnologia e do profundo ódio que os donos locais do dinheiro nutrem contra qualquer coisa que sinalize uma pequena mudança em seu status quo.

Por isso, debater a regulação econômica da mídia é mais do que necessário; é urgente, é “pra ontem”. Somente assim poderemos almejar uma sociedade com mais pluralismo e mais democracia, com cidadãos que poderão olhar criticamente uma notícia sob variados pontos de vista e não apenas a partir da “verdade única” dos colunistas, desses endeusadores do oráculo do mercado.

18 Comentários

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  1.  
    excelente artigo.
    o final é

     

    excelente artigo.

    o final é um desejo de muitos.

    assino embaixo.

    aliás, abaixo o fundamentalismo do pensamento único.

    o mundo é plural.

    como a vida,

    como a arte.

    precisamos pensar o mundo com a dialética

    resultante das enormes contradições existentes.

    e não sob o jugo do pensamento único.

    ditatorial, portanto.

  2. Zombies

    Zombies

    Do Tijolaço ( http://tijolaco.com.br/blog/?p=24357 ):

    “Uma amiga me conta que a mãe telefonou para saber como ela tinha ficado ‘durante o apagão’.

    – Mãe, aqui não teve apagão!

    – Mas como, minha filha, deu no jornal!

    – Mas não teve. E aí, teve?

    – Não. aqui não faltou luz, nem lá na sua tia fulana que falou comigo agora, lá de Florianópolis.

    – Pra você, mãe, aprender a não  acreditar em tudo o que sai no jornal…

    Detalhe: esta amiga é jornalista.”

  3. Pelo que consta, o mundo todo

    Pelo que consta, o mundo todo está em dificuldades econômicas. Só agora os EUA começam a se recuperar e até a China desacelerou seu crescimento “chinês”. A Bolívia assim como um ou outro país são exceção e se explica por motivos pontais.

    A questão desses analistas econômicos que não se assumem como porta-vozes do capital (especulativo) não é crescimento.

    Porque no crescimento ou na recessão o que pregam é a concentração de renda, que é o que a “mão invisível” do mercado faz. Os governos “bolivarianos” com a “mão visível e eleito pelo povo” do Estado fazem a distribuição de renda no crescimento. E minoram as perdas das classes baixas na recessão

  4. inimigos imaginários

    Mais um texto histriônico onde o cara aponta inimigos imaginários para supostamente “desconstruí-los”. Quem diabos são os colunistas econômicos na grande imprensa brasileira que acreditam “nos pilares do liberalismo sem freio, na aposta que a mão invisível do mercado pode tudo”?

    1. Esses economistas são uns filhos da PUC.

      Caro Ozzy, meu grande vigarista intelectual. Se o colega não citou, eu cito. Quais são os atributos intelectuais, de gestor e de pesquisador de Mailson da Nóbrega? Está todos os dias nas páginas de O Globo, Folha, Estadão e das revistas do esgoto profundo. Mas ninguém diz que quando Ministro da Fazenda, ele foi o responsável pela maior inflação da História do país: 84% AO MÊS em março de 1990.  E os comentaristas de bancos que faliram, fundos que fracassaram, de gestores públicos saídos da PUC-RJ ficaram podres de ricos e o país, podre de pobre? Quer nomes? Armínio “Soros” Fraga, Gustavo Franco (“dólar congelado”), Winston Fritsch, e outros.

       

      1. E uma correção adicional…

        Só pra não ficar chato, a Ministra da Economia em Março/1990 era a Zélia. O Maílson fez merda antes, no governo do Sarney. Esse mesmo Sarney que foi o pilar de sustentação do governo Lula no Senado.

        E, mais uma vez, ele nunca foi liberal. Ou o Plano Verão, com congelamento de preços e salários, tem alguma coisa de liberal? Difícil imaginar maior intervenção do Estado na economia… 

    2. Essa é fácil responder

      1. Leia qualquer coisa do Rodrigo Constantino.

      2. Já recebi até no WhatsApp um still duma imagem do Carlos Alberto Sardenberg comparando no Jornal da Globo o crescimento (creio que de 2013) desses países citados como ‘exemplos de sucesso’ em oposição ao do Brasil.

      1. Boa!

        Dos citados por todo mundo, o único que se aproxima do estereótipo do “defensor do liberalismo sem freios” com esse laissez-faire total é o Constanino. E eu, particularmente, acho ele uma grande porcaria. E, bem, ele é irrelevante.

    3. Miriam Leitão, Merval,

      Miriam Leitão, Merval, Sadenberguer, Reinaldo, Nunes, Waak, ou se quiser por atacado:  Veja, JN, JG, SBT, Band, Jovem Pan, Globo escrito e televisivo, CBN..Quer mais??  Vc parece que só teve um momento lúcido, quando se auto nomeou com o nome de um mito do Heavy Metal e o nome do meu cachorro!!

      1. Não

        Nenhum desses defende “liberalismo sem freios”. Caso eu esteja errado, gostaria que me apontasse onde eles defenderam esse tipo de liberalismo.

        Ninguém sério defende “liberalismo sem freios” hoje em dia, pois é uma tese furada, que só faz sentido teórico. Na prática é óbvio que há necessidade do Estado intervir em alguma medida na economia. A discussão se dá na definição de qual é essa medida.

        1. Como não, Ozzy.  Ou como vc

          Como não, Ozzy.  Ou como vc entende o significado de liberalismo sem freios.  Vc nunca irá encontrar esse liberalismo em paises imperialistas, como Estados Unidos, Canadá, Austrália, Inglaterra, Alemanha…Irá encontrar esse liberalismo em subsidiárias como México, Colômbia, Chile, Grécia, Leste Europeu…Africa…todos numa merda que dá gosto, e ainda o Brasil que tenta se livrar desse cancer.  Ou vc nunca ouviu um programa do Reinaldo Azevedo??? Ou debates com Miriam Leitão ou Waak com convidados devidamente treinados.  Ah, já ia me esquecendo do pulha do Mainardi.  Liberalismo sem freio foi o que esses países periféricos fizeram, arriaram as calças e debruçaram no balcão!!! Sobre seu apelido ser também o nome de meu cachorro, é que adoro meu cachorro, tanto quanto o comedor de morcegos.  Sem ofensas, ok??  Abs!!!

          1. Ortodoxia x Liberalismo

            Defender essa ortodoxia econômica – nos moldes do governo Dilma II, inclusive – não tem a ver com “liberalismo sem freios”. O mainstream econômico (a tal ortodoxia) tem pouca coisa a ver com o liberalismo em si. Tanto que os ortodoxos gastam laudas e laudas discutindo a melhor forma de intervir na economia para atingir os resultados esperados. Os liberais defendem que esses resultados serão atingidos se deixarmos os agentes econômicos atuarem livremente, com regulação mínima e garantia jurídica.

            E nenhum dos países citados foi, em momento algum de sua breve história, liberal.

  5. “Então, onde está escrito que

    “Então, onde está escrito que os únicos países que estão em difícil situação econômica são aqueles cujos governos tem ideias de esquerda?”

    Respondo com outra pergunta: e onde está escrito, ou melhor, quais são os dados que comprovam que os países em melhor situação econômica são aqueles cujos governos têm ideias de esquerda?

  6. Onde ecoam os esconomistas.

    No Ministério da Fazenda já tivemos advogados, médico, engenheiros, sociólogo e até economistas. Mas nunca vi economistas fazendo cirurgias, defendendo causas no tribunal do júri, construindo pontes e viadutos ou projetando barragens. Passei a odiar economistas quando estudei Cálculo III. Usei um livro escrito por um maldito economista estadunidense, acho que era de Harvard. Um dos problemas do livro era calcular qual o número máximo de bancos nas instalações de um bar (transformando um balcão reto em formato de letras “u”) com aumento da rentabilidade. A partir de “x” bancos, mesmo aumentando o lucro bruto, a tal rentabilidade caía. Tive vontade de apertar o pescoço do autor.

  7. Anjos maus

    O autor do post generaliza perigosamente em termos jornalíticos, apesar de tal procedimento não se considerar incomum na história do jornalismo , quando se trata de profissionais famosos e polêmicos, nesta ordem.

  8. Eu li este texto e por

    Eu li este texto e por incrível que pareça a primeira pessoa que me veio a mente foi o Aldo Fornanzieri que escreve aqui no GGN. Lembro de um artigo dele desancando as ideias de esquerda para a economia postado pelo Nassif, um péssimo artigo por sinal. Queria ver a reação dele ao ler esse texto.

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