Dallagnol foi lavajatizado pelo TSE, por Rogerio Dultra dos Santos

Nesta última segunda-feira, dia 16 de abril de 2023, Dallagnol sentiu o gosto do seu próprio veneno. Foi lavajatizado.

Foto Lula Marques/ Agência Brasil.

Dallagnol foi lavajatizado pelo TSE

por Rogerio Dultra dos Santos

Deltan Dallagnol é um indivíduo destituído de superego. Acha que pode tudo. E, durante um tempo, agiu como se pudesse. Violou todas as regras do direito com o objetivo de perseguir seus opositores políticos. Tinha pretensão de enriquecer e ficar famoso no processo. Queria também, quem sabe, se tornar presidente ou Senador da República. E mesmo depois dos escândalos da vaza-jato e da Operação Spoofing, foi eleito Deputado Federal com mais de 300.000 votos.

Dallagnol, sabemos, tem uma ficha corrida e tanto. Conversas vazadas com o seu comparça da Justiça, o então juiz Sérgio Moro, dão conta de que queriam grampear Ministros do STJ. Desejava também fazer um fundo controlado por ele com milhões de reais “recuperados” pelos processos ilegais da Lava-Jato para “combater a corrupção”, eleger a si e a correligionários e, quem sabe, ganhar uns trocados. Exatamente como fez ao comprar apartamentos destinados a pessoas carentes do programa “Minha casa, minha vida”.

Ainda mais. Durante boa parte do tempo da famigerada “Operação”, Dallagnol se orientou com agentes do Departamento de Justiça dos EUA, numa violação explícita da soberania nacional. Possível crime de alta traição.

Pois bem. Nesta última segunda-feira, dia 16 de abril de 2023, Dallagnol sentiu o gosto do seu próprio veneno. Foi lavajatizado.

Em decisão unânime e rapidíssima, o TSE cassou seu mandato de Deputado Federal. Utilizou-se como fundamento “argumentativo” o instituto de Direito Privado chamado “fraude à lei”, geralmente aplicado àqueles que lesam credores.

O que o instituto “fraude à lei” tem que ver com a Lei da Ficha Limpa? Rigorosamente nada. O TSE trouxe retoricamente para a aplicação de uma Lei de Direito Público um instituto de Direito Privado com o fito de bloquear no gogó a “malandragem” feita por Dallagnol.

O texto da Lei da Ficha Limpa é claro: tem que ter PAD aberto para que a exoneração seja ilegal. Na alínea q do inciso 1 do Art, 1º da Lei, alínea de autoria do então Deputado Flávio Dino, são inelegíveis para qualquer cargo os membros do Judiciário e do MP “que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar”.

Sabe-se que existiam várias investigações em aberto no CNJ contra Deltan. Nenhuma, entretanto, tinha virado Processo Admnistrativo Disciplinar no momento da exoneração.

Deltan então “driblou” a provável abertura de vários PAD’s com seu pedido de exoneração, antecipando-se, com a óbvia intenção de poder se eleger Deputado Federal, escapando das eventuais punições que deveriam atingí-lo.

Sabemos que isso é condenável eticamente. É fraudulento, inclusive. Aliàs, Dallagnol é um poço de reprovabilidade ética e moral.

Mas, nesse caso específico, ele não poderia ter o seu mandato cassado com base no tal instituto, simplesmente porque esta hipótese não está prevista na Lei da Ficha Limpa e nem pode ser utilizada por “analogia” ou interpretação extensiva. A hipótese da alínea q é claramente restritiva. Tem que existir um PAD aberto para configuração da ilegalidade. Sem PAD, sem ilegalidade. É simples assim.

“Driblar” uma futura, possível ou mesmo provável abertura de PAD com exoneração é o que aconteceu, mas não é ilegal. Assim como “Pedalada fiscal” também não é crime de responsabilidade. Utilizar “fraude à lei” como fundamento da cassação de mandato é uma aberração só possivel na cultura judicial do lavajatismo.

Agora, por que é importante tomar esta postura antipática de defender a aplicação correta da lei no caso dessa desprezível figura da história recente do país que é o Deltan Dallagnol?

Não podemos negar que possa existir uma satisfação quase libidinal em ver este substrato de desgraça ser varrido da vida pública com violência. Violência equivalente a que ele usou contra centenas de pessoas através de sua atuação criminosa enquanto Procurador do Ministério Público Federal.

Isto não quer dizer, entretanto, que devamos contemporizar a continuidade do espírito lavajatista no Judiciário Brasileiro.

Pois é. A Operação Lava-Jato acabou. Mas o espírito de perseguição para além dos limites legais ainda não foi desmontado e, ao que parece, continua bem ativo.

E esse espítito lavajatista, que hoje recai sobre essa figura minúscula que é Deltan Dallagnol, amanhã fatalmente se voltará contra a esquerda e os setores progressistas da sociedade.

Não devemos, portanto, aplaudir essa cassação. Devemos reprovar o lavajatismo e combatê-lo, onde quer que se manifeste. Em nome do Estado Democrático e Social de Direito. Em nome da Constituição. Em nome da Democracia.

Rogerio Dultra dos Santos – Professor de História Constitucional Brasileira do Departamento de Direito Público da Universidade Federal Fluminense.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. A publicação do artigo dependerá de aprovação da redação GGN.

Redação

4 Comentários

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  1. A Lei 8.112/90 estatuto do servidor público, trata do procecimendo administrativo disciplinar-PAD, que é precedido de uma sindicância.

    Art. 145. Da sindicância poderá resultar:

    I – arquivamento do processo;

    II – aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias;

    III – instauração de processo disciplinar.

    Parágrafo único. O prazo para conclusão da sindicância não excederá 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogado por igual período, a critério da autoridade superior.

    Art. 146. Sempre que o ilícito praticado pelo servidor ensejar a imposição de penalidade de suspensão por mais de 30 (trinta) dias, de demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, ou destituição de cargo em comissão, será obrigatória a instauração de processo disciplinar.

    Muito me admirou a facilidade com que o Deltan conseguiu afastar-se do serviço público, já que respondia a uma porção de sindicâncias. Estranho ainda o setor de legislação local, apoio ao Recursos Humanos, permitir seu desligamento com essas pendências.
    Existe proibição expressa quando o servidor responde a PAD. No caso, o Deltan respondia apenas a Sindicâncias, medidas preliminares ao Procedimento Administrativo Disciplinar, entretanto, a menos que fossem arquivadas ele não poderia ter se exonerado.

    Art. 172. O servidor que responder a processo disciplinar só poderá ser exonerado a pedido, ou aposentado voluntariamente, após a conclusão do processo e o cumprimento da penalidade, acaso aplicada.
    Assisti com atenção à leitura do voto do Relator, ministro Benedito, e a manipulação criminosa que o Deltan fez dos preceitos legais não deixam dúvidas quanto a fraude. Seu aproveitamento de hiatos temporais para registrar sua candidatura, como se não houvesse amanhã, não foram capazes de toldar a capacidade de observação de seus julgadores. Não foi a lei da ficha limpa, foi o estatuto do servidor o gancho do Deltan.O mais, foi consequência.

  2. ão se deve abstrair o direito da política, especialmente quando a questão é concreta.
    O acadêmico fez isso e acabou prestando serviço a parte adversa.
    À guisa de argumento de uma tese, desprestigiou, ofensivamente, o TSE, ao comparar o seu método e sentença ao da lava jato.
    Afirmar que “Dallagnol sentiu o gosto do seu próprio veneno. Foi lavajatizado.”, equivale a dizer que o TSE usou de veneno, que agiu ao arrepio da lei e do devido processo legal, como agiram ele e Moro.
    Além da tese do professor ser controversa; é preciso ter lado sempre quando a questão é real e o contexto é político, não é como estar numa cátedra academicista.
    A defesa do prócere da lava jato cabe aos seus advogados e o texto do professor, sendo ele de esquerda, poderá ser usado.
    Por fim, o cassado Dallagnol tem superego, ele não é um psicopata; o superego dele é formado por conceitos, valores, regras, sanções, normas e padrões fascistas.
    Foram graves equívocos do professor, faltou senso político, com todas as vênias.

    1. Exatamente. O senhor Rogerio Dultra dos Santos quer ser mais culto e inteligente que todos os ministros. Sendo de esquerda, essa suposta sabedoria acadêmica, não passa de mera vaidade de querer ter inteligência superior aos ministros e principalmente ao emérito relator Benedito Gonçalves, que muito bem embasou sua tese.

  3. Ou seja: com todas essas ilegalidades e fraudes ele jamais foi ficha limpa quando se candidatou a deputado. Agiu de maneira espúria e fraudou o devido processo legal. Brilhante análise!!!

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