Ronaldo Bicalho
Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
[email protected]

O Leilão de Reserva e os desafios da estruturação de novas cadeias produtivas

Do Blog Infopetro

Por clarice Ferraz

Como havíamos discutido em nossa última postagem, está prevista a realização do próximo Leilão de Reserva (LER) no dia 31 de outubro. Como podemos ver no gráfico a seguir, os LER vêm crescendo em importância. Criado para cobrir eventuais descasamentos entre a garantia física das centrais de geração e sua geração de eletricidade entregue ao Sistema Integrado Nacional (SIN), diversos fatores têm ampliado essa necessidade de “cobertura”. Assim, apesar de desconhecermos a quantidade a ser contratada, podemos esperar que haja continuidade dessa trajetória.

 

Gráfico 1: Leilões de Reserva do Setor Elétrico Brasileiro

clarice102014a

Fonte: EPE, PDE 2022: 102

No próximo LER, vemos o lançamento de, ao menos, uma nova cadeia produtiva no Brasil, a da energia solar fotovoltaica (FV). A biomassa de resíduos (RSU) não atraiu muitos empreendedores, pois o preço teto estipulado pela fonte foi considerado insuficiente.

O LER traz uma particularidade. Em sua primeira etapa, as fontes solar FV e RSU não irão disputar o leilão com a fonte eólica, sabidamente mais competitiva.  O Ministério de Minas e Energia, em sua Portaria 236 de 30 de maio passado, definiu as diretrizes para a metodologia e sistemática deste leilão, cujo detalhamento é dado pela ANEEL. A alocação entre as três fontes respeitará a determinação dos parâmetros definidos pelo MME que determina a “quantidade desejada de energia” (QTD) para cada uma das fontes. Essas são divididas em lotes equivalentes a 0,1 MW médios. Em linhas gerais, uma vez estabelecidos esses parâmetros, passa-se à competição entre as fontes. Para as fontes solar FV e RSU, se a oferta dos empreendimentos cadastrados for maior ou igual à “quantidade desejada” do mesmo produto, o montante que será contratado é a QTD. Caso a oferta não atinja a QTD, será contratado o que foi ofertado e o saldo restante será transferido para a fonte eólica.

Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), houve inscrições de 1.034 empreendimentos, que representam oferta potencial de 26.297 megawatts (MW) de capacidade instalada. Os projetos eólicos foram responsáveis pelo maior número de inscrições, com 626 projetos. Entretanto, o que chama ainda mais atenção é número de inscrições de empreendimentos de energia solar fotovoltaica. Foram inscritos 400 projetos, totalizando 10.790 megawatts (MW) de capacidade instalada. Por último, houve as inscrições de oito termelétricas a biogás e a resíduos sólidos urbanos (RSU) com pequena expressividade para o SIN.

Tabela 1: LER 2014: Empreendimentos cadastrados por fonte

clarice102014b

Fonte: EPE

O Nordeste apresenta alta concentração dos empreendimentos cadastrados, sobretudo no que diz respeito à geração solar fotovoltaica, com 8.849 MW dos 10.789 MW ofertados. O mesmo acontece com relação à energia eólica que concentra a oferta de 12.781 MW. Desse modo, do total de 26.297 MW dos empreendimentos cadastrados, 23.570 se encontram na região NE. Tal regionalização consolida a região como a nova fronteira de expansão da geração de eletricidade e torna ainda mais urgente a superação dos gargalos do sistema de transmissão.

Tabela 2: Repartição geográfica dos empreendimentos cadastrados:

clarice102014c

Fonte: EPE

Diante de tais dados, espera-se que haja significativa contratação de empreendimentos de energia solar FV. A inserção de novas fontes de geração de eletricidade, sobretudo renováveis, traz consigo grandes oportunidades de diversificação de nossa matriz elétrica e para a economia brasileira. Entretanto, não se deve subestimar o desafio da estruturação de novas cadeias produtivas com suas demandas por novos materiais e de mão de obra especializada. Para que tais cadeias possam ser estruturadas a contento é preciso planejamento e tempo.

No caso brasileiro, podemos novamente nos voltar para a análise do desenvolvimento da energia eólica. Essa enfrentou problemas em sua cadeia produtiva em fases distintas de seu crescimento. A época do PROINFA, somente 40% das usinas contratadas conseguiram entrar em operação respeitando a data prevista de entrada em operação, 2009. Entre os problemas que geraram o atraso, se destacou justamente a política de “conteúdo local” para os componentes dos aerogeradores com índice de nacionalização dos equipamentos de 60%, considerado elevado para uma cadeia industrial nascente.

Depois de superados os gargalos iniciais, a indústria eólica conheceu vigoroso crescimento. Partindo de um patamar de 22 MW de capacidade instalada em 2002, a energia eólica deverá superar a marca dos 4.000 MW até o final desse ano, com expectativa de alcançar cerca de 10.000 MW até 2016, ultrapassando largamente os 8.000 MW previstos pelo Plano Decenal de Expansão 2021, e atraindo cerca de R$20 bilhões em investimentos para o setor. Além disso, houve vigorosa redução de preços. Ao atingir o nível médio de preços de R$ 100/MWh, a energia eólica se tornou a segunda fonte mais competitiva do País, perdendo somente para a eletricidade gerada pelas grandes hidrelétricas (Ferraz, Brasil Energia, agosto 2014).

Entretanto, fontes consolidadas também conhecem problemas em suas cadeias produtivas. A cadeia produtiva da fonte eólica é nova, carece de fabricantes de componentes e, em diversos segmentos, possui apenas um único fornecedor nacional (chapa de aço laminado, resina epóxi, tecidos para a pá,  rolamentos do passo, entre outros). Somado ao sucesso dos leilões, houve exigência do BNDES por maior índice de nacionalização dos aerogeradores para conceder financiamentos. (…) O texto continua no Blog Infopetro.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador