Rapadura, por Marcílio Godoi

Funciona assim: o bolsonarista vê a atual equipe de governo sem uma só pessoa que tenha talento, informação ou brilho. Então sente que faz parte daquilo, e acolhe seus iguais

Rapadura

por Marcílio Godoi

O bolsonarismo é o triunfo dos medíocres, dos incapazes, dos frustrados, dos capitãezinhos do mato. O bolsonarismo decorre de um grande ressentimento com o ostracismo que a abertura democrática e a Constituição de 1988 legou a esses seres das sombras. O bolsonarismo é uma insurgência contra a PEC das domésticas ou o PNE, tomados como ofensa moral ao arraigado sentimento colonialista, escravocrata do brasileiro médio. O bolsonarismo é uma imensa mágoa com a felicidade. O bolsonarismo já existia, portanto, bem antes do capitão Cloroquina.

E o bolsonarista não é quem apoia o atual presidente. O bolsonarista é esse herdeiro natural do Integralismo, do fascismo brasileiro, rastejante, intolerante, burro. Com Bolsonaro no poder, essa laia egoísta e sem freio está em êxtase. E não é porque Bolsonaro é um grande líder e vai implantar reformas. Não. O bolsonarista está em mania, brincando de Polícia Rodoviária numa moto, esfuziante por saber que alguém tão destituído de qualidade humana alçou alguma notoriedade. Em suma, o bolsonarista está feliz porque é um infeliz.

Funciona assim: o bolsonarista vê a atual equipe de governo sem uma só pessoa que tenha talento, informação ou brilho. Então sente que faz parte daquilo, e acolhe seus iguais. Trata-se de uma confraria de ernegúmenos, um sindicato de estúpidos obscurantistas. Um covil de milicianos, como prova a cidade do Rio, talvez o seu ninho mais violento.

O bolsonarismo funciona como uma seita fundamentalista cujo mantra é odiar quem pensa, quem usa a lógica ou a inteligência. O bolsonarista, assumido ou não, sempre foi um sujeito reativo a arte, a cultura, aos estudos, ao estado democrático de direito. Miseravelmente egoísta, o bolsonarista sempre se sentiu à margem do mundo exatamente por ausência total de empatia. Agora que o mundo virou só truculência e escrotidão, ele se vê ali, realizado enfim. E faz arminha, grita mito, muito esquisito, masturba-se com as fotografias de Ulstra, Pinochet, Hitler e Mussolini, machos que o sodomizam em suas fantasias.

O que impressiona é a quantidade desses pobres diabos, surgindo dos esgotos, geralmente do nosso passado de assédios violentos tornados vingança. O bolsonarismo é o resultado do acúmulo de nossos graves erros históricos, um painel das covardias nacionais ao longo dos séculos. Por isso, combater o bolsonarismo é combater toda forma de injustiça. Do contrário, com uma cara nova, ele voltará. Na Alemanha há uma série de dispositivos técnicos legais e sociais para matar toda e qualquer manifestação hitlerista em seu nascedouro.

Aqui, o show diário de horrores, à cavalo, ema, jetski ou motocicleta, tais como invadir hospitais, humilhar motoboys, agredir mulheres, negros, lgbts e adversários políticos, aglomerar, enfiar veneno nas pessoas e nas lavouras, assim como plantar fakenews, não vai cessar, mesmo numa possível derrota eleitoral. O bolsonarismo tirou suas máscaras: assumiu-se como uma ração diária de ódio dada a esses tiozões do pavê-Sukita que estavam órfãos de uma ditadura pra chamar de sua. A internet facilita, viabiliza tudo isso. Steve Bannon é a mistura do Joseph Goebbels com a Leni Riefenstahl.

Passivos, indevidamente pacíficos, alienados, deixamos que fosse chocado o ovo da serpente, e o monstro de muitas cabeças hoje está aí, dando de comer aos corvos que comerão os cadáveres de nossos filhos com os nossos devidos impostos, se nada for feito imediatamente. A não ser, claro, que viajemos todos para Paris.

Apertem os cintos, para usar uma expressão de Brecht, referindo-se ao fascismo, a “besta imunda” vai destruir o Brasil e deixá-lo como o fim de todos os regimes autoritários de que temos notícias. O palhaço-demônio não entregará essa rapadura de volta pra gente tão fácil assim, não. “Vai ter que morrer uns 30 milhões, tu sabe disso!”

Marcílio Godoi, engenheiro, editor, proprietário da Memo Editorial

Este artigo não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

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