Construtora desmata território indígena do Jaraguá em ação ilegal

Ana Gabriela Sales
Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.
[email protected]

Sem estabelecer diálogo com aldeias da região, construtora Tenda derruba mais de duas mil árvores remanescentes da Mata Atlântica para construção de condomínio de alto padrão. Indígenas decidiram ocupar a área desmatada nesta quinta-feira

Construtora Tenda derruba milhares de árvores para construção de condomínio residencial de alto padrão, em São Paulo.

Jornal GGN – O povo Guarani da Terra Indígena (TI) Jaraguá, localizada no noroeste da cidade de São Paulo, amanheceu na terça-feira, 28 de janeiro, ao som de motosserras utilizadas por funcionários da empresa Mais Verde Ambiental, a serviço da Construtora Tenda. A ação, sem consulta à comunidade tradicional, é ilegal.

O terreno da empreendedora imobiliária fica ao lado da Aldeia Ytu, em frente à Aldeia Pyau e no entorno da Aldeia Yvy Porã. Na área, remanescente da Mata Atlântica, a Tenda pretende construir um condomínio residencial de alto padrão, com cerca de cinco torres de moradia para aproximadamente 800 pessoas. 

Mais de duas mil árvores, remanescentes da Mata Atlântica, são derrubadas no território indígena do Jaraguá.

No final de 2019, funcionários da Tenda estiveram com a comunidade indígena e somente na semana passada comunicaram sobre o corte de quatro mil árvores no dia 8 de fevereiro, sob a justificativa que essas eram “árvores isoladas”.  Mas, em uma ação premeditada, o empreendimento Mais Verde Ambiental, a serviço da construtora, antecipou o desmatamento da área e derrubou mais de duas mil árvores desde terça-feira, 28 de janeiro.

“As árvores, que já foram mais da metade derrubadas, são remanescentes de Mata Atlântica e o empreendimento justificou sendo árvores isoladas, como se fossem apenas eucaliptos. E não é o caso. É uma área repleta de árvores nativas e animais”, explica a ativista indigenista Ana Flavia Carvalho, em entrevista ao GGN

Segundo a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), nenhuma obra a menos de 10 quilômetros de distância de uma comunidade indígena pode ser iniciada sem a consulta prévia do povo originário. De acordo com a Constituição Federal, uma vez que o Brasil é signatário desta Lei, qualquer ação contrária é ilegal.  

Em duas reuniões, os empregados da construtora chegaram sondar a opinião dos moradores das aldeias. Mas a alegação que as “árvores eram isoladas e não havia presença de animais” não foram aceitas pela comunidade que conhece a floresta. Assim, o diálogo não avançou. 

“Foi constatado que dentro dessa devastação realizada pela construtora, tinha cedro [árvore], tinham árvores centenárias da mata e junto elas foram derrubadas colmeias de abelhas Uruçu-Amarela, uma espécie já em extinção, parte do modo de vida do povo Guarani e que são tratadas como animais sagrados. Tanto as abelhas, como as cobras e outros animais que pertencem a mata, como os animais silvestres, perderam suas moradas e, em um outro contexto, foram assassinados”, explica Carvalho. 

Há cerca de duas semanas, a possível ação da construtora – que se concretizou com o início da derrubada das árvores – foi levada ao Ministério Público Federal (MPF), que até agora não se manifestou. “Foi feita a denúncia e também um comunicado à Funai [Fundação Nacional do Índio]”, conta a ativista. 

Povo Guarani das Terras Indígenas (TI) do Jaraguá ocupa terreno das obras desde essa quinta-feira, 30 de janeiro.

Diante da derrubada das árvores remanescentes da Mata Atlântica e sem consulta dos moradores da terra indígena, a comunidade passou ocupar o terreno da obra nesta quinta-feira, 30 de janeiro, além de dar início uma cerimônia fúnebre, sem previsão de término. 

Com a manifestação, que travou o trabalho dos funcionários da Mais Verde, foram enviados ao local seguranças, um deles armado, de acordo os presentes no local. “Era visível o porte de arma, porque estava debaixo da camiseta dele [um dos seguranças]. Em momento algum ele sacou a arma. Inclusive, uma vez que a Funai foi acionada, ela encaminhou um grupo da polícia ambiental à área para haver uma conversa. Nesse momento, o segurança guardou a arma e não deixou aparente enquanto a polícia estava no local. Ele não ameaçou a comunidade com a arma, mas só o fato de deixar a arma aparente já é um tipo de intimidação”, pontua Carvalho. 

Abalada, a comunidade indígena da TI Jaraguá aguarda a manifestação dos órgãos federais acionados e um posicionamento da própria Tenda que não se pronunciou após a ocupação.  

Líder indígena, David Karai Popygua, explica situação da comunidade à Polícia Municipal Ambiental (GCM).

“Estamos em uma fase de políticas anti-indigenistas praticadas tanto em São Paulo quanto no Brasil como um todo. Precisamos dessa visibilidade para que isso seja repercutido em outras ocasiões, onde outras empresas não pensem que podem simplesmente ignorar a existência dos povos originários das terras de São Paulo e construírem seus empreendimentos”, conclui Carvalho.

Comunidade indígena em cerimônia fúnebre na área massacrada.

Em vídeo, as lideranças indígenas também reivindicam seus direitos sobre construção do condomínio residencial da Tenda.

Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

5 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Onde está Marina Silva? Onde estão as ONG’s famosas internacionais e nacionais exigindo que sejam devolvidos os territórios indígenas em terras paulistas a partir de toda Serra do Japi? Onde está Sakamoto? É exatamente como TRABALHO ESCRAVO. Quando perceberam que era CRIME praticado no berço da Moderna Esquerda Brasileira, nascedouro das Forças Progressistas, em plena Capital Paulista e Paulistana, então a pressão e os noticiários sumiram. TERRA DA BIPOLARIDADE E HIPOCRISIA. Os Guaranis do entorno do Pico do Jaraguá continuam confinados em 1 hectare ou seja área comparável a um campo de futebol. O restante da Serra e todo esplendor da Mata Atlântica e seus entornos, desde Santana do Parnaíba, Pirapora, Cajamar, Polvilho, São Paulo, Jundiaí, desde a Redemocracia, em especial com a chegada de Governos Progressistas Petistas e Tucanos, estão virando Condomínios Fechados e Segregacionistas. Que Coisa !!! Os Guaranis continuam lá, abandonados. A Verdade é Libertadora. Pobre país rico. Mas de muito fácil explicação.

  2. Quem diabos vendeu as terras dos guaranis para a construtora tenda? PQP!!!
    O fato curioso é que a construtora tenda é notória pela construção de imóveis populares em muitas regiões da cidade de SP e outros estados.
    Se pretende construir imóveis de alto padrão para 800 pessoas em local já com ampla ocupação, como está agora a região do Jaraguá, significa dizer que o preço pago pelo terreno ou foi irrisório ou foi nenhum (oportunismo, grilagem, invasão?)
    Alguém me explique!

  3. Agora pergunto, como essa construtora obteve autorização para desmatar 4 mil árvores em plena cidade de São Paulo? Quem aprovou esse crime abiental?

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador