Como modernizar a legislação trabalhista, por Luís Nassif

É hora dos sábios do Supremo entenderem que a proteção ao trabalho formal é uma das formas de fortalecer a democracia.

Agência Brasil

A Constituição diz que nenhum direito pode sofrer retrocesso. O Supremo Tribunal Federal (STF) há anos tenta reescrever a Constituição, desmontando a legislação trabalhista. Pretende substituir direitos previstos na Constituição por um mero contrato entre as partes. Ainda mais neste momento, em que é o grande garantidor da Constituição, o Supremo poderia privar a opinião pública desse estupro constitucional.

Mas o jogo é mais complexo. Os defensores da flexibilização da legislação trabalhista argumentam que ela se tornou defasada, que se tornou obsoleta frente aos novos tempos.

Nesses tempos de defesa da democracia, vamos a um exemplo de como a ditadura tratou da questão trabalhista.

Havia um dispositivo que conferia estabilidade a todo trabalhador com mais de dez anos no mesmo emprego. Era um convite para ser despedido quando chegava perto dos dez anos. O que o regime militar – repito, o regime militar! – fez, através de seus cérebros econômicos Roberto Campos e Octávio Gouveia de Bulhões?

Em 1966 implementou uma reforma trabalhista. Em troca da estabilidade aos dez anos, os trabalhadores passaram a ter o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), formado por 8% de contribuição patronal, em conta vinculada ao trabalhador. Os recursos permitiram capitalizar o Banco Nacional da Habitação (BNH), para financiamento do saneamento e da construção civil.

Ou seja, trocou-se um direito tido por anacrônico por um novo direito.

O que os democratas de 2025 propõe para substituir o que consideram uma legislação trabalhista anacrônica? Nada. Propõe simplesmente retirar todos os direitos dos trabalhadores e instituir a selvageria. A universalização da pejotização significará a quebra da Previdência Social, perda de arrecadação de Imposto de Renda, fim do auxílio desemprego e do Fundo de Amparo ao Trabalhador, entre outras perdas.

Qual a lição que se tira dessa comparação com o governo Castello? Se se julga que a legislação atual é anacrônica, que a tributação sobre a folha de salários é muito alta, que se comece a pensar em uma reforma abrangente, que substitua direitos tidos por anacrônicos por direitos modernos.

Há alguns princípios básicos em uma reforma trabalhista. Como a folha de salários é parte essencial da arrecadação tributária, não pode ser pensada de modo apartado da reforma fiscal. Uma reforma decente tem que privilegiar os seguintes pontos:

  1. A tributação sobre a folha de salários penaliza as empresas intensivas de mão de obra, em favor daquelas intensivas em capital. Para desafogar a folha, o financiamento da Previdência deveria ser um percentual do faturamento.
  2. Fala-se muito em competitividade da indústria, que seria afetada pelo regime tributário atual. A maneira de equilibrar as contas é tributar mais pesadamente os ganhos de capital e menos a produção.
  3. Por isso mesmo, a tributação de dividendos é uma política positiva, que estimulará o reinvestimento dos lucros na própria companhia.
  4. Independentemente do modelo trabalhista, o papel do sindicato é essencial para um mínimo de equilíbrio nas relações capital-trabalho.

Hoje em dia, o mercado formal de trabalho é uma das âncoras contra a expansão do bolsonarismo. Este se alimenta da precarização do trabalho e da falta de confiança no futuro. É hora dos sábios do Supremo entenderem que a proteção ao trabalho formal é uma das formas de fortalecer a democracia.

Leia também:

7 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Excelente texto mostrando os princípios fundamentais para uma eventual modernização da legislação trabalhista.
    Fica a proposta de uma reforma trabalhista de Lula 4.0.

  2. Creio simples:

    Instituição de alíquota de 10% de contribuição para o INSS sobre o total do contra-cheque, holerite, recibo, o efetivamente creditado, e/ou pix efetivado, sob o CPF do referido e não somente sobre a rubrica “salário” de todos os funcionários públicos (Executivo, Judiciário, Legislativo).

    As respectivas pensões serão concedidas única e exclusivamente à viúva do falecido somente sobre a rubrica “salário” do falecido.

    Alíquota de 9,5% sobre o efetivamente creditado , e/ou pix efetivado, sob o CPF do referido e não somente sobre a rubrica “salário” dos assalariados e prestadores de serviços sob contrato da iniciativa privada.

    Os transitados julgados por desvio de verba pública serão desligados de seus serviços com a perda vitalícia de sua remuneração e sem direito a aposentadoria compulsória recebendo como aposentadoria a somente o constante na rubrica “salário” de sua ultima remuneração quando da condenação, sendo vedado “promoções” desde o inicio do processo à título de serviço prestado nos anos anteriores a sua condenação.

    Retenção de 53,22% de Imposto de Renda sobre a remuneração por palestra ou participação em “Congresso, Seminário”, sobre o recebido, creditado e pix efetivado sob o respectivo CPF.
    Instituição de alíquota de única de 10% de Imposto de Renda sobre o total do contra-cheque, holerite, recibo, o efetivamente creditado, e/ou pix efetivado, sob o CPF do referido e não somente sobre a rubrica “salário”.

    Instituição de alíquota de única de 15% de Imposto de Renda sobre o total do efetivamente creditado, e/ou pix efetivado, sob o CNPJ das empresas prestadoras de serviços à órgãos públicos municipais, estaduais e federais.

  3. Esse é o primeiro espaço em que leio uma crítica respeitosa sobre o que o Judiciário (leia-se STF) está fazendo com os direitos sociais destruindo a CLT. Como bem lembrado estão destruindo o “velho” para construir o “novo”. Se com todo o arcabouço da CLT de proteção aos direitos sociais a mesma já era desrespeitada e rechaçada como instrumento de civilização social, imaginemos um universo gerido pelo, esse sim, anacrônico e estelionatalário princípio “pacta sunt servanda”.

  4. infelizmente só uma constituinte nos salva. após a reeleição de Lula em 2026, que será a última vez que o pt chegará ao poder, seremos tragados por uma ordem conservadora da qual dificilmente saíremos. o poder judiciário é o poder mais corrupto da república e sem justiça é caos. não sáo casos isolados d corrupção no judiciári. vide mais dos estados fededados terem os seus tribunais corrompidos. noves fora os tribunais federais e do trabalho.

    https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2025/13032025-STJ-condena-desembargadores-do-TRT1-por-participacao-em-esquema-de-corrupcao.aspx

  5. Sun Tzu disse: Quando o comandante demonstrar fraqueza, não tiver autoridade, suas ordens não forem claras e seus oficiais e tropas forem indisciplinados, o resultado será o caos e a desorganização absoluta.

  6. A lei garante aos trabalhadores proteção contra a automação, mas não há garantia contra a pejotização, o que torna inócua a proteção contra a automação. Burrice ao extremo

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador