(Sub)desenvolvimento e (des)industrialização, por Rodrigo Medeiros

por Rodrigo Medeiros

A relação entre industrialização e o processo de desenvolvimento socioeconômico dos países é conhecida desde o advento da Revolução Industrial. Esse processo complexo e não linear inclui o crescimento relativo do setor de serviços nos empregos totais e no produto. Mais recentemente, o fenômeno da desindustrialização tem sido objeto de maiores debates.

Uma matéria da BBC apontou que “promissora na década de 1980, a indústria brasileira entrou em declínio e hoje representa apenas pouco mais de 10% do Produto Interno Bruto do país” [1]. A sua perda de participação no PIB desde meados dos anos 1980 é citada na respectiva matéria como uma desindustrialização precoce, segundo a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad, em inglês). Esse fenômeno foi observado na América Latina, mas o Brasil se destacou negativamente.

A desindustrialização é considerada precoce pela Unctad “quando uma economia não chega a atingir toda sua potencialidade produtiva manufatureira e, em vez de evoluir em direção à indústria de serviços com alto valor agregado – setor terciário -, regride para a agricultura ou cai na informalidade”. Na avaliação da Unctad, que consta na matéria da BBC, o processo teve início com os choques econômicos vividos nos anos 1980, intensificando-se com a abertura comercial no começo dos anos 1990, seguido pelo abandono das políticas desenvolvimentistas e pelo emprego da taxa de câmbio como ferramenta no combate à inflação. O ciclo de boom das commodities adicionou ilusões às perspectivas de desenvolvimento regional na América Latina.

Em sua edição 752, a Carta do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) traz reflexões sobre a importância da indústria e os riscos da desindustrialização prematura. Entre as constatações apresentadas, destaco que o “crescimento da produção de manufaturas alavanca o setor de serviços, ou seja, a atividade manufatureira tem efeitos multiplicadores e de encadeamento sobre os serviços no curto e longo prazo” [2]. Apoiando-se em trabalhos acadêmicos, o Iedi afirma também que o desenvolvimento industrial promove a acumulação de capital e acelera o progresso tecnológico.

As consequências negativas da desindustrialização prematura são apontadas: “o deslocamento do emprego em direção a atividades de baixa produtividade do setor de serviços e do setor primário, bem como o aumento da informalização e da precarização das condições de trabalho e de vida das populações”. Esse debate não parece estar bem contemplado quando se discute o ajuste das contas públicas em nosso país. Afinal, a nossa democracia poderá se fragilizar ainda mais com a desindustrialização precoce.

Desde o final de 2014, estava bem claro que a desindustrialização prematura dificultaria uma rápida recuperação brasileira em um contexto no qual o Fundo Monetário Internacional (FMI) chamaria, em 2015, de “um novo medíocre” em termos de expectativas de crescimento global. Lawrence Summers, ex-secretário do Tesouro norte-americano e acadêmico de prestígio, vem defendendo a tese da “estagnação secular” e suas implicações derivadas da histerese na redução do crescimento global. Pouca atenção recebeu no Brasil.

O efeito de histerese derivado da desindustrialização prematura já apontava para a saída lenta, difícil e dolorosa da crise. O crescimento do emprego e da participação relativa no PIB do setor de serviços não se processou em consonância com o necessário aumento de produtividade da economia brasileira. A persistente inflação de serviços reflete esse quadro. Em síntese, não parece sensato jogar todo o peso dos “ajustes” sobre os trabalhadores enquanto o nosso regime macroeconômico cristalizar a sobrevalorização cambial crônica do real.

 

Notas

[1] http://www.bbc.com/portuguese/brasil-37432485

[2] http://www.iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_752.html

Rodrigo Medeiros

5 Comentários

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  1. Pois, é
    E aí, vem esse governo ilegítimo e propõe algo como a famigerada Pec 241, que só vai piorar essa situação. Como bem alertou mestre Celso Furtado (O Longo Amanhecer): “Em nenhum momento da nossa história foi tão grande a distância entre o que somos e o que esperávamos ser”.

  2. Pré sal e Petrobras seria a locomotiva da reindustrialização!

    Mas os médios e grandes Empresáriosdo Comércio e da Indústria foram os grandes apologistas do Golpe e sucumbiram ao canto da sereia do entreguismo explícito e do rentismo covarde e anti-mercado-consumidor.

    Agora amargam retração explosiva:JB de hoje informa ; RJO seis mil lojas fechadas só neste ano.

    O grosso dos  médios Empresários que embarcaram na descontrução do Governo Dilma odeiam pobre , seus clientes.

    São uns bundões. Se perguntarem quando foi descoberto o Pre sal e o que tamanha reserva significa eles botam a gente pra correr quando forem informados que se não houvesse Governo Lula dificilmente o Pré Sal seria descoberto e/ou explorado em tempo record. Se perguntarem o quê é cadeia produtiva eles não saberão responder. Se perguntarem o que significa conteúdo nacional ou geopolítica  do petróleo iii piorou .

    A classe política está envolvida somente em seus interesses particulares, mesquinhos e imediatos!

    A classe política atirou na locomotiva, furou o motor , o combustível vasou e aproveitaram  pra botar fogo

  3. A “casa Brasil”

    Recebo de herança uma casa, a “casa Brasil”, estrategicamente situada no mapa do mundo.

    Ela é enorme e possui diversos espaços interessantes: Um terreno gigante para plantar qualquer coisa; Uma varanda boa para instalar um comércio; Um galpão sólido para implantar alguma indústria; centenas de quartos que serviriam para implantar um hotel; e um monte de empregados para tocar todos estes negócios.

    Eu fiquei anos em casa ajudando ao meu pai. Os meus quatro irmãos estudaram mais do que eu, em colégios caros. Um deles é economista, outro Juiz, outro fez concurso público, e tem ainda um irmão playboy. Depois da morte dos meus pais, o playboy prefere não trabalhar, o economista diz que é melhor não fazer nada e alugar a casa para um inquilino estrangeiro. Os outros dois irmãos concordam desde que o locador garanta os seus salários. Eu fui voto perdido. O playboy não votou.

    Quase todos os empregados foram dispensados. Já eu, fiquei sem casa e, com apenas o dinheiro equivalente a 1/5 do aluguel do aluguel, fui morar num barraco no Brejo da Cruz e a fazer bicos.

    Voltei depois de algum tempo a visitar a antiga casa dos meus pais e avôs e me encontrei com o meu irmão economista morando lá. Eu achei estranho e perguntei: Que aconteceu? O meu irmão me contou que foi convencido pela propaganda e, achando que seria um bom negocio, sublocou a casa do inquilino estrangeiro, em valor mais alto que o estrangeiro pagava (ou seja, o estrangeiro leva dinheiro de graça).

    Depois de pouco tempo, o meu irmão não conseguia pagar ao locador original, e diz que está desesperado plantando no terreno e exportando a preço de banana, vendendo qualquer coisa na varanda, fabricando pregos, e até implantou um prostíbulo para aproveitar os quartos. Mesmo assim, o dinheiro não alcança para a sublocação e a divida externa aumentava a cada dia. Perguntei se os outros irmãos ajudavam, mas diz que eles não se preocupam com o problema, pois, pelo contrato da locação, é garantido o salário dos seus irmãos: Juiz e o meritocrático. O playboy mora em Miami.

    O meu pai, avô e ancestrais devem estar revoltados na sua tumba ao ver como estamos perdendo a nossa casa, a casa Brasil.

  4. (sub)

    Amém. Mas num país que tem uma única elite, parasitando o poder público, que é real e de esquerda acusando outra que é ilusória e dizem de direita, a industrialização pouco importa. É coisa do sempre combatido: capitalismo. Como falar em capitalismo se dizendo anti-capitalista? Resultado: maiores salários do país estão dentro da mordomia do orçamento e empregs públicos.(ou cartórios, aquela mamata com concessão pública que é “secagem de gelo”. O serviço prestado). Quando, como agora,  o orçamento público não comporta mais tantos parasitas, se privatiza uma parte do Estado e cria-se alguma “Agência Reguladora”. 5% das tarifas bilionárias para indicados políticos. 2016. Ainda hoje, estamos nesta discussão rasa e medíocre, projetando um país para quando? Para quem? Mais quantas décadas e décadas perdidas? 

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