A consequência da Lava-Jato no descrédito da democracia burguesa brasileira.

Quando se cria um processo produtivo gera-se um produto principal que é o objetivo da criação de toda uma estrutura fabril. Paralelamente a este se pode obter produtos secundários na concepção inicial do empreendimento. Por diversas razões o subproduto passa algumas vezes a ser mais relevante que o objeto principal da produção

Na Lava-Jato o produto principal deveria ser não o combate à corrupção, mas sim a geração do descrédito tanto dos partidos reformistas com nuances de esquerda, como de toda a estrutura partidária. O Partido dos Trabalhadores é uma primeira vítima do esquema, porém enganam-se muitos que pensam que foi casual a desmoralização do PMDB e PSDB. O discurso contra o Partido dos Trabalhadores começa antes dos “escândalos” do mensalão e da Lava-Jato, mostrando que a dinâmica do processo é bem mais ampla do que pensam a imensa maioria dos simpatizantes do partido.

A própria chance do PT ter assumido a gerência do capitalismo nacional foi gerada pelo total descrédito que os verdadeiros mandantes do golpe tinham na capacidade de gestão deste partido achando que o mesmo cairia num populismo que consumiriam os recursos e se estagnaria a economia e encerraria por várias décadas a possibilidade de outro governo reformista.

As políticas econômicas implementada nos governos Lula, que administraram o capitalismo nacional [1] de forma mais correta e mais coerente do que os governos neoliberais anteriores, procuraram reforçar o capitalismo nacional. As políticas de “socialização” na economia através de ações tipo bolsa família, incentivo a educação e outras não foi entendida pela maioria da direita ignorante brasileira. A conciliação dos governos do PT levaria a manutenção do capitalismo com o desenvolvimento de uma pequena burguesia que sustentasse o regime econômico. Estes pequenos movimentos não foram entendidos pela inculta burguesia nacional, preferindo esta abdicar de um desenvolvimento autóctone e se entregar a uma aventura neoliberal de entregar por completo o poder ao imperialismo internacional.

Erraram as chamadas elites brasileiras não só na escolha de uma entrega completa de sua pequena independência ao imperialismo, como também na escolha de quem faria o serviço. No lugar de aguardar mais dois ou três anos, precipitados por uma crise internacional, fizeram tudo que a crise se transferisse ao país com toda a sua intensidade e no momento que esta estava no seu clímax escolheram para movimentar a transição no lugar de atores de peças clássicas optaram por péssimos atores de terceira linha de ópera bufa.

Porém além de tudo com as revelações da Lava-Jato desnudou-se de forma amadora e desorganizada ao grande público a farsa da democracia burguesa. Mostrando a todos para que serve o Estado burguês. Mostra-se ao grande público parte da farsa colocando em evidência o que todos sabiam ou pelo menos desconfiavam do que é feito com a maior parte do dinheiro dos impostos, ficando evidente que os gastos com programas tipo bolsa-família ou benefícios, perto da “bolsa empresário” são mínimos.

A pergunta que deve ser feita é o porquê da magnificação do produto secundário em relação ao principal? Talvez a origem de tudo isto esteja nas próprias características do povo brasileiro em relação a outros países. Enquanto as populações de outras nações não consideram o Estado como um ente provedor com uma capacidade quase mágica de responder as demandas da população sem que esta capacidade de provimento venha da própria contribuição da mesma.

Outro fator é uma visão ainda vinculada a um messianismo em que pessoas como o Juiz Moro e sua equipe representavam quase que uma figura mítica que iria salvar todos do anjo mau da corrupção, a medida que este messianismo se vê destruído pela própria narrativa dos fatos, a população encontrando-se órfão procura no pensamento político fora do centro a resposta aos seus anseios, uma parte retomando o governo Lula como referência e outra em figuras de direita que não tem a mínima capacidade de dar uma resposta um pouco mais consequente do que verdadeiras micagens (não mitagens) de líderes fascistas do passado.

O que era para ser secundário passa a ser o principal, sendo por consquencia a grande revelação da Lava-Jato a falência do Estado burguês [2] [3]. Este fenômeno é amplificado também pela inconsequência e voracidade das oligarquias nacionais que, não satisfeitas em lucrarem mais durante o período de prosperidade, querem no momento de crise transferir totalmente para o proletariado brasileiro mais uma vez o custo da recessão.

Por outro lado, as mesmas oligarquias mais escravocratas do que capitalistas, não contavam com a capacidade de recuperação não só do Partido dos Trabalhadores como de outras tendências de mais a esquerda que começam e desmistificar não só o ardil montado para a destruição do PT e o descrédito nos partidos políticos, como ressuscitam o velho e esquecida discurso da luta de classes que a muito custo e muita doutrinação havia sido sufocado. Esqueceram que simplesmente a luta de classes não é só um discurso e com a progressão do ataque aos direitos já conquistados e com o agravamento da crise econômica, a expressão luta de classes nunca foi tão atual e moderna como nos dias de hoje.

O esquema de financiamento político da burguesia nacional feito em favor dela mesmo ficou desnudado, e a “natural existência” dos lobbies das diversas grandes corporações ficaram parcialmente expostos exatamente na forma mais grotesca e incivilizada por declarações verbais dos seus próprios operadores. A colocação de grandes empresários frente às câmaras do judiciário transformou algo que pairava no imaginário popular como algo real e insofismável. Valores de milhões ou bilhões de moeda nacional ou do icônico dólar deixaram de ser uma fantasia de séries de TV, novelas ou filmes, e para um povo que a moeda norte-americana só é vista em filmes e na TV como fantasia, passaram a ser uma realidade do dia a dia.

A partir de tudo isto o que está se colocando em jogo nos dias atuais não somente a existência de um partido e de alguns lobbies, mas sim todo o sistema de funcionamento do que se chama de democracia burguesa, onde o povo é chamado a homologar e não eleger os representantes que são propostos para gerir o sistema.

Com os números surpreendentes de beneficiados de forma legal ou ilegal do financiamento dos grandes grupos empresariais cria um impasse no chamado processo democrático da escolha do chamado “eleitor”. Deixando claro que o processo de homologação dos candidatos pré-escolhidos pelo grande capital foi desnudado e com ele toda a validade da democracia burguesa.

O que resta neste momento para a população em geral são os grupos antissistema de direita ou de esquerda, que estavam de fora mais ou menos fora do menu de escolha nas eleições tradicionais. A exclusão destes grupos era devido a incivilidade da direita mais radical para representarem a farsa, e os segundos por questionarem a mesma. A tendência natural é num primeiro momento desenvolverem-se ambos os grupos e a coexistência dos mesmos não será muito pacífica, entretanto realmente o que os nossos amigos da Lava-Jato sem querer precipitaram o país num caminho que eles jamais previram.

No momento fecham-se as opções da direita em manter a farsa, e devido à hipossuficiência da extrema direita do país [4], resta a mesma apelar para seu último baluarte que são as forças armadas, porém como estas estão impregnadas pelo discurso da extrema direita, o uso das mesmas não está na primeira escolha do imperialismo que coordena todo este movimento, pois elas podem facilmente sair de seu domínio [5].

Artigos sobre o mesmo tema:

[1] Tem sentido salvar o capitalismo brasileiro? Em 12/12/2016

[2] Promotores de Curitiba estão decretando a falência da democracia burguesa! Em 21/09/2016

[3] O que virá depois da democracia burguesa? Não será o fascismo! Em 23/09/2016.

[4] Por favor, Bolsonaro ou Moro não são Hitler nem Revoltados On Line é a Sturmabteilung. Em 13/03/2016.

[5] O Império não quer mais sócios, quer servos. Em 03/01/2017.

[6] Por que a direita descarta uma intervenção militar? Em 24/03/2015.

Redação

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