Na pandemia, Doria e Covas tratam favelas e bairros nobres como iguais

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Há uma série de medidas anunciadas, mas nenhum programa completo e sintonizado com as especificidades de territórios que são um prato cheio para a COVID-19

Jornal GGN – Praticar distanciamento social em um condomínio de classe média ou alta em São Paulo não é a mesma coisa que fazê-lo dentro de dois cômodos minúsculos em Heliópolis ou Paraisópolis, as duas maiores favelas do estado. A realidade socioeconômica de quem mora nas comunidades é, em si, um fator de peso quando o assunto é coronavírus.

Não à toa, alguns acadêmicos e setores da imprensa têm questionado quando as autoridades virão a público com um programa completo e específico para o enfrentamento da crise sanitária nas favelas, onde o vetor de propagação do vírus pode provocar um genocídio.

O problema é que, a julgar pelas manifestações do governador João Doria e do prefeito Bruno Covas, esse grande pacote não virá.

Na coletiva de imprensa do dia 10 de abril, o secretário de Saúde do Estado, José Henrique Germann, afirmou que as comunidades pobres e os bairros nobres não serão tratados com “distinção” neste momento.

Ele ainda disse que um plano exclusivo para as favelas começou a ser discutido, mas chegou-se à conclusão de que “não seria efetivo” e a solução a curto prazo seria correr atrás da estrutura hospitalar para tentar socorrer os contaminados. “Temos de partir para a assistência propriamente dita”, pontuou.

Doria, por sua vez, argumentou que embora a responsabilidade sobre as grandes favelas sejam dos municípios, o governo estadual está “apoiando todas as prefeituras” financeiramente e através da estrutura da rede pública de saúde.

Germann acrescentou que medidas foram e continuarão sendo anunciadas para as favelas, mas elas são “uma área de trabalho como todas as outras” para o grupo de gestão de crise.

As aglomerações inerentes à situação habitacional precária, claro, trazem “riscos” maiores, são uma verdadeira bomba-relógio, mas o que mais poderiam fazer?

Essa visão do governo contrasta com iniciativas que brotam nas próprias comunidade. Em Paraisópolis, por exemplo, lideranças organizaram uma vaquinha virtual para contratar, por conta própria, equipe médica e ambulâncias. Chegaram a cogitar o uso de parte do dinheiro arrecadado para alugar casarões para hospedar temporariamente os idosos e outros moradores em grupo de risco. Uma tentativa de fazer “isolamento vertical” quando famílias sofrem por não terem espaço físico para distanciamento social.

A postura pragmática do governo Doria é a mesma da Prefeitura. Na mesma coletiva de imprensa, Bruno Covas sustentou que os hospitais de campanha em construção na capital são “hospitais de porta fechadas” que não escolherão pacientes pela conta bancária ou CEP. E dobrou a aposta na igualdade social fora de contexto.

“O município não faz distinção entre classes sociais. O atendimento é para qualquer um, não importa de onde ele venha. A cloroquina [que será comprada pela Prefeitura] é para os hospitais municipais, não é para de distribuir nas ruas, sejam elas do Jardins ou Paraisópolis”, disparou o prefeito.

Na sexta, após a coletiva de imprensa, o GGN conversou com a secretária de Desenvolvimento Social do Estado, Célia Parnes, que comentou sobre uma série de medidas que foram anunciadas pensando nas favelas.

Entre elas, a distribuição de cestas básicas, o vale-refeição que compensa a merenda suspensa nas escolas, a fabricação e distribuição de 2 milhões de máscaras de tecido nas comunidades de todo o estado, a suspensão de água pela Sabesp, a regulação do preço do gás, além da possibilidade de destinar duas escolas na região de Paraisópolis para criação de leitos e previsão de distribuir cestas de higiene pessoal e produtos de limpeza doméstica. [Confira a entrevista aqui, e o resumo das medidas já anunciadas pela Prefeitura e governo estadual aqui e aqui.]

Quando Doria lançou o programa de monitoramento de aglomerações por geolocalizações, Célia reforçou que as comunidades receberão atenção especial.

“Vamos colocar estações de rádio base nessas comunidades para conseguir monitorar mais proximamente as regiões de mais adensamento. Vamos ver não só o deslocamento das pessoas, mas o índice de incidência de contágio”, disse. Célia reconheceu que “nessas regiões, o vetor de coronavírus é mais veloz.”

O secretário de Saúde da capital, Edson Aparecido, foi quem mandou a real: a situação das favelas é um drama que se arrasta há décadas e, na pandemia do coronavírus, o poder público se prepara para ser o bombeiro no meio de um grande incêndio.

Segundo o secretário, além das medidas já anunciadas, as comunidades terão campanhas de conscientização e apoio das equipes do programa Saúde da Família, que visitam os moradores fazendo acompanhamento e prevenção. Mas segurar o avanço de um novo vírus nos becos e vielas dependeria de um planejamento a longo prazo.

“É impossível falar em ação sem lembrar da necessidade de programa habitacionais e saneamento. A Prefeitura enviou projeto de lei para a Câmara, para usar recurso excedente da Operação Faria Lima em Paraisópolis. Um bilhão de reais que seriam usados na área da Faria Lima, a gente quer investir em Paraisópolis, seja para habitação ou saneamento.”

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

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