Dirceu: absolvido por Lewandowksi e condenado por Rosa e Fux

Da Carta Maior

Lewandowski absolve Dirceu, mas Rosa e Fux condenam

Para revisor, as acusações contra o ex-ministro José Dirceu foram “deduzidas a partir de meras ilações ou simples conjecturas” e “são muito mais políticas do que estritamente jurídicas”. Rosa Weber e Luiz Fux, entretanto, votaram pela condenação do petista, acompanhando integralmente o voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa, proferido na quarta-feira. A reportagem é de Najla Passos e Vinicius Mansur.

Brasília – Com duras críticas à acusação formulada pelo Ministério Público Federal (MPF) na Ação Penal 470, o chamado “mensalão”, o revisor da matéria, Ricardo Lewandowski, inocentou o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu (PT), do crime de corrupção ativa. De acordo com o revisor, a denúncia não individualiza adequadamente as denúncias imputadas a Dirceu, sendo “deduzidas a partir de meras ilações ou simples conjecturas”.
Lewandowski insistiu na falta de provas, antes alegada pela defesa. 

Afirmou que após sete anos de investigações, que contaram com quebras de sigilo bancário, telefônico e telemático, não há uma prova documental ou pericial contra Dirceu, tendo o MPF restringindo-se “a fazer meras suposições, desenhando um figurino genérico no qual poderia encaixar-se qualquer personagem que ocupasse um alto cargo no governo federal”. “As imputações são muito mais políticas do que estritamente jurídicas”, disse.

E completou: “Não afasto a possibilidade que José Dirceu tenha participado desses eventos, não descarto que ele tenha sido o mentor, mas o fato é que isso não encontra ressonância na prova dos autos”.

Segundo ele, o único elemento de prova contra José Dirceu foi o depoimento do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), colhido em fase extrajudicial e desmentido, em parte, por ele e, completamente, por diversas outras testemunhas quando em juízo. Segundo o revisor, a tese de compra de parlamentares levantada por Jefferson não tem confirmação de nenhuma outra testemunha nos autos. “Causa espécie que não tenha havido um pedido sequer do Ministério Público para que fossem realizadas acareações [entre Jefferson e os demais depoentes]”, acrescentou. 

O magistrado também destacou que, à época dos fatos, o petebista buscava sair do foco do escândalo dos Correios em que estava envolvido. A “imprestabilidade” das acusações de Jefferson, acrescentou o revisor, também se dão pelo fato dele ser corréu e inimigo declarado e “figadal” de José Dirceu.

Diante dessa “falta absoluta de provas”, a única saída encontrada pelo MPF foi invocar a teoria do domínio do fato, utilizada “em situações excepcionalíssimas, situações de guerra, mas nunca numa situação de normalidade democrática”, disse Lewandowski. O presidente do Supremo, Ayres Britto, e o ministro Celso de Mello discordaram.

O revisor também discordou das alegações que apontam “relação íntima” entre o ex-ministro e o publicitário Marcos Valério. Lewandowski deu ênfase a uma viagem feita pelo publicitário à Europa para se encontrar com dirigentes da Portugal Telecom, o que, segundo a acusação, teria acontecido a mando de Dirceu, com a finalidade de angariar recursos para o “mensalão”. Segundo o revisor, a viagem respondia a interesses “muito anteriores à posse de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência” e referentes ao banqueiro Daniel Dantas e do Grupo Opportunity. Após perder o controle da administração de fundos de pensão e, consequentemente, das empresas Brasil Telecom, Telemig e Amazônia Celular, Dantas teria enviado Valério ao exterior para negociar com a Portugal Telecom a retomada do controle das empresas de telefonia brasileiras.

Logo após Lewandowski concluir sua interpretação da viagem, o ministro Gilmar Mendes dirigiu-se até o presidente da Corte, trocou rápidas palavras e se retirou do plenário. Voltou mais tarde, com uma pasta de documentos, mas não os apresentou ao plenário.

Rosa e Fux seguem Barbosa
Os ministros Rosa Weber e Luiz Fux acompanharam integralmente o voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa, proferido na quarta. Em um voto duríssimo e cheio de ironias contra a tese da defesa de inocência de Dirceu e Genoino, a ministra Rosa Weber, tal como Barbosa, só pediu a absolvição da funcionária da SMP&B, Geisa Dias, e do ex-ministro dos Transportes, Anderson Adauto, por falta de provas. “Corruptos e corrompidos demandam corruptores”, resumiu. 

Rosa atribuiu grande peso ao depoimento do corréu Roberto Jefferson, o ex-deputado que denunciou o esquema. “Praticamente tudo que está na denuncia foi confirmado no interrogatório do parlamentar que denunciou o 
esquema”, alegou. 

Segundo ela, a falta de provas diretas contra os mandantes não tem relevância neste processo, já que em “crimes de colarinho branco se admite uma elasticidade maior da prova”. “Há indícios que gritam, permitindo que se monte um quebra-cabeças, peça por peça, como o fez o voto do eminente relator”, justificou.

Rosa disse que a denúncia deixou muito claro que houve o “ato de ofício” necessário para comprovar o crime: o voto. Mas, voltou a enfatizar que, ainda que não o houvesse, o ato de ofício não é necessário para se caracterizar o crime de corrupção, como prevê a jurisprudência da corte, firmada desde o julgamento do ex-presidente Fernando Collor de Mello. “Basta que o agente público aceite [a vantagem indevida]”, esclareceu ela.

A ministra destacou também que “não importa o destino dado ao dinheiro recebido”. Segundo ela, as defesas em nada beneficiam os réus ao dizer que a propina foi usada para quitação das dívidas de campanha. “Não deixa de ser corrupção a venda de sentença absolvitória por um juiz que esteja convicto de que o réu é inocente”, comparou.

Rosa ironizou o voto do ministro-revisor que considerou apenas Delúbio culpado pela corrupção ativa, inocentando Dirceu e Genoino. “Ora, com todo respeito, não é possível acreditar que Delúbio, sozinho, tenha comprometido o Partido dos Trabalhadores com dívidas da ordem de R$ 55 milhões, e repassado metade disso à base aliada”.

O presidente da corte, ministro Ayres Britto, concordou com ela, já deixando muito clara a tendência do voto que irá proferir na próxima terça (9). “Ele [Delúbio] não faria carreira solo com este volume de relacionamentos e com o manejo dessa soma de recursos”, afirmou.
Rosa concluiu dizendo que “existe prova acima de qualquer dúvida razoável de que Delúbio não pode ser responsabilizado sozinho”. Ela condenou Dirceu por nove crimes de corrupção ativa e Genoíno, por seis. 

O ministro Luiz Fux seguiu a mesma linha. Ele rebateu o revisor, que alegou que Genoino é um homem de poucos recursos e que, em muitos anos de vida pública, não acumulou mais do que uma casa avaliada em cerca de R$ 120 mil. “A verdade é que a corrupção não está necessariamente ligada ao interesse econômico. A pobreza do réu não tem nenhuma ligação com o crime de corrupção, porque o interesse pode ser de outra ordem que não a financeira”, afirmou.

Fux também defendeu a teoria do domínio do fato para culpar a cúpula petista, refutando artigo apresentado pelo revisor em que um jurista alemão taxava a premissa teórica como falha e superada. “Nem tudo o que é bom para a Alemanha é bom para o Brasil”, justificou.

Fixação de jurisprudência? 
Fux também criticou a linha das defesas de atribuir os repasses de verba ao caixa dois de campanha. “Caixa dois é corrupção”, afirmou ele. 
O ministro Gilmar Mendes, que tem feito coro com os colegas mais antigos ds corte ao afirmar que o tribunal não tem inovado em jurisprudências, correu para corrigi-lo. “O que se criou foi um fundo alimentado com recursos públicos e privados para fidelizar esta base partidária”, pontuou. 

Britto voltou a defender a tese de que caixa dois se refere a contribuições privadas enquanto corrupção se refere à dinheiro público. “Neste caso, o plenário já decidiu que houve desvio de recursos públicos”, lembrou.

Luis Nassif

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