Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Urnas eletrônicas: das teorias conspiratórias às dúvidas justificadas, por Wilson Ferreira

O capitão da reserva distrai a patuleia com teorias conspiratórias. Enquanto as dúvidas justificáveis são ocultadas.

Urnas eletrônicas: das teorias conspiratórias às dúvidas justificadas

por Wilson Roberto Vieira Ferreira

A pantomima do chefe do Executivo diante de embaixadores atacando as urnas eletrônicas, com inacreditáveis powerpoints by Dallagnol sobre inescrutáveis “malwares maliciosos”, foi mais um jogo de dissimulação e simulação (blefe) de um fusível para ser queimado. Tal como o jogo de prestidigitação do mágico (que com uma mão distrai o distinto público e com a outra puxa a carta secreta da manga), Bolsonaro não diz o mais importante de qualquer crítica consequente às tecnologias adotadas pelo TSE: o problema não é auditabilidade ou impressão de votos, mas de conflito de interesses e soberania: segurança criptográfica, armazenamento e contagem estão nas mãos de uma multinacional brasileira ligada visceralmente às Forças Armadas e outra com ligações comprovadas com CIA e NSA. O capitão da reserva distrai a patuleia com teorias conspiratórias. Enquanto as dúvidas justificáveis são ocultadas.

A tramitação da chamada “PEC Kamikaze” a toque de caixa com Arthur Lira tratorando o Congresso e a acelerando da distribuição de R$16 bilhões em emendas do “orçamento secreto” sem seguir as normas de transparência pública, foram as cartadas decisivas para Bolsonaro tentar se manter no poder. Passando por cima da lei eleitoral e dos próprios regimentos das casas legislativas apenas comprovam que as instituições NÃO estão funcionando – apesar dos espasmos para visibilidade midiática como o anúncio do Tribunal de Contas da União para investigar SE Bolsonaro “desrespeita a lei eleitoral”… “se”…

 Depois da própria oposição apoiar a PEC (colocada contra a parede, sob a ameaça de se tornar vilã do povo) caiu a ficha sobre o que estava embutido no pacote: o maroto conceito de “estado de emergência”, figura jurídica inexistente na Constituição, que apenas prevê “Estado de Defesa” e “Estado de Sítio”. Conceito que pode prever a instalação de um novo estado de exceção que, dependendo da vontade do PMiG, pode colocar em risco as próprias eleições.

Preocupada, oposição tentou retirar a expressão do texto da PEC. Mas sem sucesso.

Restou à oposição e à mídia progressista criticar o governo de ter “desfigurado o orçamento federal para se manter no poder”. Fala em “bomba fiscal”, revivendo o “teto de gastos”, “responsabilidade fiscal”, o perigo do país quebrar” martelados pelo financismo neoliberal. O fato é que, de repente, os discursos se inverteram. A esquerda denunciava como a austeridade fiscal destruía projetos de auxílio social. Mas agora o dinheiro apareceu! Enquanto Bolsonaro manda às favas a responsabilidade fiscal (sob o silêncio dos “mercados”), ironicamente, agora, é a esquerda que se apropria do discursos da “reponsabilidade fiscal” para criticar o governo, saindo em defesa de um dos pilares do neoliberalismo. Que a esquerda combate…

Esse é um exemplo da explosão na esquerda de uma bomba semiótica da guerra criptografada do PMiG – Partido Militar Golpista. Técnica de prestidigitação semelhante ao que o mágico faz para desviar o olhar do distinto público – tal como o mágico que com uma das mãos distrai a atenção da auditório enquanto a outra puxa a carta da manga.

Outro exemplo foi o “ato de desespero” do chefe do executivo em reunir embaixadores nessa segunda-feira para disseminar “ataques contra as urnas eletrônicas” através de slides em powerpoint toscos que se limitavam a apresentar diagramas bisonhos sobre “malwares maliciosos” e manchetes da grande mídia sobre os confrontos do TSE e STF contra ele.

O diversionismo dos “malwares maliciosos”

Claro, grande mídia rapidamente se aproxima desse jogo criptografado de prestidigitação. A Globo foi a mais rápida: crava que a fala de Bolsonaro “frustrou equipe de campanha” por parecer “estratégia de um derrotado” e destacou o erro ortográfico em inglês de um dos slides – “bienfing” ao invés de “briefing”.

A tosquice dos powerpoints (seguindo a estética “by Dellagnol” – clique aqui) seguido pelo erro ortográfico (convenientemente viralizado nas redes) são detalhes desse verdadeiro “caos com método”, de acordo com os manuais militares de simulação e dissimulação em campos de batalha.

Qual a carta que o prestidigitador Bolsonaro está puxando da manga para a qual o público não está olhando? 

Óbvio que a primeira carta por trás dessas pautas e agendas de cunho marcadamente diversionista é manter acesa a militância em torna de temas totalmente alheios a questões urgentes como a política de preços da Petrobrás voltada aos acionistas estrangeiros (ao lado da autonomia do Banco Central, pièce de résistance do hiperliberalismo dessas plagas) como a raiz da explosão inflacionária.

Mas a segunda carta que Bolsonaro puxa secretamente é justamente o ponto mais importante que qualquer crítica mais consequente às urnas eletrônicas deveria fazer: o sistema de segurança, criptografia, armazenamento e contagem de votos foi contratado de empresas cujas ligações perigosas suscitariam não “teorias conspiratórias”, mas dúvidas justificadas: a multinacional brasileira Kryptus (multinacional brasileira em segurança cibernética e criptografia para aplicações militares, governamentais e empresariais), ligada até a raiz dos cabelos com as Forças Armadas, e a norte-americana Oracle, historicamente ligada à CIA e à NSA.

Jogos de dissimulação (diversionismo) e simulação (blefar e blefar sem parar): gritar o tempo inteiro questões não significativas como auditabilidade das urnas ou a possibilidade de impressão dos votos, ocultando a questão mais crucial: o controle das eleições brasileiras por organizações que, no mínimo, suscitariam conflito de interesses e suspeita – Kryptus, empresa vencedora nas licitações da Forças Armadas (cujo representante no Executivo concorre nas eleições) e a Oracle, intimamente ligada a CIA e NSA – Agência de Segurança Nacional, aquela cujos documentos ultrassecretos,  revelados por Edward Snowden em 2013, apontavam a então presidenta Dilma Rousseff e seus principais assessores como alvos do sistema de espionagem americano – clique aqui.

Kryptus e o Exército Brasileiro

Se não, vejamos. Em ofício enviado pelo ministro do TSE Luís Roberto Barroso ao General Heber Garcia Portella, do Comando de Defesa Cibernética do Exército Brasileiro, como resposta às questões enviadas ao TSE sobre o processo eleitoral brasileiro, está descrito:

É importante frisar que os perímetros criptográficos das urnas emitem requisições de certificado que são validadas por uma Autoridade Certificadora das Urnas Eletrônicas, cujas chaves privadas estão armazenadas e protegidas em HSMs (Hardware Secure Modules) certificados ICP-Br, fabricado pela Kryptus (Empresa Estratégica de Defesa) e que também é um Produto Estratégico de Defesa – clique aqui

Ou seja, as chaves criptográficas são geradas, armazenadas e protegidas por uma empresa que já fornece produtos estratégicos de defesa para o Exército Brasileiro. Ou ainda: as respostas das questões 14,15,16 e 17 já eram conhecidas de antemão pelo próprio Centro de Defesa Cibernética do Exército – evidência de que as questões levantas ao TSE pelo Exército é puro jogo de simulação para repercussão midiática, dentro da estratégia de criar o caos informacional da “ameaça do golpe”. Afinal, o golpe já aconteceu e ninguém percebeu por que não foi televisionado – clique aqui.

Kryptus é responsável por diversos projetos de defesa do Exército brasileiro. Entre eles, módulo criptográfico do Projeto IFFM4BR: identificação amigo/inimigo, Projeto SISFRON: Sistema Integrado de Sensoriamento, Projeto LinkBR2: Sistema de Enlace de Dados

Desde 2013 a multinacional brasileira mantém relações estreitas com o Exército, quando ficou responsável por prover subsistema de criptografia para sigilo das comunicações do Exército. Por isso, é bastante conscienciosa com o seu principal cliente, fazendo homenagens institucionais em datas comemorativas do Exército, como o Dia do Soldado – veja abaixo:

Esse humilde blogueiro pergunta: isso não configuraria conflito de interesses num cenário em que um capitão da reserva ocupa a presidência e conta com três mil militares em cargos do governo federal? – numa situação em que uma empresa tão visceralmente ligada às Forças Armadas é responsável pela criptografia das urnas eletrônicas.

É claro que para ser aceita essa tese, é necessário considerar a existência real de um Partido Militar, com base ideológica, base corporativa, forma e controle de governo, além de base eleitoral e militante. Para a mídia, tudo se trataria apenas de uma empresa nacional prestando serviços ao TSE num país em que as Forças Armadas se preocupam apenas com a segurança nacional e integridade das suas fronteiras… também o coelhinho da Páscoa deve acreditar nisso.

Oracle e as redes de dados da CIA e NSA

A grande mídia frequentemente cria uma imagem da Oracle (gigante de tecnologia e informática norte-americana especializada em hardware e software de banco de dados) como uma empresa que se originou de uma humilde startup do Vale do Silício. Sua história real é ofuscada pela imagem do seu fundador, Larry Ellison, quinta pessoa mais rica do planeta segundo a Forbes, com o costume de comprar gigantescos iates e ilhas – como a ilha de Lanai, no Havaí, para onde se mudou durante a pandemia Covid-19.

Na verdade, a empresa de Ellison foi criada em 1977 como um projeto financiado pela CIA, fundamental para a criação da atual rede de vigilância dos EUA. Ellison escolheu o nome Oracle para sua empresa porque trabalhou nos planos da criação da rede de banco de dados da CIA, cujo codinome era Oracle, em 1975.

Ele [Larry Ellison] abandonou a Universidade de Chicago na década de 1960, foi para Berkeley, Califórnia, e em meados da década de 1970 começou a trabalhar em um projeto de banco de dados. Nome de código: Oracle. Cliente: Agência Central de Inteligência. Em 1977, Ellison fundou a empresa com Robert Miner e Edward Oates, batizando-a com o nome do trabalho da CIA – clique aqui.

Leia mais no Cinegnose.

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1 Comentário

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  1. Muito interessante este artigo. Realmente, sem teorias da conspiração, mas a partir dos dados analisados pelo autor, meperguntei aos meus simples botões: será que a quantidade de parlamentares do lado deste inominável presidente, não tem ligação com a ‘arquitetura’ cibernética de que fala o autor? Trata-se de poderes que, além de força financeira, são enigmáticos para a maioria da população.

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