Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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“Orçamento Secreto” e controle total de espectro: quando a esquerda emula lavajatismo, por Wilson Ferreira

Estratégia semiótica da “predicação analítica”: locuções que criam “blocos de pensamento” lavajatistas prontamente replicados por canais progressistas que, numa inacreditável Síndrome de Estocolmo, a esquerda também “lacra”.

“Orçamento Secreto” e controle total de espectro: quando a esquerda emula lavajatismo

por Wilson Ferreira

“Orçamento Secreto”, “Orçamento Paralelo”, “Pedalada Fiscal”, “Bolsolão”, “Fura Teto”. É o bate-bumbo diário da grande mídia contra as emendas parlamentares criadas para azeitar a aprovação da PEC dos Precatórios no Congresso, e prontamente suspensas pelo protagonismo do STF. Estratégia semiótica da “predicação analítica”: locuções que criam “blocos de pensamento” lavajatistas prontamente replicados por canais progressistas que, numa inacreditável Síndrome de Estocolmo, a esquerda também “lacra”. Participa da homogeneização do atual espectro político que ajuda a operar as três funções ideológicas dessa estratégia de predicação analítica: (1)Ocultar a indignação seletiva do jornalismo corporativo; (2)Ocultar o mal original: o teto de gastos; (3)Cair na armadilha do controle total de espectro e do movimento de pinça. Quem ganha? Sérgio Moro, futuro candidato antissistema com o controle de qualidade do lavajatismo. 

No seu livro “A Ideologia da Sociedade Industrial”, o pensador alemão Herbert Marcuse dedicou um capítulo chamado “O Fechamento do Universo de Locução” para, didaticamente, descrever as táticas da linguagem midiática que gera no receptor o “novo conformismo” criado não pela censura, mas pela “locução fechada” por meios de blocos de pensamento que produziriam “fórmulas hipnóticas”.

Marcuse destacava a estratégia linguística de “predicação analítica”, forma de construção repressiva em que um substantivo específico é sempre ligado aos mesmos adjetivos, que se transformam em “atributos explicativos”, transformando uma sentença em “fórmula hipnótica” que, infinitamente repetida, fixa uma imagem na mente do receptor.

“O governador manda-e-desmanda”, “bomba limpa” etc., seriam exemplos de como essa forma de locução criaria um efeito mágico e hipnótico: projeção de imagens que transmitem unidades irresistíveis, blocos de pensamento pré-fabricados, harmonia de contradições. Estratégia jornalística conhecida pela indústria da propaganda para criar “linhas de impacto” ou “incitadores de audiências” fazendo o receptor associar imagens a instituições, atitudes ou aspirações, fazendo que ele reaja de um modo específico, fixado.

“Orçamento Secreto”, “Orçamento Paralelo” são um desses “blocos de pensamento” aos quais Marcuse se referia que diariamente estão saturando nossos olhos e ouvidos. Indignação propagandística da grande mídia diante do “toma-lá-da-cá” das emendas parlamentares no momento quando a dupla Bolsonaro/Paulo Guedes impõe a necessidade da aprovação da PEC dos Precatórios no Congresso para que haja espaço no Orçamento para a implementação do Auxílio Brasil.

Indignados, colunistas da grande mídia gritam que as emendas se transformaram em “moeda política”, mobilizando milhões de reais sem qualquer publicidade ou transparência. Principalmente quando, às vésperas de um ano eleitoral, Bolsonaro apostaria todas as fichas no “populismo eleitoreiro” do Auxílio Brasil para melhorar sua imagem numa economia combalida pelo desemprego e inflação.

Enquanto os sabujos neoliberais, de costume, protestam contra a suposta irresponsabilidade em “driblar o teto fiscal” (ou, outro bloco de pensamento, “furar o teto”) , os “mercados” reagem em consonância com o tom do escândalo midiático: dólar dispara, Bolsa desaba, juros sobem.

Às véspera do ano eleitoral de 2022, no meio do “vestibulinho” promovido pelo jornalismo corporativo para encontrar uma “terceira via” (no qual, em poucos dias, o ex-juiz Sérgio Moro saiu na frente ao ser lançado à candidato à presidência pelo Podemos, pelo senador Álvaro Dias exortando que Moro “teve coragem de enfrentar o sistema”), essa estratégia de “predição analítica” tem três funções na estratégia semiótica da guerra híbrida de informações – cuja emergência para o próximo ano é evitar a interrupção do plano de desconstrução nacional para definitivamente colocar o País no papel que lhe cabe na cadeia global do Grande Reset do Capitalismo: o de uma “banana plantation”, desindustrializado e com uma economia primarizada.

(1) Ocultar a indignação seletiva do jornalismo corporativo

Ora, por que o freak out midiático nesse momento com as emendas parlamentares, se a desvirtuação dessa ferramenta constitucional em moeda política foi, até aqui, uma prática comum em todas as reformas?

Por exemplo, os pagamentos a deputados sempre aumentam nos meses que precedem cada votação estratégica. Por exemplo, só em dezembro de 2016, o governo Temer pagou aos deputados federais um valor de R$ 2 bilhões, juntamente com o pacote das reformas da Previdência e Trabalhista. Silêncio da grande mídia. Ou melhor, algumas vozes até falaram sobre o assunto, como se tudo não tivesse passado de “afago” ou “agrado para a base de Temer no Congresso”.

Em 2019, um dia antes de uma reforma da Previdência, o governo empenhou R$ 1,1 bilhão. E tudo o que a grande mídia noticiou foi a negativa de Bolsonaro de que se tratasse de “toma-lá-dá-cá”.

Para a PEC 32/2020 (Reforma Administrativa), mais R$ 6 bilhões em emendas. Mais silêncio midiático, focado em que sempre está na austeridade fiscal, não importa o custo nada austero.

Porém, nesse momento a grande mídia mobiliza um inédito esforço em martelar um conjunto de locuções em predição analítica. As preferidas: “Orçamento Secreto” e Orçamento Paralelo”.

Na primeira, a adjetivação “secreto” faz uma alusão de natureza conspiratória. Como se, de repente, as emendas parlamentares emergissem de reuniões ocultas e nada republicanas… não mais que de repente… E na segunda, a adjetivação “paralelo” dá o toque perfeito de criminalidade. Assim como um “governo paralelo” de alguma ameaçadora organização criminosa das sombras.

Repetidos diariamente (até pela própria esquerda) viram “blocos de pensamento” acríticos, criminalizando (ou melhor, judicializando) um dos mais importantes instrumentos da sociedade previsto pela Constituição de 1988 (artigo 165) que prevê, por meio de emendas, a participação do Legislativo na peça orçamentária encaminhada pelo Poder Executivo.

Uma possível crítica à imoralidade do “toma-lá-dá-cá” é substituída pela criminalização in totum pela grande mídia visando essa mesma reação na opinião pública. Nesse momento os analistas do jornalismo corporativo podem até falar em “transparência” e “publicidade” para o instrumento constitucional das emendas (aliás, necessidade nunca reivindicada, já que tudo apenas se tratava de “afagos”).

Porém, o objetivo já foi cumprido: criminalizar a política com seus jogos “secretos” (conspiratório) e “paralelos” (criminosos), o famoso “sistema” contra o qual se insurgirá a “terceira via” – claro, Sérgio Moro, aquele que teve a “coragem de enfrentar o sistema”. Novamente, o candidato “antissistema” será o mote para 2022, seja a terceira via Moro ou… Bolsonaro mesmo… 

Continue lendo no Cinegnose.

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

1 Comentário

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  1. Depois da defesa de bolsonarista homofóbioco, agora a defesa do orçamento secreto. Legal, a esquerda parece caminhar aceleradamente para a autodestruição através de seus comentaristas.

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