Opinião do Nassif: a Lava Jato e seus exageros

Como a falta de comando no MPF resultou, nos últimos anos, em ações anticorrupção mais onerosas para o país do que a própria corrupção
https://www.youtube.com/watch?v=sUrptQVTPgA width:700
 
Saiu na Ilustríssima da Folha S. Paulo, deste domingo (02), um belo artigo, escrito por Caio Farah Rodriguez, com o título ‘Além de enfrentar a corrupção, Lava Jato impõe capitalismo a empresários‘, mostrando a lógica sistêmica dos acordos de leniência. 
 
Farah Rodriguez não compara a Lava Jato com a operação italiana Mãos Limpas, mas sim compara com um caso que foi à Suprema Corte norte-americana em 1954, sobre a discriminação contra uma menina negra em uma escola. Na sentença, qual foi a ideia aplicada? Você tem hábitos arraigados de corrupção, discriminação, por exemplo, e o papel da sentença não é, meramente, punir, ela tem que definir uma maneira de romper com aquele sistema já estratificado. Então, nesse caso da menina, a escola foi obrigada a aceitá-la, mas, não apenas isso, teve que aplicar a condução adequada para a garota. Então, o distrito teve que providenciar a segurança dela. Assim, foi sendo criado todo um microuniverso em torno daquele ato para romper com hábitos estratificados.
 
No caso do acordo de leniência, Farah Rodriguez mostra idealmente quais seriam os reflexos da Lava Jato, mesmo com todos os erros cometidos. Então você pega uma grande empresa, por exemplo a Odebrecht, faz um acordo de leniência suficientemente severo, porque se não for cumprido o que se definiu no pacto a empresa acaba. Então isso obriga a empresa, dentro daquele universo dela, a estender as relações virtuosas a todo o seu corpo de fornecedores e de clientes, porque ela não pode mais aceitar o tipo de jogo ilegal.
 
Dessa forma você vai criando esses universos saneados, digamos, que acabam se ampliando e rompendo a cadeia da corrupção. No caso brasileiro, o artigo coloca bem isso, existe toda uma estrutura viciada, histórica e política que acabou virando regra em todas as relações com o setor público. 
 
Mas o artigo não aborda todos os eixos, entrando no campo jurídico, sociológico e político. Quando você lança ações anticorrupção com essa envergadura e com interesses partidários, claramente definidos, você confere um poder na ponta e está tratando com pessoas humanas, como se diz. No judiciário, sempre que você vê uma falha, uma fraqueza de um magistrado, de um ministro da alta corte, os juristas operadores do direito dizem: ‘mas ele é humano’. Mas esses são excessivamente humanos.
 
Então, o artigo analisa, conceitualmente, idealmente os desdobramentos da Lava Jato, mas não fala do conjunto de abusos que acabam cometendo quando não se tem comando a frente do Ministério Público. 
 
Vamos pegar um exemplo, do caso Gripen – Como o MPF criminalizou a compra do Gripen. Aqui eu uso um artigo do Roberto Godoy, repórter especialista do Estadão, muito bom, na área de defesa, chamado ‘Novo caça brasileiro começa a alçar voo’. A política foi um feito extraordinário para o Brasil, você teve a licitação do FX, inicialmente se queria o Sukhoi, da Suécia, mas os Estados Unidos pressionaram pela Boeing. Dilma acabau optando pelo Gripen, sueco, porque a aeronáutica tinha optado por ele, por ser o que permitia a maior transferência de tecnologia. 
 
Resultado: temos hoje os primeiros aviões que estão em teste. Assim que as 36 unidades começarem a chegar, em 2019, em pouco tempo o Brasil estará participando desse restrito universo dos países que vão disputar esse mercado dos aviões supersônicos. 
 
Tempos atrás, nos anos 1990, houve o projeto do Supertucano da FAAB, onde a Embraer participou do desenvolvimento. Com isso a empresa brasileira ganhou grande competência técnica nessa área de supersônicos, o que até então não tinha. O acumulo de conhecimento ajudou, posteriormente, a Embraer a lançar sua linha de aviões comerciais maiores. Do mesmo modo a tecnologia absorvida com o Gripen vai permitir grandes avanços na própria aviação civil. 
 
Esse programa, portanto, foi um processo sistêmico envolvendo Forças Armadas, a decisão política com o então ministro Nelson Jobim, com o Lula, principalmente, a Dilma refazendo o diagnóstico inicial e aceitando que o grande avanço seria a transferência de tecnologia. Porém, tudo isso foi resumido pelo Ministério Público a um caso de escândalo absolutamente inverossímil. 
 
O que o MPF considerou? Tinham muitos consultores da SAAB-SCANIA, sendo um deles um senhor que conheceu o Lula anos atrás, ainda no tempo da indústria automobilística, e, para fazer uma graça, resolveu o Lula, já fora do governo, arrumar esse senhor como patrocinador para um campeonato de rugby do seu filho.
 
Então, o que fazem esses procuradores? Pegam uma licitação de 10, 15 bilhões de dólares e dizem que aqueles 2 milhões, ou 1,5 milhão de reais de patrocínio tem uma vinculação. Por que isso acontece? É uma profunda ignorância econômica de todo processo de transferência de tecnologia. O coitado do procurador vai para o Distrito Federal, saí um dos factoides dos jornais, de viés partidário e político, daí aquilo é transformado em representação que vai parar na mão do procurador que tem que mostrar serviço, daí ele sai buscando pelo em ovo de todo o jeito.
 
O grande erro é a fala de comando que perdurou durante todos esses anos no Ministério Público Federal.
 
O que um procurador deveria fazer? Quando começa esse terremoto de buscar escândalo em qualquer lugar, realizar um curso chamando os procuradores, forma um grupo de trabalho para discutir o que são os financiamentos do BNDES, o que é o acordo FX, como foi toda a tramitação, as instâncias que foram envolvidas. Isso tudo faltou nesse período. Então, o procurador recebe a representação e tem que mostrar serviço. Veja, portanto, o desperdício que ocorreu esses anos todos com o conjunto de factoides, desviando procuradores de trabalhos em cima dos escândalos que existem efetivamente.
 
Em suma, um grande desperdício de mão de obra especializada atendendo a um jogo com a mídia e, com isso, se partidarizando com a mídia. É isso que se espera da nova Procuradora-Geral, é impedir esses desperdícios e que uma ação anticorrupção acabe ficando mais onerosa para o país do que a própria corrupção. Os primeiros pontos que ela coloca na sua plataforma são relevantes. Então, o que esperamos, é essa profissionalização que traz esses princípios, a renovação que traz esperança para o MPF e que ele possa se constituir, efetivamente, em uma força inteligente, e não nessa força cega em que se transformou com esse exibicionismo e essa falta de limites da Lava Jato. 
Gripen Fonte: Saab Planet
Foto: Saab Planet 
 
 
Redação

11 Comentários

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  1. A mp já sabe. o golpe e os golpistas destruíram o país.

    Está provado pelos fatos e números: o golpe e os golpistas destruiram o país. Não só economicamente, mas moralmente, legalmente, institucionalmente. O desastre que causaram está aí. A lava jato fez o seu papel sujo e deu nisso.

    O estrago foi enorme e continuará sendo.

    A única chance de retomada é a “revogação do golpe”.

    Ps.: Nassif, faça um balanco do desastre causado pelo golpe e golpistas. É imenso. Não deixemos de registrar este fato que nos esmurra a cara e mostra o que deu a irresponsabilidade destes golpistas. 

  2. A lava jato afundou os

    A lava jato afundou os submarinos da Marinha.

    Quer abater os novos caças da Aeronautica.

    Depois ela irá colocar areia nos motores dos tanques do Exército.

    Quando o país for invadido, os procuradores do MPF e os Juizes da Justiça Federal devem ser empurrados para a terra de ninguém com pistolas.

    Eles são heróis, que morram primeiro pelo país que destruíram. 

  3. Nassif uma pequena

    Nassif uma pequena correção:

    O projeto  que gregou os avanços tecnológicos a Embraer que vc se refere, foi o do caça subsônico porem a jato AMX desenvolvido pela Embraer com a então  Aeritalia, inicio em  1981. O primeiro avião a jato construído pela Embraer.             

    https://pt.wikipedia.org/wiki/AMX_A-1

    O Super tucano é um caça convencional  leve de muito sucesso mas a hélices, desenvolvido pela Embraer de outro projeto próprio  o avião treinador Tucano. 

    1. Grande correção

        Foi isto mesmo, sem o A-1 ( AMX ou Ghibli ) a série de aeronaves civis iniciadas com o EMB-145, não existiria.

  4. Para quem as empresas

    Para quem as empresas brasileiras (ou o que restar delas) vão reclamar das práticas desleais das concorrentes estrangeiras? Ou todas as empresas atuam seguindo manuais escritos por Franciscanos no Vaticano? Na teoria, tudo parece funcionar, mas a teoria, na prática, é outra.

    1. Nada, em todos os países do

      Nada, em todos os países do mundo, em maior ou menor escala, a iniciativa privada corrompe os estados nacionais. E na área de petróleo os valores são mesmo espantosos.

      Mas bem lembrado, CB: “as empresas nacionais ou o que restar delas” A gente não pode se esquecer de como é que Moro e procuradores detonaram as empresas nacionais. Não foi através de multas, foi entregando-as ao governo dos EUA que, como se sabe, é servo da iniciativa privada daquele país. Isso e através de vazamentos à mídia nacional (firmas como a “Globo”, “OESP”, “Abril”, “Folha” e demais membros do Instituto Millenium) que, como se está cansado de saber, também é servo da iniciativa privada estadunidense. O ideal é que a Justiça brasileira, como as de todos os outros países do mundo, protegesse a economia nacional. No mínimo dos mínimos não facilitasse para o dólar. Mas não: naõ só não protegeram como deram de bandeja a estrangeiros.

      Ou seja, Moro e Dallagnol não apenas prejudicaram as empresas nacionais mas sim traíram nosso país.

  5. Dilma, caminho para volta

    Hoje bem diferente de 3 meses atrás, há uma chance muito maior de Dilma voltar à presidencia, tanto pela via jurídica uma vez que está provado que a sua destituição foi uma fraude, quanto pela situação atual na qual nos encontramos, e também pela maior compreensão por parte daqueles que foram às ruas contra ela hoje muito menos refratários a um possível retorno. Portanto, se houver um diálogo com a oposição e setores da sociedade é muito provável que este seja o caminho mais fácil e possível. Resta saber se o PT que só faz besteiras enxerga essa possibilidade e trata de mexer os pauzinhos.

  6. O medo “deles”: Raquel Dodge é uma LEGALISTA. Só isso (!)

    Reação já começou… acordão em plena marcha!

    Folha confirmou – com off 3 dias depois! – tudo isto aqui que antecipamos na quinta passada (!):

    ATENÇÃO: NÃO SEJA ENGANADO! MORO E DALLAGNOL – E A GLOBO! – FORAM DERROTADOS NO STF

    Ou:

    (título alternativo)

    “Tempos estranhíssimos: foi necessária a boca ~suja~ de Gilmar Mendes para lavar a alma do Estado democrático de Direito no STF”

    Por Romulus

    – Além da decisão do STF ser um NADA (“conteúdo”?)…

    – Esse NADA não se aplica a…

    – … NINGUÉM!

    – Sensacional, não?

    – Em resumo, o acórdão é uma…

    – … declaração de intenções (!)

    – Perfeitamente inócuo juridicamente, mas com uma mensagem “política” clara:

    (1) “Os Ministros do STF são um bando de frouxos”;

    (como bem disse Lula, grampeado por… Moro!)

    Que…

    (2) decidem… ~não~ decidir (!);

    E que…

    (3) enfrentarão o pepino das delações caso a caso (opa!), à la carte, sem definir uma regra geral ~clara~.

    Sabe qual a hashtag que isso tudo aí chama??

    #Acordão!!

     

    LEIA MAIS »

     

    http://www.romulusbr.com/2017/06/atencao-nao-seja-enganado-moro-e.html

  7. Acho que só a Dilma

        O relatório da COPAC sobre o programa FX-2 preparado por anos pela FAB, umas 5.000 páginas, acho que alem do pessoal da COPAC que o preparou, só a Dilma leu e decidiu.

         E meus caros, depois que um destes rapazes procuradores alegou normas da WTO/OMC para verificar o contrato do Gripen, já dava para perceber que deste ramo ele não entende nada ( nem seus mestres lá do Norte explicaram ), pois produtos de defesa não são sujeitos a qualquer controle ou painel da OMC.

         P.S. :   ” Menos delirio ” – Escrever que o Brasil ao participar deste programa, irá futuramente competir no mercado de aeronaves supersonicas, classificar de fantasia é elogio, a India que gasta os “tubos” em defesa & tecnologia, esta desde 1983 procurando tal expertise, foi conseguir somente agora, mesmo assim a motorização do HAL Tejas é GE ( F404 ).

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