PMDB no Governo? Bomba Fiscal! Chave do cofre na mão da velha direita patrimonialista, por Ciro D’Araújo

(NOTA 1: discussão suscitada no post “O xadrez do The House of Cards“, de Luis Nassif. Nos comentários surge o importante alerta que segue abaixo.

NOTA 2: sou testemunha privilegiada de que Ciro, ao ouvir na segunda-feira ainda o áudio vazado de Temer, foi o primeiro (que eu saiba) a ressaltar a bomba fiscal implícita no discurso.

Apenas na quarta aparece artigo no Globo (salvo engano) e tweet de Renata Lo Prete alertando para essa dimensão.

Ciro já está de olho nesse desdobramento desde a liminar que o STF deu a SC na semana passada – medida estendida a outros Estados. Essa preocupação, junto a todo resto, tem alimentado nossas longas conversar via instant messages. Aliás, Ciro e Nassif são os que mais me dão “food for thought” para os posts que tenho escrito aqui no GGN. Obrigado!)

Ao texto de Ciro:

 

Orçamento sob influencia da Direita Patrimonial

Sobre a questão orçamento, confesso ter ficado absolutamente chocado com a fala “vazada” ou divulgada por Temer de seu discurso de posse, em que fala sobre repactuação da divida dos estados, inclusive com relação aos juros.

Ora, tal repactuação é uma compra de apoio político de governadores com a cabeça na força através da total irresponsabilidade para com o tesouro em época de profunda crise fiscal.

Essa bomba, aliada à já conhecida bomba demográfica que em breve pegará a previdência pública, tornarão a situação fiscal do país para além do crítico atual, a tornaram, a imagem de seu mandatário, Temerária.

Não existe possibilidade real de corte de gastos sem uma pactuação social.  O único caminho para o financiamento público sem impacto social seria o crescimento econômico.  Dilma sabia disso e nos levou a todo tipo de aventura econômica inconsequente, tanto no âmbito das políticas desenvolvimentistas tradicionais, até chegar a irresponsabilidade da tentativa de “supply-side economics” tupiniquins com as desonerações fiscais para empresários cujo espírito animal ficará para sempre retratado pela figura de um pato de borracha gigante.

Não havendo crescimento (e não acredito no milagre do crescimento neoliberal prometido), o estado só pode se financiar seu rombo fiscal de três formas.

1) Impostos.  Num ambiente conflagrado e com taxas já consideravelmente elevada (e já estou contando nessa analise com a aprovação de uma CPMF) o espaço de manobra política é bastante limitado, especialmente tendo em vista os grupos de sustentação política do governo, especificamente a Direita Patrimonialista do país.

2) Dívida.  Será o caminho natural.  Dívida é o imposto futuro e é mais injusta pois é o imposto que será cobrado de quem não pode opinar.  Porém esse caminho esbarra na capacidade e vontade da sociedade de financiar o estado.  Em alguns setores já até se começa a falar em dívida externa novamente, citando as condições favoráveis em termos de juros (especialmente quando comparado as condições internas).

3) Inflação.  O estado pode simplesmente rodar dinheiro.  Com as bombas fiscais armadas parece inevitável, e me parece que um futuro governo Temer não teria nem mesmo a intenção de desarma-las.  Corre-se o risco então de tentar controlar os efeitos inflacionários da política fiscal via manipulação cambial e levar a situação ainda pior, criando risco de crise cambial.

Ou seja, uma repetição da década perdida de 1980 em muitos sentidos. E deve-se lembrar que um governo que chega ao poder sem passar por eleição pode se tornar especialmente mais irresponsável, especialmente considerando a falta de um nome pmdbista para uma possível sucessão.

Existe sim uma situação pior do que o domínio de uma direita liberal.  É o domínio da direita patrimonial –  a primeira pelo menos tem um projeto (equivocado na minha opinião) de país.  A segunda, um projeto de poder cleptocrata e irresponsável.

Um país com instituições políticas inclusivas pode gerar instituições econômicas também inclusivas.  As segundas em geral são consequências das primeiras. E instituições econômicas inclusivas são absolutamente fundamentais não apenas para um desenvolvimento social real, mas também para o crescimento econômico per si.

A direita patrimonial tem como único objetivo manter as instituições econômicas extrativas já existentes.  Para isso ela precisaria domar o avanço institucional político inclusivo.  Parece estar próxima disso.

Não é uma situação alvissareira.

 

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Resposta de Romulus:

Só um “grão de sal” a jogar sobre essa preocupação – como se diz em inglês – ou seja, uma relativização da mesma:

Temos de levar em conta o fator gogó de vendedor nos acenos de Temer a tudo e a todos. Ele está prometendo a potenciais apoiadores do impeachment coisas que certamente terá muuuuuuuita dificuldade para entregar. Cito: reforma trabalhista/previdenciária prometida a empresários, ajuda com encrencas na Lavajato a deputados desesperados (tomemos com ex. o PP) e por fim esse aceno de bonanças fiscais a governadores e prefeitos com o garrote apertando no pescoço.

Problema? Nenhuma das partes quer perder. Todas querem ficar onde estão ou aumentar seus ganhos. A conta não fecha, infelizmente.

Como um governo ilegítimo e sem apoio popular vai entregar a mercadoria é um mistério. Haja “profissionalismo” político do bom e velho PMDB para azeitar essas pinhas bastante espetadas e fazê-las entrar pela … … … garganta, digamos assim, de uma sociedade conflagrada e radicalizada.

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“pinhas goela abaixo” – Resposta de Ciro D’Araújo:

Fazer as pinhas entrarem “respeitosamente” na goela abaixo da sociedade conflagrada seria a opção da direita liberal, que guarda um mínimo de responsabilidade.  Essa é a opção que diz: “O remédio é amargo, mas vai ser melhor para vocês depois.”

Fazer as pinhas entrarem goela abaixo da sociedade conflagrada por meio da inflação é a opção histórica da direita patrimonial.  A inflação é a solução que permite que se atenda a todos, sem atender de fato a nenhum.  Coisa que o PMDB adora fazer.  Inflação faz todos perderem mas também permite a ilusão de que todos estão ganhando.  Paga o preço maior aquele que não tem a menor forma de se defender.  Essa é a opção Mary Poppins:  “Uma colher de açúcar faz descer o remédio…”

Não creio que o PMDB aprendeu de fato a responsabilidade fiscal.

Voltando ao post original do Nassif. O mero controle do ritmo e previsibilidade da lava jato criará efeitos de curto prazo na economia. 

E a recuperação imediata costuma ser num ritmo rápido.  O PIB caiu quase 4% mas isso não significa que a capacidade de produção potencial do país caiu no mesmo nível.  As pessoas não desaprenderam a trabalhar, nem as fabricas foram implodidas.  Existe um potencial produtivo já instalado que está subutilizado pela incerteza total dos agentes econômicos quanto ao futuro.  Um “milagre” contábil pode acontecer no curto prazo que é uma recuperação quase que imediata dessa capacidade produtiva já existente.  Crescimento real da própria capacidade, entretanto, é outra coisa.

Minha maior frustração com relação a queda do governo Dilma não é exatamente a dele em si.  Acho que por seus méritos, merecia cair.  Minha frustração é perceber um projeto de destruição dessas instituições políticas inclusivas que estavam sendo construídas passo a passo.

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“merecia cair”… vai cair? – Resposta de Romulus:

A dinâmica da disputa entre os dois grupos hoje é a mesma de um segundo turno: uma disputa não de popularidade junto aos eleitores mas de rejeições. Quem tiver a menor rejeição ganha.

Em CNPT ouso dizer que mesmo debaixo do fogo cruzado, com o que está posto à mesa, o voto popular preferiria Dilma a Temer. Mas o problema é que o “colégio eleitoral” é o Congresso no processo fajuto do impeachment.

Já cansei de dizer que em algum momento o STF deve ser provocado.

Aliás, acabei de ver agora a entrevista com J. Wagner no Brasilianas/Nassis e acho que só faltou essa pergunta. Pois foi ele próprio quem postou no twitter na semana passada que o governo analisava provocar o STF depois de eventual aprovação do parecer na Comissão do impeachment. 

Na entrevista ele só fala de projeções de votos.

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colégio eleitoral”- Resposta definitiva (engulo em seco) de Ciro D’Araújo:

E considerando os colégios eleitorais…

PT é excepcional no palanque, e dá provas disso a cada manifestação pela democracia.  Participar delas é algo histórico. 

PMDB é excepcional na política de congresso, e esta está sendo conduzida por dois dos maiores articuladores da câmara na história.  

Quem vota domingo é câmara, não o povo.

O povo só vota daqui a 2 anos.

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– Romulus não tem nada a dizer. Apenas suspira longamente…

Redação

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