
Enquanto a estratégia de defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro teve como foco sustentar, perante os ministros, nesta quinta-feira (22), que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não poderia ter anexado a minuta golpista ao processo que pode torná-lo inelegível, o impetrante da ação, o PDT, tratou de se precaver da artimanha.
Em sua sustentação oral, com base na lei que permite ao juiz conhecer fatos ocorridos ou revelados depois de a ação ser proposta, o advogado Walber de Moura Agra sustentou que “a reunião com os embaixadores”, estopim da ação em julgamento, “é apenas o agravante”.
Agra, em sustentação com referências aos escritores José Saramago, Goethe e Maquiavel, disse que cada fato apensado ao processo compõe agravante às ações de Bolsonaro contra a democracia. Quando perfilados, tal “pluralidade” de “fatos agravantes” revelam que estão articulados.
Na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) 0600814-85, cujo relatório foi lido pelo relator, ministro Benedito Gonçalves, está apensada a minuta golpista encontrada pela Polícia Federal na casa de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro.
“A minuta do golpe é o ápice vergonhoso”, afirmou Agra, do que se viu na reunião com embaixadores estrangeiros convocada por Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto, com ampla divulgação pela TV Brasil, emissora pública, e nas redes sociais, atingindo mais de 1 milhão de visualizações.
Coisas diferentes
O TSE havia decidido que não se pode usar a lei que permite ao juiz conhecer fatos ocorridos ou revelados depois de a ação ser proposta para criar uma ação nova dentro de uma que já existe. Ou seja, seria apenas para trazer fatos relacionados ao conjunto de fatos expostos na demanda e instrumentalizados na petição inicial.
Aije da chapa Dilma-Temer vem sendo utilizada pela defesa de Bolsonaro para argumentar que da mesma houve uma tentativa de enxertar uma alegação de caixa 2 no julgamento da eleição de ambos em 2014. Negada pelo TSE. Por tanto, agora, a Corte Eleitoral não poderia permitir o enxerto da minuta golpista.
Ocorre que no caso da chapa Dilma-Temer, a ação era sobre abuso de poder econômico com lavagem de dinheiro de propina através de doações declaradas em 2011 e 2012. Os ministros entenderam os fatos como desconexos. Dessa forma, o caixa 2 foi desconsiderado e excluído.
Correlação comprovada
O advogado do PDT mostrou, em sua sustentação, uma correlação entre a minuta golpista e a reunião com os embaixadores. Além de transformar a nação em um “pária internacional”, incitou o descrédito no resultado e ocorreu como parte de um plano de caráter golpista.
“A reunião com embaixadores disseminou desordem informacional sobre as urnas eletrônicas como ardil para inflamar a barbárie. A minuta mostra onde essa movimentação toda, que cegou as visões, tirou a nação dos trilhos e da luz, foi parar”, disse Agra.
Para o advogado, os crimes que Bolsonaro incorreu são todos facilmente comprovados, tanto que a produção de provas atingiu o volume de 600 documentos, além de, por exemplo, a imprensa ter desmentido tudo o que o ex-presidente disse aos embaixadores.
Ele também citou que o YouTube retirou do ar o vídeo da reunião alegando que o conteúdo com notícias falsas e conclusões falaciosas infringiu a comunidade. Destacou a utilização de bens públicos para atingir objetivos pessoais, sem relação com o dever empregado pela Constituição Federal à Presidência.
Além disso, a desordem informacional e o abuso de poder possuem registros de fácil prospecção, dada a repercussão, até mesmo em jornais estrangeiros, caso do New York Times, que salientou as mentiras ditas pelo ex-presidente.
“Utilização de avião da FAB (Força Aérea Brasileira), publicidade para difusão sistemática de mentiras, ataques a ministros das Cortes Eleitoral e Suprema, mentiras sobre apuração de votos ser terceirizada, hackers transferindo votos. Mentiras, reiteradas mentiras, acusações sem provas”, bradou Agra.
Sem efeito prático
Para analistas políticos, a argumentação usada por Bolsonaro não terá efeito prático. O jornalista e colunista Leonardo Sakamoto ressalta que o TSE está “muito bem resguardado” quanto a esses argumentos do ex-presidente e acredita que a defesa faz o que o réu sempre fez: alimentar seguidores radicais.
“Do ponto de vista prático, a argumentação usada por Bolsonaro, aliados e defensores não deve ter efeito prático no tribunal. Servirá apenas para alimentar seguidores radicais quanto à narrativa de que o ex-presidente está sendo vítima de grande injustiça. O que ajuda a manter o rebanho próximo do seu pastor”, escreveu.
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