Não mais acredito no Direito, por Afranio Silva Jardim

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Não mais acredito no Direito

por Afranio Silva Jardim

A MINHA DECEPÇÃO E DESGOSTO É MUITO GRANDE. COMO LECIONAR DIREITO COM UM SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL COMO ESTE ??? ESTOU ME RETIRANDO DESTE “MUNDO” FALSO E HIPÓCRITA.

APÓS QUASE 39 ANOS LECIONANDO DIREITO PROCESSUAL PENAL E 31 ANOS ATUANDO NO MINISTÉRIO PÚBLICO DO E.R.J., DIANTE DA NOTÓRIA PERSEGUIÇÃO DO NOSSO SISTEMA DE JUSTIÇA CONTRA O EX-PRESIDENTE LULA, CONFESSO E DECIDO:

1) Não mais acredito no Direito como forma de regulação justa das relações sociais.

2) Não mais acredito em nosso Poder Judiciário e em nosso Ministério Público, instituições corporativas e dominadas por membros conservadores e reacionários.

3) Não vejo mais sentido em continuar ensinando Direito, quando os nossos tribunais fazem o que querem, decidem como gostariam que a regra jurídica dissesse e não como ela efetivamente diz.

4) Não consigo conviver em um ambiente tão falso e hipócrita. Odeio o ambiente que reina no forum e nos tribunais. Muitos são homens excessivamente vaidosos e que não se interessam pelo sofrimento alheio. O “carreirismo” talvez seja a regra. Não é difícil encontrar, neste meio judicial, muito individualismo e mediocridades.

5) Desta forma, devo me retirar do “mundo jurídico”, motivo pelo qual tomei a decisão de requerer a minha aposentadoria como professor associado da Uerj. Tal aposentadoria deve se consumar em meados do ano que se avizinha, pois temos de ultrapassar a necessária burocracia.

6) Vou procurar outra “trincheira” para uma luta mais eficaz em prol de um outro modelo de sociedade. A luta por vida digna para todos é perene, pelo menos para mim.

7) Confesso que esta minha decisão decorre muito do que se tornou o Supremo Tribunal Federal e o “meu” Ministério Público, todos contaminados pelo equivocado e ingênuo punitivismo, incentivado por uma mídia empresarial, despreparada e vingativa. 
Com tristeza, tenho de reconhecer que nada mais me encanta nesta área.

8) Acho que está faltando honradez, altivez, cultura, coragem e honestidade intelectual em nosso sistema de justiça criminal.

9) Cada vez menos acredito no ser humano e não desejo conviver com certas “molecagens” que estão ocorrendo em nosso cenário político e jurídico.

10) Pretendo passar o resto de meus dias, curtir a minha velhice em um local mais sadio…

Afranio Silva Jardim, professor associado de Direito Processual Penal da Uerj. Mestre e Livre-Docente em Direito Processual Penal pela Uerj. Procurador de Justiça (aposentado) do Ministério Público do E.R.J.

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

22 Comentários

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  1. È um mundo de

    È um mundo de lojistas……..

     

    Benemerencia para os sócios, a lei para os ditos inimigos………

    Só gostaria de saber o que Lula fez para essa gente……..ou são interesses estrangeiros que o querem afastado? ou os pilhadores do patria? Ou todos ele juntos? E por que jornalixos se prestam a esse papel hediondo?

     

  2. É isso aí. A máscara do

    É isso aí. A máscara do judiciário caiu. Um cabo e um soldado dão conta do stf. Os militares já tomaram o poder. Vejamos o que farão com 200 milhões de brasileiros, tendo como auxiliares banqueiros e carrascos. 

  3. Compreendo e respeito a

    Compreendo e respeito a decisão de Afrânio Jardim. Mas creio que é necessário continuar lutando.

    Se o Direito está sendo achado na Boca de Fumo é preciso dizer isso de maneira clara em alto e bom som. 

    Os juízes agem como se pudessem traficar conceitos jurídicos como se fossem marginais que traficam cocaína e crack? OK. Então precisamos mostrar a semelhança entre essas duas “categorias criminosas”. 

    Se a Justiça é amordaçada pelo Judiciário, em respeito à Justiça devemos ridicularizar seu algoz. 

    O aperfeiçoamento do Sistema de Justiça não se dará com o abandono da luta, mas com o enriquecimento dela por meio da criação de uma nova teoria jurídica que descreva o Direito tal como ele vem sendo praticado desde o golpe “com o Supremo com tudo”.

    Ao invés de se aposentar, Afrânio Jardim deveria aposentar os doutrinadores citados pelos juízes. 

    1. De qualquer maneira estou me

      De qualquer maneira estou me sentindo orgulhoso. Afrânio Jardim foi o primeiro grande jurista brasileiro a reconhecer, ainda que indiretamente, a validade da minha tese de que o Judiciário está aplicando os princípios do Direito Achado na Boca de Fumo.

      1. Acredito que Afrânio Jardim

        Acredito que Afrânio Jardim não desistiu da luta, mas reconheceu que a luta pela via jurídica já não existe mais no Brasil. E eu concordo com ele… Nosso judiciário já está além de qualquer reforma. A partir de agora é só refundação mesmo.

  4. Não mais acreditamos no Direito

    O carreirismo é a mola mestra hoje em qualquer profissão. Eh uma praga que aumentou nessas décadas de muito individualismo e pouca cultura. O desencanto com a profissão é algo ressentido por muitos que ou se assujeitam ou lutam contra. Quanto ao Judiciario e Ministério Publico… Não vejo saida a curto prazo. Continuar a continuar. 

  5. Não deve se aposentar não.

    Não deve se aposentar não. Precisamos resistir. O Brasil e a educação brasileira mais do que nunca precisa de professores éticos e honrados . Repensa Afrânio.

    Não sei a sua idade, mas você deve ter feito parte da geração que lutou contra o arbítrio do golpe de 64. Pensa no que foi essa luta em termos de comportamento e consciência política. Se você teve força antes, vai ter agora. 

    Pelo twiter o general Paulo Chagas mandou o seguinte recado para o Toffoli:  

    “Dias Toffoli tem a melhor oportunidade da vida dele para justificar a sua nomeação para a mais alta corte da magistratura brasileira, mesmo sem ter tido mérito para integrar a sua primeira instância.”

    E Toffoli se abaixou para o coturno desse aí. Um verme como Toffoli não merece a sua desistência.

  6. Professor, nunca tive a

    Professor, nunca tive a ilusão de que o Direito permitiria o estabelecimento de relações sociais mais justas. Muito pelo contrário, ele consolida as desigualdades.

    Observei ao longo de minha formação que boa parte dos que militam na área estão entre as pessoas mais conservadoras de nossa sociedade.

    Recentemente escrevi um post em meu face onde afirmo que Lula deixou de ser considerado um cidadão comum, ao qual cabem todas as prerrogativas constitucionais, e tem sido tratado como “inimigo do estado”, recebendo uma importação do chamado “Direito penal do inimigo”. Recebi uma chuva de criticas. De quais pessoas? Colegas advogados.

    Quando no mesmo mês recebemos a notícia de que aumentou consideravelmente o número de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza extrema, e, num momento o Presidente ratifica o aumento de 16% para os Ministros do STF, no outro, o CNJ incorpora o chamado auxílio moradia ao salário de juízes, o que se pode esperar desta classe?

    Como o amigo Fábio de Oliveira Ribeiro escreveu acima, não podemos abandonar a luta. Mas creio que os militantes destas causas não serão em sua maioria, pessoas ligadas ao mundo jurídico. Espero que não venham a criminalizar os movimentos sociais.

     

     

     

     

     

  7. A tragédia, prezado

    A tragédia, prezado Professor, é que não é apenas no Direito que há o descrédito. Não seria o caso de trazer para cá advogados cubanos ?

  8. Resista, Professor.
    Como lamentamos o rumo que tomamos, onde os bons são suplantados pelos medíocres.Seria egoismo tentar dissuadi-lo da decisão, mas temos o dever de estender as mãos e dizer-lhe: encontre outra trincheira, trace outras estratégias. Abandonar a luta por justiça, não. Seria admitir a prevalência do mal e da incompetência como determinante dos nossos destinos. Não merecemos sucumbir no lamaçal. Manteremos as cabeças livres da iniquidade. Resistamos.

  9. Prisão em segunda instância só depois que STJ condenar Lula

    Prisão em segunda instância julgada só depois que STJ condenar Lula. É o palpite de muita gente. Aí, ele continuaria preso, porque alguns ministros entendem que decisão do STJ basta. Mas a Constituição, aquele pedaço de papel, fala do trânsito em julgado!!!

  10. O que deve ter pesado muito

    O que deve ter pesado muito também, Nassif, é que ele foi professor do Barroso na UERJ.

    Deveria ter se sentido um dos responsáveis por um “brilhante” aluno seu, “humanista e iluminista” ter chegado ao Supremo. Daí a decepção deve ter sido enorme.

    Agora veio a gota d’água, quando um ministro do supremo vale menos do que outro, dependendo da decisão que tome 

  11. Desista não !
    Por favor, repense…
    Existem alguns seres humanos que são frágeis, alguns são normais… e alguns são excepcionais
    Não pense nas injustiças contra alguém… Pense nos milhares, milhões… Eles precisam de toda nossa ajuda. Não somos melhores do que eles, somos mais abençoados.
    Temos dons e capacidades diferentes para fazer a diferença…
    Chegamos até aqui por DEUS e pelos Bravos…

  12. Pergunto ao Dr. Afranio,

    Pergunto ao Dr. Afranio, professor de direito de Direito processual penal.

    Se a Constituição federal, através do seu art. 5º, inciso LXI autoriza a prisão de um cidadão desde que por ordem escrita e fundamentada de autoridade judicial competente:

    LXI –  ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

    Dando suporte à prisão temporária e preventiva do art. 283 do CPP, o art. 637 desse mesmo  Código de Processo Penal não dá o fundamento para a prisão após o pronunciamento da 2ª Instancia?

    Art. 637. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença.

    Se o código de Processo Penal criou a prisão temporária e preventiva, ele também criou a execução da sentença após a sentença de 2º grau, mesmo que pendente o recurso para as cortes superiores.

    1. Lei Posterior à CF/88 X CPP do Estado Novo

      Vou chutar uma resposta.

      A) LXI –  ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

      As hipóteses de prisão deste inciso são as cautelares: preventiva, temporária e em flagrante.

      Para a definitiva definitiva se aplica o inciso seguinte

      LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

      ————————————————————————————————————————————————————

      B) Dando suporte à prisão temporária e preventiva do art. 283 do CPP, o art. 637 desse mesmo  Código de Processo Penal não dá o fundamento para a prisão após o pronunciamento da 2ª Instancia? Art. 637. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença. Se o código de Processo Penal criou a prisão temporária e preventiva, ele também criou a execução da sentença após a sentença de 2º grau, mesmo que pendente o recurso para as cortes superiores.

      Lei posterior modificou essa norma, que era da época do Estado Novo, aliás uma ditadura, onde o conceito de prisão costuma ser, digamos, mais elástico, trazendo nova redação do art. 283 do Código de Processo Penal:

      Art. 283.  Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

      As ADC tratam exatamente desse art. 283 e estão prontas para ir a plenário desde abril de 2018, sabendo-se que 6 dos 5 ministros já se manifestaram a favor dessa constitucionalidade, embora uma ministra tenha evitado adotar o voto de sua consciência pessoal e jurídica, pela constitucionalidade, por dizer respeitar a maioria, que simplesmente não existiria, se ela simplesmente votasse como entende estar na Constituição.

      Pelo  que entendi, não há razão jurídica para o julgamento dessas ações não terem sido pautadas em 2018 e ficarem só para abril de 2019.

      Até porque o tema interfere em milhares de casos de réus presos, o que indica prioridade de tramitação em todos os tribunais, ao menos do mundo civilizado.

      Aí se deveria aplicar, talvez, outro inciso da Constituição:

      LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

      Na minha modesta forma de ler, foi esse o fundamento jurídico para a decisão, técnica, do Min. Marco Aurélio.

       

      1. Realmente você está

        Realmente você está chutando……. pra lateral.

        “As hipóteses de prisão deste inciso são as cautelares: preventiva, temporária e em flagrante.”

        Você fala que as hipóteses deste inciso são as cautelares. Mas esse inciso não cita prisões cautelares. 

        A prisão em flagrante está na Constituição, mas a prisão preventiva e temporária é criação do Código de Processo penal, não da Constituição. O INCISO APENAS FALA EM DECISÃO FUNDAMENTADA, NÃO FALA DE PRISÕES CAUTELARES.

        Aí está o seu chute.

        Aliás, nem o próprio inciso 57 fala sobre prisão, somente sobre culpa.

        O inciso que fala sobre prisão é o 61.

        NÃO EXISTE NA CONSTITUIÇÃO NENHUM ART., PARÁGRAFO OU INCISO QUE DISPONHA SOBRE PRISÕES CAUTELARES E REGULAMENTE A PRISÃO PREVENTIVA OU A PRISÃO TEMPORÁRIA.

        A CONSTITUIÇÃO DEIXOU PARA AS LEIS ORDINÁRIAS CRIAR E REGULAMENTAR AS HIPÓTESES DE PRISÃO ANTES DO TRANSITO EM JULGADO.

        O Código de Processo Penal regulamenta a prisão temporária, a prisão preventiva e pelo art. 637 a prisão após a decisão de 2º grau.

        Não há inconstitucionalidade nenhuma.

         

         

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