O plano de Obama

Coluna Econômica – 20/02/2009

Em geral, os sistemas de financiamento habitacional precisam ficar atento a dois parâmetros. O primeiro deles, é a compatibilidade com a renda do mutuário. O segundo é a compatibilidade com o “funding” (isto é, a remuneração da poupança que serviu de lastro para o financiamento).

No extinto Sistema Financeiro da Habitação (SFH) brasileiro, havia um problema. No início a poupança tinha remuneração trimestral e era corrigida pela ORTN. Já os salários eram reajustados anualmente. As prestações passaram, então, a ser corrigidas anualmente. Como criava uma defasagem, o Banco Nacional da Habitação criou um Coeficiente de Equiparação Salarial (CES), um acréscimo no valor da prestação para compensar essa defasagem.

Quanto explodiu a inflação dos anos 80, o CES ficou insuficiente para cobrir o rombo do saldo devedor; e as prestações ficaram altas, em relação ao reajuste salarial. Foi um pepino que levou anos para se ajustar.
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No caso norte-americano, o problema foi semelhante.

A lógica do Plano de Obama para o setor habitacional é a seguinte:

1.Havia uma armadilha especialmente na reta final, quando a bolha imobiliária tornou-se maior. Os financiamentos tinham juros fixos por algum tempo. Depois, eram corrigidos por juros flutuantes, que variavam de acordo com a categoria de risco do financiamento. Assim, mutuários da faixa de risco (isto é, aqueles cuja relação prestação/rendimentos fosse muito alta), passada a fase de carência estavam condenados à inadimplência, já que o valor da prestação subiria mais ainda com os juros flutuantes.

2.O que o plano Obama propõe é trazer a prestação para um teto máximo equivalente a 31% da renda familiar (nos moldes do que era o antigo Sistema Financeiro da Habitação) através de dois expedientes. Primeiro, os agentes financiadores reduzem os juros até um determinado percentual. Depois, o governo complementa o que faltar. Haverá US$ 75 bilhões para ajudar especialmente os mutuários que estão na iminência de perder os imóveis. Mais US$ 200 bi para compensar o ajuste.

3.Haverá uma proposta de mudança jurídica, permitindo ao juiz decidir sobre a redução nos valores das prestações, no caso de imóvel principal das famílias.

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O pacote de Obama, de um lado, amenizará o grave problema enfrentado pela sociedade americana, das famílias que perderam seu principal imóvel. Havia muitos aventureiros, que tomavam financiamento para um segundo ou terceiro imóvel confiando na sua rápida valorização. Esses não serão contemplados pelo pacote.

O segundo benefício será conter a enxurrada de casas vazias, que acabava impedindo a recuperação do mercado imobiliário.

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No fundo, com muitos e muitos meses de atraso, os Estados Unidos, através de Obama, recuperam o grande instrumento da era Roosevelt, que foi a criação de uma empresa para renegociar todos os empréstimos complicados do sistema habitacional. Essa empresa durou dez anos. No final, tinha renegociado quase todos os contratos, enfrentado um nível baixíssimo de inadimplência e recuperado todo o capital empregado.

Luis Nassif

2 Comentários

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  1. Creio que primeiro faltou
    Creio que primeiro faltou regulamentação para permitir que os dados do setor imobiliário fossem rastreados com precisão, depois supervisão para acompanhar e avaliar o desempenho do setor, e por final faltou fiscalização para verificar se o mínimo de regulamentação estava sendo respeitado.

    Mesmo quando já estava claro a necessidade de uma maior intevenção do governo para corrigir os exageros dos mercados, houve grande resistência, principalmente por parte do secretário do tesouro americano do governo Bush, onde todas as ações visavam preservar o livre mercado, mesmo os incentivos fiscais e o fundo de apoio ao setor financeiro foram elaborados nestas direções.

    O fato é que a renegociação dos contratos das hipotecas fere uma das pedras fundamentais da formação das expectativas do livre mercado, o que exigirá pelo menos nos primeiros momentos uma maior iregulamentação e ssupervisão daa economia para monitorar e evitar exageros por parte dos consumidores.

    Mais do que recuperar a confiança dos consumidores no futuro, o atual processo de renegociação dos contratos das hipotecas pode levar novamente a se cometer exageros, confiando de que o estado intervirá novamente.

    Isto indica que a recuperação da atiividade econômica nos EUA pode ser muito mais rápida do que a maioria imagina.

    O Presidente está semana já deu o recado de que agirá rápido caso a demanda volte a presionar os preços, primieiro diminuindo a injeção de liquidez

  2. Nassif, nao entendi muito bem
    Nassif, nao entendi muito bem essa história de juros flutuantes, duas coisas, primeiro como os compradores aceitavam isso ? segundo como eles funcionam, n entendi essa parte de variam de acordo com o risco do financiamento, o que seria esse risco, como media-se isso.

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