Censura de Moraes para proteger Toffoli contraria maioria no STF

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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A maioria da primeira turma do STF já apontou, em julgamento no ano passado, que figuras públicas precisam ser mais tolerantes em relação à imprensa. E que, em favor daqueles que se sentem ofendidos por um trabalho jornalístico, há outras medidas de reparação que não a censura prévia ou a remoção de conteúdo de sites e blogs

Jornal GGN Para proteger a honra e imagem do presidente do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli, Alexandre de Moraes determinou na segunda (15) a remoção de uma reportagem da revista digital CrusoÉ, que insere o ministro no contexto da delação premiada de Marcelo Odebrecht.

A decisão de Moraes – que deve cair com o arquivamento do inquérito pela procuradora-geral da República Raquel Dodge – repercute na grande mídia como censura e autoritarismo por parte de um membro do Supremo, que deveria ser a instância máxima a defender a liberdade de expressão e de imprensa.

Ironicamente, embora não reflita em seu despacho, Moraes sabe que sua decisão destoa do entendimento da maioria dos ministros da primeira turma do Supremo, um colegiado que ele próprio preside. 

É que o caso da CrusoÉ guarda paralelos com a censura imposta ao jornalista Marcelo Auler. Deste julgamento, Moraes saiu voto vencido. 

Em 2018, a primeira turma do STF julgou recurso do blogueiro contra a remoção de reportagens que citam Erika Marena, ex-delegada da Lava Jato que se sentiu ofendida e recorreu à Justiça em busca de indenização.

Por 3 votos (Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber) a 2 (Moraes e Marco Aurélio Mello, que é contra a censura, mas não admitiu o recurso por motivos técnicos), a maioria da primeira turma sustentou que remover da internet um trabalho jornalístico, de interesse público, sem a devida discussão, não é caminho a ser chancelado pelo Supremo.

Para aqueles que se sentem prejudicados pela imprensa, há direito de resposta e outros tipos de reparação junto ao Judiciário. A imediata “supressão do texto jornalístico” não deve ser medida primeira.

Ademais, os ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso deixaram uma lição para Moraes e Toffoli: figuras públicas precisam ter “maior tolerância quanto a matérias de cunho potencialmente lesivo à honra dos agentes públicos, especialmente quando existente interesse público no conteúdo das reportagens e peças jornalísticas excluídas do blog por determinação judicial.”

Esse “grau de tolerância às imputações a agentes públicos” é determinante para “conferir segurança jurídica aos informadores e jornalistas em geral. Caso contrário, seriam inviabilizadas até mesmo as mais sérias empreitadas jornalísticas investigativas”, acrescentou Fux.

Ainda segundo o ministro, o Judiciário deve “exercer a sua função contramajoritária, assegurando a divulgação até mesmo de ideias inconvenientes perante a visão da maioria da sociedade.”

E a cereja do bolo: “(…) se é fato que não se deseja a proliferação das tão nocivas fake news, também o é que o Judiciário deve ter parcimônia ao limitar o exercício da atividade jornalística.”

Barroso, por sua vez, afirmou aos colegas de turma que desde que ingressou na Corte, em 2013, lê notícias “absolutamente inverazes envolvendo cada um de nós”.

Mas “a vida pública”, sustentou Barroso, “vem com esse ônus de suportamos a crítica”. “Eu acho muito difícil alguém operar no espaço público com exacerbação de sensibilidade.”

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. Tivessem este zelo antes e protegessem uma única coisa, a Constituição da República e tudo estaria muito diferente. Por fama imediatista ajudaram a gerar o início do caos, soltaram as bestas. Agora que elas cresceram e não cabem mais em suas jaulas, vão ser diuturnamente surrados por elas.

  2. Entendo que alguns ministros do Supremo resolveram não mais suportar as chantagens e ameaças produzidas pela chamada “milícia digital fascista”. Ministros e familiares são os alvos da intimidação.
    Essa milícia digital é poderosa, tem membros nas instituições públicas e é financiada pelos mesmos grupos econômicos que ajudaram a eleger Bolsonaro.
    Acredito que alguns ministros decidiram “chutar o pau da barraca” e enfrentar os criminosos que se movem nas sombras dos subterrâneos sociais. Por que só agora, não sei…

  3. Antagonista é o porta voz oficial da lava jato e o Mainardi é tão somente um “agro-jornalista” (plantador de notinhas). Desde humilhante prisão do Lula não tenho mais estômago e fígado para ler, ouvir e assistir antagonista, globo, folha, estadão, jovem pan, Augusto Nunes. Bizarro foi um vazamento ao vivo diante de um “juiz” como aconteceu com o antagonista e o Moro. Lembram? Moro afinou porque no depoimento apenas tinham Judiciário, Ministério Público e Advogado. O advogado denunciou em tempo real o vazamento e o juiz prevaricou. Simples assim.

    Diálogo travado entre a defesa de Marcelo Odebrecht e Sergio Moro:

    Defesa de Marcelo Odebrecht — Antes que Vossa Excelência encerre a gravação, estou vendo aqui, no site Antagonista, que o depoimento do senhor Marcelo está sendo transmitido, neste exato momento, em tempo real, de sorte a desrespeitar a determinação de Vossa Excelência do segredo de Justiça. Está aqui. Quer que eu coloque para Vossa Excelência? (…) E só pode ser vazado daqui de dentro. Então, nós estamos numa situação de flagrância. É só entrar no site e ver.

    Juiz Sergio Moro — Tá… Ehhh… A gente trata disso sem precisar da gravação aqui.

    Defesa de Marcelo Odebrecht – Não, não, faço questão que isso fique registrado aqui.

    Juiz Sergio Moro – Não, sim, mas…

    Defesa de Marcelo Odebrecht – Vossa excelência não quer ver a fidelidade da transmissão?

    Juiz Sergio Moro – Sim, doutor. Mas é uma questão pertinente ao interrogatório dele [Marcelo Odebrecht]. Nós tratamos na ata. Pode interromper a gravação.

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