Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva
Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva é economista, estudou o mestrado na PUC, pós graduou-se em Economia Internacional na International Afairs da Columbia University e é doutor em História Econômica pela USP. Aposentou-se como professor universitário, e atua como coordenador do NAPP Economia da Fundação Perseu Abramo, como colaborador em diversas publicações, além de manter-se como consultor em agronegócios. Foi reconhecido como ativista pelos direitos da pessoa com deficiência ao participar do GT de Direitos Humanos no governo de transição.
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Reflexões sobre a PEC 6×1, por Luiz Alberto Melchert

O texto deixa nebulosa a possibilidade de se fazerem horas-extras. Isso abre espaço para dois cenários de comportamento do empregador

José Paulo Lacerda – CNI

Reflexões sobre a PEC 6×1

por Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva

Todas as vezes em que se publica um extra nesta coluna, afirma-se que ela não é jornalística, porém, reflexiva Não é sua intenção relatar fatos, mas refletir sobre acontecimentos relatados por quem tem muito mais competência para o fazer.

A PEC 6×1, como ficou conhecida, embora ainda não tenha um número oficial, é de uma simplicidade draconiana. Reza que a jornada de trabalho não pode ultrapassar oito horas em quatro dias, num total de trinta e seis horas por semana. Até onde minha calculadora consegue chegar, trinta e seis horas por semana, divididas por quatro dias resultam em nove horas por dia. Como resolver isso? Pela compensação de horas, ou seja, as quatro horas que sobram teriam que se compensadas num quarto dia, dependendo de acordo sindical. O texto também deixa nebulosa a possibilidade de se fazerem horas-extras. Isso abre espaço para conjecturar dois cenários para antever o comportamento do empregador

No primeiro caso, em que se permitem duas horas extras por dia com um suposto acréscimo de 100%, o empregador tenderá a recalcular  o salário-hora como se segue: Duas horas extras por dia, numa semana de quatro dias, correspondem a oito horas. Acrescendo-se a elas os citados cem por cento, serão dezesseis que, se somadas às trinta e seis iniciais, resultam em cinquenta e duas horas. Como anteriormente se pagavam quarenta e quatro horas semanais, dividindo-se 44/52, teremos que a redução de salário seria de 15,4% para manter o dispêndio no mesmo patamar que antes. Um cidadão que ganhava R$10.000,00 ao mês, passaria a amealhar R$8.460,00, caso o empregador queira manter o custo com mão de obra.

No segundo caso, em que não se permitem horas-extras, mas a nona hora do dia tenha de ser compensada num quinto dia útil, a conta seria mais simples, bastando dividir as novas trinta e seis horas pelas tradicionais quarenta e quatro, resultando numa perda de 18,2%, ou seja, um trabalhador que ganhava R$10.000,00 ao mês passaria a receber R$8.180,00.

O leitor pode alegar, com razão, que a mesma constituição não permite a redução de salários. Existem inúmeros subterfúgios para se fazer isso, sendo o mais comum demitir o empregado, fazê-lo trabalhar sem registro por noventa dias e reconduzi-lo ao cargo com os novos vencimentos. Numa análise fria, a medida seria inócua. Só que não é bem assim. No primeiro cenário, nenhuma hora-extra a mais seria aceitável, deixando o empregado no fio da navalha, sendo compelido a contratar mais gente para não correr o risco de perder vendas. No segundo caso, supondo-se que a produtividade seja constante, serão necessárias mais pessoas para o mesmo nível de produção.

É nesse ponto que entra a experiência do empregador. Ele sabe que não se contrata uma pessoa para cobrir uma ou duas horas por dia. Quando se agrega mais alguém à equipe, haverá um salto de horas disponíveis, ou seja, contratar empregados aumenta a capacidade de produção aos saltos, não de uma forma contínua como os livros costumam documentar. Além disso, as pessoas especializam-se o que pode desequilibrar a harmonia no esforço em produzir.

Quem está lendo este texto até agora, pensará que há um choque negativo pela redução da jornada de trabalho. Não é necessariamente assim. A melhora nas condições de trabalho vêm sendo exaustivamente estudadas em psicologia e administração da produção há um século. O Experimento de Hawthorne foi uma série de estudos realizados entre 1924 e 1932 na Western Electric Company, em Hawthorne, Illinois, EUA. A pesquisa foi liderada por Elton Mayo e outros cientistas sociais. Objetivo inicial:

Investigar o impacto da iluminação no ambiente de trabalho sobre a produtividade. Os pesquisadores estenderam o experimento, introduzindo várias mudanças no ambiente de trabalho, incluindo:
1. aumento e diminuição da iluminação;
2. mudanças nos horários de trabalho;
3. Intervalos mais frequentes;
4. Melhoria nas condições de trabalho.

A produtividade aumentou consoante às mudanças realizadas. Quando as mudanças foram revertidas, a produtividade não caiu. O Experimento de Hawthorne revelou que o fator mais importante para a produtividade não era o ambiente físico, mas sim a atenção e o reconhecimento dado aos trabalhadores. A participação nos estudos e a sensação de serem valorizados aumentaram a motivação e a satisfação dos colaboradores. Por causa disso, é muito provável que os empregadores que não usarem subterfúgios para reduzir os ganhos dos trabalhadores a fim de manter o nível de custo de mão de obra,  tenham um inesperado ganho de produtividade com a consequente redução de custos.

Mas nem tudo são flores. Há muito o que regulamentar. Há mais de dez tipos de jornada de trabalho. Os profissionais de saúde podem ter jornadas de 12×36, ou 24×72; trabalhadores em atividades ininterruptas como granjas, leiterias, aeroportos entre outras, costumam usar a escala 6×2; trabalhadores em shppping center e lojas que abrem aos domingos, têm escala em rodízio; os que trabalham em condomínios fazem a escala 5×1. Tudo isso deverá ser revisto e, provavelmente para mais conforto do trabalhador e ganho do país. Ganhos sociais nunca são catastróficos, retirada de direitos invariavelmente levam ao caos.

Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva é economista, estudou o mestrado na PUC, pós graduou-se em Economia Internacional na International Afairs da Columbia University e é doutor em História Econômica pela Universidade de São Paulo. Depois de aposentado como professor universitário, atua como coordenador do NAPP Economia da Fundação Perseu Abramo, como colaborador em diversas publicações, além de manter-se como consultor em agronegócios. Foi reconhecido como ativista pelos direitos da pessoa com deficiência ao participar do GT de Direitos Humanos no governo de transição.

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