
O veredito de absolvição no caso Daniel Alves mostrou que, para uma mulher, denunciar um estupro nunca é suficiente. Não bastam provas, testemunhas ou mesmo coragem quando o agressor tem poder e influência, o que nos leva a questionar o que mais uma mulher precisa fazer para ser considerada vítima.
Nesta sexta-feira (28), a Espanha decidiu que a palavra de uma jovem de 23 anos – que teve lesões comprovadas, exame de DNA, testemunhas (incluindo policiais) e imagens da noite do crime – não é “confiável”. O tribunal catalão usou o argumento da “falta de fiabilidade” para absolver Alves, ignorando que o jogador mudou sua versão cinco vezes ao longo do processo, sempre que novas evidências o desmentiam.
Em 2023, Alves foi condenado a 4 anos e 6 meses por agressão sexual após estuprar a jovem no banheiro de uma boate em Barcelona. Agora, está livre após pagar 1 milhão de euros (R$ 6,2 milhões) de fiança – valor que simboliza justiça para quem pode comprá-la.
Um sistema que exaure a vítima
Ao GGN, a ativista e primeira brasileira a judicializar um aborto na Suprema Corte, Rebeca Mendes, disse que estamos diante de um caso emblemático, isso porque a vítima seguiu todos os protocolos. “Ela tinha acesso a recursos financeiros, provas materiais, testemunhas. E mesmo assim o tribunal vai dizer que a palavra dela não é confiável”.
Para a escritora Debora Diniz, a palavra da mulher é submetida “a rituais de veridição, de testes de verdade que não buscam o que de fato aconteceu, mas brechas de proteção aos potenciais agressores”. O resultado? Um sistema que exaure a vítima até que ela desista de buscar justiça.
Esse caso traz à tona uma questão ainda mais dolorosa, a constante luta para que as vozes sejam ouvidas antes que a violência atinja o extremo do feminicídio. “O que uma mulher precisa fazer para que ela seja entendida pelo judiciário como uma vítima? Quando ela morre? Porque se foi ‘apenas estuprada’, tudo bem?”, questionou Rebeca.
A pergunta não é retórica: no Brasil, apenas 8,5% dos estupros são denunciados, segundo o IPEA. No ano passado, a projeção do instituto era de 822 mil casos anuais.
O caso Daniel Alves expõe ainda como o patriarcado se transforma em estratégia de defesa, um jogo perverso que inverte culpas e joga sobre a vítima o peso do crime que sofreu.
Patriarcado como estratégia de defesa
Para a comunicadora e ativista Rozana Barroso, a sociedade insiste em questionar a conduta da mulher, como se o problema estivesse nas reações da vítima, e não nos atos do agressor.
Essa lógica perversa, segundo ela, se materializa nos interrogatórios destrutivos, como “por que esperou?” ou “por que foi com ele?”, perguntas que desviam o foco do debate que realmente importa, “por que nossa sociedade produz tantos agressores sexuais?”.
São questionamentos que revelam a estrutura patriarcal em ação e ignoram que a denúncia pode surgir tempo depois da violência sofrida por se tratar de um momento em que a vítima finalmente se sente segura para romper com o silêncio.
É possível traçar um paralelo com o recente caso de Juliana Oliveira, ex-assistente do programa “The Noite”. Ao denunciar Otávio Mesquita por atos libidinosos ocorridos em 2016, a comediante enfrentou o mesmo roteiro de descrédito.
O apresentador, por sua vez, defendeu-se classificando a agressão como “brincadeira de época”, argumento que, segundo Rozana, revela como a violência ainda é naturalizada sob o disfarce do humor.
“De fato, o episódio aconteceu há anos, o que não impede da Juliana ter o direito de denunciar agora, de ter entendido agora, principalmente por entender que nós mulheres passamos por situações como essa diariamente e muitas vezes demora mesmo para cair a ficha, porque nós somos submetidas à situação de violência, à situação de assédio, à situação de abuso e muitas vezes não temos reações contra isso”.
A absolvição de Daniel Alves pelo tribunal catalão não é um erro jurídico – é a regra. Mais uma vez, o sistema penal tratou a palavra de uma mulher como moeda de troca, enquanto o poder e o dinheiro do agressor valeram como prova de inocência. O caso escancara a pergunta que persegue todas as vítimas de violência sexual: quantas cicatrizes, exames e testemunhas são necessários para que uma mulher seja considerada digna de crédito?
Um sistema que reconheça as vítimas como sujeitos de direitos, não como personagens de uma narrativa constantemente posta em xeque, é urgente. Se até provas materiais são insuficientes, o que resta às mulheres que denunciam? E às que não?
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Isso é uma monstruosidade. Pobre Justiça humana, só embuste e pervesidade. Cenário medieval….
E o tribunal que o inocentou era constituído por três mulheres e um homem. Alguém, por favor, explique.
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O Brasil tão mal acostumado com suas instituições capengas, nas quais não confia, que quando uma sentença não é do seu agrado, logo as culpa, não sem razão. O Brasil tem um festival de impunidade que abrange o andar de cima que é difícil pensar diferente. Transferir esse sentimento para outros países demonstra que a falta de confiança nelas se torna ideológica e não mais racional. A sentença de absolvição, para quem leu pelo menos o resumo pela imprensa, demonstra as dúvidas tanto no relato da vítima quanto do réu, agora inocentado, com relação a sequencia de eventos, seus testemunhos e as provas materiais, como o vídeo. Os fóruns de discussão, dos sites ditos progressistas, estão apinhados de ataques ao povo espanhol, aos juízes, ao réu. Isso mostra que o progressismo no Brasil está longe de ser qualquer coisa progressista. Além do que é um desserviço ao combate contra a violência à mulher esses tipos de acusações infundadas como vimos com Johnny Depp, Marcius Melhen, Neymar, entre outros. Longe de estar alinhado ao personagem da história, ao contrário cultivo um profundo asco por suas posições ideológicas, e sentir uma imensa sensação de injustiça, preferi confiar no relato dos juízes, agindo de forma mais racional e não sentimental/ideológica. Temos que construir um país onde podemos confiar em nossas instituições, acabar com a impunidade para certas castas, e assim parar de transferir nossa indignação para as instituições e povos de outros países que sequer nos dizem respeito.
O que a mulher precisa é se defender sozinha. Se a legítima defesa da mullher fosse privilegiada, homem não folgava com ela.
A polícia sempre dúvida das alegações do acusador, qualquer pessoa, homem ou mulher, sempre dizem o mesmo da polícia, parece que o acusador é vilão, este é padrão de trabalho da polícia, não é por ser mulher. Essa ideia de achar que todos que são acusados são culpados é próprio das pessoas da extrema direita, pra mim não existe mais esquerda, só existem neoliberais e extrema direita.
Ficou provado com base em filagens que a denuncia eh falsa.