Aquiles Rique Reis
Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.
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Jean Charnaux: o cara é fera, por Aquiles Rique Reis

Matrizes (Fina Flor) é o CD do violonista e compositor Jean Charnaux. Confesso que nunca havia ouvido falar do moço, que dedicou seu CD a três grandes violonistas: Hélio Delmiro, Marcus Tardelli e Guinga. Mas, antes mesmo de colocar o disquinho para rodar, cochichei baixinho, para que só eu ouvisse (ainda que estivesse sozinho em casa): um violonista carioca, de 27 anos e com tamanho bom gosto para selecionar suas admirações, tem tudo para ser um bom instrumentista. Dito e feito.

Matrizes é um álbum bem gravado, cuja mixagem foi ajustada com precisão cirúrgica para tirar o máximo possível da sonoridade dos instrumentos. Nas onze faixas compostas por Charnaux, predomina o seu violão de seis cordas. As composições têm brilho próprio, ou seja, tanto podem brilhar ao toque do violão, como estão aptas a se deixar bem revelar por outro instrumento, como o piano ou o clarinete, por exemplo. O contrabaixo de André Vasconcelos o acompanha em duas músicas, numa delas com a bateria de Jurim Moreira. Moreira volta a acompanhar Charnaux em outra faixa, mas dessa vez com o contrabaixo de Pablo Arruda.

Além do toque do violão – seja ele com mais pegada ou mais delicado – , dá também para quase escutar a respiração do instrumentista. Tal virtude aproxima tanto a música do ouvinte que quase o coloca ao lado do violonista, como se fossem dois amigos de infância que se reencontram.

Como são curtinhas (juntas, as onze faixas não somam 30 minutos), as músicas veem como pequenas ondas que lavam a areia da praia, numa arrebatadora sucessão de belezas. Mal uma termina, sem que haja tempo para recuperarmos a emoção sentida, outra tem início… como se a beleza de uma engrandecesse a outra, aumentando a boniteza que têm. Meu Deus do céu!

Logo de cara, o dedilhado em “Celeste” fascina. Pela sequência de notas, quase sem trastejar (leve ruído causado pelo correr dos dedos por sobre as cordas), já dá para sacar a dimensão do músico. Virtude esta que está presente nas demais músicas.

Com nuances acentuando as dinâmicas, tem início “Prelúdio em Mi Maior”. Desdobrando-se em sentimento, o violonista faz a canção soar bonito.

“Guinguiana” é a forma que Charnaux escolheu para homenagear um de seus mestres. A levada nordestina, a harmonia e o ritmo são a cara do homenageado. Tudo simples e belo, refletindo a alma do Nordeste que ali pulsa forte. E que segue pulsando firme também em “Voador”, outro exemplo de brasilidade.

“Trem Pelo Brasil”, outro grande momento do disco, fecha a tampa. Com o ritmo a cargo da bateria e do contrabaixo, o violão dispõe da chance de se revelar ainda mais suingado.

Nem popular nem erudito, o cara é fera. A técnica com que maneja as cordas do violão o aproxima do primor. Seu virtuosismo se faz nítido sem que ele precise complicar as composições, sem que faça dos solos uma cachoeira de notas tocadas apressadamente, ou que as harmonias se rebusquem em falsa erudição… Não há mais palavras: o cara é fera.

Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4

Aquiles Rique Reis

Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.

6 Comentários

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  1. Acatando a sugestão, fui

    Acatando a sugestão, fui ouvir o rapaz no youtube. Muito bom violonista, mesmo. Aos vinte e sete, já é todo ‘manhoso’! Curti!

  2. Localização

    Sem criticar, apenas sugerindo, acho que essa matéria deveria estar no blog de violão. Para melhor organização dos assuntos.

    Vou procurar ouvir o disco e, quem sabe, compra-lo.

    Abraços.

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