Bandeirantes é processada por incitar ódio contra indígenas

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Sugerido por Alfeu

Do CIMI

Grupo Bandeirantes é processado por incitar ódio contra povo Tupinambá
 

O Grupo Bandeirantes de Comunicação vai responder a uma ação judicial por ter veiculado, em rede nacional, duas reportagens com conteúdo discriminatório e informações distorcidas sobre os conflitos fundiários no sul da Bahia, responsabilizando caciques do povo Tupinambá de Olivença por toda a sorte de crimes, inclusive a morte de um agricultor, e acusando os indígenas de invadir fazendas, ameaçar e expulsar moradores.

O processo, de autoria da comunidade indígena Serra do Padeiro e do cacique Rosivaldo Ferreira da Silva, pede liminarmente o direito de resposta da comunidade Tupinambá às reportagens caluniosas, transmitidas pelo Jornal da Band e pelo sistema de radiodifusão do Grupo Bandeirantes com o intuito de incitar o ódio e a violência da sociedade contra o povo Tupinambá de Olivença, e para deslegitimar a luta dos indígenas pela demarcação de seu território, já reconhecido pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como de ocupação tradicional.

A Funai publicou em 2009 o relatório circunstanciado, que delimitou a Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença em cerca de 47 mil hectares, abrangendo partes dos municípios de Buerarema, Una e Ilhéus, sul da Bahia. Porém, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, desobedecendo aos prazos estabelecidos na legislação, ainda não assinou a portaria declaratória, que encaminha o processo demarcatório da TI para as etapas finais.  

As reportagens difamatórias foram ao ar nos dias 25 e 26 de fevereiro, logo após a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, de suspender as reintegrações de posse em sete áreas localizadas na terra Tupinambá. Sem tratar do contexto da demarcação da terra, o repórter Valteno de Oliveira declara: “Desde que a Funai resolveu criar a área para os índios a violência impera aqui na região. Um bando de caciques armados, liderados por Babau, o mais temido deles, faz o diabo”. A reportagem, levianamente e com informações inventadas, pinta o cacique Babau, da aldeia Serra do Padeiro, como um criminoso foragido da Justiça.  “O paradeiro de Rosivaldo Ferreira da Silva, o Babau, é desconhecido. Ele responde a oito processos, por estupro, ameaça e destruição do patrimônio público e agora é suspeito, junto com o cacique Cleildo, de ordenar a execução de Juraci (agricultor assassinado)”.

“O Grupo Bandeirantes parece desconhecer ou evitar conhecer o massacre dos Tupinambá ao longo da história, para difundir histórias inventadas: escondendo o verdadeiro conflito e massacre na região, inclusive os mais recentes. Ademais, sem nenhuma prova associa indígenas e, em especial, os caciques, aos crimes mais esdrúxulos, e até mesmo ao crime de estupro, com vistas a incentivar o ódio social por este povo”, consta na ação contra a emissora.

O povo Tupinambá de Olivença tem sofrido com um processo de violência e opressão desde os tempos de colonização. Histórico que as reportagens ignoraram sumariamente. Apenas nos últimos meses, além do agricultor, cinco indígenas foram assassinados dentro de sua terra. Três deles mortos em uma emboscada armada por pistoleiros. Em agosto de 2013, um ônibus que carregava estudantes indígenas foi atacado a tiros quando voltava para a aldeia. De agosto até janeiro de 2014, 28 casas no município de Buerarema – todas de moradores indígenas – foram incendiadas por grupos ligados aos invasores da terra Tupinambá.

Tropas da Força Nacional de Segurança e da Polícia Federal fixaram em 2013 uma base na área indígena, sendo substituídas pelo Exército Brasileiro em março de 2014. Os policiais perseguem, agridem moradores e ameaçam de morte o cacique Babau e seus familiares. Uma carta denúncia relatando as ações violentas da polícia  foi encaminhada à 6ª Câmara do Ministério Público Federal e ao Ministério da Justiça.

Nenhum desses fatos foi noticiado. “Após todos esses anos, ao arrepio da história, o mesmo povo, que vem lutando para não ser dizimado, sofre perseguição midiática, sendo taxado de terrorista, criminoso, assassino e estuprador, como se nota das reportagens aqui questionadas. O judiciário não pode quedar-se inerte ante esse atentado aos direitos dos povos indígenas, muito menos ante as falsas informações injuriosas, caluniosas e de má fé do canal de televisão réu, numa tentativa de jogar a sociedade contra aqueles que foram acossados, perseguidos e mortos em função da gana de não-indígenas pela terra naquela região, historicamente habitada pelo Povo Tupinambá”, reitera a ação.

O Ministério Público Federal também deve intervir nas fases do processo judicial, protocolado na última sexta-feira (4) na Justiça Federal em São Paulo.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. Essa região (cacaueira) foi

    Essa região (cacaueira) foi conquistada a BALA…e até hoje, é este o seu império.

    Terra de coronéis e de “coronézinhos” ( filhos e netos),

    Que a BAND É RURALISTA, isso é sabido. Logo logo produzirão outro “GALDINO”. É o incentivo à “teoria Custer”…”indio bom é índio morto”. Isso tem “dedo” de Ronaldo Caiado (casou-se com uma latifundiária baiana, e quer influir na região) e sua “udr” ainda usa “o chicote”, QUE PODE VIR EM FORMA DE REPORTAGENS DA BAND… 

    Essa região É RECONHECIDA COMO INDÍGENA, até pela HISTÓRIA. Ou será que Cabral chegou em Porto Seguro, e encontrou franceses dançando minueto? 

    Minha trisavó era índia, desta região. E foi capturada “a dente de cachorro” por um português. E isso aconteceu bem antes da primeira fazenda de cacau se estabelecer na região.

  2. Não é de hoje que a Rede
    Não é de hoje que a Rede Bandeirantes incita o ódio contra os índios. Em 2012 eu mesmo publiquei um texto no Observatório da Imprensa criticando a maneira distorcida como o clã Saad trata conflitos entre posseiros e indígenas: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed691_band_tambem_silencia_os_indios .

    Depois deste texto nunca mais os donos do OI publicaram qualquer coisa minha. Acho que eu mesmo acabei sendo “indianizado” a pedido da Band. Ha, ha, ha…. Espero que aqueles babacas sejam condenados.

  3. Não bem assim, o furo é mais

    Não bem assim, o furo é mais embaixo. procurei a reportagem e não é bem isso que diz no texto colocado no blog e induz ao erro o leitor.A reportagem é sobre uma fraude.  Posso estar errado se não for esta a reportagem.

    BA: pessoas são coagidas a fazer cadastro na Funai

    Moradores eram recrutados para se inscreverem como se fossem índios para engrossar invasões de terra no sul da Bahia

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=yYSJQtQUaSU%5D

    Centenas de moradores são coagidos a fazer cadastro na Funai (Fundação Nacional de Índios) como se fossem índios para engrossar invasões de terra no sul da Bahia. A região vive um conflito permanente por causa da expulsão de agricultores dessas propriedades. O Jornal da Band revelou, com exclusividade, como funciona a fraude que criou uma tribo de falsos indígenas.

    Apesar de a constituição proibir a ampliação de áreas indígenas desde 1988, a  Funai faz vista grossa e há quatro anos demarcou uma área de quase 50 mil hectares que abrange três municípios.

    A área pretendida pela Funai fica numa região conhecida como Costa do Cacau e do Dendê. São terras ocupadas tradicionalmente há séculos por mestiços, descendentes de índios, brancos e negros que povoaram o Brasil desde os tempos do descobrimento.

    Enquanto o Ministério da Justiça não dá a palavra final, mais de 100 propriedades já foram invadidas por grupos armados liderados por caciques que se dizem índios Tupinambá. Mesmo quem tem mandados de reintegração de posse é obrigado a aguardar o efetivo da polícia que é escasso na região.

    Os conflitos aumentaram desde que uma base da Polícia Federal foi atacada no início do ano. Os índios são apontados como autores dos disparos. No início do mês, um agricultor foi morto a tiros e teve a orelha cortada. Quatro suspeitos são procurados, mas até agora ninguém foi preso.

    Para aumentar o exército de invasores, os caciques fora da lei forjam cadastros de não índios. E em bairros da periferia de Ilhéus a lista já passa de oito mil.

    Depois que o escândalo dos registros falsos veio à tona, mais de 300 pessoas procuraram voluntariamente a Funai para se descadastrar. Procurada, a Funai disse que não tutela índios e que não vai comentar a denúncia. O juiz e a procuradora responsáveis pela investigação e pelo julgamento do assassinato do líder dos produtores de cacau reclamam da ausência do estado na região.

    http://noticias.band.uol.com.br/cidades/noticia/100000666624/ba-moradores-sao-coagidos-a-fazer-cadastro-como-indios-.html

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