O atual e o inatual no fascismo: um debate premente, por Francisco Carlos Teixeira da Silva

Levamos muito tempo para nomear o fenômeno e dizer de público que a besta estava prenha também entre nós

O atual e o inatual no fascismo: um debate premente.

por Francisco Carlos Teixeira da Silva

Aqui no meu recolhimento involuntário, acompanho os sentimentos variados, justos, da nossa bolha progressista, anti-bolso-fascista. 

Há sentimentos de incompreensão e medo ante o peso, real – não nos cabe negar a realidade -, do “voto bolsonarista” e de esperança pela continuada liderança do único candidato que é de fato a trincheira, barricada e bandeira do antifascismo no Brasil.

A incompreensão, medo e raiva deve-se em grande parte, embora não somente, ao desconhecimento do poder de “arrasto” (sedução, schöneschein, seduzione, cf. as historiografias clássicas), como Di Grazzie e Peter Reichel. Porém, desde o Interior, que pode manter-se original, da III internacional, com Dimitrov, Zetkin e principalmente com Gramsci já sabíamos que o(s) fascismo(s) são movimentos de massa, diversos e com mil máscaras.

Levamos muito tempo para nomear o fenômeno e dizer de público que a besta estava prenha também entre nós, ainda uma vez pensando o Brasil como uma ilha perante o mundo. Sempre houve ao menos dois obstáculos epistemológicos para o debate do fascismo no Brasil, para além da ausência do estudo dos fascismos no mundo acadêmico brasileiro.

A saber, 1. Um fundo literário sociológico sobre a chamada “Ternura brasileira” e a crença num povo bom, solidário, fraterno – essa seria “Volkskultur” do brasileiro. Desde Caldas Barbosa, no século XIX, passando por Olavo Bilac, consolidando-se no samba-exaltação e na poesia de Cassiano Ricardo, nos autoidentificamos como o “povo não-violento”, que não faz guerras ou revoluções. Só depois de 1936, e com sua bagagem alemã, Sérgio Buarque de Holanda revelou ao Brasil a sua verdadeira face. O homem cordial e suas “paixões mobilizadores” (cfRobert Paxton).

Enfim, forçado pela torrente do processo histórico, fomos obrigados a nos olhar no espelho de Oscar Wilde. E decididamente não gostamos da imagem. A visão culturalista de uma determinada “brasilidade” se mantém na mídia e nos livros didáticos. A dissonância, quando ocorre, como no “Fado Tropical” que Chico Buarque de Holanda buscou no seu pai, é minoritária. Não é por menos que barracões de escolas de samba constituíram-se nos últimos anos em laboratórios de “history from bellow”, por vezes mais importantes, para a educação popular, que departamentos acadêmicos de História.

2. Um segundo fator, reside na ausência da recepção do debate historiográfico alemão, italiano e britânico sobre o atual e o inatual nos fascismos hoje”. Precisamos conhecer o inimigo, ou seremos confundidos e confundiremos aqueles que devemos aclarar. Como nas temáticas de “nazismo de Esquerda” e do conceito guarda-chuva de “Totalitarismo”, que hegemonizou o debate no Brasil, colocando o foco nas “aparecências” externas do fenômeno fascismo e abandonando a questão da participação e do agir das massas – para além do horror de sua participação na política, como na tradição de Jacob Burckhsrdt até Hannah Arendt. Em verdade, muitos Pesquisadores, como De Felice ou Trevor-Hopper, Historiadores-testemunhas do fascismo histórico, sempre recusaram a possibilidade de uma “Ressurgência dos Fascismos” no nosso tempo.

Bom, hoje compreender os Fascismos é uma imperiosidade acadêmica e da cidadania. Em especial para os Historiadores e seu grande campo – arquivologia, patrimônio, museologia no mínimo-, ou nos depararemos, em muito breve, com uma “história oficial” e com a destruição de acervos e “monumentos” da memória no Brasil.

Mais do que nunca, ou deciframos o enigma do atual experimento fascista ou seremos devorados! 

Francisco Carlos Teixeira da Silva UFRJ UFJF. 

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Redação

3 Comentários

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  1. Pena, que há quase dois anos enviei uma mensagem falando do livro neofascismos que organizei com outros colegas na UFF.
    Fui ignorado….

    Talvez pq vcs só dão bola pros “famosos” da academia…

    Existem MUITOS estudos atuais na academia brasileira.

    Mórula.com.br/produtos/neofascismos

  2. Meu Deus essas figuras estão dando um soco no estomago dos pracinhas Brasileiros( podemos dizer na memoria do exercito e que esta apoiando essa criatura que são facistas.

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