As estratégias do coach Pablo Marçal como candidato à prefeitura de São Paulo superam as adotadas pelos ex-presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump, e aproximam-se ao radicalismo de figuras como o ex-estrategista de Trump, Steve Bannon, e o presidente argentino de ultradireita, Javier Milei.
Essa é a análise do professor e historiador João Cezar de Castro Rocha que, em entrevista ao jornalista Luis Nassif durante o programa TVGGN 20H, desvendou o modus operandi de Marçal e suas táticas para angariar votos em um momento dominado pela “economia da atenção.”
“Numa entrevista assustadora, dada ao The New York Times, antes de ir para a prisão, o Steve Bannon disse uma frase que quando eu li, pensei ‘bom, esse homem está ressentido porque está indo para a prisão’. Ele disse ‘Nós queremos muito mais, o MAGA (Make America Great Again) é apenas o começo. Muito em breve vocês terão saudade do Donald Trump”.
O historiador destaca que o “intelectualismo brilhante, mas perverso” de Bannon atingiu o paroxismo, a radicalização máxima do fenômeno da “economia da atenção”.
“Ao assistir o Pablo Marçal no debate, o que me veio à mente foi a entrevista do Steve Bannon. O modelo para o Pablo não é o Bolsonaro, é o Javier Milei. Isto é, uma radicalização máxima de um fenômeno [economia da atenção]”.
O fenômeno, estudado desde a década de 1970 pelo cientista Herbert Simon, parte do princípio de que, do ponto de vista da condição humana, existe uma escassez das nossas capacidades de atenção e cognitiva. “ A atenção é uma mercadoria escassa”.
“Vamos com muita modéstia e humildade reconhecer que a extrema-direita, capitaneada por pessoas como Steve Bannon e Carlos Bolsonaro, compreenderam de maneira brilhante e perversa, o funcionamento da economia da atenção”, compara Rocha.
Nesse caso, o recurso normalmente adotado pela extrema-direita para garantir visibilidade é o escândalo, a vulgaridade e o grotesco. “Quem grita mais alto pode ser escutado, quem faz a ação mais inusitada, mais absurda, é visto”.
O modelo é semelhante ao adotado pelo filósofo e guru da extrema-direita, Olavo de Carvalho, que se tornou um “meme ambulante” ao reduzir a língua portuguesa a expressões simples e frequentemente vulgares, garantindo assim a constante atenção do público. “A própria presença dele era memética”, relembra Rocha.
Marçal, por sua vez, surpreendeu na autopromoção do ponto de vista de negócio, tendo criado uma comunidade de pessoas anônimas que têm como responsabilidade uma competição interna para ver quem faz os melhores cortes do coach, para depois serem premiadas por isso.
“Ele mesmo se tornou uma plataforma, a plataforma ‘Pablo Marçal’, o que significa a “colonização definitiva da política pela economia da atenção”, explica o historiador. “A crítica contundente dispensa adjetivo. Se for capaz de desmascarar o método que ele usa, que é tão espantoso, o método é a maior crítica”.
Crime é digital mas a justiça é analógica
O modus operandi do empresário, que supostamente comete crimes em série na esfera digital, segundo Rocha, à luz das acusações contra os demais candidatos à disputa por São Paulo, como com Guilherme Boulos e Tábata Amaral, tende a se fortalecer porque não há uma reação à altura daqueles que são atacados.
“Qual o problema? Eles consideram que a ação do Pablo Marçal é baixa, vil, vulgar, abaixo da linha da cintura, e é. E tendem a não reagir da maneira que precisam reagir. Como reage? A equipe do Boulos deveria ter batido, no dia seguinte, na porta do TRE-SP e protocolado um pedido de impugnação da candidatura”.
“Ele não pode fazer aquele gesto. Mas por que ele faz? Porque ele está contando com o fato de que o crime é digital mas a justiça é analógica, um problema mundial, não só brasileiro”.
Confira a fala completa do professor pelo corte abaixo:
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O estilo agressivo de Trump e Bolsonaro abriram a porteira para radicalização cada vez maior de candidatos da extrema direita como foi o caso de Milei vitorioso na Argentina e agora com o tal Marçal candidato a prefeito de São Paulo. Daqui pra frente um vai tentar superar o outro em truculência e violência verbal já que infelizmente as massas populares são presas fáceis para esses tais justiceiros de ocasião vide a popularidade que alcançam os programas policialescos da TV como do Datena que explora a desgraça alheia.
Isto tudo é sinal de que mais e mais artifícios são criados para retirar a realidade do debate. Este é mais um artigo relevante sobre a pauta irrelevante que somos obrigados a discutir. Enquanto está em jogo a economia e a governança da maior cidade do país, tudo se paralisa para reduzir a discussão eleitoral à “economia da atenção”. Este é o ápice da redução. Inclusive pouco importa assunto colocado, parece que o que importa é a economia da atenção. Uma figura absurda, agressiva, sem objetivos que não seja lacrar, se torna um candidato de peso, sobre o qual todos falam. Ele ganha publicidade grátis. Goebbels já usou como método o uso exaustivo da mentira, que na época não era chamada de fake news, mas conseguiu estabelecer o Reich nazista.
Os Goebbels de hoje não precisam mais do suporte de instituições, partidos, nem mesmo da mídia tradicional. Precisam apenas das redes. E assim se tornam influencers, em geral em algum assunto que não tem nada de relevante ou nada a ver com a política e as necessidades de um país. Algo pontual, mas que pode trazer até milhões de seguidores. Segundo alguns especialistas trabalham com a “economia de atenção”. Uma espécie de show relâmpago, uma stand-up de curtíssima duração. Mas obviamente os robots aumentam a duração, isto é, repetição e alcance destas fragmentadas stand-ups, cuja função não tem nada a ver com o conteúdo, se é que tem algum. Apenas aumentam a exposição do influencer. E assim um debate político que já vinha sendo cada vez mais apelativo e cada vez mais balizados pela excitação dos mais baixos instintos, bala e bíblia, agora se encaminha pela ausência total de debate.