Carmem Lúcia rejeitou Habeas Corpus em favor de Lula, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Carmem Lúcia rejeitou Habeas Corpus em favor de Lula

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Aqui mesmo no GGN noticiei a interposição de um Habeas Corpus em favor de Lula. Ontem fui intimado de que ele foi rejeitado sumariamente pela Ministra Carmem Lúcia. Segundo ela o STF não teria competência para conceder HC contra ato praticado por juiz de primeira instância. Já impetrei o recurso cabível contra a decisão. Abaixo reproduzo na íntegra os argumentos utilizados no Agravo Regimental: 

“O HC impetrado pelo agravante foi rejeitado liminarmente através de decisão monocrática proferida pela Presidente do STF. Portanto, é indiscutível o cabimento do presente recurso. A decisão agravada foi publicada em 18/04/2018 e tem o seguinte conteúdo:

“HABEAS CORPUS 155.531 (274) ORIGEM : 155531 – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PROCED. : PARANÁ REGISTRADO :MINISTRO PRESIDENTE PACTE.(S) : LUIZ INÁCIO DA SILVA IMPTE.(S) : FABIO DE OLIVEIRA RIBEIRO (107642/SP) COATOR(A/S)(ES) : JUIZ FEDERAL DA 13° VARA FEDERAL DE CURITIBA DECISÃO HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. AUTORIDADE COATORA CUJOS ATOS NÃO SE SUBMETEM DIRETAMENTE À COMPETÊNCIA DESTE SUPREMO TRIBUNAL. HABEAS CORPUS AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. COMPETÊNCIA DECLINADA. REMESSA DOS AUTOS. Relatório 1. Habeas corpus, com requerimento de medida liminar, impetrado por Fábio de Oliveira Ribeiro, advogado, em benefício de Luiz Inácio Lula da Silva, indicando-se como autoridade coatora o Juízo da Décima Terceira Vara Federal de Curitiba/PR. Examinada a matéria posta à apreciação, DECIDO. 2. A espécie não comporta ato processual válido a ser adotado neste momento pelo Supremo Tribunal Federal. 3. A competência do Supremo Tribunal Federal para julgar habeas corpus é determinada constitucionalmente em razão do paciente ou da autoridade indigitada coatora (al. i do inc. I do art. 102 da Constituição da República). No rol constitucionalmente definido não se inclui a atribuição deste Supremo Tribunal para processar e julgar originariamente habeas corpus no qual figure como autoridade coatora juiz federal. A matéria não admite discussão mínima por se cuidar de norma de competência constitucional expressa, a impossibilitar interpretação extensiva. 4. Pelo exposto, nego seguimento ao presente habeas corpus, prejudicado o requerimento de medida liminar neste Supremo Tribunal (inc. XIX do art. 13 c/c § 1º do art. 21 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal), e determino a remessa dos autos ao Tribunal Regional Federal da Quarta Região para as providências jurídicas cabíveis. Publique-se. Brasília, 16 de abril de 2018. Ministra CÁRMEN LÚCIA Presidente”

O fundamento jurídico adotado para a rejeição sumária deste Habeas Corpus, portanto, foi a impossibilidade do remédio heroico contra ato do juiz de primeira instância ser impetrado diretamente no STF. Isso acarretaria supressão de instância. Ainda segundo a decisão agravada, a matéria não comportaria discussão porque a competência atribuída ao STF não pode ser interpretada de maneira extensiva.

Ora Exa., ao interpor o Habeas Corpus o agravante requereu expressamente a aplicação da jurisprudência que ocorreu num caso semelhante. Refiro-me, obviamente ao caso notório do banqueiro Daniel Dantas. Naquela oportunidade, o STF concedeu HC contra ato do juiz de primeira instância para livrar o paciente da prisão sem se preocupar com a impossibilidade de interpretar extensivamente a constituição federal. A supressão de instância, rejeitada neste caso, não foi um obstáculo à concessão do remédio heroico pelo STF.

Aquela decisão proferida em benefício do banqueiro Daniel Dantas foi amplamente debatida pela imprensa especializada (matérias jornalísticas em anexo). Portanto, a Ministra Carmem Lúcia não poderia rejeitar sumariamente o presente Habeas Corpus como se aquele precedente STF não existisse ou não admitisse a interpretação extensiva da constituição federal.

Ao condenar Lula, a autoridade coatora deu valor inquestionável de prova à acusação jornalística sacada contra ela pelo jornal O Globo. Portanto, nada impede que o STF reconheça o precedente jurídico da supressão de instância no caso Daniel Dantas, aplicando-o ao presente HC, em razão dele ter sido reconhecido e criticado pela imprensa especializada.

A constituição federal é uma só, mas ela não foi interpretada por Carmem Lúcia da mesma forma que o STF a interpretou no caso de Daniel Dantas. O tratamento distinto dado aos dois casos sugere que, na melhor das hipóteses, o banqueiro ligado ao PSDB não deveria ser rebaixado pelo STF à condição de cidadão comum para quem a supressão de instância é proibida. Na pior das hipóteses, Carmem Lúcia indeferiu o presente HC como se o rigor jurídico se aplicasse apenas a Lula, não tendo ele direito ao mesmo tratamento excepcional concedido a Daniel Dantas.

O que distingue as sociedades modernas daquelas que existiam antes da Revolução Francesa é o respeito ao princípio da igualdade. Antes de se impor como Lei, entretanto, a igualdade entre os seres humanos se tornou um fundamento moral basilar das novas sociedades que estavam em construção.

“Una metafísica de las costumbres es, pues, indispensable, necesaria, y lo es, no sólo por razones de orden especulativo para descubrir el origen de los principios prácticos que están a priori en nuestra razón, sino porque las costumbres mismas están expuestas a toda suerte de corrupciones, mientras falte ese hilo conductor y norma suprema de su exacto enjuiciamento. Porque lo que debe ser moralmente bueno no basta que sea conforme a la ley moral, sino que tiene que suceder por la ley moral; de lo contrario, esa conformidad será muy contigente e incierta, porque el fundamento inmoral producirá a veces acciones conformes a la ley, aun cuando más a menudo las produzca contraria.”(Colección Clásicos Inolvidables, Kant II, Librería El Ateneo Editorial, Buenos Aires, 1951 – Fundamentación de la metafísica de las costumbres, Prólogo, p. 477)

A proibição de aprovação de Leis que façam distinção entre as pessoas em razão de cor, raça, credo, situação econômica, partido político ou ideologia e a proibição de Tribunais de exceção (ou seja, de Tribunais que julguem alguns casos e não outros ou que apliquem a alguns casos uma interpretação da Lei e em outros interpretações distintas da mesma Lei) são princípios que se ajustam perfeitamente à metafísica dos costumes de Kant. Essas garantias ecoam na obra de John Rawls, cujo primeiro princípio de justiça foi assim formulado:

“Cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema total de liberdades básicas iguais que seja compatível com um sistema de liberdade para todos.” (citado por Miguel Gualano de Godoy in Constitucionalismo e Democracia, editora Saraiva, São Paulo 2012, p. 82)

O paciente deste Habeas Corpus não foi tratado pela Ministra Carmem Lúcia da mesma maneira que o STF tratou o banqueiro Daniel Dantas. Portanto, a decisão agravada viola frontalmente um princípio basilar republicado que não pode sequer ser objeto de discussão parlamentar (refiro-me obviamente ao art. 5º, caput, da constituição federal). No caso de Lula a competência constitucional do STF foi considerada limitada, no caso do banqueiro ela foi ampliada para permitir a concessão de HC contra o ato praticado por juiz de primeira instância.

Evidente, a não utilização do precedente de Daniel Dantas no caso de Lula expõe a natureza doentia, nauseabunda e imperfeita da sociedade construída no Brasil. Nós adotamos formalmente os padrões civilizatórios modernos (o princípio da igualdade é expresso no art. 5º, caput, da CF/88 e reverbera em vários incisos do mesmo), mas nossas instituições preservaram intactas as distinções de tratamento que existiam no Ancien Régime. Esse fenômeno é descrito por alguns juristas brasileiros como Estado de exceção, regime de exceção, Estado Pós-Democrático ou neofascismo. Todavia, nenhuma dessas explicações encontra substrato na realidade brasileira. Ao negar o presente HC a Ministra Carmem Lúcia apenas e tão somente agiu como se Lula fosse um cidadão comum sem direito à interpretação excepcional dada no caso do aristocrata das finanças.

Face ao exposto, em homenagem ao precedente do próprio STF que admitiu a possibilidade de concessão de HC contra decisão de juiz de primeira instância (caso Daniel Dantas) requer o processamento e o PROVIMENTO do presente recurso, revogando-se a decisão agravada para que o remédio heroico seja conhecido e provido após a concessão ou não da liminar que foi requerida, tudo como medida de indispensável Justiça!”

Três documentos incontestáveis à luz da teoria jurídica da prova empregada por Sérgio Moro acompanharam o recurso.

https://www.conjur.com.br/2008-jul-15/soltura_dantas_tipico_supressao_instancia

http://g1.globo.com/Noticias/Politica/0,,MUL852653-5601,00-STF+CONFIRMA+LIBERDADE+AO+BANQUEIRO+DANIEL+DANTAS.html

https://www.conjur.com.br/2008-jul-11/procuradores_lamentam_decisao_soltou_daniel_dantas

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

14 Comentários

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  1. Nos sombrios anos de 1789….

    Voltamos aos tempos em que Laynay, governador da bastilha, ainda tinha sua cabeça na ponta do pescoço e não na ponta de uma lança. Guardava, altivo, nos sombrios porões da bastilha inocentes condenados ao esquecimento. 

    Me desculpe, Fábio, mas não estamos mais na era dos argumentos…

    A nova era pertence aos Barrosos e Carmem Lúcias, Launay e et caterva. 

    Já ouviu falar em ditadura?

     

    1. Sim. Já ouvi falar de

      Sim. Já ouvi falar de ditadura. Nasci em 1964 filho de um defensor do presidente João Goulart. Estou convencido de que a única coisa decente a fazer numa ditadura e expor os métodos ridículos empregados pelos seus líderes medíocres.

       

      1. Eu respeito a sua opinião mas

        Eu respeito a sua opinião mas o que você realmente deveria fazer em uma ditadura é derrubar a mesma prendendo ou liquidando o ditador e todos os cúmplices dele. Mas considerando como a população brasileira é mansa e covarde, a menos que você goste de viver em uma ditadura (o que não parece ser o seu caso) eu recomendaria ir embora para um país aonde a população tenha um pouco mais de balls e aonde levem a sério a idéia de sistema judicial.

        (eu sempre recomendei que vocês deveriam restaurar a democracia brasileira com o uso de força armada, dado ser óbvio que o sistema judicial brasileiro só serve para proteger os golpistas. Mas eu agora estou admitindo que vocês não vão conseguir fazer nada sem o apoio maciço da população e essa população é covarde e mansa demais para se revoltar, então a alternativa é ir embora e deixar os macaquitos se matarem entre si)

         

          1. Não é minha briga, caso

            Não é minha briga, caso contrário eu já teria contratado algumas dezenas de mercenários e agora eu estaria sentado na cadeira presidencial como dono do Brasil. Mas não adianta trocar um invasor por outro invasor certo?

            E eu “fico enchendo o saco” porque eu vejo potencial no Brasil. Vocês têm potencial para muito mais porém isso depende de vocês deixarem de agir como escravos e passarem a agir como nação, então eu estou tentando passar algumas dicas de como se tornar nação.

          2. Você vê potencial na

            Você vê potencial na destruição do Brasil, mas tem medo de ser destruído se fizer alguma merda. Entendo…

      2. Você está certo!

        foi só um desabafo. Resta mesmo a resistência. 

        Nasci em 1960 e meu pai que era do antigo partidão passou bons bocados correndo dos  IPM’s.

        abraço! 

  2. Vamos “supor” que haja formação de quadrilha na Justiça

    Vamos supor (só supor, hein!) que um grupelho (incompetente mas bem adestrado) formado por alguns delegados de polícia, alguns procuradores e alguns juizes/desembargadores (STF?) aparelhados por um p(l)utocracia qualquer nacional e estrangeira se juntem para:

    1) Conspirar contra inimigos ou “atrapalhadores” de seu grupo (rede que se estende acima e além deles), usando o sistema de Justiça para condená-los a qualquer custo, dizimando-os com o apoio de suas extensões acima e além (mídia, bancos, órgãos estrangeiros, etc.).

    2) Conspirar contra a economia de seu país, dizimando principalmente a parte mais competitiva, desenvolvida e crescente, permitindo inclusive lucrativos negócios na participação de despojos.

    3) Combater a “corrupção” fazendo milionária corrupção, abocanhando parcelas dos bilhões descontrolados em contas secretas, movimentações confusas ou manipuladas, caixas 2, 3, 4, n, acordos de delação via milionárias “advogagens parças”, numa festa discretíssima (sem guardanapos…), “meritocrando” milionaríssimas aposentadorias em Maiâmi.

    Como hoje o país só tem um ou dois juízes heróis e uma “tasca a força” (ou taca forca?) idem, que vai de delegas a desembargas (supremas?), apoiados pela mírdia de uma nota só, me pergunto:

    Quem neste país será(ão) o(s) “herói(s)” mocinho(s) que vai(ão) pegar os (supostos) heróis bandidos?

    O povo, não creio.

    A História, sem dúvida!

    Mas aí já é tarde pra nós…

     

     

     

    1. Quem faz suposições em se

      Quem faz suposições em se tratando de Direito Penal são Deltan Dallagnol e Sérgio Moro.  Eu não suponho nada, meu caro.

      Meu HC em favor de Lula é fundamentado na prova fotográfica da parcialidade de Sérgio Moro e na prova jornalística da “interpretação cordial” da competência constitucional do STF no caso do banqueiro Daniel Dantas.

      Apresentei provas das alegações que deduzi no STF. Suas suposições devem ser discutidas com os inimigos de Lula.

      1. Vc está tão defensivo que não enxerga nem quem está do seu lado

        Acalme-se “meu caro”. A “suposição” (um importante elemento para o Conhecimento, Ciência e Desenvolvimento Humano) é apenas um reforço na mesma direção do seu esforço judicial, já que questiona (ironicamente?) possibilidades gravíssimas na operação do sistema de Justiça (sem controle!) por pessoas como as que vc mencionou.

        Já imaginou se a tradução” de “task-force” for formação de quadrilha, em vez de “força-tarefa”?

        Nem precisa se desculpar. Se não ficou claro, sugiro que leia de novo e repita até entender. 

        “Suponho” que isto irá acontecer.

  3. Parabéns pela demonstração de

    Parabéns pela demonstração de resistencia.

    Mesmos sabendo de antemão da negação de tais pedidos, como dizia o saudoso jornalista do DMC, é muito importante para se expor a hipocrisia e o cinismo do novo poder discricionário do Brasil. A analogia com os HCs de Daniel Dantas foi muito bom.

    Já compartilhei, destacando a parte em que essa comparação aparece.

    1. Só para lembrar: quando a

      Só para lembrar: quando a questão debatida é “competência do STF” para julgar HC impetrado contra ato de juiz da primeira instância pouco importa se a prisão foi temporária ou não. Se você não entende de Direito, consulte um profissional da área antes de criticar outro.

  4. Recurso no Habeas Corpus

    Recurso no Habeas Corpus impetrado em favor de Lula será submetido a julgamento virtual no pleno do STF.

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