Quem vota em quem no Rio Grande do Sul

O detalhamento dos dados da pesquisa Vox Populi, contratada pelo Sul21 e realizada durante os dias 5 e 6 de setembro, permite verificar as características dos votos no Rio Grande do Sul e apontar modificações ocorridas nos últimos anos.

Considerando-se as intenções de voto para o Governo do Estado e centrando a análise no perfil dos eleitores dos dois concorrentes melhor colocados, Ana Amélia Lemos e Tarso Genro, percebe-se que a atual senadora mantém-se à frente, em ambos os turnos, em todos os segmentos sociais analisados, exceto entre os eleitores maduros (com 60 anos ou mais), no primeiro turno, entre os quais o atual governador aparece na dianteira.

TADEU - PESQUISA RS
Fonte: Pesquisa Vox Populi/Sul21 – setembro 2014

Os maiores percentuais de intenções de voto em Ana Amélia Lemos ocorrem entre os eleitores com escolaridade de nível médio, no primeiro turno, e entre estes e os com renda entre 2 e 5 salários mínimos, no segundo turno, enquanto que os picos das intenções de voto em Tarso Genro ocorrem entre os eleitores maduros e os com escolaridade de nível superior, no primeiro turno, e entre os maduros, secundados pelos do sexo masculino, no segundo turno.

Os piores desempenhos de Ana Amélia Lemos ocorrem entre os eleitores maduros secundados pelos com renda de mais de 5 salários mínimos, no primeiro turno, situação que se inverte no segundo turno. Tarso Genro tem seus menores desempenhos, em ambos os turnos, entre os eleitores do sexo feminino, os adultos (de 30 a 59 anos), os com escolaridade de nível médio e os com renda de mais de 2 até 5 salários mínimos.

TADEU - PESQUISA RS - SEGUNDO TURNO
Fonte: Pesquisa Vox Populi/Sul21 – setembro 2014

Adotando o mesmo procedimento para a análise das intenções de voto para a Presidência da República no Rio Grande do Sul, percebe-se que Dilma Rousseff lidera, no primeiro turno, em todos os segmentos analisados, sendo que Marina Silva, no segundo turno, fica à frente entre os eleitores jovens (até 29 anos) e entre os que têm renda superior a 5 salários mínimos e empata entre os que possuem escolaridade de nível médio.

A análise da distribuição dos votos no interior de cada segmento pesquisado permite constatar que os eleitores mais propensos a votar em Dilma Rousseff, no primeiro turno, são os com rendimento até 2 salários mínimos, os de idade mais avançada e os com escolaridade de nível fundamental, aos quais se somam, no segundo turno, os do sexo feminino. Os eleitores jovens, os que têm escolaridade de nível médio e os com renda até 2 salários mínimos são os que mais se declaram dispostos a votar em Marina Silva no primeiro turno, sendo que o segmento de renda superior a 5 salários mínimos assume o lugar do extrato de renda anterior no segundo turno.

TADEU - PESQUISA PRESIDÊNCIA
Fonte: Pesquisa Vox Populi/Sul21 – setembro 2014

Aécio Neves obtém seus melhores desempenhos entre os eleitores com escolaridade de nível superior, com renda maior do que 5 salários mínimos e com idade madura, sendo que seus percentuais de intenção de voto são superiores aos de Marina Silva entre os segmentos de escolaridade de nível superior e entre os de mais idade e se iguala aos dela entre os que possuem rendas mais elevadas.

TADEU - PESQUISA - PRESIDÊNCIA SEGUNDO TURNO
Fonte: Pesquisa Vox Populi/Sul21 – setembro 2014

O padrão que se observa a partir da análise das intenções de voto é reforçado quando se verificam as manifestações das rejeições de voto pelos diferentes segmentos do eleitorado gaúcho. Tarso Genro, para o Governo do Estado, e Dilma Rousseff, para a Presidência da República, são os candidatos mais rejeitos em todos os segmentos considerados. Os índices de rejeição de Tarso Genro e de Dilma Rousseff são praticamente idênticos. Eles atingem seus ápices entre os eleitores jovens, os que possuem escolaridade de nível médio e os que têm renda nas duas faixas mais elevadas.

TADEU - PESQUISA - REJEIÇÃO RS
Fonte: Pesquisa Vox Populi/Sul21 – setembro 2014

A se confirmarem as tendências aqui detectadas, ocorrerá, nestas eleições, uma nova alteração do padrão do voto no Rio Grande do Sul e, provavelmente, no Brasil. Considerando-se o comportamento dos eleitores rio-grandenses e brasileiros durante o atual período democrático, ou seja, durante as eleições ocorridas desde 1986, os estudiosos do voto detectaram a ocorrência de dois padrões distintos, até aqui, no país.

O primeiro deles, que se estende a partir de 1986 até cerca de 2002, no qual os eleitores das áreas urbanas e economicamente mais desenvolvidas, jovens, mais escolarizados e de renda média votavam preferencialmente nos candidatos do PT, enquanto os eleitores das áreas rurais e das menos desenvolvidas do país, maduros, menos escolarizados e de menor renda votavam preferencialmente nos candidatos do PFL (hoje DEM) e, depois, também do PSDB (veja-se CÉSAR, B. T. PT: a contemporaneidade possível. Porto Alegre: Ed, Universidade/UFRGS, 2002, 395 p.).
O segundo padrão, que coincide com o período dos dois mandatos presidenciais de Luís Inácio Lula da Silva e do primeiro mandato de Dilma Rousseff, no qual o eleitorado que preferencialmente votava no PT tornou-se, gradativamente, o das áreas urbanas e rurais menos desenvolvidas, de idade adulta, medianamente e menos escolarizados e de renda média a baixa, enquanto o PSDB passava a conquistar os eleitores das áreas mais urbanas mais desenvolvidas, mais instruídos e de maior renda (veja-se SINGER, A. V. Esquerda e direita no eleitorado brasileiro. São Paulo: Edusp, 2000. v. 1700. 203 p.).

A análise dos resultados das pesquisas de intenção de voto de 2014 permite pensar que um terceiro padrão estaria em curso no presente momento com a transmigração dos votos dos segmentos que votavam preferencialmente no PSDB para a(o)s candidata(o)s que aparecem com maiores chances de derrotar a(os) candidata(o)s do PT e, além disso, pela fuga e até rejeição de voto dos eleitores jovens, de renda média e de escolaridade média e alta em relação aos candidatos do PT.

A primeira grande característica do novo padrão que se prenuncia é a negação dos partidos políticos, de modo geral, como forma de representação e, ainda, da própria política como forma de atuação social e a negação do PT, de modo específico. As adesões eleitorais que ocorrem hoje se fazem, em grande parte, pela negação e não pela afirmação e se agora fortalecem o PP e Ana Amélia Lemos, no nível estadual, e o PSB e Marina Silva, no nível nacional, poderão vir a favorecer quaisquer outros partidos e candidatos que cumpram o mesmo papel nas eleições seguintes.

Não é à toa que os grandes motes desta campanha eleitoral no RS e em todo o país sejam o da “nova política”, sem que se explicite qual seja ela, e o do “governar com os bons, independente dos partidos”, manifestado também nas fórmulas: “meu partido é o Rio Grande do Sul” ou “meu partido é o Brasil”, como se a essência da política não fosse a explicitação dos interesses divergentes e a resolução de seus conflitos.

A segunda grande característica do novo padrão está relacionada com uma mudança estrutural em curso na sociedade brasileira. Os eleitores que hoje abandonam os candidatos do PT e que dificultam a reeleição de Tarso Genro e de Dilma Rousseff são os dos segmentos de renda média e de escolaridade de nível médio e superior. São eleitores que passaram a votar no PT durante os governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, que ascenderam social e culturalmente durante os seus governos, mas que agora já não se sentem representados por este partido.

Trata-se da geração dos jovens (até 29 anos) e de parte da geração dos adultos (de 30 a 59 anos) de hoje, que não viveram a ditadura civil-militar de 1964-1984, com suas promessas de fazer crescer o bolo da riqueza nacional para só depois distribuí-la, que não conheceram a instabilidade econômica com altas taxas de inflação e a situação de altíssima concentração de renda que caracterizou historicamente a sociedade brasileira e que são filhos de famílias recém-incluídas nos estratos médios de consumo e de renda. Hoje, diante do quadro de desaceleração do crescimento e sob bombardeio constante do noticiário negativo sobre a economia feito pela grande mídia, estes segmentos sociais temem a possibilidade de reversão da condição social que atingiram.

Tendo conquistado um melhor patamar de renda, consumo e escolaridade, os novos setores médios brasileiros hoje buscam candidatos que lhes prometem a manutenção do crescimento econômico (ainda que, na prática, isto possa significar a reversão do processo de diminuição da desigualdade social, atualmente em curso), melhor qualidade dos serviços que passaram recentemente a consumir, uma “nova” forma de atuação política (de cunho, talvez, antipartidário) e um “novo” modo de agir das instituições públicas, posto que as antigas formas institucionais “não mais os representam”.

Benedito Tadeu César – Cientista Político

Publicado originalmente no site Sul21 http://www.sul21.com.br/jornal/quem-vota-em-quem-no-rio-grande-do-sul/

Redação

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