No desastre de Brumadinho, CVM expõe a praga dos CEOs genéricos, por Luís Nassif

A praga dos CEOs genéricos, montados no estilo Welch, surgiu com a 3G de Jorge Paulo Lemann. O desastre das Americanas foi consequência óbvia

Antonio Cruz – Agência Brasil

O CEO genérico foi a maior praga já criada pela administração privada. Baseou-se no modelo Jack Welch, um blefe que encantou muitos empresários nos anos 90.  Sobre Jack Welch vale a pena ler o artigo “Como a Boeing foi colocada no caminho do desastre pelo culto a Jack Welch”.

A primeira vez que ouvi falar dele foi pelo banqueiro Walther Moreira Salles, depois de uma de suas viagens anuais pelo mundo. Voltou impressionado dos Estados Unidos com a nova lenda que se formara em torno de Welch.

O capitalismo estava prestes a uma de suas mudanças radicais, substituindo o capitalismo de família pelo dos CEOs genéricos, pessoas sem conhecimento específico da atividade, especialista exclusivamente em aumentar o valor de mercado da empresa.

Como faziam isso? Segundo a fórmula Welch, reduzindo custos em todos os cantos, na manutenção, no desenvolvimento, apertando os fornecedores, montando layoffs periódicos, vendendo ativos para engordar os dividendos, usando os lucros para a recompra de ações. Em suma, a fina flor do imediatismo da financeirização, sacrificando o futuro em beneficio do lucro imediato.

Entrou-se na fase terminal da financeirização, com o CEO genérico participando dos lucros, tendo direito a ganhos inimagináveis em períodos mais racionais do capitalismo.

Agora, a condenação do ex-CEO da Vale, Fábio Schvartsman, no voto do relator Daniel Maeda, da Comissão de Valores Mobiliários, é a comprovação cabal dessa imprudência das S/As brasileiras com os CEOs genéricos.

Segundo o relatório:

  • os Acusados não participavam de discussões relacionadas ao risco de rompimento de barragens, se contentando em receber informações resumidas e genéricas;
  • não solicitavam relatórios ou qualquer outro documento que poderiam mostrar o verdadeiro estado da Barragem B1;
  • se limitavam apenas a tomar conhecimento de que as DCEs eram emitidas, não procurando se informar em que condições; não participavam de nenhuma reunião do PIESEM e não tinham “curiosidade” em receber os relatórios finais, que possuíam informação a respeito da não conformidade relacionada às barragens, especialmente, quanto à Barragem B1;
  • não havia reuniões com subordinados para discussão específica do assunto; vários funcionários da Companhia tinham conhecimento sobre os riscos e instabilidades das barragens, assim, tais informações poderiam ser obtidas com um “mínimo esforço”;
  • após o rompimento da Barragem B1, várias barragens da Vale foram consideradas como acima do risco permitido, demonstrando que essa era uma situação endêmica que os diretores deveriam saber; e
  • a Diretoria Executiva sempre tratava o risco de rompimento das barragens junto de diversos outros riscos, que tinham potencial gravoso muito menor.

A praga dos CEOs genéricos, montados no estilo Welch, surgiu com a 3G de Jorge Paulo Lemann. O desastre das Americanas foi consequência óbvia desse estilo. Antes dele, a quebra da Sadia e do próprio Unibanco – que se salvou sendo adquirido pelo Itaú – também se deveu à adoção sem critério desse sistema de corta-custos e corta-futuro.

Mesmo a grande revolução da gestão, nos anos 90, com os programas de qualidade total, acabou substituída pela tesoura implacável de CEOs genéricos.

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2 Comentários

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  1. Nassif
    A muitos anos atrás, li durante um voo na revista da TAM, na época do Comandante Rolim, um artigo de economia em que dizia que cortes excessivos nos gastos visando lucro poderiam GERAR ANEMIA E QUE ANEMIA MATA.
    “Parece coincidência”

    Infelizmente não lembro o nome do autor, mas era muito conhecido.

  2. A normalização do curto prazo na atividade empresarial é a forma atual e disfuncional de gerir patrimônios diversos.
    Mas não só.
    A visão do imediato espalhou-se por todos os setores e explodiu com o advento do celular e das redes sociais .
    Alguns anos atrás o verbo “causar” foi lançado genericamente para toda e qualquer atuação humana sem a necessária explicitação do que causou.
    Na televisão as entrevistas são restritas e pouco explicativas.
    Na sequência, natural, apareceram os “influencers” muitos em confluência com atividades criminosas e não adequada e prontamente sujeitas à ação policial. Ditam padrões, conceitos e ganham muito dinheiro com a financeirização da atividade.
    Neste tranco perdemos racionalidade, funcionalidade e outros qualificativos da atividade e comunicação social e particular.

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