Se o plano golpista de militares para assassinar o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em dezembro de 2022, tivesse tido êxito, Lula não seria o primeiro presidente a ser vítima das Forças Armadas.
Ao longo da história do Brasil, três presidentes já perderam a vida em atentados golpistas. Juscelino Kubitschek, vítima de um acidente provocado de carro, João Goulart, que teve um infarto provavelmente provocado por envenenamento, e Carlos Lacerda, que sofreu um ataque cardíaco, mas que ainda há dúvidas sobre a real causa da morte.
Além da morte em um hiato de menos de um ano, os três presidentes tinham outra particularidade: formavam uma frente ampla civil pela democracia, a fim de pôr fim ao regime militar.
“Os anos 1970 foram anos tremendamente difíceis para as democracias brasileiras, Operação Condor, troca de informações, troca de prisioneiros, ao ponto depois que o serviço, eu chamo isso mais ou menos como uma uma grande cooperativa do terror, porque a Operação Condor uniu todos os serviços secretos dos países, isso se deu no Chile, lá, como promovido a primeira vez pelo serviço secreto chileno, e realmente houve várias, várias aniquilações, várias, algumas, algumas bem-sucedidas, várias bem-sucedidas, várias foram descobertas antes, mas realmente esse processo foi um processo muito difícil”, afirma João Vicente Goulart, filho do ex-presidente.
Apenas no governo de Dilma Rousseff (PT), a família de Jango conseguiu fazer a exumação do corpo, para checar se ainda havia resquícios de substâncias que pudessem indicar o envenenamento.
Contente pelo plano frustrado dos kids pretos em executar o presidente Lula, além do vice-presidente, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), Goulart ressalta que o governo do pai também sofreu várias tentativas de interferência.
“Nós tivemos ali casos já, ele ainda no governo, que essas, esses, essas tendências, né, dentro dos exércitos, dentro das forças reacionárias que existem dentro das Forças Armadas. Elas não só manipulam o processo político, não só manipulam de um governo que tende a ser progressista, um governo que tende a ser promotor de direitos, de direitos trabalhistas, como foi o governo João Goulart, como é o Nacional Desenvolvimento, ele sempre tem essas, essas, essas tendências e protegidas pelo alto comando”, continua o convidado da TVGGN da última terça-feira (20).
João Vicente lembra que o governo Goulart teve uma série de tentativas de golpe porque defendia o processo das reformas de base, projeto amplamente apoiado pelo povo brasileiro, mas que contrariava o interesse das elites.
Então, em um evento em local público para fortalecer o apoio popular, nos anos 1970, os golpistas acordaram que matariam não apenas o presidente, mas todos que estivessem com ele no palco.
“O general Olímpico, no comando, que matariam lá no palanque, matariam todos aqueles que estivessem juntos, matariam Jango e matariam todos para terminar com a pressão popular [pelas reformas de bases]”, lembra.
“Esses acontecimentos são muito graves, são acontecimentos que nós temos que ter de que isso existe dentro, não só das nossas Forças Armadas, como existe em outras Forças Armadas, que operacionalizam a Operação Côndor, posteriormente”, afirma o entrevistado.
Para Goulart, o Brasil tem ainda a difícil tarefa de desconstruir “essa sanha e esse paralelismo que existe dentro das Forças Armadas”. “Acredito, sinceramente, que nós temos um desafio muito grande, que é uma reformulação das nossas Forças Armadas, para colocá-las não como um poder de Estado, e sim subordinadas ao Estado brasileiro, que elas nunca se subordinaram.”
Assista ao relato de João Vicente Goulart na íntegra na TVGGN:
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Segundo parágrafo. Corrige isso! Quando que Carlos Lacerda foi presidente???
Em Paris há diversos monumentos em homenagem aos soldados estrangeiros mortos em combate a favor da ocupação francesa na África e na Indochina.
No Brasil isso não é necessário, os próprios brasileiros oferecem esse serviço de graça.
As forças armadas brasileiras são um exército de ocupação com uniforme nacional.
Lembrem-se que há quem considere as batalha dos Guararapes entre portugueses e holandeses como a pioneira do exército nacional, enquanto a guerra pela independência foi travada apenas na Bahia por forças populares por apenas alguns meses e com a ajuda do corsário francês Labatut e da esquadra inglesa comandada pelo Almirante Cochrane.
Praticamente nunca houve um exército nacional libertador no Brasil.
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É essa a realidade que os militares do Brasil sempre quiseram esconder tentando reescrever a história ocupando as redes com fakenews.
Se “nunca se subordinaram”, é chegada a hora!
As FFAA precisam ser ensinadas e treinadas a obedecer e servir aos poderes e interesses civis e a manter suas armas apontadas para fora da nação e não para dentro dela.
As escolas militares precisam ser revisadas para seu real papel, e não sua avacalhação ser espalhada para a educação civil.
E que se monte este cavalo encilhado.
Minhas homenagens ao João Vicente Goulart, ainda que tenha todas ressalvas em relação ao pai.
Em um dos únicos momentos em que, nesse país, parte das forças armadas se colocaram do lado legalista, leia-se III Exército, o presidente não teve a coragem de reagir e derrubar três colunas vindas de MG (Olímpio Mourão) e uma merreca de cadetes da AMAN (Geisel).
Não foi capaz de articular-se no aparato militar, errou em todos os quesitos, enfim, ainda que tenha sofrido o golpe pelos acertos políticos, e não pelos erros, o fato é que sua estratégia foi sofrível.
Ahhhhh, mas os EUA estavam estacionados no Atlântico Sul com a IV Frota.
Sei, mas pergunto: com o Vietnã ativo, recém saídos da crise dos mísseis e da Baía dos Porcos, eles se aventurariam a invasão a um país com essas dimensões?
Iriam reativar a crise dos mísseis de Cuba, com um bloqueio ao Brasil, empurrando o maior país do sul para os braços da URSS ou da China?
Não sei.
Pouco provável.
Feito o preâmbulo, é preciso dizer:
Os Estados periféricos do capitalismo tendem a comportar FFAA obedientes aos eixos centrais do capitalismo, isso é fato.
As dissidências desse modelo doutrinário militar ocorrem em países onde os processos de constituição desses estado nacionais se deram com mais ou menos intensidade de ruptura, ou seja, países com tradições anticoloniais podem ter mais ou menos militares rebeldes a esta lógica de obediência, de acordo com os contingentes históricos.
No Brasil houve alguns momentos, algumas janelas históricas onde a formação e gerenciamento das FFAA seguiram um modelo mais autônomo em relação ao Tio Sam, dentre os quais eu destacaria a Era Vargas, que legou a Jango, lá na frente, a possibilidade de ter militares legalistas, ou politicamente alinhados com teses anticoloniais, ou nacionalistas, como queiram.
Detalhe: eu não disse aqui que as FFAA nesses períodos fossem menos intervencionistas, mas havia nesses intervalos um sentido nacionalista anticolonial, e isso é importante ressaltar.
O desmonte foi severo no pós 64.
Em 2003, com a chegada de Lula ao governo, teve início uma elaborada estratégia de recuperar essa terreno, e o grande artífice foi Genoíno.
Daí uma das razões da caçada que sofreu, enquanto que, no campo político mais amplo, o alvo foi Dirceu.
Genoíno tinha interlocução, capacidade teórica e disposição para tratar com os militares.
Não se viu, ou pelo menos não com intensidade, qualquer movimento nas casernas durante a primeira tentativa de derrubada de Lula, com o mensalão.
Novamente, retirado o obstáculo (Genoíno), os EUA retomaram esse território.
As FFFA não são determinantes para o golpe, e 2016 mostrou isso.
Elas são componentes simbólicos importantes, mas não ditam o sucesso de um golpe.
Nem em 64 elas foram mais que um estandarte poderoso, só isso.
Militarmente falando, não resistiram muito tempo a uma reação legalista.
Claro que, depois de consumado o golpe, trataram de aproveitar a oportunidade, e criaram a versão (do vitorioso) que eram muito maiores que eram, na verdade.
Eu penso que é justamente isso que está em andamento.
E dentre tantos comentários e textos produzidos aqui, é possível resgatar parte deles, para fazer um apanhado geral:
– Há consenso que sem o “ok” dos EUA não tem golpe, e por mais incrível que pareça, os momentos de maior potência (e execução) de golpes no Brasil se deram com os Democratas no poder dos EUA (61, crise da renúncia, com Kennedy, 64, com Johnson, e, 2016, com Obama).
– Há consenso que os atuais articuladores militares são uns patetas, o que não quer dizer que sejam menos perigosos até.
Em 64, por exemplo, todo o círculo militar mais alto narrou que Olímpio era limitado, que se precipitou, e o resto veio atrás, como um efeito em cadeia.
A posição relativa de poder de Olímpio Mourão pós golpe prova essa narrativa, e ele mesmo se chamava de “vaca fardada”.
Voltando aos dias de hoje, Lula imagina, com o seu núcleo duro que construir uma governabilidade “externa” significa atender a todas as ordens do mercado, o que tem feito sem pestanejar, e sem considerar os custos políticos futuros, inclusive da erosão de seu capital político.
Não aprendeu nada com o mensalão e com 2016, 2018, etc.
Talvez ele tenha a arrogância de imaginar que é dele a iniciativa de pautar a agenda política do país.
Eu concordaria que essa ilusão seria boa, caso estivesse voltada para a construção de uma ideia de agenda que não fosse tão recuada, e que promovesse, pelo menos, alguma tensão do lado da direita e do mercado.
Mais importante que as badernas da diplomação, os acampamentos nos quartéis, os caminhoneiros, as vivandeiras, o 08/01, e agora essa mal fadado plano, é o resultado da manutenção do país nesse estado de eterna respiração suspensa, como ensina Wilson Ferreira, do Blog Cinegnose.
Se houvesse que ter golpe, ou seja, se os EUA dessem a ordem, já teria acontecido.
Porém, parece mais importante encurralar o governo Lula, restringindo qualquer chance de desobediência ou questionamento prático das vontades do mercado.
O G20 que poderia ser um evento político para realçar a “liderança” de Lula, tornou-se um evento de gafes, emoldurado por uma “crise” de um plano para matar o presidente, e outros.
Biden lançou mísseis sobre o R dos BRICS (que poderia ter feito antes ou depois), veio com 50 milhões no bolso para a floresta, quase uma ofensa.
O chinês não trouxe nada de concreto, a não ser tentar empurrar a Nova Rota da Seda, enfim, até Milei tirou uma casquinha, cumprindo seu papel de lacaio menor do eixo central do capitalismo.
Infelizmente, não parece que Lula mudará o rumo de suas políticas interna e externa.
Um possível segundo mandato vai ser ainda pior, marcado desde o início pelas conspirações e articulações para sua sucessão.
Biologicamente falando, mais velho e mais fraco, tende a se exasperar ou deixar de lado tarefas mais espinhosas, como o trato diário da política, justamente, o que é a sua melhor qualidade.
O rompimento definitivo da coesão em torno de Lula trará ainda mais instabilidade para esse campo meio amorfo, chamado de progressista.
As lideranças nascentes são muito novas ainda, como o menino do Recife, filho do Eduardo Campos, não tem “casca” suficiente para encarar a nacionalização de seu nome, a tempo de concorrer em 2030.
E olhando de perto, assim como o pai, me parece que ele quer seu aquilo que Rodrigo Pacheco sonha: uma versão atualizada de JK.
É pouco para o que esse país precisa.
Começou bem, mas acabou sendo pessimista demais no final, a meu ver. Lembremos que Lula não é Dilma e nem Temer e um segundo mandato traria sim mais fôlego, não como foi em Lula 2, mas alguma folga na taxa de juros (nova diretoria assumindo BC), na Petrobras (mais autonomia e menos dividendos), congresso menos reativo, possivelmente outro presidente dos EUA, etc. Nesse ponto, discordo um pouco da análise, pois vejo que o primeiro mandato de Trump foi muito mais bélico com a América Latina do que Obama (apesar de tudo o que apontaste). A lava jato foi muito mais agressiva ao invés de arrefecer, prendendo jornalistas, reitores e até impedindo a candidatura de Lula, foi inventado o Guiadó e a Venezuela foi ameaçada de invasão, no Peru um ex presidente se matou, novo bloqueio a Cuba, foi criada a figura de Bolsonaro, houve eventos esquisitos como “facada” nesse personagem, morte de Mariele, inundação de desinformação nas redes desreguladas, etc. Na minha visão, Trump causou muito mais estragos com essa onda militarista por aqui. E agora será um grande desafio pra Lula.
Sobre FFAA e polícias.
Ainda no finzinho do governo da família Garotinho, entrando já no de Cabral, o ISP, Instituto de Segurança Pública desempenhou um importante papel no auxílio da avaliação e formulação de estratégias de segurança pública no Estado do Rio.
Senão me engando, a presidenta era Ana Paula Miranda.
Acho que foi naquela época que se estabeleceu o SIM, Sistema de Metas Integradas, com a divisão do Estado em AISP, RISP, CISP, que eram divisões territoriais de monitoramento, onde havia áreas (mais amplas), regiões (menos amplas) e circunscrições (a menor unidade), o resto da sigla era comum integradas de segurança pública.
O mais importante foi diagnosticar que as mortes e violência policial obedeciam, às vezes, ou na maioria das vezes, os arranjos políticos locais e suas lógicas financeiras, os chamados grupos de extermínio, e por aí, ao invés de confrontar esse “arranjo produtivo local”, o ISP e o SIM passaram a premiar com 13 mil por semestre (o primeiro lugar, e aí baixava nas colocações inferiores) as áreas e os policiais militares e civis lotados naquele semestre naquelas unidades policiais.
Todo mês, trimestre e semestre tinha reuniões de nível, de acordo com a hierarquia da região, onde policiais das duas forças avaliavam resultados, expunham propostas.
Havia obrigatoriedade de reunião com os conselhos comunitários de segurança, tanto para PM como para PCERJ.
As AISP funcionam em prédios unificados, CPA (para PM), comando de polícia de área, e DPA (para civil) departamento de polícia de área.
Claro que houve um cuidado, na época, de atrair os PMs (a parte mais sensível no trato diário do policiamento, porque ela impacta tudo com a abordagem de rua) para um ambiente de treinamento e debates acadêmicos, cursos, etc.
Oficiais mais novos foram privilegiados, recém saídos da academia.
Delegados e policiais civis, idem.
Nada disso funcionaria sem o estímulo financeiro, que provocou um fato inusitado: cada batalhão, cada delegacia vigiava os vizinhos da mesma região, para que não incorressem em mortes na ação policial, evitando a perda do prêmio.
Nesta esteira, teve o Bolsa Copa, e o Bolsa Olimpíada, que seriam cursos pagos pela União e pela SENASP para sensibilizar policiais em várias áreas, desde Direitos Humanos, até inteligência.
As bolsas nunca foram pagas.
Os prêmios da meta SIM caíram de 13 mil para 3 mil reais.
Os dados do ISP mostram que esse período trouxe os menores índices de MIAE (morte por intervenção por agente do estado), ou seja, a famigerada letalidade policial.
Eu não acho que a sociedade deve pagar para policial não matar, óbvio, mas o fato é que há mortes, e que isso obedece a uma lógica de causa e efeito.
E não agir na causa, como tentou o ISP, é burrice, e por causa de uma mixaria.
O prejuízo não são apenas as inaceitáveis mortes que voltaram, mas a quebra de um ambiente de confiança que começou a se estabelecer, de diálogo e estudos.
É mais ou menos o que Genoíno tentou fazer com os militares, e nunca mais ninguém tentou.
Não é só dar dinheiro, como vimos no caso da PF, PRF.
É preciso mais que isso, no entanto, também é preciso entender como funciona a cabeça de quem está com a arma na mão e o poder (ou parte) estatal para o uso da força.
Carlos Lacerda presidente? Tem certeza?