Reforma é única saída para problemas do Judiciário, diz desembargador

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Carlos Henrique Abrão, no Consultor Jurídico

As pesquisas acentuam o descrédito da população em relação à Justiça.

As instituições não inspiram confiança de um modo geral, mas as causas precisam ser mais bem exploradas e discutidas.

Cogita-se da Reforma do Judiciário, mas ela nunca é feita como se espera. Mudamos nossos códigos, alteramos as leis, fazemos medidas provisórias, tudo de modo paliativo, porém não se dialoga e se levanta, de maneira transparente e objetiva, o sentido do congestionamento, da demora, e a razão pela qual as principais cortes do país apresentam debilidades no enfrentamento das causas levadas ao conhecimento.

O ministro Joaquim Barbosa, já na sua despedida do STF, deixa algumas lições e reflexões importantes para todos nós que almejamos um Judiciário mais perto dos problemas da sociedade civil e que não seja tratado com menoscabo pelos demais Poderes da República.

Custa-se a acreditar que um ministro presidente da Suprema Corte abandone sua função antes do vencimento e da expiração do mandato. São contingências inexplicáveis, mas para tudo há algo de positivo.

Os franceses já diziam a chaque chose malheur est bon. E isso se fortalece na medida em que a reforma deve adotar parâmetros, a começar pelo enterro solene da Lei Orgânica da Magistratura, a revisão do papel do Conselho Nacional de Justiça, a subsistência da Justiça castrense, a composição dos tribunais, a exagerada demora na promoção em alguns estados e, fundamentalmente, o critério de o mérito ser colocado antes da antiguidade e ser amplamente aplicado em todo o território nacional.

O processo eletrônico é uma moderna e nova ferramenta que se incorpora à Justiça brasileira. Porém, a prestação de serviços jurisdicionais está bem longe da vocação da sociedade, da expectativa da cidadania e do interesse de reduzir a impunidade, aumentando as condenações para efetivo cumprimento.

Reestudar o quinto constitucional é primordial e fundamental. Juízes esperam mais de 25 anos para chegar às últimas instâncias e são preteridos muitas vezes pela falta de vagas. O quinto deveria ser reduzido ao décimo e, paulatinamente, extinto. Não há mais espaço para sua estabilidade.

O que observamos é um total desinteresse pela carreira da magistratura. Somente no estado de São Paulo, mais de 200 cargos estão vagos. A reforma da Previdência, o salário defasado, as adversas condições de trabalho e, sobretudo, a espera de três anos para fazer o concurso, todos esses ingredientes levam o formado em Direito a procurar outras opções, ainda que menos vantajosas sob o prisma do salário.

No entanto, o interminável serviço necessita de novas fórmulas. Assim como as instâncias superiores fazem com repercussão, relevância, recurso repetitivo e tudo o mais, não é mais operante no século XXI a infindável discussão de causas idênticas individuais, com o uso quase imperceptível de ações coletivas ou de ordem difusa.

A arrecadação é pequena e houve uma explosão de gratuidade nos últimos cinco anos. Metade das causas em tramitação se faz pela assistência judiciária gratuita, e isso não pode mais perpetuar.

Os estados aniquilam o funcionamento da Justiça, apequenando-a com orçamento incompatível e transferindo todas as responsabilidades para ela. Todos os meios alternativos foram esvaziados e os juizados estão assoberbados de processos. A função do crédito fácil, dos planos de saúde e de questões rotineiras, tudo desagua na jurisdição.

Em pleno século XXI, da moderna tecnologia, das ferramentas e dos instrumentos eletrônicos, não é mais possível convivermos com o processo retrógrado, artesanal, cujo custo-benefício não compensa a intervenção amiúde do Estado-Juiz.

A ampla reforma é o caminho natural para apararmos as arestas e refundarmos a base de um novo Judiciário brasileiro.

Carlos Henrique Abrão é desembargador do TJ-SP

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

10 Comentários

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  1. “A reforma da Previdência, o

    “A reforma da Previdência, o salário defasado,””

    Dizer que o salário no nosso corrupto Poder Judiciário está defasado, só pode ser piada!!!

    1. Ele falou em salário só para

      Ele falou em salário só para despistar, no fundo odeiam o PT porque o LULA fez uma reforma previdênciária que lhes tirou o privilégio de aposentarem com salário integral sem pagarem para isto.

    2. O fato do salário ser alto é diferente de estar ou nao defasado

      Pode-se discutir se o salário de um juiz deveria ou nao ser alto (pessoalmente acho que sim, porque pelo menos facilita a resistência a subornos…). Agora, se o salário era X, e passou muito tempo sem ser corrigido, ou corrigido abaixo da inflaçao, está sim defasado, e isso é uma espécie de estelionato com o servidor. 

      É um cargo de muita responsabilidade, que exige formaçao extensa e inclui riscos. Melhor que seja bem pago, isso custa mais barato para o Estado do que uma maior susceptibilidade dos juízes à corrupçao. Em termos ideais isso nao deveria ser assim, mas a realidade é o que é, nao a que deveria ser idealmente. 

  2. MUdar tudo.

    Acho muito difícil, tinha que mudar tudo. Mas que tal tirar os juizes de detrás dos enormes pacotes de papel que chamam de inquerito e coloca-los frente a frente com os acusados e a vítima e seus familiares, escutá-los e seus advogados, tão cedo quanto possível e ali mesmo aplicar a pena?

    Isto de a polícia prender, soltar, e abrir inquerito na justiça para daí a 10 anos, quando os personagem nem são mais as mesmas pessoas, não tem nada com justiça.

  3. Para variar, o ínclito

    Para variar, o ínclito magistrado esquece do principal: quais as razões para o excesso de judicialização no nosso cotidiano? A Justiça Federal, por exemplo, vive esse gigantismo em função da previdência oficial e dos financiamentos imobiliários da CEF: resolvidos esses 2 casos, poderia diminuir em cerca de 70%. Qual a razão para as leis não serem feitas e cumpridas em sua integralidade? Qual a razão para juízes reescreverem a legislação, quando da apreciação judicial de casos concretos? A mesma Justiça Federal, vê-se, com a criação das varas recursais, reinventou os “tribunais de alçada”, sem qualquer base jurídica-legislativa para tanto. A segurança pública, via Polícia Civil, responsável pelas investigações e inquéritos, sabemos todos, está sucateada (pessoal e material), já que os “financiamentos” de campanha, sempre e sempre, encontram doadores proprietários de empresas privadas de segurança (em SC, inclusive, os irmãos Berger, são donos de uma dessas empresas); então, os administradores públicos (governadores e prefeitos) não querem nem saber de colocar dinheiro nisso (e contrariar seus financiadores). Daí, os inquéritos são mal feitos, defasados; as investigações não andam; falta pessoal para qualquer função; o MP, por sua vez, desconsidera os inquéritos por estarem incompletos; e os casos morrem por aí. Haja crime. Nas demais áreas, tudo é judicializado: procons não funcionam, agências reguladoras não regulam, governos são omissos ou comprometidos; sobra um judiciário que se defende por dentro, corporativamente, como se essa “valorização” melhorasse a vida de quem quer que seja. No fundo, no fundo, ninguém está preocupado com o bem viver da população que se explode cada vez que necessita de amparo constitucional.

  4. Não há como se fazer Justiça

    Não há como se fazer Justiça qdo os responsáveis por isso não fazem qq ideia do país como um todo. Temos há decadas um judiciário absolutamente elitista, magistrados que vão decidir a partir de sua visão de mundo ou, no máximo, a partir do politicamente correto que é nada menos que uma percepção imposta; ou seja, o ocntato com a realidade é zero. Pra mudar, só no tranco; assim como fizeram com o “Mais Médicos”; a categoria inteira chiou mas teve que expor seu elitismo e corporativismo. A existência de 200 vagas para a Magistratura em SP é surreal; devem ter milhares de profissionais querendo concorrer a essas vagas mas que devem ter sido avaliados como não suficientemente bons para tão nobre função. Ora, que palhaçada, é a mesma teoria dos médicos e da OAB, a sociedade merece o “melhor do melhor”, se não for isso, não é nada. E, bem,,, estamos vendo aí, quem são, afinal, os melhores entre os melhores… Não resolvem essa questão pq não tem interesse, ou melhor, tem interesse em manter as coisas como estão para dar uma valorizada na profissão bem como, manter a reserva de mercado.  A OAB segura os profissionais,os concursos ” selecionam” os que querem e o que sobra das vagas é distribuído entre, eventuais aprovados… Não existe explicação para 200 vagas para a magistratura. Reforma do Judiciário, só no tranco. Os caras tem levar um primeira cacetada para cairem na real. A Justiça não pode estar a mercê de castas, se está, não é Justiça.

  5. REFORMA JUDICIÁRIA E APRIMORAMENTO DEMOCRÁTICO

    A reforma do poder judiciário que precisa ser feita para promover o aprimoramento democrático e um funcionamento mais adequado e mais justo da sociedade é muito diferente daquela pretendida por indivíduos autoritários e tendenciosos como o citado ex-presidente do STF. E a mais importante reforma para o resgate da verdadeira Justiça consiste na concreta preservação da efetiva vigência do estado democrático de direito, através do pleno respeito à legislação em vigor, às garantias constitucionais e aos princípios jurídicos. Tudo isso é muito diferente das mudanças cerceadoras de direitos, que visam a supressão de vias recursais e a aplicação indiscriminada de entendimentos padronizados, desvinculados das peculiaridades específicas das realidades objetivas levadas a julgamento. A Justiça que a sociedade deseja e necessita é aquela que se pauta pelas práticas democráticas e pelo senso de humanidade.

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