A PEC dos Magistrados e seu ataque à República

A PEC 63, um símbolo dos conflitos distributivos no Brasil e da resistência antirrepublicana das elites de outrora: quais são seus efeitos temerários para a sociedade e para a Administração Pública?

Chamo a atenção para a iminente aprovação, no Senado, da Proposta de Emenda Constitucional 63/2013, que trata – tanto em seu texto original, proposto principalmente pelo Senador Gim Argello e relatado por Blairo Maggi, como no substitutivo de Vital do Rêgo, que não alterou o propósito da medida, tendo inclusive agravado suas implicações, conforme a seguir – de alterações significativas na lógica de remuneração de juízes e integrantes do Ministério Público de toda a federação, inclusive Estados e Distritos. Conforme versa o processo legislativo referente às PECs, são necessárias 5 sessões ordinárias de discussão para que então se proceda à votação em dois turnos. Na última Sexta-feira, na quarta sessão ordinária, a proposição de uma emenda à medida por parte do Senador Humberto Costa interrompeu o trâmite ordinário da PEC, o que redundaria em mais tempo para que fosse discutida. No contexto do cancelamento de diversas sessões por parte da Mesa do Senado, isso significaria que possivelmente a proposta sofreria deliberação apenas em meados de Julho. No entanto, ontem, dia 9, após grande pressão das associações de magistrados, as emendas tiveram parte considerável de suas assinaturas de apoio retiradas (no caso da proposta de Humberto Costa, 10 de 30 Senadores deixaram de subscrevê-la – 27 são necessárias para que ela seja admitida). Com isso, a PEC voltou a seu trâmite normal. Com o cancelamento supracitado das sessões, é possível que a proposição venha, agora, a ser votada no começo do próximo mês. Os debates, até agora, foram consideravelmente escassos, consoante exporemos a seguir, em um contexto de considerável pressão de associações de classe e, de forma absolutamente perturbadora, dos próprios órgãos da Administração Pública, como o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público e o Tribunal Regional do Trabalho, numa coleção de atos imorais e ilegais. Mais gravemente, veremos que o tema muito pouco foi abordado na imprensa, inclusive pelos blogs progressistas, razão pela qual redijo esta postagem e convido os leitores à reflexão, tendo-se em vista a impressionante coleção de achaques e ataques que a medida promove (inclusive a partir de sua discussão, quanto mais de sua aprovação) com relação a uma pretensão minimamente republicana de espaço público.

Histórico

 De forma sintética, a proposta – elaborada em um contexto de expressiva mobilização por parte de associações de magistrados – institui o que se denominou como “valorização por tempo de exercício”, o que significa um acréscimo no subsídio de juízes, promotores e procuradores da ordem de 5% a cada 5 anos de efetivo exercício em atividade jurídica, até o incremento máximo de 35% no pecúnio mensal (para o caso de o servidor que tiver mais de 35 anos de atuação). O normativo foi elaborado de forma a abranger também os aposentados e os dependentes pensionistas, e considera, para a contagem do tempo de trabalho mencionado, inclusive atividades de cunho jurídico realizadas antes do ingresso nas carreiras, sendo que os efeitos da proposição seriam imediatos após a sua entrada em vigor.

No relatório original, Blairo Maggi vota pela aprovação da medida, considerando-a constitucional e entendendo que o adicional proposto não constituiria, em si, uma parcela remuneratória, mas sim uma indenização. Dessa forma, esses valores não fariam parte do teto constitucional (que virtualmente submete todos os agentes públicos dos três poderes – inclusive a Presidenta da República – à exceção de funcionários de empresas estatais, não submetidos ao regime estatutário), o que permitiria, por exemplo, que um magistrado com 35 anos de experiência com atividades jurídicas e no último nível de sua carreira tivesse vencimentos de mais de 40 mil reais (ao passo que o limite remuneratório no setor público, hoje, é de algo como 28 mil reais). Com a licença de Maggi para eventualmente disputar o governo do Mato Grosso, Vital do Rêgo assumiu a relatoria da PEC e manteve as ideias contidas do documento original.

Em meio aos parcos debates realizados – que contaram com o voto em contrário de Eduardo Suplicy, que argumentou pela inconstitucionalidade da proposta, tendo-se em vista o seu descomprometimento para com os tetos remuneratórios mencionados – o Senador peemedebista realizou uma simbólica adaptação ao normativo: deixou de fazer valer a proposta no sentido de sê-la uma indenização, tornando-a, de fato, uma parcela remuneratória, ao mesmo tempo em que instituiu uma exceção ao teto remuneratório exatamente para os beneficiários dessa medida. Na prática, então, ele retirou os magistrados do regime remuneratório que submete todos os demais servidores públicos (consubstanciado principalmente no art. 37 da Constituição) e estabeleceu um próprio para eles, no art. 93, diferenciando-os como categoria superior. Essa, de fato, não é uma percepção velada: tanto Maggi como Vital do Rêgo assumem na justificação que juízes e integrantes do Ministério Público não estão no mesmo nível dos demais, pois são “agentes de poder político” e “personificam órgãos estatais fundamentais”. Com efeito, a medida serviria como um incentivo para esses servidores permanecessem em suas funções, evitando a eventual evasão existente.

A PEC contou com expressivo apoio até o momento, tendo sido inicialmente apoiada por figuras de suporte ao governo Dilma, como Vanessa Grazziotin (PCdoB/AM) e tidas como promotoras de agenda ética, como Pedro Taques (PDT/MT). Ela foi recentemente aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) por mais de vinte congressistas, incluindo-se, dentre eles, senadores ligados ao governo e/ou postulantes de uma práxis tida como mais favorável à moralização da Administração Pública, como Randolfe Rodrigues (PSOL/AP), Pedro Simon (PMDB/RS), Lindberg Farias (PT/RJ) e Paulo Paim (PT/RS) – para além, é claro, de integrantes da oposição. Quatro foram os senadores vencidos: Gleisi Hoffman (PT/PR), Eduardo Suplicy (PT/SP), Armando Monteiro (PTB/PE) e Aloysio Nunes (PSDB/SP). Dentre os apoiadores da medida que se pronunciaram publicamente, vale destacar o agora ex-Ministro do Superior Tribunal Federal, Joaquim Barbosa (que redigiu uma nota anunciando publicamente seu apoio); o próprio autor principal da PEC, Senador Gim Argello (que argumentou no sentido de que a falta de progressão salarial expressiva é causa da desmotivação dos juízes); Senador Romero Jucá (que comentou sobre a circunstância de o magistrado “se matar de trabalhar” e ser forçado, ainda, a dar aulas à noite para “complementar a defasagem salarial”); e o Senador Jayme Campos (que postulou que o “baixo” salário dos magistrados seria um convite à corrupção). Dentre as falas críticas, cabe citar a dos senadores Roberto Requião e de Aloysio Nunes, que defenderam que a medida é, respectivamente, uma “excrecência corporativa” e o decreto de “morte do subsídio”.

Curiosamente, a proposição ensejou ainda a elaboração de emendas aditivas, como a de Rodrigo Rollemberg (PSB/DF) e de Inácio Arruda (PCdoB/CE) – que buscaram estender a benesse para membros da Advocacia Pública e da Defensoria Pública – e de Randolfe Rodrigues – que intentou promover seu alcance geral para todos os servidores da Administração Pública Federal que recebem subsídio. Cabe lembrar, mais uma vez, que essas propostas precisam contar com o expressivo apoio de 27 Senadores (1/3 da Casa) para vir a ser discutida. O normativo de Rollemberg foi rejeitado em parecer de Vital do Rêgo, que considerou que os magistrados são, na prática, mais “diferenciados” do que as categorias sugeridas pelo Senador brasiliense. Posteriormente, Randolfe retirou sua proposta, apesar de sua repercussão positiva em associações de classe de servidores do Poder Executivo; todavia Inácio Arruda a adotou, o que redundaria em sua necessidade de análise pela CCJ.

Finalmente, é preciso citar a proposta de emenda do Senador Humberto Costa (PT/PE) que, ao identificar que a questão a ser resolvida é justamente a configuração de um plano de carreira adequado para os magistrados (o congressista não cita os integrantes do Ministério Público), sugere o fim da limitação rígida entre pisos e tetos – hoje há a especificação de que a diferença de remuneração entre juízes não pode ser maior do que 10% nem menor do que 5%, de forma que não há progressão salarial expressiva na carreira, para além de todo o esquema de vinculação das remunerações de magistrados, ao teto constitucional aferido exatamente de acordo com os vencimentos dos Ministros do STF (o que acaba por se tornar uma espécie de efeito-cascata no Judiciário) – sem que o teto remuneratório seja ultrapassado e sem que a competência legislativa dos tribunais para propor esses planos de carreira seja sobrestada pelo Congresso. Foi, conforme dissemos no começo deste artigo, um encaminhamento para que a PEC viesse a sofrer deliberação apenas após a Copa do Mundo, considerando-se que agora teria que ser analisada pela Comissão de Constituição e Justiça antes que o tema vá a Plenário. A mobilização das associações de classe, no entanto, desmobilizou não apenas essa emenda, mas também as outras duas supracitadas, que foram arquivadas. Em tese, agora, a PEC segue seu trâmite normal, podendo vir a ser votada após o término da quarta e da quinta sessões deliberativas ordinárias (o que deve ocorrer, em razão dos cancelamentos de expedientes promovidos pela Mesa do Senado, apenas no começo de Julho, o que poderá dar fôlego mínimo de negociação para o Governo).

O caráter temerário da PEC de um ponto de vista orçamentário

O normativo em questão, que recebe expressivo apoio de diversas associações de magistrados de todo o país, representa um conjunto de riscos consideravelmente expressivos para a Administração Pública brasileira. O mais evidente deles é, de fato, é o acachapante descontrole das contas públicas, consubstanciado no desrespeito aos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Com efeito, muito pouco tem sido discutido a respeito dos reais impactos orçamentários que a medida trará. Em parte, é possível explicar esse vazio em razão da própria dificuldade de aferição dos custos, considerando-se que, sabidamente, o Poder Judiciário é o que menos tem a oferecer ao cidadão em termos de transparência: há abundantes complicações no sentido de se ter dados sistematizados e consolidados sobre os dispêndios com pessoal, quanto mais a respeito do número de juízes e, especialmente, de sua faixa etária – para que seja possível efetivar uma estimativa razoavelmente robusta, em especial quando olhamos para as realidades estaduais no âmbito desse Poder.

A situação se torna ainda mais complexa quando se leva em conta a necessidade de se calcular o montante extra de recursos a serem empregados para remunerar também os aposentados e os pensionistas, já que os dados, para esses segmentos, são ainda muito mais escassos e fragmentados, para além do fato de que, em alguns estados, aparentemente a execução orçamentária desses valores ficar sob o controle de órgãos que estão situados no Poder Executivo, de forma que, eventualmente, pode estar em vigor uma curiosa – e potencialmente ilegal – manobra de subestimação dos gastos com pessoal. Esse elemento é exatamente o numerador utilizado para o cômputo dos limites constantes da LRF (sendo a Receita Corrente Líquida o seu denominador). Se é retirado desse numerador o montante que diz respeito aos aposentados e pensionistas, então obviamente cria-se a ilusão de que a situação fiscal do ponto de vista dos dispêndios com pessoal não é tão grave assim, o que constitui um equívoco básico.

Apesar de todas essas dificuldades – que ensejariam um trabalho muito meticuloso de estudo antes de qualquer decisão equilibrada – há estimativas (como as realizadas por parte da equipe econômica do Governo, conforme o noticiado aqui: http://extra.globo.com/noticias/brasil/pec-dos-magistrados-pode-custar-ate-30-bilhoes-para-uniao-12725898.html) que indicam um dispêndio potencial de até 30 bilhões de reais, caso a medida seja aplicada, conforme querem os propositores da emenda e as associações de classe, de maneira retroativa (caso não o seja, o montante mínimo considerado nos cálculos é da ordem de 3 bilhões de reais por ano, um valor expressivo por si só e absolutamente tendente a crescer exponencialmente nos próximos anos conforme os quadros envelhecem, se aposentam e são renovados). Para se ter uma ideia, durante a greve federal de 2012 o Ministério da Educação e os professores das universidades públicas federais negociaram um incremento salarial que variou entre 25 e 45% e que teve um impacto orçamentário estimado em cerca de 4 bilhões de reais (http://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,sindicato-representante-de-professores-de-sete-universidades-federais-aceita-plano-do-governo,905463), cerca de 13% do aventado para os juízes e membros do Ministério Público. Há de se comentar que enquanto um integrante do magistério recebe pouco mais de 5 mil reais como remuneração inicial, um magistrado aufere mais de 23 mil reais, no mínimo. Além disso, o total de docentes de universidades públicas federais é da ordem de 71,2 mil (http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2013-05-05/expansao-de-universidades-federais-nao-acompanhou-melhoria-das-condicoes-de-trabalho-de-docentes-diz-), ao passo em que o total de beneficiários da PEC 63 chegaria a 30 mil dentre os ativos (http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/05/joaquim-barbosa-reajuste-salario.html). Nem é preciso cogitar o quão impressionante seria o impacto orçamentário caso a PEC viesse a valer para todos os servidores públicos federais que recebem subsídio (a correspondência não é linear, mas a folha de pagamento anual dos funcionários ativos e inativos, civis e militares, supera os 174 bilhões de reais – http://www.planejamento.gov.br/plan/Bol216_Abr2014_parte_I.pdf).

Do ponto de vista do desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal, também é possível realizar algumas ponderações relevantes. Um relatório trimestral do DIEESE a respeito do comprometimento dos estados com os limites da LRF da perspectiva do Judiciário (disponível aqui http://www.dieese.org.br/boletimredeservidores/2013/boletimRedeServidoresJudiciarioDezembro2013.pdf) mostra, por exemplo, que 9 estados estão já consideravelmente próximos ao chamado limite prudencial (5,7% da Receita Corrente Líquida comprometida com gastos com pessoal, sendo o teto desse limite 6%). Não é difícil chegar à conclusão de que a aprovação da medida resultará, necessariamente, no estouro desse patamar. Na prática, isso significará uma série de restrições a esses entes e a seus agentes. No que se refere aos órgãos, a partir do momento em que o limite prudencial é atingido, tornam-se obrigados, nos dois quadrimestres seguintes ao estouro desse teto, a fazer essa proporção retornar a níveis a ele inferiores, o que significaria a redução em pelo menos 20% dos gastos com comissionados e funções de confiança, bem como a exoneração dos servidores não-estáveis. Caso tais medidas ainda não sejam suficientes, até mesmo servidores estáveis poderão perder seus cargos, conforme estabelece a própria Constituição Federal. A LRF ainda apregoa, nesse contexto, a vedação à realização de concursos públicos, o provimento de cargos, a contratação de hora extra e, é claro, o aumento das remunerações. Finalmente, a persistir tal quadro por mais de oito meses, fica o ente proibido de receber transferências voluntárias, de obter garantias de outro ente e, inclusive, de contratar operações de crédito. Para os agentes que praticam tais atos, há ainda uma série de sanções penais (para além da declaração da nulidade do ato), como a reclusão de 1 a 4 anos e multa equivalente a 30% dos vencimentos anuais).

O que vemos, então, é que a proposta em questão tem o potencial de criar um verdadeiro caos administrativo no Poder Judiciário brasileiro, considerando-se todo o rol de restrições a que passa a ficar submetido – em virtude de uma medida que, na realidade, atende aos interesses de segmentos bastante específicos que já estão secularmente instalados dentro da magistratura e do Ministério Público. Aliás, a autofagia contida no autointeresse dos juízes é especialmente expressiva considerando-se que a evidente transgressão à LRF trazida a partir da implementação da PEC redundaria, dentre outras consequências, na demissão dos servidores admitidos há menos tempo na magistratura. 

A simbologia da PEC como um pináculo corporativo de um Brasil ainda distante do republicanismo

                  Para além de todas as questões orçamentárias e administrativas levantadas, a PEC contém e expressa em si mesma uma constelação de assuntos que, em meu entendimento, sintetizam vícios e obstáculos de primeira grandeza para a consolidação de um pensamento republicano no Brasil. Um primeiro aspecto nesse sentido, obviamente, é a completa ausência de juízo ético acerca do significado simbólico e prático com relação à superação do teto estabelecido na Constituição Federal para as remunerações percebidas por servidores públicos. A desfaçatez é particularmente impressionante tendo-se em vista o uso de estratégias jurídicas que são absolutamente claras em reconhecer uma espécie de regime “supra-constitucional” para magistrados e membros do Ministério Público, como se realmente fosse possível admitir que os integrantes dessas carreiras estivessem – meritocraticamente e de direito – situados acima de qualquer outro funcionário da Administração Pública.

                  De uma perspectiva orçamentária, chama a atenção a completa falta de sensibilidade pública por parte de agentes tidos como os mais elevados do ponto de vista de sua reputação moral para com as implicações de uma medida que lhes beneficia estritamente – e apenas a eles –, considerando-se o impacto multibilionário nas contas públicas, a circunstância de já serem, hoje, duas das carreiras mais bem pagas de todo o setor público brasileiro (com remuneração inicial cerca de 15 vezes superior ao piso dos professores da rede básica, 5 vezes maior do que o de professores das universidades públicas federais, e quase o dobro da recebida pelas carreiras do ciclo de gestão – as que recebem vencimentos mais expressivos dentro do Poder Executivo Federal) e o pesadíssimo alcance da proposição para as contas do Poder Judiciário situados em Estados próximos da insolvência financeira.

                  Impressiona, então, a naturalidade com que integrantes dessas carreiras percebem a si mesmos quase que como entidades despersonalizadas, como se fosse uma honra para a sociedade brasileira tê-los como também partícipes dela. Curiosamente, inclusive, vale dizer que, para as associações que os representam e para os congressistas que apoiam iniciativas como essa PEC, uma das causas fundamentais para a morosidade do Judiciário é justamente o “baixo” padrão remuneratório dos juízes, situação altamente “desmotivadora” para esses profissionais. Nos dizeres da Justificação da PEC, a proposta ali contida serviria como “atração para aqueles que estão em vias de abandonar a magistratura em prol de horizontes remuneratórios menos estreitos”. Não só não há constrangimento nesse entendimento como ele aparece como fator fulcral a ser considerado pelos Senadores para a aprovação da medida. A pergunta, tão retórica quanto óbvia, só poderia ser a seguinte: passam esses senhores por um processo espetacular de alienação social ao viverem em um país cujo salário mínimo – auferido por algo como 25% da população – é o equivalente ao que recebem em menos de um dia de trabalho e ainda assim não estarem satisfeitos, ou realmente entendem ser esses senhores parte de uma casta superior, acima da mundaneidade de nossa sociedade, tais quais lugares-tenentes de um republicanismo antirrepublicano?

                  Sem dúvida, é possível dizer que o primeiro termo da pergunta possui resposta positiva. O ponto que merece análise um pouco mais detalhada, no entanto, é o segundo momento desse questionamento. Como podem juízes, promotores e procuradores serem capazes de viabilizar uma rationale capaz de combinar, a respeito de uma interpretação com relação a si mesmos, questões tão bizarramente contraditórias como a percepção de que compõem estratificações por merecimento? Castas meritocráticas? De fato, essa condição-demanda sui generis – que está próxima de ser mais uma vez referendada e aprofundada pelo Senado – pode ser, ao menos, parcialmente compreendida pelo momento histórico vivido pelo Brasil. Com efeito, se pudemos observar, ao longo desta última década, uma redução considerável do padrão de desigualdades sócio-econômicas no seio da sociedade brasileira (tendo o Índice de Gini caído de surreais 0,63 em 2000 para 0,5 em 2012, um patamar ainda distante de um nível civilizatório, mas que ao menos criou uma situação mínima de reconhecimento do Estado para as populações mais pobres, agora dotadas de algum grau de dignificação), algo em sentido razoavelmente similar também ocorreu no interior da burocracia.

Em 2002, um integrante da carreira do ciclo de gestão do Poder Executivo Federal tinha uma remuneração equivalente a cerca de 4200 reais, um auditor da Receita Federal recebia aproximadamente 4500 reais, um consultor legislativo da Câmara dos Deputados auferia 3600 reais e um juiz federal, pouco mais de 10 mil reais. Em  2014, as duas primeiras carreiras possuem vencimentos iniciais da ordem de 14 mil reais, os consultores ganham mais de 25 mil reais e os juízes substitutos auferem algo como 23 mil reais. O abismo entre a elite do Judiciário e a do Executivo ainda é grande, mas certamente é muito menor do que há 12 anos, caindo de mais de três vezes de diferença para uma vez e meia. No caso do Legislativo, então, não há mais o que falar em termos de disparidade salarial, pelo contrário. De fato, um expressivo processo de valorização salarial beneficiou consideravelmente algumas das carreiras de Estado durante os governos de Lula e Dilma Rousseff. Não há o que dizer, é claro, em termos da não-valorização dos magistrados – seu salário é um feito constitucional, uma proxy necessária do teto constitucional (90% do teto). O ponto é, contudo, que a distância entre juízes e as demais carreiras diminuiu expressivamente (talvez uma novidade histórica sem precedentes na realidade bacharelesca brasileira), reduzindo o sentido de agrupamento exclusivo, de elite, que sempre foi socialmente alimentado sobre aqueles desde os períodos imperiais.

O impacto dessa mudança de status, que ocorreu tão rapidamente, muito provavelmente tem repercutido nessas classes privilegiadas. Sua atitude intempestiva – que busca passar por cima, como um trator, de um dos fundamentos materiais do equilíbrio orçamentário contido na Constituição Federal – é uma resistência a esse processo de mudanças, algo similar ao que ocorre, por exemplo, com relação à reação de certos setores de nossa sociedade à instituição das cotas para negros em universidades e concursos públicos – política que seria vista por alguns arautos do pensamento conservador como um ataque à meritocracia, talvez o que também o cume do Judiciário pense a respeito da sua relativa perda de proeminência e status diante de outras carreiras de Estado, supostamente menos “excepcionais e meritórias”. A meritocracia claramente não é atingida em nenhum momento por medidas como as políticas afirmativas – que promovem uma necessária promoção da diversidade no acesso a serviços e postos públicos diante do evidente predomínio branco e rico –, mas sim o são as velhas castas, que se aferram às regras que elas mesmas instituíram, como vício antirrepublicano, para constituírem-se como tais com alguma pretensão de legitimidade racional-burocrática.

Vale ressaltar que essa consciência autocentrada por parte de determinados operadores do Direito é constante desde o texto constitucional, que criara com força suprema um mecanismo de valorização salarial extensível a toda a magistratura por meio de gatilhos que elevam os vencimentos a partir de iniciativa do próprio Guardião da Constituição (o STF) e que se disseminam, acriticamente, como efeitos-cascata pelos tribunais Brasil afora – uma lógica que evita uma real discussão acerca de planos de carreira e de discussões mais claras inclusive a respeito da produtividade e da meritocracia dos juízes, temas provavelmente só menos proibidos do que a regulamentação da mídia. Por meio de estratégias como essa, protegem-se essas carreiras da produção de planos de desenvolvimento e de reconfiguração de sua atuação escorados em uma “eticidade pecuniária” que só existe pelo fato de a vinculação salarial comentada estar positivada na Constituição.

Por sinal, é possível perceber nesse comportamento de juízes e membros do Ministério Público um outro duplo de características antirrepublicanas intrínsecas: a leitura de que a medida em questão significa uma espécie de “promoção da isonomia” e o uso do Direito, dever seu de ofício, como ferramenta para a realização de seus interesses mais pecuniários e imediatistas. No que se refere ao primeiro aspecto, a retórica apontada na Justificação da PEC, nas falas de Senadores favoráveis a ela e nas cartas-pressão de associações de magistrados constituem exemplos claros de externalização de uma visão muito particular de isonomia, na medida em que diz respeito apenas aos “seus”, isto é, aos próprios juízes, promotores e procuradores. O argumento aponta para a eficácia da medida salarial como uma estratégia para a promoção de “isonomia” no tratamento dos juízes, seja entre aqueles que acabaram de entrar no serviço público e os que se aproximam da aposentadoria (um entendimento mais tradicional sobre o conceito, tratando, possivelmente, do que poderia ser a valorização de acordo com o tempo de carreira – questão, conforme visto, que não é tratada na PEC, apenas na emenda de Humberto Costa), seja entre os juízes e os demais (uma visão que retorce completamente essa noção, já que inverte a máxima de que os “desiguais devem ser tratados desigualmente, na medida de sua desigualdade” num postulado capaz de justificar sua posição supra-constitucional, de desiguais com pretensão quasi-aristocrática). Não é à toa que uma das emendas é rejeitada em parecer por querer estender a benesse em questão para membros da Advocacia Geral da União e da Defensoria Pública, algo que não seria “isonômico” pelo fato de esses profissionais não gozarem do mesmo status (nobiliárquico?) dos juízes. Isso, é claro, apesar do fato de o evento capaz de resultar nesse pecúnio extra aos juízes poder ser exatamente o mesmo para qualquer outro profissional que viesse a exercer esse pseudo-direito e que passasse a trabalhar no serviço público: a atuação jurídica. Em outras palavras, teria direito a 35% de remuneração a mais um juiz que tivesse acabado de ingressar na magistratura caso tivesse trabalhado nessa seara – fora do Poder Judiciário – por 35 anos, mas não o defensor público que tivesse vivenciado a mesma e exata situação (com a única diferença de que teria sido aprovado, na realidade, para ocupar uma posição na Defensoria Pública, e não em algum tribunal).

É absolutamente óbvio, então, que o suposto critério adotado para “premiar isonomicamente” os juízes e membros do Ministério Público nada possui de acurado, lógico, científico ou justo. Trata-se apenas de um argumento de ocasião utilizado para assegurar sem sombra de dúvidas o benefício àqueles que já estão em seus postos de juízes e que podem gozar desse reajuste sem cumprir qualquer esforço extra (também não é à toa que solicitam retroatividade nos pagamentos, o que é tão particularmente esdrúxulo que praticamente inviabiliza uma análise mais estruturada e menos apaixonada). Com efeito, o que esse processo traz à tona é o risco embutido na posição de poder legiferante (ou flagrantemente lobista) que esses atores possuem no processo político-legislativo, considerando-se seu estrito domínio do ferramental jurídico para fazer valer seus interesses sem dificuldade e com uma pretensão de neutralidade axiológica. O que ocorre, então, é uma espécie de sequestro e subsequente esvaziamento do campo normativo, tendo-se em vista o quanto esse conhecimento técnico é um domínio escasso no país e o quanto esse agrupamento social, por se assemelhar historicamente a uma casta, posiciona-se facilmente de modo a entremear-se junto aos mais relevantes tomadores de decisão, oferecendo-se-lhes potencialmente serviços próprios de seu ofício como moedas de troca para a adoção de medidas que atendam a seus propósitos. Há, portanto, um conflito ético possivelmente insolúvel nesse contexto de interrelação sem controles entre Legislativo e Judiciário, na medida em que as relações entre magistrados e juristas, por suposto, extravasam os domínios públicos e as regiões em que os instrumentos de transparência poderiam vigorar. Da combinação entre a proximidade com o poder e a dominação tecnopolítica dos instrumentos legais e legítimos para a consagração de interesses puramente pessoais é que emerge um dos esquemas mais subreptícios de corrupção no Brasil contemporâneo, tal qual o enunciado neste caso.

Lamentavelmente, a postura das associações de classe correspondentes a outras carreiras do setor público contribui sobremaneira para esse cenário fortemente antirrepublicano. Em vez de buscarem racionalizar o debate, de discutirem os impactos da medida para a ética e para a gestão pública; ou, ainda, em vez de criticarem o uso tão obviamente político contido em uma mudança constitucional tão pontual, várias delas apenas emulam e repetem tal raso corporativismo. Buscam, então, não o impedimento da efetivação de tal medida, mas a sua extensão para o seu setor, a sua carreira, o que nada é diferente da chula expressão do senso comum: o “trem da alegria”. Contentam-se, então, não em repensar o Estado, em buscar soluções para o país no que se refere a uma política remuneratória que possa vir a repensar e reorganizar as prioridades da nação. Preocupam-se apenas com a possibilidade de virem ou não a desfrutar do mesmo vilipêndio, da mesma técnica – antiga, na verdade – de espoliação estatal.

O ethos, tão básico, é consubstanciado na máxima de que não cabe a uma entidade de classe como essas “incomodar” a “luta” de outra, desde que seja possível, de alguma forma, conquistar o mesmo “direito”. A turva visão, então, é a de que o jogo de poder é infinito quando se refere aos ganhos que se pode obter para o próprio grupo. Nada se considera a respeito da percepção óbvia de que o montante contido no erário é o mesmo, isto é, os recursos públicos para a remuneração constituem um mesmo “bolo” para todos, de forma que a retirada de uma parcela maior por parte de um segmento resulta necessariamente na redução do potencial de retirada desse bolo por parte dos demais – que podem, por razões mil, serem muito mais legítimos materialmente para tanto. No entanto, a sensibilidade desses grupos fica posta necessariamente a partir da consideração do Estado como seu negativo, e não daquilo que se poderia compreender como “comportamentos antirrepublicanos”, que sintetizam, como práxis, como sua própria forma de atuação. Em outras palavras, o “outro a ser atacado” não é a “imoralidade”, mas o Estado – que contém, é claro, uma série de imoralidades constitutivas, mas não possui esses elementos como sua característica intrínseca. É por isso que não se sustenta a ética desmaterializada defendida por determinadas associações de servidores públicos, já que ela não só não conseguem fazer frente a um cristalino caso de assalto ao orçamento público (como este em questão) como ainda se colocam à disposição – como cúmplices ou partícipes – deste nefasto processo. Nenhum comentário sobre impacto orçamentário, sobre o desrespeito ao pacto constitucional erga omnes, como manifestação da soberania popular, estabelecido com relação ao teto constitucional. De fato, é esse tipo de postura, tão criticado em círculos da sociedade civil voltados ao combate à corrupção (alguns deles com a participação de determinadas associações de classe), que subsidia o classicamente falacioso argumento a favor do pagamento de toda sorte de benesses a congressistas para além do teto constitucional, visto justamente como símbolo maior do privilégio desmesurado. A falácia reside justamente no raciocínio de que o que ocorre pode até ser algo errado, mas “se ele tem, então também quero”. Fim da inconsistência lógico-moral? Não, apenas o começo do efeito-cascata, eventualmente a beneficiar toda a alta burocracia dos três poderes.

Cabe ainda fazer comentário específico a respeito das manifestações formais de apoio à PEC 63 por parte de órgãos que integram a própria estrutura do Poder Judiciário e da Administração Pública, bem como de magistrados, que assinaram documentos – chamados, em alguns casos, de “notas técnicas”, como se isso pudesse dar algum ar de neutralidade às pretensões personalistas desses sujeitos – em nome dessas instituições com o fito de esclarecer e publicizar esse suporte à aprovação da medida. Vale destacar, com relação ao primeiro grupo mencionado, as notas encaminhadas ao Senado por parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão justamente responsável por realizar o controle interno do Poder Judiciário, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que possui função similar para com o chamado “parquet”, e ainda do Conselho Nacional de Procuradores Gerais (CNPG). No que se refere ao segundo grupo, estão registrados como anexos e avulsos da PEC no sítio do Senado (http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=115294) ofícios de figuras como o desembargador Carlos Alberto Araújo Drummond, aparentemente na posição de “representante” do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região. Não há como não manifestar a mais profunda objeção a tais manifestações, na medida em que não é possível compreendê-las de forma minimamente distinta daquilo que representa: a apropriação pública, sem mediações, por atores privados, com vistas à realização de interesses puramente privados. Sem rodeios, trata-se de uma forma consagrada de corrupção: o patrimonialismo antítese maior de uma práxis republicana e herança nefasta e deletéria de uma lógica de atuação imperial-nobiliárquica. Talvez nada sintetize melhor o absurdo do que está em jogo do que a combinação de imoralidade e ilegalidade trazida a partir desse mecanismo de mobilização, que resume o grau de corrosão das instituições públicas brasileiras que, supostamente, são as principais responsáveis, hoje, pelo estabelecimento dos padrões éticos mais elevados nos domínimos públicos. Curiosamente, seus agentes tantas vezes colocam-se nessa posição heroica. O pecaminoso lobby externalizado (bizarramente) mediante as próprias instituições (sem que ocorram nem individualmente, nem mediante associações de classe, o que já seria bastante questionável, conforme já apontado aqui) expõe a silenciosa e abominável tragédia ética que se consolida nos backstages do Judiciário e do Ministério Público.

O comportamento, enfim, de vários Senadores, merece atenção própria, considerando-se que vários deles – citados no começo deste artigo – filiam-se a um pensamento de esquerda, e/ou postulam uma práxis política com profundidade ética. Em que pese tais posicionamentos teóricos – que necessariamente, a meu ver, redundariam numa objeção transversal e inegociável ao conteúdo desta PEC –, tantos deles posicionaram-se a favor da medida, compactuando com o supracitado corporativismo rasteiro da magistratura (que sequer parece ser capaz, a esta altura, de sustentar argumentos mais profundos para a defesa dessa causa, a não ser as proclamações de vitória similares àquelas que ocorreriam em negociações salariais tradicionais – com a diferença de que estamos tratando, aqui, do fim do teto constitucional por meio de uma alteração de dispositivos fulcrais da CF). Lamentavelmente, vários congressistas que defendem, em tese, uma visão mais republicana sobre o Estado brasileiro (e, em vários casos, já até foram capazes, em suas histórias como congressistas, de propor medidas mais consonantes a essa compreensão), parecem agora ter se rendido sem questionamento a essa PEC numa espécie de “populismo pseudo-meritocrático”, por tantas razões um equívoco sem tamanho para a Administração Pública e para o próprio amadurecimento institucional da sociedade brasileira. Crer em falácias primárias (ou enunciá-las, como o fazem vários Senadores) como a de que os salários baixos de magistrados seriam um incentivo ou à evasão, ou à corrupção, ou ainda à falta de produtividade em um país com padrão remuneratório tão inferior não pode ser visto como mera ingenuidade ou despreparo. Infelizmente, trata-se da justificação extemporânea de uma agenda que tem conteúdo claro – e antirrepublicano – do ponto de vista do conflito distributivo de recursos públicos no Brasil – não contemporânea por serem esses argumentos superados, nas discussões a respeito da necessidade de elevada remuneração de políticos e altos burocratas, desde pelo menos o século XIX em diversos países desenvolvidos. Não podemos aceitar que tais defesas ocorram, muito menos por parte de congressistas supostamente alinhados a uma visão menos elitista e mais democrática a respeito do nosso país.

Convido e convoco a todos, então, para uma profunda reflexão a respeito das consequências da aprovação dessa medida – que, considerando-se o histórico normativo nacional, certamente dará ensejo a uma torrente de proposições similares e possivelmente tão danosas quanto essa não apenas ao orçamento e gestão públicos, mas aos próprios padrões cívicos da cidadania. Que sejamos capazes de apontar aos congressistas que estamos, sim, acompanhando diariamente o andamento da medida, e que clamamos por discussões que tratem-na com a seriedade que lhe é devida, e que, sim, vetem-na, e que dediquem seus esforços normativos para a elaboração de políticas públicas que realmente enderecem questões que se refiram ao interesse nacional, à redução de toda forma de desigualdade e opressão, à transformação progressista da sociedade e à realização real de seu potencial republicano, vis-à-vis o corporativismo togado que insiste em viger em nossa democracia.

Sérgio Roberto Guedes Reis

 

Redação

26 Comentários

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  1. Quanta besteira!!!!

    O papel aceita tudo mesmo. Essa PEC só existe porque foi a forma encontrada por parcela do governo para superar a gritante diferença remuneratória entre os juízes da União (trabalho, federal) e os juízes dos Estados, que em alguns locais ganham o dobro do que a União paga a seus juízes. Vá explicar para o cidadão que ocupa o cargo essa diferença de salário!!!!!! O teto só vale para a esfera federal. Nos Estados há muito tempo o salário dos servidores, principalmente os juízes, está atualizado com o poder aquisitivo do nosso dinheiro. Dentro da própria União há servidores com funções triviais, principalmente no legislativo, e que tem salário igual de juiz. O teto aproximou a base do telhado, hilaricamente, certa cubanização do serviço público federal. 

    1. Beirando os oito anos de

      Beirando os oito anos de frequência neste blog é a primeira vez que leio um participante de forma inconsciente titular de forma tão apropriada seu comentário. 

      Pois é. Quanta besteira escreveu esse [email protected]. Difícil escolher a campeã. Como não vale voto em branco opino pela frase “Essa PEC só existe porque foi a forma encontrada por parcela do governo………”

      Ah! Merece medalha “honra ao mérito” a conclusão : …………O teto aproximou a base do telhado, hilaricamente, certa cubanização do serviço público federal”.

      Iniciou com uma besteira, findou com uma sandice sem pé nem cabeça.

      1. Não. Os subsídios dos juízes

        Não. Os subsídios dos juízes estaduais costumam ser bastante próximos dos federais, sendo em geral inferiores somente nos níveis iniciais.

        Todas as remunerações podem ser consultadas nos sítios dos tribunais. Por exemplo:

        – Juízes federais: http://www.cjf.jus.br/cjf/cjf/administracao-de-rh/tabelas-de-remuneracao/magistrados/Tabela%20de%20Remuneracao%202014%20magistrado.pdf/at_download/file

        – Juízes do Trabalho: http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/35479/2014_ato0003_csjt_rep01.pdf?sequence=2

        – Juízes do TJ-SP: http://www.tjsp.jus.br/Download/Transparencia/ResCNJ102/2014/ResCNJ102AnexoIIICJan2014.pdf

        – Juízes do TJ-RJ: https://portaltj.tjrj.jus.br/documents/10136/1159759/anexo-iii-c-01012014.pdf

        Todos os sítios também apresentam a folha completa de pagamentos dos magistrados, onde se pode ver a sua remuneração total, em atendimento à Resolução CNJ Nº 151, de 5 de julho de 2012. Por exemplo, a folha de pagamento dos magistrados do TJ-SP pode ser consultada em http://www.tjsp.jus.br/Download/Transparencia/ResCNJ102/2014/ResCNJ102AnexoVIIIMagistradosAbr2014.pdf.

      2. Mesmo que fosse esse o caso

        Mesmo que fosse esse o caso (e não o é, tendo-se em vista que até com relação aos vencimentos iniciais a disparidade é, na prática, consideravelmente pequena – um juiz federal recebe inicialmente cerca de R$ 23,9 mil, ao passo em que, em SP e no PR, esse valor é de 21,6 mil; no RJ e em MG, é de 22,8 mil; no RS é de 19,4 mil), há de se considerar:

        1) os vencimentos desses juízes estaduais são, hipoteticamente, “baixos”? Os números acima apontam que não.

        2) os vencimentos dos servidores públicos, de uma forma geral, não deveriam corresponder à capacidade de pagamento de cada ente ou poder (inclusive como pondera a LRF, dado o estabelecimento de limites de despesas com pessoal)? Estou convicto de que sim, considerando-se que essa modalidade de despesa equivale a uma dentre tantas outras, de custeio ou investimento, que são absolutamente necessárias à continuidade dos serviços públicos e à expansão da capacidade estatal de prover políticas públicas.

        3) Se há um problema no tocante à eventual pouca variação nos vencimentos de juízes ao longo de suas carreiras, e se eles já recebem remunerações tão elevadas (sendo no mínimo praticamente 80% do teto constitucional), por que não estabelecer um plano de carreira? Vale lembrar que essa competência propositiva, de forma geral, é dos tribunais.

        4) No caso de haver disparidade salarial expressiva entre os magistrados, é uma saída válida a quebra do teto constitucional – um dos símbolos maiores do que existe de isonomia, em patamares muito modestos, no que se refere ao padrão remuneratório dos servidores públicos – apenas para satisfazer o interesse desses pequenos grupos descontentes e pouco representativos das necessidades e prioridades de dispêndio nacionais? Estou convicto de que não e, a meu ver, um raciocínio que se encaminhe dessa forma (tais quais tantas falas de Senadores favoráveis à PEC) é altamente falacioso. Vc não acha?

        1. A prática é diferente da teoria

          Na fórmula teto tudo legal, ninguém é contra. Problema é a prática. Nos estados como forma de burlar o teto, mas de forma legal porque autoriizado, há inúmeras vantagens que elevam o salário na prática a 23 mil líquidos mensal no menor  patamar, isto no PR e SP, que são os estados que pior remuneram. . Juiz da União de mesmo nível ganha 15/16 mil líquido mensal, sem qualquer truque aplicável. Juiz da União com vinte, trinta anos de carreira, desembargador etc, ganha menos líquido do que qualquer juiz estadual em início de carreira que, não sei se vcs sabem, ganha mais quatro mil reais do TRE de indenização por cumular função eleitoral, auxílio moradia de outros quatro mil, gratificação por exercer função administrativa de direção do forum, venda de dias de plantão, de férias, de licença prêmio. Nada disso um juiz da União tem. O mais vergonhoso, o salário é menor do que o do promotor federal de mesmo nível que com ele trabalha. A idéia da parcela do governo é que se não dá para continuar essa vergonha com os magistrados da união, fato que até o congresso já sabe, por outro lado não se pode aumentar o teto, por conta do efeito cascata e a indexação fictícia de salários de diversas carreiras do serviço públiico federal. A solução da pEC pode não ter sido uma das melhores,mas é a única por enquanto em discussão no CN. Efeito republicano já é viajar na maionese, com o perdão do termo.

          Agora, pergunto aos machões do blog se eles exerceriam a função do fausto de sanctis na satiagraha em são paulo capital por 16 mil reaus mensais, salário líquido de impostos e contribuição? Aposto que apenas a minoria idealista o faria, incluindo o próprio. 

          1. Desculpe, mas o raciocínio

            Desculpe, mas o raciocínio que busca justificar o desrespeito ao teto constitucional por parte de juízes federais simplesmente porque isso já ocorre em nível estadual não pode ser percebido como nada menos do que falacioso. Faz tanto sentido como como se eu dissesse que os funcionários do Legislativo deveriam ter o mesmo expediente dos congressistas, ou gozar dos mesmos recessos que eles desfrutam, exatamente por que eles o fazem. É o raciocínio: “Já que é essa patifaria toda, qual é a minha parte do espólio?” . Aliás, me faz lembrar esta imagem abaixo, que expressa a ideia de que “dois erros não fazem um acerto”, ou de que “um erro não justifica o outro”: 

            O ponto é que os Judiciários estaduais ainda permitem de forma mais clara a transgressão do teto por ainda haver nesse nível um déficit absolutamente significativo de transparência e, por conseguinte, de controle social. Antes da implementação da Lei de Acesso a Informação, o descalabro ético do recebimento de vencimentos acima dos limites constitucionais ocorria desenfreadamente em todo o território nacional. Na verdade, nós nem sabíamos quanto o servidor ganhava. Desde então, diversos grupos de servidores – como foi o caso de alguns no Poder Judiciário Federal e, especialmente, no Legislativo Federal – passaram a sofrer o chamado abate-teto em suas folhas de pagamento. A tendência é isso chegar, sim, em breve, ao Judiciário, sempre o poder menos transparente dos três. A solução, então, para as disparidades salarias não é “abrir a porteira” e assaltar os cofres públicos, mas sim promover a verdadeira isonomia no interior das próprias regras constitucionais.

            E no que se refere à correlação entre “macheza” e “bons salários”, por esse critério teríamos de decuplicar, por exemplo, os vencimentos de  centenas de milhares de policiais que hoje atuam em toda a federação brasileira. Não me parece possível, orçamentariamente falando. E é essa questão financeira, por sinal, que explicita, com imensa obviedade, o porquê de a PEC ser um ataque frontal à República, considerando-se todo o rol de mecanismos patrimonialistas, conforme desenvolvi no texto, que a viabilizam. Precisamos avançar decisivamente na construção de um espaço público mais probo, e não darmos vários passos atrás para resgatarmos os “bons tempos do Império”.

          2. Corrigindo a (novamente)

            Corrigindo a (novamente) errônea informação do [email protected], um desembargador federal recebe em torno de R$ 20 mil líquidos (fora férias, 13º etc.). Os subsídios dos juízes federais podem ser encontrados em http://www.cjf.jus.br/cjf/cjf/administracao-de-rh/tabelas-de-remuneracao/magistrados/Tabela%20de%20Remuneracao%202014%20magistrado.pdf/at_download/file, conforme comentário feito acima. Inclusive, a remuneração completa dos desembargadores pode ser encontrada nos sítios dos Tribunais. A do TRF3 (onde trabalha o desembargador federal Fausto De Sanctis) pode ser encontrada em http://www.trf3.jus.br/trf3r/fileadmin/docs/asom/transparencia/sege/2014/04-Abril/TRF3/TRF3_Anexo_VIII_Abril_2014.pdf. A remuneração típica desses desembargadores (incluindo a do desembargador De Sanctis) é, em resumo:

            Subsídio: R$ 26.589,68Auxílios: 751,96Total rendimentos: R$ 27.341,64Total descontos: R$ 7.189,57Rendimento líquido: 20.152,07

    2. não colou, desculpa. nada justifica tal pec 63
      Kkkkkkkkk..No mínimo controverso seu argumento, pois se a questão é diminuir a diferença remuneratória entre juízes federais e estaduais, com essa PEC 63 continuará na mesma, já que o reajuste atinge tanto em âmbito federal, quanto em âmbito estadual!!! Pra mim, isso eh pura choradeira de quem qr sempre $$$. Vale frisar que o MP espertamente se equipara aos magistrados, pois se julgam tão ‘diferenciados’ quanto os juízes entre as carreiras de estado. Interessante é que esse movimento ta se configurando um corporativismo dual (mp e magistrados). Seria mais digno a Magistratura lutar por um estatuto novo e único para todos!!! Agora empurrar uma PEC dessa discriminatória e segregacionista dentro da própria Adm Pub. Se a mídia espalhar em todos os meios de comunicação a população derruba!! Tão abafando e divulgando pouco.. pois sabem que a rejeição será alta!!!

  2. Como já sabia de antemão,

    Como já sabia de antemão, mesmo que superficialmente, do tema do artigo, já no primeiro parágrafo o estômago começou a embrulhar. Mas segui em frente porque desejava ardentemente apreender o que realmente significava, significa essa malsinada PEC 63/2013. Confesso, ao final – literalmente, ou seja, sem firulas retóricas – estava tão nauseado como estivesse no auge de uma ressaca homérica. 

    O texto do Sergio Roberto Guedes reis é daqueles para ser emoldurado no panteão que simbolicamente ergui para abrigar contribuições notáveis, fora de série. Pouca vezes tive a oportunidade de ler uma exposição tão bem escrita, coerente, embasada e articulada como essa. 

    Como o post é longo e basicamente tem um só eixo sobre o qual se assentam apreciações de cunho legal, ético(esse principalmente), administrativo, sociológico e até filosófico, me falta até argumentos para comentá-lo. Assim, sinteticamente recorto e destaco esse naco do mesmo por considerá-lo, não uma síntese do todo, mas o mais expressivo e que toca verdadeiramente nos brios daqueles que ainda tem aquilo que se costuma denominar de consciência cívica ou cidadã:

    Da combinação entre a proximidade com o poder e a dominação tecnopolítica dos instrumentos legais e legítimos para a consagração de interesses puramente pessoais é que emerge um dos esquemas mais subreptícios de corrupção no Brasil contemporâneo, tal qual o enunciado neste caso.

    Se o Judiciário brasileiro, devidamente mancomunado com parte do Legislativo, persistir nessa imoralidade, decerto dará uma contribuição decisiva para finalmente lançar suas imagens – já desgastadas – para o fundo do poço do opróbrio e da devassidão moral.

    1. Caros inteligentes

      Caros inteligentes pensadores,

      estou aqui lendo o livro intitulado “1808” e gostaria de precavê-los, infelizmente, de que ainda estamos em 1808, provavelmente porque por falta de referência os nossos pais dos pais dos pais dos pais não conseguem mudar dois séculos de cultura, nem mesmo após dois séculos. A mudança de costumes move-se com a lentidão de um enorme navio e seu pequeno leme, mas falo de um navio de milhões de toneladas e um leme de centímetros.

      Por isso, já peço desculpas antecipadas, pelos tataranetos que podem, ainda, não somente postular – o que já merece todos os pedidos de desculpas – como aprovar a PEC em questão, juntamente com outras.

      Nosso leme de centímetros parece pegar boas marés, como diminuir o índice GINI (é isso?) da desigualdade social de 0,63 para 0,5; ou permitir que mais pessoas voem, dirijam e vão ao juizado de pequenas causas.

      Tão logo seja possível, colocaremos o navio na rota republicana, mas não sei quantos graus faltam (180?) para nosso leme de poucos centímetros nos proporcionar esta mudança cultural em todos os tataranetos de 1808.

      Faço também meus os elogios de JB Costa ao autor Sérgio Guedes. Vocês corrigem o leme, ou a rota, do país.

       

      Respeitosamente,

      Vladimir Bergier Dietrichkeit

  3. A idéia de se criar um

    A idéia de se criar um adicional por tempo de serviço não tem nada de absurdo. No serviço público federal já existiu o quinquênio. Por si só a proposta é razoável. O que não é razoável são os argumentos de que os magistrados são mal remunerados. E é pior absurdo querer desobrigá-los de respeitar o teto remuneratório. Aliás um observador atento teria notado sem dificuldade que uma coisa nega a outra. Se os magistrados fossem mal remunerados não teriam a preocupação com o teto remuneratório do serviço público. Fazem a pressão para serem desobrigados dessa limitação justamente por saberem que seus salários vão estourar o limite.

    1. O pagamento de adicional por

      O pagamento de adicional por tempo de serviço (ATS) é uma ferramenta extremamente primitiva de gestão de pessoas. O ATS não estimula a inovação; não estimula o atingimento de objetivos e metas; não estimula a capacitação nem o enriquecimento intelectual dos servidores. É uma remuneração extra que, para ser auferida, não exige a produção de nada. Por isso é tão desejada por grupos que desejam extorquir o Estado sem oferecer nada em contrapartida.

  4. E depois que aprova, vira

    E depois que aprova, vira clausua pétrea, ninguem mais remove, mesmo que o país quebre eles vão receber meio milhão de reais por ano, fora os penduricalhos diversos. E nem precisa ter orçamento, previsão, dizer de onde vai cortar, nada. É aprovado na hora. E julgar os nossos processos com isençao e rapidez???? Nem pensar.

  5. Esqueceram de mencionar o

    Esqueceram de mencionar o Lewandowisk, que falava ao telefone com membros da CCJ, quando da aprovação da PEC (e condenaram o JB porque ele enviou uma nota técnica aprovada pelo STF recomendando a aprovação). Ele, o Lewando, o mais amado das associações de magistrados. Porque será?

  6. Classes de Entrada

    Sergio,

    Parabéns pelo excelente texto. Não sabia de nada disso, e não teria
    entendido tão bem sem a convincente abordagem que você constrói de
    mais dadas com o leitor.

    Deixo uma curiosidade, pois não vi esta sugestão no texto, mas deve
    haver algum motivo para esta sugestão não ter sido abordada.

    Do ponto de vista do incentivo à carreira, bastaria criar mais classes
    inferiores de entrada para os magistrados, e permitir diferenças
    maiores entre os salários de entrada e de saída? Isto seria
    republicano, pois diminuiria o gasto com magistrados nas classes
    iniciais; genuinamente criaria um incentivo à progressão na carreira,
    pois haveria aumento salários, por exemplo, até mesmo de 35%, porém
    recebendo 35% menos nas novas classes iniciais, mantendo o teto
    constitucional; e, afinal, seguindo o raciocínio de que o dinheiro é
    limitado, está economia poderia permitir a contratação de mais
    magistrados, agora que, assim como ocorreu com os aeroportos, a
    população mais simples tem acesso tanto à aviação quanto à justiça,
    com a criação dos excelentes juizados especiais. A contratação de mais
    magistrados permitiria um aumento do conforto, com diminuição da
    quantidade de tarefas, para cada magistrado.

    Pode corrigir estas minhas sugestões? Claro, elas não atendem ao
    status, aumento nobiliárquico dos magistrados, mas supondo que metade
    deles consiga enxugar o cifrão que corre nas veias OM a mera ameaça de
    conseguirem aprovar um aumento em suas rendas, metade deles pode
    enxergar esta sugestão como republicana e mais inteligente do que
    dispendiosa.

    O que você acha?

    Muito obrigado,
    Vladimir Bergier Dietrichkeit

    1. Oi, Vladimir. Obrigado pela

      Oi, Vladimir. Obrigado pela leitura e pelo elogio. Faz muito sentido, a meu ver, a sua preocupação com a apresentação de uma proposta que venha a lidar de forma construtiva com a questão. Acho que faltou isso no meu texto – e eu sempre critico quando apenas se faz uma crítica sem a apresentação da solução do problema. De todo modo, tinha achado que o ensaio já tinha ficado bem longo, e minha preocupação inicial foi denunciar a tragédia que se avizinha. Creio sinceramente que devemos mobilizar consideravelmente nossos esforços para que essa PEC não venha a ser aprovada, em que pese o poder dos lobbies.

      Dito isso, entendo que a saída passa realmente pela elaboração de uma proposição que venha a significar um plano de carreira para os magistrados (e membros do MP). De certa forma, creio que será essa a estratégia que parte do governo virá a adotar como contrapartida à PEC. O Humberto Costa, conforme relatei na seção sobre o Histórico, tinha colocado uma emenda que visava retirar uma dessas amarras fundamentais contidas na CF, que é essa vinculação proporcional necessária entre os vencimentos de Ministros do STF, membros dos tribunais superiores e, subjacentemente, de tribunais estaduais. Trata-se de uma “escadinha” que faz uma série de limitações. Veja o Art 37, XI, da CF:

      ” XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como li-mite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o sub-sídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tri-bunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos”

      Em seguida, o inciso XIV coloca o seguinte:

      “XV – o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV deste artigo e nos arts. 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;”

      Já o parágrafo 4º do Art 38 diz:

      “§ 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. “

      Daí, no que se refere especificamente ao Judiciário, temos o seguinte (art. 93, V):

      “V – o subsídio dos Ministros dos Tribunais Superiores corresponderá a noventa e cinco por cento do subsídio mensal fixado para os Ministros do Supremo Tribunal Federal e os subsídios dos demais magistrados serão fixados em lei e escalonados, em nível federal e estadual, conforme as respectivas categorias da estrutura judiciária nacional, não podendo a diferença entre uma e outra ser superior a dez por cento ou inferior a cinco por cento, nem exceder a noventa e cinco por cento do subsídio mensal dos Ministros dos Tribunais Superiores, obedecido, em qualquer caso, o disposto nos arts. 37, XI, e 39, § 4º;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

      Quer dizer, em outras palavras (fugindo do juridiquês, e eu não sou advogado, nem me dou muito bem com o Direito), há uma dupla vinculação – que não é peremptória, obrigatória, mas que a discricionariedade permite com que quase sempre os valores máximos permitidos sejam os instituídos:

      No nível federal, o teto é a remuneração dos Ministros do STF. Os membros dos Tribunais Superiores corresponderá, necessariamente, a 95% desse valor concedido ao STF.

      No nível estadual, temos que o teto é o subsídio do Desembargador. O que se diz, em seguida, é queos subsídios serão escalonados de acordo com dois elementos: 1) a diferença salarial entre as categorias de juízes não pode ser superior a 10% ou inferior a 5% (exatamente o tópico que o Humberto Costa propôs alterar); 2) Não pode o subsídio estadual exceder 95% do auferido pelos Ministros de Tribunais Superiores (que significa, por sua vez, 95% dos vencimentos dos Ministros do STF). É exatamente isso o que significa o limite de 90,25% do vencimento do STF como limite para o Desembargador (95% dos Ministros do STF x 95% dos Ministros dos Tribunais Superiores). Como vc pode ver, é uma amarra bem consistente e rígida, que garante aos magistrados vencimentos iniciais extremamente elevados para os padrões brasileiros.

      Como há aquele argumento da irredutibilidade dos subsídios (parágrafo 4º, Art. 38), certamente seria um imbróglio imenso promover um plano de carreira que, na prática, signifique a redução dos vencimentos iniciais dos magistrados de forma a se criar um “delta” para que ocorra a construção de níveis de progressão. De fato, os mecanismos no Judiciário são um pouco diferentes – em parte provavelmente da resiliência de uma tradição imperial, como disse no texto. A evolução salarial ocorre quando o sujeito vai subindo na hierarquia, de forma a se tornar desembargador, ministro de tribunal regional, ministro de tribunal superior, etc. E o próprio processo de “promoção”, em parte, ocorre por antiguidade (e parte por “merecimento”), i.e., de maneira “compulsória” após um determinado tempo de trabalho. Eu entendo que é preciso mudar radicalmente essa lógica. É necessário que haja tanto um mecanismo de evolução na carreira no sentido de se ter um ganho de atribuições e responsabilidades ao juiz ao longo do tempo como, eventualmente, o aumento dos vencimentos auferidos em razão da assunção de postos (um pouco como ocorre no Executivo por meio dos DAS, funções de confiança e funções comissionadas). O problema é que a lógica, no Judiciário, é que se o cara assumiu o posto de Desembargador, ele, no mínimo, “morre” aí. Sua pior punição é a aposentadoria compulsória em caso de falta muito grave.

      Se tivermos condições de mudar a CF (e aí seria preciso entrar em discussões sobre direitos adquiridos, questionando-se, p.ex. se ela ocorre em razão de eventual redução de subsídios – o que poderia ser inconstitucional, mas também poderia, talvez, ser legal, caso se entenda o caso como mudança de regime jurídico, no qual já há o estabelecimento da inexistência dos tais direitos adquiridos), então seriam essas algumas das questões que ensejariam um profundo debate. Eu concordo, em linhas gerais, com a proposta que você colocou. Seria, na minha opinião, uma forma inteligente e republicana de lidar com a situação. Idealmente, precisamos reduzir, sim, esses valores iniciais, pois de outra forma se torna inviável a elaboração de um plano de carreira que não seja figurativo. Apesar de todas as imensas dificuldades que uma proposição nesse sentido poderia ter, eventualmente valeria lutarmos por essa possibilidade, se não para que ela seja conquistada em sua integralidade, mas pelo menos para que o tema seja debatido com a seriedade devida. Talvez, no final das contas, só uma tragédia orçamentária como o estouro da LRF em 9 Estados após a aprovação da malfadada PEC venha a criar um contexto de crise institucional que seja realmente favorável para que discutamos a questão nos termos em que precisa sê-lo: a necessidade de se estabelecer um plano de carreira para a Magistratura.

      Um abraço

  7. Os Príncipes do Judiciário

    Vergonha. Primeiro tinha-se que garantir a recuperação dos professores dos ensinos fundamental e médio, como fizeram potências econômicas como a Suécia e a Koréia do Sul. Nós estamos, uma vez mais, alimentando essa cultura das castas e seus privilégios. Isso é uma indignidade. Só pra lembrar: trata-se de dinheiro público e isto exige que se estabeleça prioridades em meio a escassez.

  8. quem
    Não se trata de igualar salários dos juízes e promotores estaduais e federais. Eles já tem isonomia salarial. O que pode, eventualmente, ter de diferença são os benefícios extras… os subsídios todos os juízes federais e estaduais serão acrescidos pelos quinquênios retroativos (a contar da data em que obtiveram sua carteira da OAB ou de emprego público anterior ao atual… provavelmente a grande maioria dessa elite do funcionalismo público já terá ainda o benefício da sexta parte: ao completar 20 anos acrescenta-se alem dos 4 quinquênios [20%] mais 20% referente ao benefício chamado de sexta parte, ao qual todos farão jus senão imediatamente, assim que completarem os supramencionados 20 anos de serviço público. Pior que ninguém divulga ao povo que há cerca de 8 anos atrás o MP e a Magistratura trocaram esses mesmos quinquênios que agora pleiteiam de volta por não menos de 80 % de aumento em seus contra-cheques. Esse país é uma vergonha mesmo! Enquanto estamos mergulhando numa recessão vem o alto escalão do poder judiciário e do ministério público pleitear a aprovação desta PEC 63/13, maculada pela irrazoabilidade total e descarada indecência!

  9. Os juizes estaduais estão já

    Os juizes estaduais estão já há alguns anos recebendo mais que os juizes federais. Como o atual governo possui ressentimentos com o Judiciário e Ministério Público (Julgamento do Mensalão), prejudica como pode a Justiça Federal como pode, tentando ao máximo desmoralizar os juizes federais e sucatear os servidores. Assim, as justiças estaduais, como tem autonomia orçamentária, (é o governandor do Estado que sanciona a lei), têm reajustado os subsidios de seus juizes e servidores, hoje atualmente tanto juizes quanto servidores da justiça estadual são bem melhores remunerados que os juiz e sevidores federais.

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