Fernando Castilho
Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

A sonda da discórdia, por Fernando Castilho

Em uma das imagens, por exemplo, a sonda nasogástrica não parece estar inserida pela narina, o que contradiz sua finalidade básica

Reprodução

A sonda da discórdia, por Fernando Castilho

Já se passaram oito dias desde que o senhor Jair foi internado em uma UTI. O fato chama atenção, pois, em geral, a permanência na unidade de terapia intensiva é breve, justamente devido ao alto risco de infecção hospitalar. Nessas situações, a transferência para o quarto costuma ocorrer assim que o quadro clínico permite — o que, ao que tudo indica, já deveria ter acontecido.

Paralelamente, há inconsistências visíveis nas fotos e vídeos que ele próprio publica em suas redes sociais. Em uma das imagens, por exemplo, a sonda nasogástrica não parece estar inserida pela narina, o que contradiz sua finalidade básica: alimentar o paciente que não pode ingerir alimentos por via oral. Nos mesmos registros, ele aparece tomando sopa — algo, no mínimo, incompatível com o uso efetivo da sonda. O excesso de eletrodos espalhados pelo corpo também chama atenção: embora possam ser necessários para monitoramento contínuo, o contexto levanta dúvidas legítimas.

É possível, sim, que o estado de saúde de Jair seja realmente delicado. Mas convém lembrar que, há apenas um mês, ele exibia plena disposição física ao pilotar um jet-ski em Angra dos Reis, com Silas Malafaia na garupa. E, há apenas duas semanas, estava eufórico e cheio de energia na Avenida Paulista, participando de uma manifestação cujo objetivo declarado era evitar sua prisão.

Naturalmente, por uma questão humanitária, não se espera que o STF exija de imediato uma perícia médica independente para averiguar se o ex-presidente está, de fato, obstruindo a Justiça — sobretudo diante do fato de que o oficial de Justiça sequer conseguiu entregar-lhe o acórdão que o tornou réu. Qualquer medida mais incisiva, nesse momento, serviria de combustível para o discurso de perseguição política promovido pelas hordas bolsonaristas, sempre prontas a explorar qualquer gesto institucional como parte de uma suposta narrativa de vitimização.

Ainda assim, seria perfeitamente razoável que o tribunal solicitasse ao hospital um laudo médico atualizado, claro e objetivo, que atestasse o real estado de saúde do paciente. Trata-se de um procedimento rotineiro, legítimo do ponto de vista institucional e absolutamente justificável.

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

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