Contradições e desafios das Instituições Políticas no Brasil, por Antônio Augusto de Queiroz

A oposição de extrema-direita tem se caracterizado pelo uso sistemático da desinformação e por campanhas de ódio nas redes sociais

Escher

Contradições e desafios das Instituições Políticas no Brasil

por Antônio Augusto de Queiroz

No cenário político brasileiro, as instituições enfrentam desafios e contradições que influenciam diretamente suas ações e políticas. Essas tensões se manifestam no governo federal, sob a liderança de Lula 3, no Congresso Nacional, no Supremo Tribunal Federal (STF) e na oposição de extrema-direita. Este texto propõe uma análise crítica desses aspectos, destacando divergências e sugerindo abordagens para compreender melhor o papel dessas instituições na conjuntura atual.

O governo Lula 3 tem se empenhado em garantir transparência orçamentária e fortalecer mecanismos de integridade e combate à corrupção, como reconhece a Transparência Internacional. No entanto, a existência de ocupantes de cargo de alto escalão com histórico de denúncia de desvio de conduta, e a continuidade de sigilos prolongados em documentos de interesse público, tem levantado dúvidas sobre a efetividade das práticas de transparência.

A oposição de extrema-direita, por sua vez, tem se caracterizado pelo uso sistemático da desinformação e por campanhas de ódio nas redes sociais, priorizando a luta política sobre qualquer compromisso com políticas públicas efetivas. A ideia de reduzir de oito para dois anos o período de inelegibilidade da Lei da Ficha Limpa e a defesa da anistia para condenados pela tentativa de golpe de Estado em janeiro de 2023 ilustram sua estratégia de enfraquecimento dos mecanismos de controle e integridade institucional. Em vez de atuar pela fiscalização da administração pública, essa oposição busca deslegitimar as instituições, promovendo discursos que fomentam violência, discriminação e ataques contra grupos sociais sob o pretexto da liberdade de expressão.

O GGN vai produzir um novo documentário sobre os crimes impunes da Operação Lava Jato. Clique aqui e saiba como apoiar o projeto!

O Supremo Tribunal Federal tem desempenhado um papel central na contenção de retrocessos institucionais, tanto na defesa da democracia e no combate a desinformação, quanto na prestação jurisdicional e no preenchimento de lacuna legal por omissão do Congresso Nacional na regulamentação de temas constitucionais. Além disso, atuou para barrar o chamado Orçamento Secreto, uma prática que comprometia a transparência no uso dos recursos públicos. No entanto, o STF tem sido alvo de críticas por revisar decisões da Operação Lava Jato, corrigindo abusos e erros processuais. Esse enfrentamento tem levado a questionamentos infundados sobre sua imparcialidade, utilizados como ferramenta política para desacreditar a corte.

O Congresso Nacional, apesar de avanços em legislações voltadas para controle, transparência e combate à corrupção[1], continua marcado por tentativas de apropriação do orçamento público sem a devida transparência. Esse comportamento compromete a confiança da população na instituição legislativa e levanta dúvidas sobre o compromisso dos parlamentares com a ética e a responsabilidade fiscal.

Um problema adicional está na forma como a corrupção é percebida no Brasil. A avaliação da integridade do País, representada pelo Índice de Percepção da Corrupção (IPC) da Transparência Internacional, baseia-se em opiniões e não em evidências objetivas, resultando em distorções. O Brasil, por exemplo, figura em 107º lugar entre 180 países, atrás de nações sem sistemas efetivos de freios e contrapesos. Isso não significa negar a existência de desvios, mas aponta a inadequação desse critério de mensuração, que reforça uma visão distorcida sobre os esforços de transparência e combate à corrupção. De fato, é bem difícil acreditar que estejamos, mesmo, piores que Ucrânia, África do Sul, ou mesmo Argentina, Colômbia, e empatados com Nigéria, Tailândia e Turquia, sem falar nos “microestados”, que figuram nesse ranking. Veja a série histórica do Brasil (a nota varia de 0 a 100 e quanto mais baixo o índice, maior a corrupção percebida):

Diante desse quadro, torna-se essencial repensar o papel e o funcionamento das instituições, fortalecendo mecanismos de transparência, accountability e diálogo democrático. A superação desses desafios exige, de um lado, reformas estruturais e, de outro, maior engajamento social em prol de uma política mais ética e inclusiva. Além disso, é fundamental consolidar uma cultura de prestação de contas das ações de integridade e combate à corrupção, em conformidade com a legislação vigente. O enfrentamento da desinformação e das campanhas de ódio promovidas pela extrema-direita e por falsos moralistas também se mostra imprescindível. Somente assim será possível construir um sistema político mais justo, capaz de responder às demandas de uma sociedade marcada por profundas desigualdades e complexidades.

Antônio Augusto de Queiroz – Jornalista, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo pela FGV. É sócio-diretor da empresa “Consillium Soluções Institucionais e Governamentais”, foi diretor de Documentação do Diap e é membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável da Presidência da República – o Conselhão.


[1] Leis de controle, transparência e combate à corrupção: – Lei da Transparência (Lei Complementar 131/09, conhecida como Lei Capiberibe); – Lei de Captação de Sufrágio, que aceita a evidência do dolo para efeito de cassação de registro e de mandato (Lei 12.034/09); – Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10); – Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/11); – Atualização da Lei de Combate à Lavagem de Dinheiro (Lei 12.683/11); – Lei de Conflito de Interesses (Lei 12.813/13); – Lei de Responsabilização da Pessoa Jurídica, ou Lei Anticorrupção (Lei 12.846/13); – Lei da Delação Premiada, ou lei que trata de organizações criminosas (Lei 12.850/13); e – Emenda Constitucional do voto aberto na cassação de mandatos e apreciação de vetos (EC 76/13).

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

“Democracia é coisa frágil. Defendê-la requer um jornalismo corajoso e contundente. Junte-se a nós: www.catarse.me/jornalggn “

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador