À procura de Airton Barbosa…

Escrevo estas linhas com a certeza de que não vou saber reverenciar devidamente a grande história de Airton Barbosa, mas, ainda assim, ouso, porque me incomoda a procura.

Comecei pensando que o Brasil é mesmo um país muito rico, culturalmente falando. Tão rico que pode se dar ao luxo de dispensar homenagens a um homem genial. Falo de Airton (Lima) Barbosa. Cheguei è esta história através destas cirandas da vida, cujas voltas sempre acabam lá na banda de cima, no caso, em Pernambuco e, muitas vezes, pelas mãos de Carminha e Urian, como é este o caso.

Este estado tem dado ao Brasil talvez a mais rica contribuição na constituição da nossa “brasilidade”. Às vezes acho que é em Pernambuco (com passagem pela Bahia) que está o celeiro da nossa vida cultural mais profunda. Pois bem, será a cidade de Bom Jardim, na região do semi-árido brasileiro, que nos presenteará,  em 1942, com o nascimento deste que é muito mais do que um grande fagotista.

Airton Barbosa se muda para o Rio de Janeiro de Juscelino, em 1960 e terá a oportunidade de aprimorar sua caminhada com Noel Devos,  músico francês, radicado no Brasil e revolucionará a música brasileira, muito além do seu sopro maravilhoso, composições e arranjos.

Airton foi o artífice, em 1962, do Quinteto Villa Lobos, grupo de instrumento de sopros e que se consolida como um dos mais importantes grupos de música de câmara do Brasil e que acaba de completar 50 anos e em plena atividade (atualmente  está envolvido no projeto dedicado à obra de Carlos Althier de Sousa Lemos Escobar, o Guinga).

É grande a lista onde Airton Barbosa está  presente e não é apenas nas atuações do quinteto.  Ele dá as notas na produção de trilhas sonoras para filmes nacionais, como em  “Morte e Vida Severina” de Zelito Viana, sobre o poema de João Cabral de Melo Neto. Com Mário de Aratanha, funda, em 1977, a gravadora Kuarup Discos a qual, lamentavelmente, encerra suas atividades em 2009, depois de prestar 32 anos de serviços ao melhor a música brasileira. Este homem de luta enxerga muito além e participa, ativamente, da fundação da Cooperativa dos Músicos do Estado do Rio de Janeiro (COOMUSA).

Airton foi, sem dúvida, um homem singular, mas existe um silêncio, uma coisa que incomoda acerca da sua morte. Ao tentar saber mais da sua trajetória política e das causas da sua morte, este silêncio é ensurdecedor. Sobre este assunto são raras as menções. E exatamente isto, menções, raras e…  vagas.

Fiquei muito intrigada por esta alusão de Noel Devos, dizendo que Airton “às vezes chegava atrasado aos ensaios da orquestra do teatro municipal do Rio de Janeiro onde havia sido aprovado em concurso, tirava o sapato durante o ensaio ou ficava lendo jornais socialistas na contagem dos compassos.”

Ora, Airton morreu em 1980, portanto, já na época do governo Figueiredo, época da anistia concebida por manu militari e que, ainda assim, sofria a radicalização de setores inconformados com o processo de redemocratização e que se revelou, por exemplo, no ato terrorista praticado por militares contra o Rio-centro, em 1981, quando se celebrava um show comemorativo ao Dia do Trabalhador. Teria, a morte de Airton, alguma relação com estes momentos vividos no Brasil?

 

Assim como Devos fala da frustração de ver o quanto o país perdeu pelo muito que Airton poderia ter feito, da falta que faz como instrumentista, o qual, diz ele “até hoje estou procurando”, podemos dizer que nós também estamos procurando registros que nos indiquem as razões que calaram, definitivamente, este artista maior. Alguém sabe?


É dele este fagote:


 

Luis Nassif

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