A primavera norte-americana está apenas começando, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Os invasores do Congresso Americano são homens e mulheres brancos que parecem estar histericamente determinados a predominar no cenário político apesar de terem perdido a eleição.

A primavera norte-americana está apenas começando

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Hoje Mark Zuckerberg anunciou no Facebook a suspensão da conta de Donald Trump. Segundo ele isso seria necessário porque:

“Following the certification of the election results by Congress, the priority for the whole country must now be to ensure that the remaining 13 days and the days after inauguration pass peacefully and in accordance with established democratic norms.”

https://www.facebook.com/zuck/posts/10112681480907401

Tradução:

“Após a certificação dos resultados eleitorais pelo Congresso, a prioridade para todo o país deve agora ser garantir que os 13 dias restantes e os dias após a posse decorram pacificamente e de acordo com as normas democráticas estabelecidas.”

O ilusionismo dessa decisão me parece evidente. O fenômeno político criado e potencializado pelo Facebook, cujos lucros são maximizados pela quantidade de cliques dos usuários, não pode ser interrompido. A ascensão de Donald Trump e o fortalecimento do trumpismo foi uma consequência do modelo de negócio que transformou Zuckerberg num dos homens mais ricos do planeta. E ele simplesmente não pode impedir o frenético compartilhamento de Fake News e o tsunami de ódio político e racial na plataforma que criou.

Ao se referir à utilização das redes sociais durante a Primavera Árabe, Jaron Lanier afirma o seguinte:

“O que as redes sociais fizeram na  época, e o que sempre fazem, foi criar ilusões: de que é possível melhorar a sociedade apenas pela vontade; de que as pessoas mais sãs serão favorecidas em disputas difíceis; e de que, de algum modo, o bem-estar material simplesmente surgirá.

O que na verdade acontece, sempre, é que as ilusões se desfazem quando já é tarde demais, e o mundo é herdado pelas pessoas mais rudes, mais egoístas e menos informadas. Quem mais se machuca é qualquer pessoa que não seja uma babaca.” (Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais, Jaron Lanier, Editora Intrínseca, Rio de Janeiro, 2018, p. 147)

Durante a Primavera Árabe, os norte-americanos estimularam os interessados a utilizar as redes sociais para acelerar a destruição de diversos regimes políticos no Oriente Médio. Hillary Clinton comemorou sorrindo na televisão o linchamento e o assassinato de Muammar Kadafi. Os EUA se beneficiou política e economicamente em decorrência guerra híbrida que provocou a desdemocratização do Brasil em 2016.

Como seu modelo (Donald Trump), Jair Bolsonaro também utiliza as redes sociais para espalhar Fake News, estimular o ódio político e fazer ameaças veladas e abertas contra o que restou da democracia brasileira. As relações entre Eduardo Bolsonaro e Steve Bannon são amplamente conhecidas. Ambos se esforçaram muito para criar o clima propício a um golpe de estado nos EUA.

No Twitter, Edward Snowden comemorou a decisão tomada pelo dono do Facebook https://twitter.com/Snowden/status/1347224002671108098. Ao que parece ele esqueceu algo importante: a possibilidade dos grupos terroristas e fascistas continuarem existindo e agindo apesar da derrota de Donald Trump e do fracasso do golpe de estado encenado em 06/01/2021. Ninguém deve ficar surpreso se alguns trumpistas se tornarem mais radicais e violentos em virtude do silêncio que foi imposto ao líder deles.

Evgny Morozov já havia nos alertado que:

“Uma política preocupada em saber as causas antes de corrigir os efeitos pode eventualmente ser uma política de exageros emotivos, levando ao nacionalismo ou coisas piores. Mesmo assim, ela nos serviu bem até agora, apesar das perdas que sofremos em decorrência de sua ineficiência. A tentação da política baseada na IA é evidente: é barata, limpa e supostamente pós-ideológica. O custo, no entanto, pode ser a própria democracia e, a menos que Siri ou Alexa passem a refletir sobre a política da memória e as formas de lidar com a injustiça histórica, não parece que vale a pena pagar esse preço para ter menos buracos nas ruas.” (Big Tech – a ascensão dos dados e a morte da política, Evgny Morozov, Ubu Editora, São Paulo, 2018, p. 143)

Um buraco foi aberto na república norte-americana. Mas aqueles que o cavaram não pertencem às minorias historicamente injustiçadas. Os invasores do Congresso Americano são homens e mulheres brancos que parecem estar histericamente determinados a predominar no cenário político apesar de terem perdido a eleição.

Ferido, o orgulho deles se transformou em ressentimento. Esse sentimento poderoso foi catalisado e potencializado pelas Fake News espalhadas freneticamente por Donald Trump e seus principais assessores.

Portanto, puco importa se Trump deixará ou não a Casa Branca. Em virtude do modelo de negócio adotado por empresários como Mark Zuckerberg, o tumor o presidente dos EUA plantou na sociedade norte-americana continuará crescendo no submundo “on line”.

Em breve, os vândalos brancos e bem nascidos invadirão as ruas das principais cidades norte-americanas. O movimento deles será facilitado pelos policiais, sempre prontos a tolerar quais abusos cometidos por homens brancos que odeiam negros, índios, hispânicos e imigrantes.

O Estado norte-americano foi criado para reprimir negros e exterminar índios. Ao longo do século XX, os EUA evoluiu um pouco. Mas dificilmente as agências estatais daquele país conseguirão reprimir norte-americanos brancos que dizem lutar em favor da liberdade enquanto desmantelam violentamente o regime político para restaurar a opressão racial.

Focada na preservação do império, a elite política dos EUA (democratas incluídos) não tem interesse ou condições de educar politicamente a população norte-americana. Isso tem sido feito pela indústria cultural e pela internet, espaços em que predominam as ilusões e as distorções sobre o que significa ser um bom cidadão.

Os bárbaros já estão dentro do território dos EUA. Eles foram criados pelo novo modo de vida norte-americano. O fato deles terem acesso fácil a armamentos poderosos é um detalhe que não pode ser desprezado. Além disso, é evidente que os inimigos declarados ou não dos norte-americanos utilizarão as redes sociais para instigar a manada de idiotas brancos armados a se jogar no abismo de uma guerra civil permanente, irracional e economicamente desastrosa.

O feitiço empregado pela CIA ao redor do mundo desde a década de 1950 finalmente começou a se voltar contra os feiticeiros norte-americanos. Bem feito!

Fábio de Oliveira Ribeiro

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