
Peça 1 – o PCC e as terceirizações em prefeituras
Nos últimos tempos, o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado)de São Paulo passou a identificar a nova frente de atuação do PCC (Primeiro Comando da Capital): os serviços terceirizados ou quarteirizadas de prefeitura municipais.
A semente inicial está na Lei no.9.637/98, que regularizou a situação das Organizações Sociais. Conferiu poder discricionário às Secretarias para escolher a entidade qualificada como OS, inclusive com dispensa de licitação e a inexigência de concursos púbicos para a contratação de pessoal.
Houve uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1923), perante o Supremo Tribunal Federal, visando estabelecer um mínimo de controle sobre as OSs.
Ao final, a ação foi julgada parcialmente procedente para conferir interpretação, estabelecendo que o procedimento de qualificação das organizações sociais, a celebração do contrato de gestão, as dispensas de licitação, a outorga de permissão de uso de bem público, os contratos a serem celebrados com terceiros e a seleção de pessoal deveriam ser conduzidos de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do artigo 37 da CF – que estabelece os princípios e diretrizes que regem a Administração Pública brasileira em sua totalidade, abrangendo os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, tanto na esfera federal quanto estadual, distrital e municipal.
Até agora, o Gaeco identificou uma série de organizações que mereceriam um acompanhamento mais de perto.

As investigações não se restringiram ao Gaeco de São Paulo. Segundo o Estadão, a ação do PCC e do Comando Vermelho foi identificada em investigações de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Ceará entre outros. Recentemente, o Tribunal de Contas de São Paulo incluiu entre as OSs a serem acompanhadas algumas delas contratadas pela prefeitura municipal de Poços de Caldas.
Os setores preferenciais são a saúde, a coleta de lixo e influenciando o uso e ocupação do solo em áreas de preservação ambiental.
De acordo com lei paulista, a fiscalização dessas OSs será feita pelo Tribunal de Contas do Estados e pela Assembleia Legislativa. Mas cabe ao Ministério Público Estadual a missão inicial de fiscalizar os contratos e encaminhar as suspeitas ao TCE. Daí a extrema relevância do promotor estadual no combate ao crime organizado nas prefeituras.
Mas esse trabalho não vem sendo realizado a contento em inúmeras prefeituras – e sob o beneplácito das corregedorias estaduais. Ou seja, um setor sob suspeita de estar sendo invadido por organizações criminosas, atuando em várias prefeituras, sob o beneplácito de promotores que se alinharam às forças políticas locais.
Daí a enorme importância do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) colocar as coisas nos eixos.
Peça 2 – as terceirizadas de São João da Boa Vista
Alvo de uma correição do CNMP – com julgamento previsto para esta terça feira -, o promotor Nelson O’Really é um caso clássico de partidarização do ministério público, tornando o promotor aliado e cúmplices de irregularidades na Prefeitura. E enfraquecendo fundamentalmente o papel do Ministério Público Estadual, em um momento em que o governador Tarcísio de Freitas tenta retirar dele poderes de fiscalização.
Aliado explícito da prefeita da cidade, O´Really não colocou nenhum obstáculo a contratos suspeitos, fechado com empresas suspeitas. Mais que isso, empreendeu uma perseguição cruel a desafetos ou pessoas que meramente discordavam de suas posições.
Com essa postura, tornou o MPE um poder ameaçador e pouco efetivo no combate às irregularidades especialmente dos contratos de terceirização.
O caso da M Construções
A prefeitura assinou um contrato sem licitação com a empresa M Construções & Serviços Ltda para a coleta de resíduos sólidos urbanos e sistemas complementares de limpeza urbana. Foi um contrato provisório de 180 dias, para fugir da licitação.
A empresa contratada tem um amplo histórico de irregularidades. Ainda em 2023, seu contrato com a prefeitura de Ourinho foi denunciado pelo Tribunal de Contas do Estado:
Em Imperatriz, no Maranhão, a prefeitura foi acusada de prorrogar o contrato com a mesma empresa, com aditivos que chegaram a R$ 25 milhões. Em Santa Rita, na Paraíba, a prefeitura atropelou as recomendações do Ministério Público da Paraíba, e montou uma licitação de lixo viciada, no valor de R$ 30 milhões. Sempre com a mesma empresa.
Novas irregularidades ocorreram no município de Baieux, na Paraíba. Segundo denúncia do Ministério Público do Estado da Paraíba (MPPB), a empresa teria feito doações de dinheiro a candidatos a prefeito e vereadores do município, em troca de vantagens na contratação de serviços públicos.
Em outra denúncia, a empresa teria operado por mais de um ano na cidade de Bayeux sem a licença de operação ambiental necessária.
Outras irregularidades ocorreram em Palmas, Tocantins.

Não se sabe de nenhuma iniciativa dos promotores de São João da Boa Vista, Nelson O’Really e ……., tido no MPE como especialista em lavagem de dinheiro.
O caso da Plural
Em seguida, foi rompido o contrato com a M Construções e assinado contrato com a Plural Serviços Técnicos Ltda, também com contrato emergencial, sem licitação. A M Construções questionou, alegando fraude na licitação.
Assim como a M, a Plural havia vencido a licitação para coleta de lixo automatizada em Porto Alegre. Mas a imprensa local constatou que já havia sido denunciada por fraudes em licitação.
Segundo o jornal Matinal News,
“Um dos processos de Ferreira Júnior teve origem na Operação Sanus, do Ministério Público (MP) de Minas Gerais, na qual se apura fraude e sobrepreço na contratação de empresas em São Lourenço. No Rio de Janeiro, ele é investigado por uma tentativa de fraude em licitação na capital fluminense. GZH informou que a empresa não retornou os pedidos de entrevista”.
Logo depois, a empresa desistiu do contrato de Porto Alegre alegando dificuldades para comprar containners necessários para a operação.
Em São João, ela conseguiu um contrato sem licitação, mantendo como fornecedora a esposa do promotor O´Really.
Apesar do histórico de denúncias contra ambas as terceirizadas, apesar do promotor Ernani de Menezes Vilhena Junior VIlhena ser especialista em identificar fraudes em licitações, nada foi feito. Mais: a empresa 3W, de Wellen Zanetti, a esposa do promotor, tornou-se não apenas fornecedora da Plural, como alugou terrenos para a empresa abrigar seus caminhões.
Valendo-me de um recurso gráfico que promotores gostam – árvores -, o esquema ficou assim:

O caso Rita Lobato
O Instituto Rita Lobato faz parte da relação das OSs sobre estrito acompanhamento do Gaeco de São Paulo.
Seu diretor é Nilson Figueira de Souza. Ele é responsável pelo Instituto Rita Lobato de Mogi Guaçu, Mococa, Barretos e São João da Boa Vista. Em São João, o Instituto foi aberto em 24.11.2022. Ao todo, o Instituto possui 5 CNPJs.
O contrato com a prefeitura de São João da Boa Vista foi assinado em 6 de maio de 2022. O valor do contrato foi de R$ 47.934.213,00.
Segundo o contrato, caberia ao Instituto, “A operacionalização, apoio e execução de atividades e serviços de saúde na UPA-Unidade de Pronto Atendimento ,Serviços de Saúde Mental sendo CAPSII-Centro de Atenção Psicossocial, CAPS-AD-Centro de Atenção Psicossocia-Álcoll e outras Drogas, CAPSI-Centro de Atenção Psicossocial Infantil e Ambulatório de Saúde Mental, Unidades e Serviços de Atenção Primária sendo eles do modelo de Estratégias de Saúde da Família, Unidades Básicas de Saúde E Sad-Serviço de Atendimento Domiciliar, Serviços de Especialidades, sendoo CEM-Centro de Especialidades Médicas, CEO-Centro de Especialidades Odontológicas e SAE Serviço de Atendimento Especializado”.
O caso Avante Social
No dia 11 de janeiro de 2024, a prefeitura de São João da Boa Vista estabeleceu parceria com o Instituto Jurídico para Efetivação da Cidade e Saúde – Avante Social. O contrato vai até julho, com valor de R$ 293.793,25.
Em junho de 2021, a Controladoria Geral da União publicou um Relatório de Avaliação sobre os trabalhos da Avante Social no Rio Grande do Norte, remunerado com recursos do Fundo Nacional de Saúde.
Constatou-se um prejuízo de mais de R$ 2 milhões.
Peça 3 – a partidarização da promotoria
Fechar os olhos para malfeitos de aliados é apenas uma das contraindicações dessa partidarização de promotores. A outra é a utilização do aparato legal – especialmente da Lei da Improbidade – para perseguição política a desafetos.
No caso do promotor O`Really, há uma infinidade de abusos, parte dos quais comprovado pela corregedoria do CNMP que foi à cidade, depois que a corregedoria do Ministério Público Estadual arquivou sumariamente todas as denúncias apresentadas contra ele, em um exemplo deplorável do pior corporativismo.
Entre outros relatos, diz o relatório do corregedor:
61. Inicialmente, merece apuração, mediante a instauração de Processo Administrativo Disciplinar, as condutas constantes na Reclamação Disciplinar n° 1.101181/2022-7812, em face dPromotor de Justiça Nelson de Barros O’Reilly Filho, consistente na utilização de rede social em nome próprio para realizar manifestações de caráter ideológico de modo a demonstrar simpatia partidária por determinado grupo político
62. (…) Determinadas publicações feitas pelo Promotor de Justiça em seu perfil pessoal na rede social Facebook, no qual se identifica como Membro do Ministério Público de São Paulo, são favoráveis a novo golpe militar no País; volta da ditadura militar; o ataque à segurança e lisura das urnas eletrônicas empregadas no processo eleitoral; favoráveis a kit de remédios comprovadamente ineficazes para combate ao vírus da Covid19, a exemplo do uso do medicamento denominado cloroquina, pela população; contrariedade aisolamento social, como meio de contenção da propagação o vírus da Covid-19, dentre outros
1. O Promotor de Justiça Nelson de Barros O’Reilly Filho faria parte de grupo ou página dFacebook, denominada, inicialmente, CEPM, mais tarde chamada de TENENTE TORRES, conformconsta da fl. 39 da petição de Representação que deflagrou a Reclamação Disciplinar n. 1.01181/202278. Neste sentidoa)
A. Descrições do Grupo (pág. 40, RD 1.1181/2022-78) – “CEPM – UNIDOSFOCADOS E FORTES – GRUPO DE CEOM FORTES – CEPM – SÃO JOÃO DBOA VISTA”; “GRUPO DE DIREITA QUE ACREDITA NOS VALORES DA FAMÍLIA TRADICIONAL, NOS PRINCÍPIOS E VALORES ÉTICOS E MORAIS E QUE APOIOS PROFISSIONAIS DA ÁREA…
b) “Você apoia que o presidente Bolsonaro acione as forças armadas parrestabelecer a ordem no Brasil” (publicado em 01/08/2021, p. 40-41). Nesta publicação Nelson “curtiu” o conteúdo, o que fica público para quem acessar publicação
c) À pág. 41, constam publicações no referido grupo, do qual o Reclamado Nelson integrava, com a fotografia do então Presidente da República Jair Bolsonaro e comos seguintes dizeres “ESSE STF É UMA VERGONHA MESMO…” (01/104/2021), outra com a imagem de todos os ministros do STF e com os seguintes dizeres ”QUANDO O BANDIDO É O JUIZ, A NAÇÃO VIRA RÉ! Lula foi Solto? Sim. Provou ser inocente? Não – apenas provou que o consegue ser mais corrupto do quele!” (Publicado em 23/07/2021)

Não apenas isso. O inquérito mostra falsificação de um Boletim de Ocorrência, perseguição implacável a pessoas que meramente discordaram de posições suas.
Peça 4 – o papel do CNMP
Nos últimos anos, o desmonte institucional do país instaurou uma selva jurídica, com juízes atuando em desacordo com a jurisprudência dos tribunais e, especialmente, vários promotores, filhotes do lavajatismo, montando pactos políticos com prefeitos.
Acontece em Poços de Caldas, onde a Prefeitura municipal contratou uma Organização Social por mais de RFF$ 40 milhões, sem chamamento, três dias depois da OS sofrer intervenção em sua cidade de origem. Nada se sabe da atuação do promotor estadual, nem do Ministério Público Estadual de Minas Gerais.
O caso Nelson O`Really é mais escandalosa porque foram inúmeras denúncias arquivadas pelo corregedor, sem sequer serem analisadas, obrigando o CNMP a abrir uma correição especial.
Hoje haverá sessão do CNMP. Há em julgamento a atuação de muitos promotores. Caberá ao CNMP o discernimento de separar culpados e inocentes, mas, principalmente, o senso de responsabilidade de saber que ele é a última instância para a moralização de um poder fundamental, o Ministério Público.
A proposta da correição feita em São João da Boa Vista, apesar do trabalho meticuloso que realizou, não resolve a questão. Ela propõe uma suspensão de um período curto e a remoção para outra cidade, como se a remoção pudesse resolver problemas graves de conduta.
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Inaceitável o que está ocorrendo em São Paulo que virou terra de ninguém com promotorias a serviço de ilícitos e retaliações. Estes Promotores tem que ser apropriadamente responsabilizados.
Parabéns ao Nassif. O que ele fez nesse caso os advogados geralmente não conseguem fazer, pois o CNJ e o CNMP costumam desdenhar as representações feitas por advogados.