Madame Wu e o experimento de fim de ano que mudou a Física

Do Gizmodo

Madame Wu e o experimento de fim de ano que mudou a Física para sempre

Por: Jennifer Ouellette
 
A maioria de nós recebe o ano novo com a família e os amigos. A ciência, entretanto, não tira férias – nem os cientistas responsáveis ​​por grandes experimentos em curso. Um dos mais famosos exemplos históricos disso é o caso da física Chien-Shiung Wu — muitas vezes chamada de “Madame Wu” — que desistiu de passar a virada com seu marido na década de 1950 para provar que a natureza é ligeiramente canhota.

Por muito tempo, os físicos pensaram que, quando se trata das leis da Física, a natureza não tem preferência de direita ou esquerda. Isso significa que o nosso mundo deveria ser praticamente idêntico a sua imagem espelhada. É uma forma de simetria. Matematicamente, ela é conhecida como paridade, e deveria ser conservada em todos os processos subatômicos. E é, de fato, pelo menos para o eletromagnetismo e para a força nuclear forte. Vários experimentos mostram que as coisas eram exatamente desse jeito.

Mas em 1956, dois teóricos americanos de origem chinesa enviaram um pequeno artigo para o periódico Physical Reviewquestionando se a paridade seria conservada em interações nucleares fracas. Tsung-Dao Lee e Chen Ning Yang tinham até mesmo algumas ideias de como poderiam testar sua hipótese, e convenceram Wu — que se especializou em experimentos de interação fraca na Universidade de Columbia — a trabalhar no projeto.

Wu, por sua vez, se tornou parceira de físicos do que era então o National Bureau of Standards, em Washington, DC, já que eles tinham as instalações certas para fazer as medições de precisão necessárias. (O órgão é agora conhecido como NIST, ou Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia.)

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Os experimentos cruciais foram realizados no NBS entre o Natal e o Ano Novo de 1956 — em grande parte porque Wu percebeu a importância fundamental que eles poderiam ter, e ela queria se antecipar a todos os outros.

Ela deveria acompanhar o marido em uma viagem para a China; eles tinham até mesmo reservado passagens no navio Queen Elizabeth. Em vez disso, ela ficou para trabalhar nos experimentos, e seu marido viajou sem ela.

Wu e seus colegas usaram átomos de cobalto-60 mantidos em campos magnéticos a temperaturas muito baixas. Os núcleos de cobalto-60 têm uma rotação intrínseca — o equivalente quântico ao momento angular, como um pequeno giroscópio, exceto que é mais uma propriedade da partícula do que uma rotação real. Eles também emitem partículas beta à medida que decaem.

A ideia era usar os campos magnéticos para orientar os núcleos, fazendo com que todos girassem na mesma direção, e, em seguida, contar quantos elétrons foram emitidos para cima e para baixo, depois do decaimento dos núcleos. Se a paridade fosse conservada, deveria haver números iguais.

Para surpresa de todos, não havia números iguais de partículas beta emitidas em ambas as direções. A natureza, ao que parece, é “uma canhota semi-ambidestra“, mostrando uma ligeira preferência para a esquerda.

Wu pegou o último trem de volta para Nova York na Véspera de Natal — estava nevando muito e os aeroportos foram fechados — para relatar suas descobertas iniciais para Lee, dizendo-lhe que “a simetria observada era reprodutível e enorme.”

A queda da paridade foi um resultado tão importante e emocionante que alguns físicos não acreditaram em um primeiro momento. Wolfgang Pauli, que recebeu o Nobel de Física em 1945, supostamente exclamou “Isso é um absurdo total!” quando ouviu falar sobre isso. Houve pressa para replicar o experimento. Os resultados foram confirmados e a conservação da paridade foi, sem dúvidas, violada. Até mesmo Pauli estava convencido.

Lee e Yang receberam o Prêmio Nobel de Física no ano seguinte. No que é amplamente percebido dentro da comunidade da física como uma injustiça, Madame Wu não foi incluída no prêmio, apesar de ter sido seu conhecimento sobre experimentos que ajudou a provar a hipótese de Lee e Yang.

Ela teve uma carreira científica bastante destacada, no entanto. E, definitivamente, teve muito a comemorar na virada de 60 anos atrás.

Referências:

Lee, T.D. e Yang, C.N. (1956) “Question of parity conservation in weak interactions”, Physical Review 104 (1): 254-258.

Wu, CS et al. (1957) “Experimental test of parity conservation in beta decay”, Physical Review 105 (4): 1413-1415.

 

Redação

11 Comentários

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  1. Nao vou ler mais, pra mim eh

    Nao vou ler mais, pra mim eh besteirol:  a quebra de simetria so acontece com coisas que vao na direcao contraria aa do tempo, que eh numericamente serial e ascendente.

    Como demonstrado pelo codigo SE, alias:  em serie, uma maravilha, contra-serie…  toda simetria se quebra.

  2. Critérios do Prêmio Nobel

    Vimos que neste caso o comitê do Prêmio Nobel optou por premiar os formuladores teóricos, em vez da física que elaborou os experimentos. Em outro caso, provavelmente mais famoso, o da descoberta da radiação cósmica de fundo, oriunda do Big Bang, o comitê adotou o critério inverso, premiando os responsáveis pelo experimento, e deixando de fora os formuladores teóricos, o que também foi considerado uma grande injustiça.

    Para leigos como nós, é difícil opinar sobre qual deveria ser o critério mais correto. Pela leitura do artigo, fica a impressão de que Madame Wu foi mais importante. Já no caso da radiação cósmica do Big Bang, posterior a este, parece que é consenso da comunidade científica que os formuladores teóricos (os que previram a existência dessa radiação) tiveram papel mais importante do que os experimentadores que a descobriram. Até porque o que se diz por aí é que a descoberta foi quase casual. Talvez essa seja a grande diferença a influenciar as opiniões. Madame Wu teve que construir seu experimento, enquanto Arno e Penzias teriam esbarrado em seu resultado. (Há outras versões, conflitantes a esta que é a mais difundida.)

    Só sei que, quando o comitê do Nobel priorizou os formuladores teóricos (caso Madame Wu), foi criticado. E quando privilegiou os condutores do experimento (caso Arno e Penzias), foi criticado também. E que talvez a crítica recebida num caso tenha influenciado o comitê a adotar o critério oposto no caso posterior.

    Aqui no Brasil tivemos um caso talvez semelhante. O físico César Lattes elaborou e conduziu experimentos que revelaram a existência de certo tipo de decaimento, e sua descoberta foi premiada com o prêmio Nobel de Física, mas quem ganhou o prêmio foi o chefe dele. Que, dizem, não tinha contato direto com os trabalhos, nem participou deles.

  3. MARÍLIA CHAVES PEIXOTO, 

    MARÍLIA CHAVES PEIXOTO,  Santana do Livramento/RS, 24/02/1921 – RJ,05/01/1961

    http://www.aplateia.com.br/VisualizarNoticia/6226/dia-5-registra-os-54-anos-de-morte-da-santanense-marilia-chaves-peixoto.aspx

     

    ARTIGO APONTA PRIMEIRAS DOUTORAS EM MATEMÁTICA NO PAÍS,  13 Abr 2015, http://www.cnpq.br/web/guest/noticias-popularizacao/-/journal_content/56_INSTANCE_a6MO/10157/2533999

     

    MARIA LAURA MOUZINHO LEITE LOPES (Timbaúba-PE, 18/01/1919 – Rio de Janeiro-RJ, 20/06/2013)
    UMA DAS PRIMEIRAS DOUTORAS EM MATEMÁTICA DO BRASIL E EDUCADORA QUE SE PROJETA POR DENTRO DA NOSSA REALIDADE MAIS DURA,  Nascimento, J. B.,  ( solicite por e-mail: [email protected])

     

    ALGUMAS MULHERES DA HISTÓRIA DA MATEMÁTICA E QUESTÃO DE GÊNERO EM C & T., http://sitiodascorujas.blogspot.com.br/2013/06/mulheres-na-matematica.html

     

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