Diário da Peste 22

No condomínio onde eu moro existem alguns exemplares de furnarius rufus, pássaro vulgarmente conhecido pelo nome joão-de-barro. Um deles gosta de se alimentar nos gramados próximos do prédio em que eu moro.

Quando o encontro eu paro e fico espiando. Ele também para e olha para mim durante alguns segundos. Depois ele sai em disparada e para novamente há alguma distância para conferir onde eu estou. Eu geralmente fico mais alguns segundos encarando ele e o pássaro volta à sua rotina certo de que eu não represento um perigo.

Essa noite sonhei com esse passarinho. O furnarius rufus estava balançando no galho seco de uma árvore baixa. Eu me aproximei e estendi o braço e ele caiu na palma da minha mão. Ele tremia como se estivesse doente então eu fiz o que podia. Eu o acariciei e o aqueci entre minhas mãos. Algum tempo depois ele já estava saudável voou para longe.

Os pássaros tinham uma significação importante da religião dos romanos. Eles eram arautos de vitórias ou derrotas. Os resultados das disputas políticas e das guerras eram lidos no céu pelo áugure que observava os pássaros e interpretava os sinais que eles davam https://pt.wikipedia.org/wiki/Ausp%C3%ADcio. Os gregos, por sua vez, atribuíram grande valor simbólico à coruja, pássaro que fazia companhia para a deusa Atena. Uma bela representação da crença antiga na importância dos pássaros é feita no filme Tróia (2004). Quando o conselho de guerra troiano se reúne o sacerdote prevê uma grande vitória em virtude de ter observado uma águia.

O deus Horus era simbolizado como um falcão dourado. O beija-flor (mainu, em Tupi-Guarani) é considerado um símbolo de grande poder espiritual pelos índios brasileiros. Entre os cristãos a pomba tem um significado importante. Ela representa tanto a paz quanto o espírito santo. Em 2014, o ataque sofrido pela pomba soltada por uma criança ao lado do Papa foi considerado um sinal de mau agouro https://www.youtube.com/watch?v=-xUf4IZL0FQ.

Não sei como interpretar o sonho que eu tive. Só sei que gosto muito do furnarius rufus que é meu vizinho. Ele já está tão acostumado comigo que as vezes não se importa com a minha proximidade. Ele para o que está fazendo, dá uns passinhos e fica me olhando intrigado. “O que esse humano está querendo comigo?” – imagino ser a pergunta que ele faz a si mesmo.

Jarbas Passarinho, militar que meu avô chamou de “pardal de rabo torto” num de seus poemas, não apreciava muito Jair Bolsonaro https://www.redebrasilatual.com.br/politica/2011/03/nem-todos-os-militares-estao-com-bolsonaro-diz-jarbas-passarinho/. “Ele irrita muito os militares também, porque quando está em campanha, em vez de ele ir ao Clube Militar, como oficial, ele vai pernoitar no alojamento dos sargentos…” disse aquele ex-Ministro da Educação da ditadura militar.

Bolsonaro é chamado de mito por seus seguidores. Mas eles nunca ousaram especificar que mito ele representa. Aliás, creio ser oportuno dizer aqui que concordo com a tese de Durant: “Mais do que contar, como faz a história, o papel do mito parece ser o de repetir, como faz a música.” (As estruturas Antropológicas do Imaginário, Gilbert Durand, Martins Fontes São Paulo, 2001, p. 361). Ninguém sabe exatamente qual mito Bolsonaro pretende repetir, mas é notória a predileção que ele tem por assassinatos em massa. O próprio Bolsonaro mesmo disse isso na TV na década de 1980, fato que tem sido ressaltado nos últimos dias https://www.viomundo.com.br/arapuca/dr-rosinha-talvez-bolsonaro-realize-agora-com-o-coronavirus-o-sonho-de-matar-30-mil.html.

Certa feita, o genocida Henry Kissinger disse que os EUA deveria diminuir a população dos países do terceiro mundo. Esse objetivo pode ser alcançado de diversas maneiras: guerras externas, guerras por procuração, guerras civis, etc… Governantes locais controlados ou subornados pela Casa Branca certamente podem ajudar os norte-americanos a realizar seus planos genocidas.

A letalidade do COVID-19 no Brasil foi calculada em 5,5%. Portanto, se levarmos em conta a população Brasileira 11.495.000 pessoas serão condenadas a morrer nos próximos meses caso Bolsonaro consiga realizar seu sonho de contaminar todo mundo rapidamente. Impossível dizer o que ele ganhará apressando esse genocídio. Talvez o preço e as condições de pagamento tenham sido prescritas no Acordo Secreto que ele admitiu ter feito com Donald Trump em 2019.

O último rei gaélico da Escócia, Mac Bethad mac Findláich, ou Maelbeatha (em gaélico escocês MacBheatha mac Fhionnlaigh), nome anglicizado Macbeth, reinou por 17 anos https://pt.wikipedia.org/wiki/Macbeth_da_Esc%C3%B3cia. Ele foi um governante pacífico e generoso com a Igreja e se tornou famoso por inspirar o personagem de Shakespeare.

O Macbeth shakespeariano é um usurpador cruel casado com uma mulher extremamente ambiciosa. Após cometer diversos crimes de sangue ele é derrotado e deposto por um exército que se aproxima furtivamente do castelo dele. O volume correspondente da Martins Fontes recebeu o número 17 https://www.martinsfontespaulista.com.br/macbeth-558034.aspx/p.

Bolsonaro disputou a presidência usando o número 17. Essa coincidência é interessante, pois ele também é um tirano cruel casado com uma pastora ambiciosa. Nesse momento ele está acuado e, como o Macbeth de Shakespeare, o mito parece ser incapaz de perceber que será inevitavelmente deposto por um exército que ele não consegue ver.

Macbeth da Martins Fontes 17. Bolsonaro Macbeth eleito com o número 17. Em maio fará 17 meses que Bolsonaro está na presidência. Suponho que o 17º mês de reinado do tirano genocida seja especialmente auspicioso para despachá-lo do poder. Mas não direi aqui que esse é o significado verdadeiro do meu sonho que relatei no início. Sou advogado e não áugure romano.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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