Crise na Argentina ameaça relação econômica com o Brasil

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Da Agência Brasil

Crise argentina ameaça comércio já desaquecido com o Brasil

A perspectiva de aprofundamento da turbulência econômica na Argentina, caso se confirme a possibilidade de um novo calote da dívida externa do país, causa apreensão pelos efeitos que pode trazer para o Brasil. De acordo com analistas, uma reedição do default de 2001 traria desconfiança e restringiria ao extremo o crédito para os argentinos. O financiamento de exportações e importações seria prejudicado. Haveria piora de uma situação já evidenciada há alguns meses na balança comercial brasileira: a retração no fluxo comercial com o país vizinho, um dos principais parceiros do Brasil, e dificuldade em compensar, direcionando as vendas para outros mercados.

Após o calote de sua dívida há 13 anos, a Argentina renegociou com 93% dos credores. No último dia 26, o país depositou US$ 1 bilhão destinados a pagar quem aceitou a reestruturação. Entretanto, o juiz norte-americano Thomas Griesa ordenou a restituição da verba ao país, entendendo que os argentinos devem pagar primeiro a fundos especulativos, conhecidos como fundos abutres, que reclamam 100% do valor nominal dos títulos. Para evitar um novo default, os argentinos precisam negociar com esses fundos. Griesa nomeou um mediador para acompanhar o diálogo.

Na quinta-feira (3), a Organização dos Estados Americanos aprovou uma declaração de respaldo à posição argentina, destacando que a intervenção judicial no processo de reestruturação da dívida de um país soberano traz instabilidade ao sistema financeiro internacional. O documento não foi apoiado pelos Estados Unidos e o Canadá. O Brasil é favorável à Argentina. O chanceler argentino, Héctor Timerman, discursou no encontro, afirmando que o país negociará com os credores, mas “não abandonará seu povo para favorecer os fundos abutres”.

Caso não se alcance uma solução negociada e haja default, a relação da Argentina com instituições financeiras e parceiros comerciais será penalizada. “Em um país que está em default, os bancos são mais resistentes a abrir linhas de crédito. O custo, por exemplo, de financiamento de exportações, ficará mais caro”, diz Walber Barral, da Barral M Jorge Consultoria e ex-secretário de Comércio Exterior. “Empresas terão dificuldade em receber por eventuais exportações [para a Argentina]. Vão exigir que as vendas sejam feitas a partir de pagamentos antecipados”, acrescenta José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil.

Segundo Castro, em um cenário de calote, o Brasil sentirá diretamente os efeitos. “A Argentina é o principal destino dos manufaturados [brasileiros]. Um total de 50% [desses produtos] vai para a América do Sul, principalmente a Argentina. [O Brasil] não tem competitividade para exportar para outros mercados”, diz, ressaltando que a dificuldade em vender industrializados para mercados como os Estados Unidos e a União Europeia está principalmente no preço elevado. No Mercosul, as tarifas mais baixas permitem valores competitivos, mesmo com custo alto de produção no Brasil.

Na avaliação de Castro, as elevações nas exportações brasileiras para os EUA, que subiram em nove dos últimos 12 meses, e a mais recente recuperação nas vendas para a União Europeia, não significam necessariamente que o Brasil esteja conquistando mais fatias desses mercados. “No caso dos Estados Unidos, o principal responsável foi a venda de aviões de dois, três, até cinco anos atrás. Até maio, [a comercialização de aviões] cresceu 223% [em relação ao mesmo período de 2013]. Não é coisa que se venda de forma contínua. No caso da União Europeia, [uma eventual] recuperação econômica [do bloco] ajuda, mas não temos preço para participar desse mercado”, diz.

Em um cenário de incertezas, Walber Barral e José Augusto de Castro concordam que o acordo automotivo renovado recentemente entre o Brasil e a Argentina ajuda a diminuir a insegurança. “O acordo automotivo foi extremamente importante para dar previsibilidade a esse mercado”, diz Barral. “O acordo não tem nada de novo, mantém o ritmo [do comércio]. Se não houvesse [renovação], [o setor] teria forte impacto”, acrescenta Castro. O acordo, por si só, no entanto, não resolve os problemas do setor automotivo, que já sofre há algum tempo com a queda da demanda de consumidores por veículos, tanto do lado brasileiro quanto argentino. A Argentina também impôs restrições à compra de dólares no país, o que tem afetado o comércio bilateral de maneira geral.

Assim, na hipótese de não haver calote, as perspectivas para as relações comerciais entre o Brasil e a Argentina melhoram, mas permanece o cenário de desaquecimento na economia argentina. “Há uma expectativa do mercado de que haja acordo. [Mas] a balança comercial [com os argentinos] vem caindo desde o ano passado. O que normalizaria é ter crescimento econômico. Depende do cenário mundial, mas a previsão é que não tenha no curto prazo”, comenta Walber Barral. De janeiro a junho deste ano, as exportações do Brasil para a Argentina caíram 19,8% em relação ao mesmo período do ano passado. O fluxo comercial entre os dois países recuou de US$ 524 milhões, de janeiro a maio de 2013, para US$ 385 milhões nos cinco primeiros meses deste ano.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

8 Comentários

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  1. Mentira!!!

    Se não fosse a Argentina, o Brasil teria assinado o tratado de livre-comércio com a União Européia e o que resta de nossa indústria seria varrido do mapa.

    Samuel Pinheiro Guimarães alertou essa possibilidade. Creio que as manifestações de junho impediram o governo de seguir adiante.

    A União Européia adota a política do “Mal estar social” precariza as relações de trabalho para conquistar ganhos de produtividade.

    A maioria do PT é contra esse acordo, mas infelizmente uma parcela do partido se informa pelo PIG (que apoia, assim como a maioria da direita brasileira).

  2. A ENGENHARIA FINANCEIRA NA DIPLOMACIA GEOPOLÍTICA

    A coisa mais sensata a ser feita pelo governo brasileiro é construir uma solução de financiamento para a caução integral da dívida da Argentina com os fundos abutres. Isto poderia ser feito com recursos das reservas brasileiras, através do BNDES, e teria a finalidade primordial de garantir a evolução positiva das exportações do Brasil para o país vizinho. Tal financiamento pode ser garantido por cotas de importação de trigo argentino, e pode vir a permitir um equacionamento de médio prazo capaz de alavancar o incremento do comércio binacional. Por outro lado, tal caução criaria a possibilidade da Argentina prosseguir a negociação com os famigerados fundos abutres de maneira menos desfavorável, sem a corda no pescoço imposta pela ‘justiça’ norte-americana. Onde estão os estadistas e os diplomatas, grandes conhecedores da ciência econômica e da lógica que deve reger as estratégias geopolíticas?

  3. O Brasil não pode abrir mão

    O Brasil não pode abrir mão de acordos multilaterais por causa de Argentina (os demais participantes do Mercosul pouco contam, atualmente). É o abraço do afogado.

  4. O Brasil vai pagar por ter

    O Brasil vai pagar por ter sido ideológico em seus cordos comerciais.

    Um governo com políticas econômicas equivocadas que se amarrou a vizinhos mais equivocados.

    Vamos exportar para quem? Cuba?

    A população vai pagar a conta com produtos caríssimos e defasados.

    Parabéns Lula e Dilma!

     

  5. REITERAÇÃO DE COMENTÁRIO

    Passou a ser cada vez mais frequente o bloqueio temporário dos comentários que envio para este site. Agora já passam de 22 horas, e o comentário que enviei pouco depois das 19 horas ainda não foi exibido. O bloqueio temporário fica mais evidente pelo fato de haverem sido exibidos nesta mesma página, sem nenhuma demora, diversos comentários que mostram horários de postagem muito posteriores ao envio do meu comentário bloqueado. Este problema tem acontecido com frequência, e não decorre de nenhuma falha de procedimento de minha parte, pois em todas as ocorrências foi emitida a mensagem do site que indica haver sido recebido o comentário. Esta é uma situação bastante desagradável, pois o bloqueio, mesmo que temporário, tende e reduzir a quantidade de pessoas que têem acesso ao comentário cuja exibição é postergada. Mas, seria um ingênuo equívoco imaginar que este dissabor possa ser capaz de extinguir minha disposição de expressar minhas opiniões. Assim, conforme procedimento padrão que tenho adotado, segue a reiteração, na íntegra, do comentário até agora não exibido:

    A ENGENHARIA FINANCEIRA NA DIPLOMACIA GEOPOLÍTICA

    A coisa mais sensata a ser feita pelo governo brasileiro é construir uma solução de financiamento para a caução integral da dívida da Argentina com os fundos abutres. Isto poderia ser feito com recursos das reservas brasileiras, através do BNDES, e teria a finalidade primordial de garantir a evolução positiva das exportações do Brasil para o país vizinho. Tal financiamento pode ser garantido por cotas de importação de trigo argentino, e pode vir a permitir um equacionamento de médio prazo capaz de alavancar o incremento do comércio binacional. Por outro lado, tal caução criaria a possibilidade da Argentina prosseguir a negociação com os famigerados fundos abutres de maneira menos desfavorável, sem a corda no pescoço imposta pela ‘justiça’ norte-americana. Onde estão os estadistas e os diplomatas, grandes conhecedores da ciência econômica e da lógica que deve reger as estratégias geopolíticas?

  6. calma, nada de alarmismo catastrófico…

    calma, nada de alarmismo catastrófico…

    não vai não respingar a crise deles em nóis

    na de agora los hermanos têm a proteção divina:

    papa francisco brandirá éditos interditos excomunhões 

    pra cima de los abutres do juiz gringo do capitalismo apátrida

  7. O Brasil não deve se meter com os rolos da Argentina

    Esta situação com os fundos holdouts deve ser resolvida com o pagamento integral para eles, pois isto preveniria futuras irresponsabilidades por parte de governos como o da Argentina, que endividam o país demasiadamente e depois não querem pagar a conta.

    E é do interesse de todosque tem dinheiro aplicado, pois mesmo no Brasl poderá chegar um momento em que o governo não cumpra os contratos e quem aplicou em renda fixa vai ter uma surpresa bem desagradável.

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