Mensalão. Um processo que mudou conceitos e desnudou a fragilidade da Justiça

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Mensalão. Um processo que mudou conceitos e desnudou a fragilidade da justiça.

É comum a afirmação de que a AP 470 irá mudar o marco da justiça. Fico a me perguntar qual marco?

Para quem acompanhou todo o processo, inclusive a academia, ficou a sensação de que nada se sabe, e a nítida impressão que o STF estava perdido nos conceitos de raiz, nos princípios fundamentais do direito e da própria democracia.

Desde o seu inicio, ainda na fase preliminar, que a divergência entre pontos basilares, -os princípios elementares -, do direito estão sendo postos em debates como se os nossos mais altos juízes tentassem redescobrir a própria essência do direito.

Foram muitos os momentos em que os nossos ministros se dividiram quando a esses princípios primordiais e universais, como o amplo direito de defesa, o instituto universal da dúvida a favor do réu, o momento do crime, a conceituação do que são provas e indícios de provas, e mesmo a indicação do juízo competente, entre tantos outros.

Foi assim que os nossos ministros não conseguiram se entender quanto ao desmembramento do processo, aceitaram frágeis indícios de provas como elemento probatório suficiente para condenações, tiveram sérias divergências quanto ao momento do crime de corrupção.

O princípio do direito penal mínimo que o mundo jurídico universal tanto preza foi jogado no lixo com a constatação da irresistível corrente condenatória. Os ministros optaram por um retrocesso em que se atropelaram princípios constitucionais construídos ao longo dos últimos anos.

Foi observado que ministros tidos como os mais garantistas do STF, como Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello, tolheram a única chance dos réus em dirimir dúvidas da própria corte amplamente representadas pela grande divergência e mesmo no reconhecimento de erros que fizeram o STF modificar algumas condenações.

Essas modificações de decisões em Embargos Declaratórios tiveram efeito infringente, então por que estão a negar a aceitação dos Embargos Infringentes?

A resposta só é apenas uma. O medo que as penas sejam diminuídas e que os réus não saiam algemados para o deleite da mídia.

Tiveram sérias dificuldades em estabelecer quais réus estariam em função de exercício de função aptos a serem julgados pelo STF e aceitaram os quarenta réus.

Essa situação de se julgar quarenta réus em um mesmo processo por si só deveria indicar que a análise de tantos e a apreciação de muitos juízes do colegiado demandaria enorme tempo; e é isso que alguns deles agora apelam para dar fim no processo.

Estabelecer logo no início dos trabalhos a conotação política do que viria a acontecer em todas as fases do processo, ficou demonstrada pelo próprio Presidente do STF à época, Carlos Ayres Britto, quando tratou o mensalão como um plano do PT para se perpetuar no poder, chamando-o de“golpe“, que era “um projeto de poder que vai muito além de um quadriênio quadruplicado”. 

Este princípio adivinhatório foi de uma irresponsabilidade que maculou toda a AP 470, ao mesmo tempo em que demonstrou a ignorância do ex-ministro ao ter “esquecido” que a busca do poder se dá nas alianças pré-eleitorais pactuadas nas campanhas.

Este julgamento e a tecnicidade atípica aplicada já marcaram negativamente o STF no meio acadêmico e na sociedade.

Inúmeros artigos de vários juristas renomados criticando o julgamento já circulam nos diversos meios.

Vários conceitos e princípios aplicados na AP 470 não serão reutilizados no futuro, nem mesmo pelo STF, e ficará definitivamente figurado que se tratou de um juízo de exceção.

http://assisprocura.blogspot.com.br/2013/09/mensalao-um-processo-que-mud…

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

7 Comentários

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  1. Mudar os critérios?

    Assis,

    Talvez mudar os critérios?

    O livre-docente pela Universidade de São Paulo (USP) em Direito do Estado Dircêo Torrecillas, pensa assim. Ele considera ironico que os demais tribunais brasileiros tenham mais exigências para escolher seus integrantes do que o Supremo.

  2. O Poder Judiciario brasileiro

    O Poder Judiciario brasileiro sofre de grave problema de assimetria com o resto do Pais. Foi o Poder que mais cresceu em verbas, numero de funcionarios, numero de predios mas não cresceu em organização e eficiencia.

    O Poder Judiciario ve como um atentado à sua independencia de julgar qualquer tentativa de melhorar sua organização e eficiencia com introdução de mecanismos de mensuração, de metas por prazos e por inercia

     continua a funcionar como se o Tesouro tivesse recursos ilimitados e pudesse imprimir dinheiro à vontade.

    Exemplos de falta de regras organizacionais falando apenas no Supremo:

    1.Porque os votos não tem um limite de tempo? Poderia ser de no maximo 30 minutos, se um Ministro não consegue expor um voto em 30 minutos é porque não tem poder de sintese e organização das ideias,  ler um voto, apenas ler, porque a maioria e escrita por assessores, por duas horas é o cumulo da ineficiencia. Em colegiados há que haver controle do tempo, não pode falar quanto quiser porque não há pauta que funcione se não tem hora para começar e acabar, é assim no Conselho de Segurança da ONU, nas reuniões do FMI, nas cupulas do G-7, na Corte Internacional de Justiça em Haia, nas audiencias da Rainha da Inglaterra, em todo lugar civilizado.

    2.O STF tem obrigação de julgar como tribunal originario mais de mil potenciais reus, não existe a minima estrutura para isso. Porque o STF não patrocina uma PEC para reduzir esse numero, ficando restrito a julgar apenas o Presidente da Republica?  Alem de ter uma clientela tão grande, ainda, por vontade propria, admite reus sem foro privilegiado, como os 37 do mensalão, apenas para criar massa critica para o espetaculo mediatico.

    3.O numero de funcionarios do STF, em torno de 3.800, não tem paralelo no mundo, 350 funcionarios para cada Ministro, seguranças são em torno de 400, telefonistas e recepcionistas tambem em torno de 400, copeiros em torno de 220, é algo inteiramente fora de proposito e o numero aumenta todo ano.

    Com tudo isso o STF tem um monumental atraso em julgamentos, há processos e não são poucos, de 30 anos, de 20 são comuns, 10 anos tem um caminhão. Um Tribunal Supremo deveria julgar apenas questões constitucionais , a Suprema Corte americana julga em torno de 200 processos por ano. todos processos de repercussão publica em grandes temas para construção jurisprudencial que cria parametros gerais para todo o Pais.

    Entre as 50 reformas que o Brasil precisa, a do Judiciario é das mais importantes., esta aí o mensalão como vitrina da bagunça historica de um sistem arcaico que é completamente disfuncional para um Pais moderno.

    1. Concordância total

      Perfeito AA,

      O processo do “mensalão” ao menos serviu para o desnudamento de tudo isto. A situação está posta. Quando vai aparecer um político com culhões para propor a reforma?

       

    2. País moderno?
      Mais de 90% da população se declara religiosa; cerca de 50% da população está na informalidade; o Estado está lotado de funcionários fantasmas ou filhotados políticos indicados por canalhas… Um país destes pode ser tudo, menos moderno, e o espetáculo medieval que brota das cavernas do STF apenas refletem esta realidade.

    3. País moderno?
      Mais de 90% da população se declara religiosa; cerca de 50% da população está na informalidade; o Estado está lotado de funcionários fantasmas ou filhotados políticos indicados por canalhas… Um país destes pode ser tudo, menos moderno, e o espetáculo medieval que brota das cavernas do STF apenas refletem esta realidade.

  3. VÍCERAS PODRES POR BAIXO DAS TOGAS

    Quem diria que a Globo com o circo todo armado para derrubar o PT nas eleições, com a transmissão ao vivo  e “comentaristas” políticos altamente selecionados, bombardeando dioturnamente o julgamento, daria tantos tiros no próprio pé.

    Não só não conseguiu seu intento, como mostrou para toda população o quanto são venais e corruptos os nossos juízes, com raras exceções. 

    O STF que no inconciente coletivo era algo  venerado por muitos, como um baluastre de dignidade e justiça. Caiu em desgraça e sentou nos bancos dos réus tal qual qualquer marginal, ladrão ou quadrilheiro.

    Jamais eles imaginaram que teríamos acesso a todas essas informações veiculadas pela rede, que desmoraliza a maioria deles, e os coloca aos nossos olhos, como criminosos privilegiados isentos de julgamentos e punições.

    Vimos sob a luz dos holofotes o quanto são podres as víceras  dos nossos togados e como se faz de cega a nossa JUSTIÇA.  

    O quanto ainda é fragil a nossa DEMOCRACIA e o quanto está amadurecida a maioria do nosso povo que: não se deixa mais atrair pelo canto da VENUS PLATINADA.

    PLESBICITO JÁ!!!

    DILMAISUMAVEZ!!!

     

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