Para entender a estratégia econômica

As crises de financiamento externo obedecem a um mesmo roteiro, desde os anos 90:

1.     O déficit externo vai se aprofundando.

2.     À medida que atinge níveis perigosos, há uma redução do fluxo de investimentos externos, provocando uma desvalorização do real.

3.     A atitude do Banco Central consiste em aumentar os juros – para assegurar o financiamento externo e para segurar a alta de preços.

4.     Quando os capitais externos sentem que a desvalorização chegou ao fim, consideram que o país fica “barato”. Os capitais voltam ganhando com os juros altos e com a possível revalorização do real. Até à crise seguinte.

Desta vez, há algumas diferenças no processo.

Primeiro, o nível das reservas cambiais e dos swaps cambiais, reduzindo o impacto da saída de dólares. Amenizou mas não anulou o ciclo. Tudo dependerá da maneira como a Fazenda e o Banco Central irão atuar.

O caminho da desvalorização cambial

Nessa hipótese, o BC mantem a desvalorização cambial. A intenção será mudar os preços relativos, permitindo a recuperação da economia através das exportações e das novas rodadas de concessão pública.

Para que haja esse movimento, a inflação precisa ser controlada sem se recorrer a uma nova apreciação cambial.  O que significa que as políticas monetária e fiscal terão que ser muito mais radicais, implicando em um grau de recessão maior para permitir completar o ciclo de mudança de preços relativos e recuperação das exportações.

Como a queda da economia impactará na arrecadação de impostos, os cortes serão mais drásticos que numa política menos ortodoxa. É um ciclo perverso, uma aposta que, completada a mudança de preços relativos, a economia possa deslanchar via exportações e via volta das concessões – além da recuperação da Petrobras.

Não será tarefa fácil, mas é a única viável.

Hoje em dia, há uma penetração muito maior de bens intermediários importados, significando que o impacto do câmbio se dará também sobre produtos fabricados no país. Além disso, há o impacto do realinhamento da tarifas públicas. Em contrapartida, uma melhor previsão de safra e de preços agrícolas.
Mas o ajuste se dará em cima de salários e emprego. Apenas em um prazo mais largo se sentirá o novo ciclo de recuperação econômica.

O desafio maior será o de montar uma sustentação política e social para essa transição.

A volta da apreciação cambial

Nessa hipótese, o BC se afoba com a questão inflacionária e permite nova rodada de apreciação cambial. A recessão será menor mas se manterá a economia em banho maria e com a espada de Dâmocles da crise externa no pescoço.

Nesse caso, a economia continuará se arrastando nos próximos anos, com dificuldade para se recuperar devido ao esgotamento do crescimento via consumo das famílias.

Seria um vôo de galinha até a próxima crise.

Luis Nassif

11 Comentários

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  1. Para entender a “corrupção” petista do trabalho contra o capital

    Kjeld Jakobsen: Golpes de hoje, em defesa do neoliberalismo, combinam mobilização popular com instrumentos legais

    publicado em 24 de março de 2015 às 12:40

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    Em artigo na Carta Maior, Róber Iturriet Avila ligou a variação do salário mínimo ao golpismo

    Golpes de Estado de ontem e de hoje

    por Kjeld Jakobsen, no Teoria e Debate

    Em um momento crítico da Guerra Fria entre as décadas de 1950 e 1970, quando muitos países do Terceiro Mundo lutavam por sua independência política e outros que já a possuíam buscavam um novo modelo de desenvolvimento econômico e social, as grandes potências defendiam seus interesses imperialistas e colonialistas por meio da promoção de golpes militares para derrocar governantes progressistas ou de esquerda.

    Esses interesses eram principalmente a preservação do seu espaço geopolítico diante da expansão das experiências socialistas no período pós-Segunda Guerra e a manutenção de suas empresas multinacionais.

    Esses golpes, via de regra, eram protagonizados pelas Forças Armadas do país em questão sob o pretexto de garantir a “segurança nacional” e combater o comunismo, contando com o apoio civil de sua burguesia e classes médias, bem como de órgãos de imprensa sob seu controle, empresas, igrejas, entre outros aparatos da superestrutura.

    O apoio externo, normalmente norte-americano, assegurava os recursos para bancar a propaganda contra o governo a ser derrubado, a mobilização civil e eventualmente a compra de armas e pagamento de mercenários, caso dos golpes que derrubaram o presidente Jacobo Arbenz da Guatemala, em 1954, e Patrice Lumumba no Congo, uma década depois, além de muitos outros.

    O padrão golpe de Estado por meio das Forças Armadas locais com apoio de setores da burguesia nacional para implantar ditaduras civis ou militares com envolvimento direto de agências de inteligência como a norte-americana CIA foi o que vigorou até a queda dos regimes de socialismo real no Leste Europeu e na União Soviética no final dos anos 1980.

    Na América Latina, poucos países escaparam dessa sina e a violação de direitos humanos foi recorde. Na já mencionada Guatemala houve o assassinato e desaparecimento de aproximadamente 200 mil pessoas entre o golpe de 1954 e a assinatura do acordo de paz entre o governo e a guerrilha de esquerda em 1996.

    O golpe militar que derrubou o presidente Sukarno na Indonésia, em 1965, cobrou a vida de cerca de 700 mil pessoas suspeitas de serem comunistas ou de esquerda. Na Argentina estima-se que a ditadura militar dos anos 1970 seja responsável por perto de 20 mil desaparecimentos.

    A conjuntura pós-Guerra Fria significou a adoção do modelo de democracia liberal na maioria dos países que haviam optado pelo regime do socialismo real na segunda metade do século 20, bem como a redemocratização de muitos outros países que conviveram com ditaduras civis ou militares, caso do Brasil e de outros países da América Latina.

    Os governos civis que assumiram após as ditaduras em geral adotaram o neoliberalismo como política econômica, aprofundando a concentração de renda, o desemprego e a informalidade.

    Quando o resultado eleitoral na Venezuela levou Hugo Chávez à Presidência em 1998, inaugurou-se uma série de mudanças políticas na América Latina que questionavam o modelo neoliberal vigente, bem como a geopolítica hegemonizada pelos EUA.

    Esses questionamentos e a busca de vários países latino-americanos por modelos de desenvolvimento mais autônomos provocaram a reação do imperialismo e dos setores econômicos e políticos nacionais a ele vinculados.

    Essa reação, no entanto, deixou de ser militar, como durante a Guerra Fria, assumindo nova estratégia e doutrina.

    Estas consistem, grosso modo, em gerar um questionamento social ao governante em exercício que possa justificar sua destituição por meio de instrumentos previstos na legislação nacional, mesmo que sua aplicação seja distorcida.

    Convém lembrar que, embora as legislações de muitos países latino-americanos que passaram por ditaduras militares tenham sido reformadas após o fim desses regimes, certos poderes mantiveram-se inalterados e conservadores, como o Poder Judiciário.

    O sistema presidencialista é o dominante nos países latino-americanos e os Parlamentos possuem mecanismos para destituir o presidente na maioria deles (impeachment). Tais características visivelmente vigoram no Brasil e em outros países do continente.

    Portanto, essas são as duas instituições com capacidade de aplicar os atuais “golpes legalizados”, como vimos no Paraguai em 2013, quando em função de um conflito de terras na região de Curuguatay morreram vários camponeses e policiais.

    Esse ocorrido pôs tanto a esquerda como a direita contra o presidente Fernando Lugo e, em menos de 48 horas, o Parlamento paraguaio, por meio de um “julgamento político”, votou por sua destituição, uma vez que seu apoio parlamentar era praticamente inexistente. Essa adjetivação da decisão visou impedir qualquer tipo de debate jurídico sobre seu mérito, já que o Parlamento é um organismo essencialmente político.

    O golpe aplicado contra o presidente Manoel Zelaya de Honduras, em 2008, quando um pelotão militar o retirou de madrugada do palácio presidencial e o despachou para a Costa Rica, foi referendado imediatamente pelo Parlamento e pela corte suprema do país.

    Como justificativa, alegaram que Zelaya pretendia ilegalmente mudar a Constituição hondurenha para possibilitar a reeleição presidencial, embora ele mesmo não fosse diretamente beneficiado, pois o referendo que propôs para definir a questão seria realizado somente na eleição que escolheria seu sucessor.

    Entretanto, em outros países da região em que os presidentes têm maior poder e maior representatividade, como na Venezuela, Bolívia e Equador, a estratégia golpista teria de ser mais sofisticada, e assim foi introduzido o elemento mobilização social, bem como atos de violência ou sabotagens que pudessem desgastar o governo.

    A Venezuela enfrentou essa situação pelo menos três vezes.

    Na primeira, houve um golpe civil-militar clássico que, no entanto, destituiu por menos de 24 horas o presidente Hugo Chávez, pois a população e militares leais o reconduziram ao governo. Nas outras, tudo começou com processos de mobilização como a greve geral de 2002, o questionamento da oposição ao resultado eleitoral que sagrou Nicolás Maduro vitorioso em 2013 e as recentes manifestações articuladas pelos setores oposicionistas mais direitistas, como Leopoldo Lopez e Maria Corina Machado.

    Na verdade, essas mobilizações são organizadas por setores sociais minoritários, embora contem com apoio externo. A mídia que as apoia lhes dão uma dimensão muito maior do que a real e, além disso, a introdução do fator violência com mortes de civis por meio de franco-atiradores, conforme verificado em vários momentos na Venezuela ou no já mencionado massacre de Curuguatay.

    Essas mortes tendem a ser divulgadas pela mídia como de responsabilidade do governo, que estaria reprimindo duramente manifestações legítimas. A intenção é criar um ambiente que favoreça a intervenção de alguma instituição supostamente republicana para restaurar a ordem e a paz social e dar legitimidade popular ao golpe de Estado.

    O presidente da Bolívia, Evo Morales, enfrentou algo semelhante durante seu primeiro mandato por meio de um movimento separatista que opunha várias províncias ao governo central, quase paralisando o país.

    O presidente Lula, no Brasil, também enfrentou um processo político desgastante em 2005 que a oposição brasileira só não levou até o fim porque imaginava que a eleição do ano seguinte resolveria a questão a seu favor. E agora estamos assistindo aos desdobramentos das investigações sobre a Petrobras com as quais a oposição pretende questionar o mandato da presidenta Dilma.

    Não é apenas na América Latina que as forças conservadoras desprezam a democracia para defender seus interesses. Na Europa, berço da democracia ocidental, há vários casos da utilização de mecanismos burocráticos para defender certos interesses econômicos em detrimento da opinião majoritária da população.

    Por exemplo, a imposição das medidas de austeridade na Grécia pela Troika, formada pelo Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI, impedindo que o governo de Georges Papandreau as submetesse a referendo popular, assim como a pressão da mesma Troika em 2010 sobre o Parlamento italiano para substituir o governo Berlusconi por um “gabinete técnico” que levasse as medidas de austeridade adiante na Itália. Desde aquele momento até hoje o país já está no terceiro primeiro-ministro não eleito pelo povo.

    Ou seja, num primeiro momento era importante que o capitalismo neoliberal fosse legitimado democraticamente, e, como não havia contraponto devido à queda dos regimes do socialismo real e a crise da social democracia, foi o que aconteceu.

    No entanto, como agora há questionamentos sérios a esse modelo, principalmente pelas experiências alternativas na América Latina, a legitimação democrática torna-se menos importante e, nesse sentido, a pressão que os governos progressistas da região ora sofrem tende a aumentar, pois há poucos aliados com os quais poderão contar no resto do mundo. Ou seja, os golpes de Estado de ontem eram para combater o comunismo e atualmente servem para defender o neoliberalismo.

    *Kjeld Jakobsen é diretor da Fundação Perseu Abramo

    http://www.viomundo.com.br/politica/kjeld-jakobsen-golpes-de-hoje-em-defesa-do-neoliberalismo-combinam-mobilizacao-popular-com-instrumentos-legais.html

  2. Uma janela de oportunidade se abriu

    Se a Dilma bancar o caminho da desvalorização, a história fará dela uma Estadista. Poderão ser dois ou três anos doloridos (segurar a barra nesses momentos é a prova real da grandeza de um(a) líder), mas que no final não só irá colher fruto, como legará uma nova dimensão econômica para o país. 

    Terá envergadura para bancar?….

    Chegamos naquele momento em que ou se pisca ou pisa firme rumo pra frente e ponto final. Uma janela de oportunidade se abriu com toda essa crise política. Cabe a ela, E TÃO SOMENTE A ELA decidir se ruma ou se hesita.

     

     

  3. Sei não.

    Com todo respeito ao Nassif, que é sem sombra de dúvida um excelente analista de economia, mas o fato é que tenho lá minhas dúvidas em relação a esse trade off (consumo x depreciação) apresentado no texto. 

    1. Pode ser que seja uma questão mais de longo prazo, mas Ignácio Rangel insistia que a inflação, na era dos oligoplios, não é produzida pelos salários (pelo consumo do trabalhador, enfim), mas pela capacidade osiosa dos própios oligopólios (a chamada inflação oligopolista, também presente em teoricos marxistas como P. Sweezy e outros tantos keynesianos de boa cepa)

    2. No mais, vejo uma contradição na argumentação: se o ciclo consumo se esgotou como atribuir a ele um repique inflacionário? Em uma situação dessas (que penso ser ter lá sua dose de verdade), a desvalorizaçaão cambial (absolutamente necessaria, vale dizer) não teria o efeito inflacionário que se está supondo. No mais, e para pensar com Rangel, na medida em que a desvalorização aquece as plantas industriais dos oligopolíos, a causa oligopolista da inflaçao simplesmente arrefece (permitindo absorver, de resto, o impacto do realinhamento das tarifas públicas).

    Concluindo: não me convence muito essa tese (típica da era pré-keynesiana) de enfrentar a crise metendo a mão no bolso do trabalhador. 

    1. Nem a mim. Estou apenas

      Nem a mim. Estou apenas expondo a lógica que vai na cabeça deles e o s desdobramentos de uma política inevitável (por decisão da Dilma)

  4. Acho que um bom caminho

    seria manter o cambio desvalorizado fomentando as exportações , investir pesado via BNDES nos pequenos e médios empresários que são os que mais geram emprego e onde o campo para incentivar a inovação e o ganho de produtividade é enorme , mantendo a poltítica de valorização do salário em vigor atualmente e ao mesmo tempo diminur essa taxa selic o mais rápido possível , tentando evitar ou minimizar uma recessão que se avizinha.

    Fazendo esse grande esforço no mercado interno mais as novas concessões públicas atraindo o capital externo já ajudaria bastante nessa fase de turbulência que estamos passando.

     

  5. A estratégia econômica neoliberal

    Concentram toda a movimentação de capital nas suas mãos – Swift – FMI – BIS – Banco Mundial – imprimem até esculhambar com o Dólar, que é uma moeda sem lastro e digitalizam todo o dinheiro nas mãos do povo.

    Ai, com o controle total da moeda circulante, dão o golpe por trás dos panos e são felizes para sempre.

    Falta só combinar com os Russos e Chineses.

    Vevemos em tempos interessantes.

  6. Perfeita análise.
     
    É

    Perfeita análise.

     

    É exatamente esse o plano. E vai funcionar porque terá o apoio do andar de cima : deliciosos juros de 14 % aa.

     

    A coisa vai acontecendo de forma controlada. E o aquecimento da economia também.

     

     

  7. Perfeita análise.
     
    É

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    A coisa vai acontecendo de forma controlada. E o aquecimento da economia também.

     

     

  8. Como leigo no assunto, me

    Como leigo no assunto, me parece que tanto o caminho, quanto a dosagem foram definidas lá atrás com escolha da dupla Levy/Barbosa, não? Me parece também que está definido o objetivo de dar protagonismo à indústria na próxima etapa de desenvolvimento do país, é isso mesmo?

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