América Latina avança no diálogo na Venezuela e EUA tentam se apropriar

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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EUA deram vitória à oposição. Agora recua e diz que é responsável pelo diálogo do Brasil, Colômbia e México na Venezuela. Mas Petro exclui EUA.

Países da América Latina se reúnem para negociar diálogo na Venezuela, e EUA se aproveitam – Fotos: Divulgação/Reprodução – Montagem: GGN

O Brasil avança na mediação da América Latina junto ao conflito político na Venezuela, dando voz a outras representações políticas, enquanto os Estados Unidos recuam e agora atuam para se apropriar de possível sucesso neste diálogo, após o reconhecimento de vitória ao opositor ser mal visto pelas países da região.

Os primeiros dias após o anúncio da Comissão Eleitoral da Venezuala de que Nicolás Maduro foi reeleito deram ao Brasil um peso de protagonismo sobre como as lideranças locais iriam se posicionar e, mesmo entre governos de esquerda, cobrar do país a transparência das eleições.

Mas a importância do presidente Lula na mediação superou as proporções esperadas, diante do risco de interpretação de interferência política. Desde então, o presidente brasileiro assumiu o tom de esperar as atas de registros eleitorais do país para parabenizar Maduro, sem deixar de elogiar o dia de votações e com a cautela de não incitar qualquer questionamento da legalidade do processo, menos de reconhecer a vitória da oposição.

Este último feito foi, contudo, o adotado por outros países da América Latina, iniciando-se pela Argentina de Javier Milei e pelos Estados Unidos, assim como Peru, Uruguai, Equador, Costa Rica e Panamá.

No quinto dia após o anúncio de reeleição de Maduro pelo órgão eleitoral do país, o chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken, emitiu comunicado afirmando que há “evidências esmagadoras” de que Edmundo González “recebeu a maioria dos votos na eleição presidencial da Venezuela em 28 de julho”.

O comunicado dos EUA foi seguido por pronunciamentos dos países da região alinhados politicamente com a oposição da Venezuela. “Todos podemos confirmar, sem lugar para nenhuma dúvida, que o legítimo ganhador e presidente eleito é Edmundo González”, havia escrito a chanceler argentina, Diana Mondino.

Diante das falas, países liderados por governos de esquerda – Brasil, Colômbia e México – decidiram se unir, em nota conjunta, na última quinta (01), e também firmar a posição pedindo transparência, mas sobretudo diálogo da oposição e situação na Venezuela para um desfecho eleitoral.

A iniciativa dos países foi amplamente elogiada por outras lideranças mundiais, como o presidente da França, Emmanuel Macron, que telefonou ao presidente Lula nesta segunda-feira (05).

Risco de autoproclamação da oposição

“O presidente Lula reiterou seu compromisso com a busca de uma solução pacífica entre as partes e que respeite a soberania do povo venezuelano”, informou o Planalto, em nota. Na conversa, os presidentes coincidiram que era necessário impedir um cenário similar ao de 2019, com a autoproclamação do opositor Juan Guaidó, que se declarou interino, sem legitimidade, e mantendo dois presidentes no país em completa instabilidade política.

Nessa mesma linha caminha o atual opositor Edmundo González, que chegou a emitir uma nota, nesta segunda, pedindo aos países estrangeiros apoio para que ele se autoproclame vencedor das eleições, assinando uma declaração de “presidente eleito da Venezuela”.

Diante deste arriscado passo da oposição, mas ainda em meio à demora do governo da Venezuela em divulgar as atas eleitorais para confirmar a reeleição de Nicolás Maduro, Lula decidiu atuar conjuntamente, novamente ao lado da Colômbia e do México.

Lula quer sair do protagonismo

O presidente brasileiro já informou que não quer falar sozinho, o que atiçaria um protagonismo único e de com grande responsabilidade e consequências em relações diplomáticas e internacionais.

Até mesmo em reuniões diretas com Nicolás Maduro, o líder brasileiro pediu que sejam conjuntas, com Gustavo Petro, da Colômbia, e López Obrador, do México. O mesmo deve ocorrer no envio de representações diplomáticas: os três países devem enviar juntos os seus chanceleres.

Nesta terça (06), Petro assumiu a liderança do grupo e amenizou o peso da responsabilidade do diálogo para Lula, ao emitir um comunicado nas redes sociais sobre a sua posição.

“Como povos vizinhos e irmãos, nós, a Colômbia e a Venezuela, estamos em uma situação extremamente vulnerável e a primeira coisa que devemos defender é o povo e a paz. (…) O caminho é buscar a verdade e, em cima dela, alcançar soluções a favor da democracia”, escreveu o presidente da Colômbia.

EUA voltam atrás e se apropriam de gesto latino

E o mais recente gesto dos EUA, com o avanço positivo das representações latino-americanas de esquerda no continente, foi de recuar de que teria reconhecido González como vitorioso das eleições na Venezuela e afirmar que está em contato com o Brasil, México e Colômbia para que a Venezuela caminha a um diálogo.

O Departamento de Estado dos Estados Unidos afirmou, nesta segunda, que o governo de Joe Biden não tinha reconhecido Edmundo González como presidente do país: “[Reconhecer o opositor como presidente da Venezuela] não é um passo que estamos dando hoje. O que estamos fazendo hoje, é que estamos em contato próximo com nossos parceiros na região – especialmente com o Brasil, México e Colômbia – sobre um caminho a seguir”, disse o porta-voz do governo dos EUA, Matthew Miller.

Em sua fala, Petro, contudo, parece ter contrariado essa tentativa de os EUA se aproximar do grupo latino-americano sobre uma atuação na Venezuela: “Embora a posição dos EUA ainda não seja clara, a oposição e Maduro devem chegar a um acordo político porque, caso contrário, o êxodo e a guerra irromperão por toda a América”, afirmou.

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