O fim da TV Brasil como afronta à comunicação pública

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Sobre a tentativa de transformar a EBC em Ministério de governo interino e o apoio da Folha de S. Paulo na interferência de Michel Temer
 
 
Jornal GGN – Nos próximos dias, o presidente interino Michel Temer enviará ao Congresso um projeto de lei para modificar a estrutura da EBC, permitindo o fechamento da TV Brasil. Trata-se de uma mudança na lei da Empresa Brasileira de Comunicação, acabando com o conselho curador, responsável por tomar as decisões mais importantes da agência e que garante independência em relação ao Executivo.
 
Apesar de controlada pela União, a EBC tem uma produção independente de conteúdo, desvinculada da agenda da Presidência da República. Dentro do sistema público de comunicação, distingue-se dos veículos de comunicação estatais ou governamentais, com autonomia, mas, ao mesmo tempo, apresentando-se como um contraponto às emissoras e grupos privados. 
 
O objetivo de Michel Temer é acabar com a estrutura que garante à EBC a independência do Poder Público, hoje organizada pela Assembleia Geral, Órgãos da Administração e Órgãos de Fiscalização. Neste último, o Conselho Curador, hoje único responsável por uma exoneração de cargo diretor antes do contrato, é uma das metas de extinção do presidente interino.
 
De acordo com a Folha de S. Paulo, o projeto de lei de autoria de Temer vai também reduzir os custos da empresa. Para isso, acabará com a TV Brasil, que hoje ocupa metade dos gastos da EBC. Também estaria previsto neste projeto o fim do mandato para o presidente, que poderia ser destituído, a qualquer momento. A intenção é subordiná-lo à Presidência da República, e não mais ao Conselho Curador.
 
Esses mecanismos que garantiam à empresa o teor independente são vistos por Temer como “travas” que barram ingerências políticas.
 
Folha sustenta interferência de Temer
 
Para dar credibilidade à radical interferência do governo interino no sistema público de comunicação, transformando-o em governamental, a reportagem da Folha de S. Paulo, por outro lado, justificou a tentativa de Temer por supostos existentes direcionamentos políticos da EBC nos mandatos petistas.
 
Com esta finalidade, trouxe a seguinte argumentação:
 
“Os críticos questionam os salários altos de alguns profissionais, como o dos jornalistas Sidney Rezende, Paulo Moreira Leite e Luís Nassif. Segundo eles, os programas das “estrelas” da EBC eram “pró PT” e chegaram a ter reclamações de telespectadores à Ouvidoria pelo ‘alinhamento político'”.
 
Esses “críticos” citados pelo jornal foram, segundo a Folha, executivos da EBC ouvidos na condição de anonimato. E foi além na teoria:
 
“Com a demissão de Ricardo Melo, esses contratos foram cancelados por Laerte Rimoli, escolhido para substituí-lo. Mas Melo reassumiu e logo levou ao ar uma entrevista com a presidente afastada Dilma Rousseff feita por Nassif –o que caiu como afronta na equipe de Temer”.
 
A reportagem é que afronta alguns pontos atestados não somente pela legislação brasileira que assegura o funcionamento da EBC, como também considerações recentes da Corte máxima, o Supremo Tribunal Federal (STF).
 
EBC como Ministério de Governo
 
A exoneração do presidente da EBC, Ricardo Melo, a mando do interino Michel Temer, substituindo-o por Laerte Rimoli, assim como fez com cargos ministeriais, já tratando a agência como um dos braços de seu governo, foi considerada pelo ministro do STF, Dias Toffoli, como ilegal.
 
Em sua decisão, no início deste mês, o ministro afirmou que a exoneração de funcionários de agências reguladoras não pode “ficar a critério discricionário” do Executivo, com prejuízo “da subversão à própria natureza da autarquia especial, destinada que é à regulação e à fiscalização dos serviços públicos prestados no âmbito do ente político, tendo, por isso, a lei lhe conferido certo grau de autonomia”.
 
Dias Toffoli deixou claro que o mandato do presidente da EBC é de quatro anos e apenas pode ser interrompido por decisão do conselho diretor, que teria a responsabilidade por um possível afastamento de Ricardo Melo. E, ainda, atestou que no Conselho, formado 22 membros, “há nítido intuito legislativo de assegurar autonomia à gestão da Diretoria Executiva da EBC, inclusive ao seu Diretor-Presidente”.
 
Entrevista Dilma
 
Já a descrição do jornal sobre a entrevista concedida pela presidente afastada Dilma Rousseff à TV Brasil contraria a própria “apuração” realizada alguns dias antes pela Folha. Em reportagem, o mesmo jornal explicou, após ouvir Luis Nassif, que a entrevista já havia sido marcada pelo jornalista, antes da exoneração de Ricardo Melo.
 
Com a decisão de Dias Toffoli contra a exoneração e a volta do presidente da EBC, Ricardo Melo deu sequência à entrevista já agendada para o dia 5 de junho. Como o programa do jornalista na emissora tinha sido suspenso por determinação do novo governo de Temer, a entrevista foi ao ar, conforme agendado, em grade da TV Brasil. 
 
Seguindo os preceitos de autonomia aos Poderes da Empresa Brasileira de Comunicação, a divulgação da entrevista com Dilma Rousseff não foi uma “afronta”, como descreveu a Folha, mas seguiu a grade prevista da emissora.
 

20 Comentários

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  1. Transparência nesse momento.

    As rádios e as  TVs públicas (como a TV Brasil, TV Cultura de São Paulo) precisam ser rediscutidas. Sem corporativismo . A TV Brasil tem uma programação mais genuína, mais voltada para a cultura do país.  A TV Cultura atual gasta muito de suas verbas em produções estrangeiras (séries como Sherlock e Downton Abbey) já exibidas na TV paga e disponíveis em DVDs. Ou seja, o dinheiro do povo de São Paulo alimenta empregos britânicos. É preciso também mais transparência nos gastos, em salários pagos . Neste século, a TV Cultura  e a Rádio Cultura chegou a gastar 14 mil por mês com o produtor de um programa feito de música clássica (meia ou uma hora por dia) que também ganhava em cima da publicidade. Nunca se conheceu a auditoria feita na TV Cultura de SP. Mas sabemos que existem altos salários nessa emissora e, quem sabe, na TV Brasil. Neste momento precisamos de  transparência. Ampla.  Em tempo: já reclamei do site da TV Cultura de SP (pobre em informações), me disseram que estão em fase de transição. Isso dura há meses.

    1. Na Cultura FM tem 2 programas

      Na Cultura FM tem 2 programas de notícias, um matutino e outro verpertino, de “jornalistas” que prefiro não citar os nomes porque seria impssível digitá-los sem palavrões juntos. Ambos devem ganhar muito bem para serem totalmente parciais. Já pensei em reclamar, mas também acho que a Cultura FM é tão insignificante que não vale a pena.

  2. Em nome de acabar com o

    Em nome de acabar com o petismo (um discurso que convence gente  de dois neurônios) este governo usurpador desconstrói tudo, quer acabar com tudo. Só não quer mexer nos de sempre, os donos do capital e os corruptos.

  3. Agora Temer vai atacar o

    Agora Temer vai atacar o GEAP, com toda a sua maldeza.

    GEAP é uma empresa privada; um plano de saúde que atende todos os funcionários do Governo Federal. Muitos nem conhecem a vantagem – conheciam. Eu fui descobrir que minha mãe, já sem chance de ser conveiada em qualquer plano de saúde, devido à idade avançada, conseguiu tudo que precisou do GEAP. 

    Já com quase 100 anos, passou mais de um ano indo e vindo de hospital. Logo também soube que ela teria direito a enfermeira, fonoaudióloga, fisioterapeuta, e muito mais. O valor desse plano não passa de 30% do salário, valor que sempre cabe no bolso.

    É nojento demais ver um sujeito, por meio de um golpe baixo, assumir a presidência do Brasil, movido a um revanchismo sem rpecedentes, ou talvez comparado aos governos fascistas.

    Que coisa mais ridícula Temer não ter gostado da entrevista de Dilma, como se ela tivesse gostar das entrevistas dele. O sol brilha pra todos. 

    Mas, se por aqui houver um mínimo de justiça, em pouco tempo outras denúncias contra esse canalha vão ser suficientes para ele não ter direito ao sol. 

  4. O jornalismo corporativo

    O jornalismo corporativo isento nunca foi. Mas é poder privado, não público. E o leitor escolhe ou rejeita sua produção. Ninguém, em sã consciência aguenta assistir ou lê matérias tendenciosas das empresas de comunicação brasileiras. A TV Brasil abria espaços para todos. Os programas eram mais palatáveis.  Não sou muito fã do Markum, não vi a entrevista com Aloysio Nunes, a quem abomino. Mas assisti a outras entrevistas sem problemas. A presença da excelente Teresa Cruvinel dava fôlego ao programa. Vi, com alegria, que no meio do imbroglio era possível ter matérias sobre os movimentos contrários ao afastamento da Presidenta eleita por 54 milhões de votos. Tive esperança de algum equilíbrio, veja só a ironia, com um canal público que se dispôs a fazer o que nenhuma empresa jornalística fez: mostrar o outro lado dos fatos. Nessas condições prefiro entrar para uma ermida. Mentiras qualquer um conta sozinho. Temer já é uma afronta, ele acabar com uma emissora pública em plena época de Olimpíadas, é uma piada política. Ou um suicídio político. Haja incompetência!

  5. CRÁPULAS DESTRUIDORES

    e pensávamos que seriam as saúvas que acabariam com  o Brasil…

     

    taí este DESgoverno Temer, sucessor em linha DIRETA e ordem unida com o DESgoverno de FHC.

    QUEBRANDO TUDO!!!!!

     

    A Tv Brasil é a única opção dentre tvs abertas que se pode assistir sem neuronios serem agredidos.

    Tv Brasil + NBR + Tv Escola são importantes instrumentos subutilizados pela população.

     

    Eu lamento profundamente o fim das tvs públicas.

     

    Terrível!

    1. Informações Conselho Curador EBC

      Ana,

       

      Se você acessar a página da EBC, da TV Brasil e de outras emisssoras públicas, encontrará essa informação, que é pública.

      O conselho é formado por 22 membros, com seguinte distribuição:

      1) 15 da sociedade civil;

      2) 4 do governo Federal;

      3) 1 da Câmara dos Deputados;

      4) 1 do Senado;

      5) 1 do corpo de empregados da EBC.

    2. Informações Conselho Curador EBC

      Ana,

       

      Se você acessar a página da EBC, da TV Brasil e de outras emisssoras públicas, encontrará essa informação, que é pública.

      O conselho é formado por 22 membros, com seguinte distribuição:

      1) 15 da sociedade civil;

      2) 4 do governo Federal;

      3) 1 da Câmara dos Deputados;

      4) 1 do Senado;

      5) 1 do corpo de empregados da EBC.

      1. Obrigada pela informação,

        Obrigada pela informação, João. Vou entrar no site porque gostaria também de saber quem indica esses membros.

  6. Eu já tinha feito o alerta

    O presidente enterino, preposto do eduardo cunha, queria fazer algo ainda pior: baixar uma MP, alterando imediatamente a Lei 11.652/2008. Conclamei jornalistas independentes a denunciarem tal manobra ou comunicarem a parlamentares de Esquerda, para entrarem com ação no STF, impedindo o presidente enterino de usar tal expediente, pois NÃO existe o caráter de urgência que justifique a adoção de uma MP, para alterar a lei citada. 

    Temeroso de nova derrota no STF, no caso de tentar baixar uma MP, ao governo enterino resta elaborar um PL e submetê-lo ao Congresso Nacional, cuja composição e índole da maioria dos memnbros atuais bem sabemos qual é. 

    Além de eduardo cunha, a destruição da EBC e da comunicação pública tem as 20 digitais dos irmãos Marinho, dos Frias, Civitas e Mesquitas. O descréfito atual do PIG faz com que as pessoas mais esclarecidas passem a se informar por meio das emissoras públicas. E se a comunicação pública brasileira crescer, o PIG pode sofrer muitas baixas e acelerar o seu inexorável declínio.

     

  7. Vamos pressionar o senado

    Vamos pressionar o senado para derrubar o golpe surjo desse golpista que tem medo da verdade. Tem medo da TV Brasil porque é imparcial. É um governo interino golpista, tomando o poder através de alianças com uma oposição sem propostas ou propostas do não amor a democracia e ao Brasil. Fora governo interino golpista. Você e seus aliados fazem mal a nosssa democracia. Vamos mandar e-mails para os senadores. É certo que tem a turma do golpe, mas existe aqueles que sabem que se o golpe prosperar ficará uma cicatriz marcada para sempre na democracia brasileira…

  8. Recado

    Durante décadas, os principais paises da Europa – Inglaterra, Alemanha, França, Itália, Espanha, Portugal –  só tiveram televisões públicas.  Naturalmente porque ainda pensavam que o povo deveria receber informações isentas para poder escolher seus destinos, coisa que vinha do tempo do Jefferson. Na Alemanha Ocidental, por exemplo, existiam cinco redes regionais de televisão, sustentadas por um imposto direto pago pelos proprietários de aparelhos de tv (no Brasil, na era Vargas, tínhamos tributo semelhante sobre os aparelhos de rádio). Mas voltemos à tv alemã: as redes eram controladas por conselhos formados por representantes dos principais sindicatos patronais e de trabalhadores, das principais crenças religiosas, dos partidos governamentais e da oposição – enfim, por uma bela amostra da sociedade daquela região. Esse conselho se reunia e contratava um profissional, com mandato de dois anos e direito a uma reeleição, para tocar a rede. Mas seu mandato acabava imediatamente se o conselho decidisse, por maioria, que a televisão estava sendo parcial no trato de algum problema.  Ou seja, a programação era absolutamente isenta em todos os sentidos. (A crítica que alguns alemães faziam era de que se dava tempo demais a programas com a Filarmônica de Berlim, então dirigida pelo Von Karajan…) Ainda hoje as tvs públicas, como a BBC, cumprem o papel que os fundadores da democracia reservaram para a área de comunicação.  Mas, aquí no Brasil, que história é essa de querer democracia?
     

  9. A única TV assistível no Brasil

    Que uma indignação maior do que a demonstrada nas manifestações contra o esvaziamneto do Minc ocorram pela TV Brasil.

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