Isso ainda não é uma fantasia, é apenas uma reflexão

*áudio de leitura da a-crônica: 110610_002

Hoje, ao ler os jornais, percebi o total distanciamento de mim mesma em relação às vozes que são aquilo que sustenta qualquer texto literário. Simplesmente, mais uma vez, não tenho comigo essa voz supostamente bem perfilada e que dita o tom exato daquilo que se escreve. Afinal, essa única fala que possuo para escrever nos jornais, essa que agora está disponível para leitura, talvez não passe de uma mentira muito reflexiva sobre o ato de escrever e buscar uma voz. E isso, talvez, seja como não-ter-uma-voz.

E o que tenho é uma não voz que trafega rumo ao entendimento desmedido e à reflexão exaustiva sobre o ato de escrever. Sendo nada mais do que uma predileção do pensamento em torno ao próprio trabalho.

Talvez, fosse necessário escrever como se escreve um recado deixado em cima da mesa: saí para resolver algumas pendências e volto às 17 horas, cuide dos pássaros e do cachorro, não deixe faltar alimento a ninguém. E isso talvez não seja, necessariamente, a busca de uma voz. Mas a expressão da própria voz sem elaborações ou entonações e reflexões para além do fato de se comunicar.

E aqui, nesse lugar absolutamente feito para escrever, não existe intenção em se realizar apenas a simples e comum comunicação. O que necessito veementemente é comunicar através da fantasia e a fantasia exige ver e estar com a não-realidade. Afinal, quando falo que escrevo crônicas para o jornal, isso nada mais é do que uma imensa mentira.

E hoje, ao ler os jornais, percebi que a insistência em refletir mais uma vez sobre as vozes, assim, de forma repetitiva e cansativamente, era o mais digno com este próprio viver, em que, muitas vezes, estou a buscar exatamente a mesma coisa: a fantasia. Mas há semanas que não consigo escrever uma só linha de palavras fantasiosas. Mesmo que seja muito estranho ler fantasia numa “crônica” de jornal. E, agora, essas palavras aqui ainda não são uma fantasia, são apenas reflexão. Entende?

Redação

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