O desmonte da Rádio MEC

Sugerido por Henrique Marques Porto

Do site soniarabello.com.br

O desmonte da Rádio MEC

Sonia Rabello

A rádio MEC, uma das emissoras mais importantes da referência cultural e a mais antiga do país, corre o risco de ser extinta ou pelo menos de perder a sua programação voltada para a música clássica.

No último dia 25, o programa “Sala de Concerto” foi cortado e, segundo informações, desde janeiro deste ano, centenas de profissionais no Rio foram demitidos, entre jornalistas, produtores executivos, apresentadores, locutores, operadores de áudio e técnicos de manutenção.

O processo de “enxugamento” da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), empresa responsável pela manutenção da rádio, tem ocorrido para que passe a cumprir uma missão marginal à Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), fundada em 2007 para gerir as emissoras de rádio e televisão públicas.

A mudança estava prevista na lei que criou a EBC, mas havia sido evitada até agora através de duas Medidas Provisórias (MPs), que conseguiram estender o tempo de “vida útil” da Acerp, e consequentemente o emprego dos profissionais da estação três anos a mais que o prazo previsto em lei.

Confira a petição que já reuniu milhares de assinaturas em defesa da emissora.

O desmonte – No dia 21 de março de 2013, de acordo com o impresso “Amigo Ouvinte”, os funcionários foram surpreendidos com uma ordem judicial interditando o lugar, com prazo de três dias para que tirassem todo equipamento e acervo, sendo obrigados a saírem do prédio que ocupavam (AM, há 71 anos e a FM há 30 anos). Foi alegado que o prédio estava condenado. 

O valioso acervo, os grandes estúdios, quase tudo ficou para trás. O momento de tensão agrava-se não somente pelo fato da rádio estar fora do Ministério da Educação desde 1998, a rádio agora ficou fora do lar. Ou seja, estão interditados, há mais de um semestre: o maior estúdio do país, os estúdios A e B, o Auditório, a Discoteca e suas cabines, todas as salas da AM e FM, as cabines de transmissão; os estúdios do 5º andar e a sala de Direção.

Além disso, o elenco também está sendo desertificado e os números referenciais da AM e FM no dial mudarão por ordem do Ministério da Comunicação. O que sobrará da velha rádio ?

História

A Rádio MEC pode ser considerada a mais antiga emissora do país, pois descende da pioneira Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, fundada em 1923, por Roquette-Pinto, Henrique Morize e outros membros da Academia Brasileira de Ciências e da sociedade da época. Como, naquela época, o modelo de programação mais próximo do que pretendiam botar no ar era a programação das agremiações lítero-musicais, movidas a palestras e recitais, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro constitui-se como uma agremiação desse tipo – com o diferencial de que podia irradiar os seus saraus.

Durante seus 13 anos de existência, a emissora manteve uma programação eminentemente “cultural”, e, demonstrando que cultura também “educa”, “ensinou” poesia, literatura e ciência, “educou” ouvidos para a música de concerto e “deu as primeiras aulas” de pronúncia padrão brasileira da língua portuguesa. Ninguém tem dúvida de que o rádio brasileiro foi um dos principais responsáveis pela unificação linguística do país, mas nem todos sabem que a coisa começou com a Rádio Sociedade, Assim, apesar de transmitir uma programação cultural, a Rádio Sociedade também foi o berço da ideia do rádio educativo – uma ideia que amadureceu enquanto Roquette-Pinto era seu diretor, e que estava pronta, quando ele doou a estação ao governo.

A doação

Em 1936, a nova lei de comunicações exigiu que todas as estações aumentassem a potência de seus transmissores e, Roquette-Pinto, que dirigia a descapitalizada Rádio Sociedade, descartando a possibilidade de buscar capital na praça e tornar-se um empresário do ramo das comunicações, preferiu doar a emissora ao, então, Ministério da Educação e Saúde. Mas impôs as condições de que a rádio transmitisse apenas programação educativa/cultural e não fizesse proselitismo de qualquer espécie – comercial, político ou religioso. Tal compromisso, assumido através de ato jurídico perfeito, foi mantido até 1995, quando, logo no início de seu governo, Fernando Henrique Cardoso desvinculou a Rádio daquele ministério e colocou-a, junto com a TVE, sob a tutela da Secretaria de Comunicação da Presidência da República.

Uma Rádio Educativa e Cultural

A Rádio Ministério da Educação e Saúde, depois Rádio Ministério da Educação e Cultura e hoje Rádio MEC, é uma rádio de resistência cultural, e tem prestado um inestimável serviço. Uma legião de ilustres colaboradores produziu, ao longo de sete décadas, uma programação única. Produtores, músicos, escritores, radioatores, poetas e jornalistas como Cecília Meireles, Carlos Drummond e Manoel Bandeira, Geny Marcondes, Fernanda Montenegro e Fernando Torres, Sergio Viotti, Otto Maria Carpeaux, René Cavé, Fernando Tude de Souza, Magalhães Graça, Edna Savaget, Francisco Mignone, Alceo Bocchino, Edino Krieger, Marlos Nobre, Paulo Santos, Nelson Tolipan…

O acervo – Os mais antigos programas conservados pelo Acervo da Rádio MEC, um dos mais importantes do país, remonta à década de 1960. Da programação e do cast de rádio teatro que a rádio manteve até final dos anos 1980, restam poucos exemplares, sendo o mais importante o Teatro Sérgio Viotti, com 60 programas em bom estado. A voo de pássaro, pode-se dizer que os 3000 programas acervados são um espelho das três grandes realizações da emissora: o rádio educativo e o rádio cultural (cujo capítulo principal foi escrito em parceria com a Orquestra Sinfônica Nacional).

Uma programação musical única e a maior experiência brasileira de educação a distância

Nenhuma rádio brasileira divulgou tanto e por tanto tempo a música de concerto. A importância que ela teve para a nossa música erudita equivale à importância que a Rádio Nacional teve para a nossa música popular. No que diz respeito à produção da musica de concerto brasileira, propriamente dita, a Rádio MEC prestou um serviço incomparável, porque, além de transmitir e divulgar, produziu centenas de gravações exclusivas da Orquestra Sinfônica Nacional, da orquestra de câmera, e também de duos, trio , quarteto e quinteto instrumentais. Várias dessas gravações – realizadas no Estúdio Sinfônico pelo lendário técnico Manoel Cardoso.

A propósito da OSN, a única orquestra radio sinfônica que o país teve, deixou de pertencer à Rádio, em 1981, está hoje, desfalcada, na UFF, em Niterói. A disposição dos Amigos Ouvintes é a de negociar o retorno da OSN à sua origem, fazendo com que a Rádio volte a possuir uma orquestra – como acontece com a RTF, com a Rádio da Baviera, e tantas outras emissoras européias e dos USA –, e retomar seu programa de ensaios e gravações de nossa música de concerto, é uma necessidade cultural que precisa ser satisfeita.

A emissora protagonizou os mais importantes capítulos da história do rádio educativo brasileiro. Abrigada no Ministério da Educação, e pondo em prática o modelo sonhado por Roquette-Pinto, a rádio provocou a criação do SRE–Serviço de Radiodifusão Educativa, e passou a transmitir uma programação única, que, na década de 40, já estava coim bastante qualidade de broadcasting e incluía divulgação cientîfica, literatura, aulas de ginástica, cursos de Alemão, Francês, Inglês e Língua Portuguesa. De lá pra cá, passando pelos programas do Colégio do ar foto nos anos 1950; e pelos do Projeto Minervafoto nos anos 70; até 1998, quando foi retirada do Ministério da Educação, são quase cinquenta anos de produção ininterrupta, transmitindo milhares de programas e centenas de séries educativas. Com o Serviço de Radiodifusão Educativa ainda ativo, e a famosa portaria 568 – que tornava obrigatória a transmissão de programas educacionais em todas as rádios –, as séries e campanhas produzidas ali, no centro do Rio de Janeiro, alcançavam quase todo o país.

Após o Minerva, e até mesmo após a extinção do SRE, a Rádio continuou produzindo, em menor escala, séries de educação para o trânsito, higiene, programas de Ciência, História e Língua Portuguêsa. Hoje, apesar de praticamente não transmitir programação educativa, a emissora continua a educar, pois continua a ser uma rádio cultural.

Os Amigos Ouvintes defendem a volta da emissora ao Ministério da Educação, a quem ela pertence de direito, e consideram que só assim ela poderá retomar sua função educativa e voltar a a fazer, efetivamente, parte da expressão cultural da cidade e do país.

http://www.soniarabello.com.br/o-desmonte-da-radio-mec/
 
Para assinar a Petição pela preservação da Rádio MEC: https://secure.avaaz.org/po/petition/VAMOS_SALVAR_A_RADIO_MEC_DA_EXTINCAO/?fbdm
Redação

10 Comentários

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    1. Por sinal, eu DETESTO quem

      Por sinal, eu DETESTO quem aperta suas proprias estrelinhas pois automaticamente assumo que eles nao sao honestos nem com eles proprios e muito menos comigo.

      1. otimo

        Gostei da sua bronca ,faz sentido alguns comentarios nao tava batendo

        tenho dificuldade ,talvez ansiedade ao postar corretamene o que

        penso .

        mil estrelas pra voçe,sempre atento.

  1. Nota de esclarecimento – Rádio MEC FM do Rio de Janeiro

    Nota de esclarecimento – Rádio MEC FM do Rio de Janeiro
    A EBC desconhece a origem da informação que circula na web, via Avaaz, sobre a extinção da MEC FM Rio

    URL fixa:
    Versão para impressão
    Esclarecimento sobre a MEC FM TV Brasil/ Ana Paula Migliari

    A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) desconhece a origem da informação que circula na web, via Avaaz, sobre a extinção da Rádio MEC FM do Rio de Janeiro. A emissora permanece no ar, com programação voltada para os diversos gêneros da música de concerto, e seu constante aperfeiçoamento faz parte dos objetivos estratégicos da EBC, conforme previsto no planejamento da Empresa de 2012-2022.

    A EBC esclarece que a Rádio passa, neste momento, por mudanças decorrentes da absorção das atividades da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (ACERP), cujo contrato de gestão com a Empresa se encerra no final de 2013. Mudanças estas que, seguindo determinação legal, envolvem a substituição de funcionários da ACERP por empregados da casa.

     

     

  2. Sinto-me dividido.
    Sempre

    Sinto-me dividido.

    Sempre gostei dos programas do Marlos Nobre, das óperas completas aos domingos, do programa de jazz do Nelson Tolipan, etc. Mas sempre me pergunei: por que tem que ser com dinheiro público?

    O Roberrto Setúbal, se não me engano, pronunciou a pérola: “não gosto de conversar com banqueiro: eles só falam em arte; gosto de conversar com artista: eles só falam em dinheiro!”

    Não tem nenhuma radio que possa atender à “alta cultura”, não?

    Aqui no Rio a Globo FM se atreveu; uma tal de Opus 90 (não sei mais detalhes), também… Ali pelos 90, ainda em pleno vigor do jabá.

    Será que atualmente não dá pra voltar a reestruturar o departemenbto comercial das rádios?

    Por que o pessoal da música de orquestra não vai pedir dinheiro lá na casa dos banqueiros? Ah, tem que ter uma rede pública pra “me salvar”? Pra transmitir o que “é bom”?

    Sei que não tem ninguém rico, privilegiado, na Rádio MEC… Mas, talvez, até ficassem…

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