Suspense nas relações comerciais com a Venezuela

Do Correio Braziliense

Suspense nas relações comerciais

PAULO SILVA PINTO

Com a incerteza política, a vantajosa venda de produtos brasileiros para a Venezuela pode estar ameaçada. No ano passado, 78% dos itens nacionais industrializados tiveram como destino a nação vizinha

Os 14 anos de governo de Hugo Chávez ajudaram a salvar a balança comercial brasileira. As nossas exportações para a Venezuela cresceram 841,9% entre 1999 e 2012. As vendas de lá para cá, por sua vez, subiram apenas 2,3%. “O Brasil se aproveitou da relação pessoal entre Lula e Chávez. Houve muitas obras de empreiteiras brasileiras lá, e isso abriu caminho para a venda de equipamentos”, explicou o presidente da Associação dos Exportadores Brasileiros (AEB), José Augusto de Castro.

Por outro lado, a fraqueza da produção do país vizinho impediu o aumento da corrente no sentido contrário. “Não há o que comprar da Venezuela”, resumiu Castro. O petróleo, que move toda a economia local, tem características que impedem que seja processado nas refinarias da Petrobras. Com a atual instabilidade política no país, porém, as exportações brasileiras tendem a perder terreno. “Isso já está acontecendo em consequência da desvalorização do bolívar (moeda local)”, ressaltou Castro.

Segundo ele, depois das mudanças no câmbio venezuelano em janeiro, o setor privado não consegue mais ter acesso a produtos de fora. “Hoje, o país só compra o que o governo quer”, disse. Nesse quadro de incertezas, os recentes resultados negativos da balança comercial brasileira tendem a se agravar. O país vizinho é responsável por um dos nossos mais elevados superavits comerciais — só perde para a Holanda, que tem o maior porto europeu e, por isso, concentra a entrada de produtos no continente.

Superavits

O saldo bilateral entre Brasil e Venezuela foi, em 2012, de US$ 4,06 bilhões. As exportações somaram US$ 5,06 bilhões, e as importações, apenas US$ 996,8 milhões (veja gráficos). Para se ter ideia do peso disso, em fevereiro deste ano, o país teve deficit de US$ 1,27 bilhão no comércio exterior, o maior já registrado para um segundo mês. Em janeiro, o saldo negativo foi de US$ 4,03 bilhões, o maior para qualquer mês.

As vendas para a Venezuela são importantes não só pelo montante, mas porque concentram itens de grande valor agregado, que o Brasil tem dificuldade de mandar para mercados mais competitivos. Os produtos industrializados foram responsáveis por 78% das nossas vendas ao país vizinho no ano passado.

Se um novo presidente não alinhado com o legado de Chávez for eleito, o Brasil tende a ser prejudicado também indiretamente, com o provável fim da relação privilegiada entre a Venezuela e Cuba. Isso tem permitido à ilha caribenha driblar o bloqueio imposto pelos Estados Unidos. E, ao Brasil, incrementar as vendas para o país dos irmãos Raúl e Fidel Castro.

Otimismo

As hesitações nas vendas do Brasil para a Venezuela, no entanto, não devem durar muito, de acordo com a avaliação da pesquisadora Lia Valls, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV). “A fase complicada vai passar.” É também a opinião do economista Felipe Queiroz, da agência de classificação de risco Austin Rating. “A curto prazo, poderá haver problemas, mas não acreditamos em mudança na corrente comercial, porque a Venezuela depende muito do Brasil”, disse ele.

Em julho, a Venezuela assumirá a presidência rotativa do Mercosul, bloco do qual faz parte oficialmente desde o mês passado, quando a sua integração foi aprovada pelo Congresso do Paraguai. Por isso, há dúvidas sobre o que poderá ocorrer nas negociações com outros países a partir de agora. Mas Lia Valls não vê grande risco de problemas. “Quem entra em um bloco comercial, a princípio, está interessado em ampliar o comércio com outros países”, defendeu.

Luis Nassif

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