“Mundo vive crise de lideranças políticas e intelectuais”, afirma González

Para pensador político, a globalização econômica e midiática aumentou os desafios dos governos democráticos que querem se sobrepor ao mercado

Jornal GGN – Como os países em desenvolvimento devem reagir frente à interdependência imposta pela globalização? Quando saiu do governo da Espanha, em 1996, o ex-primeiro ministro Felipe González apontou fortes desequilíbrios da economia global. “Me assustou pensar que a economia real crescia, em um nível global, a 3% enquanto os fluxos de capital, a economia financeira, cresciam a 70%, acumulativo a cada ano”, destacou durante sua entrevista exclusiva ao programa Brasilianas.org.

“O modelo de globalização da economia tem dois problemas: primeiro, a financeirização frente à economia real, que gera riquezas e, consequentemente a isso, vem o segundo problema que é o da redistribuição desigual dos ganhos. Pode-se observar, por exemplo, que a China tirou da pobreza a muitíssimos… Mas a distância entre essa gente que saiu da pobreza e os mais ricos aumentou”, prosseguiu.

Para enfrentar esse quadro, González defendeu a atuação de um estado forte sobre a economia, e que os países do eixo Sul-Sul invistam na competitividade.

“Cada país – Brasil, Espanha, Argentina – tem que se perguntar como enfrentar os desafios de uma economia global para poder competir com vantagem e inserir-se na economia global e defender o valor da coesão social, do bem estar”, refletiu. Para ele essa é a margem de manobra que os países em desenvolvimento ou com economias enfraquecidas possuem para vencer os impasses da crise econômica mundial.

“O primeiro elemento que a esquerda tem que superar é não ter medo de querer uma economia altamente competitiva, para inserirmo-nos com vantagens na economia global”, pontuou. González criticou as medidas tomadas nos últimos anos pelo governo espanhol rebaixando salários, ajuste que acabou contribuindo para a destruição de empregos. Por isso, ele sustenta que a redistribuição via salários precisa estar ligada à produtividade e à incorporação de tecnologia, sem desconsiderar a existência de um salário-mínimo base.

González foi presidente por 13 anos e meio, administrando o terceiro governo desde a retomada da democracia na Espanha, de 1982 a 1996. Seus mandatos foram marcados por políticas de modernização e universalização de serviços públicos básicos (educação, segurança social e saneamento), investimentos na industrialização e infraestrutura, via aumento da dívida pública e recursos do Fundo de Desenvolvimento da União Europeia.

A crise dos partidos de esquerda

Durante a conversa com o apresentador Luis Nassif, ele concordou que os governos da social-democracia tradicional europeia estão desorientados e isso explica porque vem perdendo terreno para partidos políticos da direita.

González analisou também que a imagem da social-democracia na Europa ainda é afetada pelas condições que levaram à queda do muro de Berlim, de “um sistema alternativo do comunismo falido”. Ao mesmo tempo, os partidos da esquerda na região “movem-se na defensiva”, perdendo discurso e representação frente ao povo.

“É uma coisa bastante dramática, porque [vivemos isso] em um momento em que as políticas neoliberais e desreguladoras nos levam à implosão do sistema financeiro global”.

Por tudo isso, o ex-primeiro ministro apontou para a necessidade de os partidos tradicionais compreenderem e aplicarem a linguagem dos movimentos sociais conectados à internet.

“Muitas dessas iniciativas [que nascem nas redes sociais] expressam um desejo de participação da coisa pública não canalizada através dos partidos”, ponderou.

O pensador político enxerga dois fenômenos decorrentes da globalização e democratização da tecnologia da comunicação. O primeiro é o aumento da interdependência. “Me parecia que as televisões americanas, como a CNN, nunca teriam concorrência. [Mas] agora, no mundo árabe está a Al Jazira. Podemos gostar ou não, mas a Al Jazira está também na Europa, na Grã-Bretanha e em uma parte do mundo ocidental”, destacou.

Essa interdependência no meio da comunicação tende a homogeneizar as mensagens para todo o globo. Ao mesmo tempo, González identifica o aumento de reações de identidade “que tendem a firmar a personalidade de cada um”.

Na nova estrutura no campo da mídia – decorrente da popularização do uso da internet –, o poder não está mais em quanta informação uma pessoa consegue obter. “O relevante hoje é como alguém coordena a informação de maneira inteligente para conseguir objetivos. Como tira da informação a sobra que não faz mais do que estorvar e confundir”, considerou.

Esse cenário traz importantes impactos para a democracia e um desafio maior para os dirigentes políticos.

“Cada grupo social que se indigna por algo tem razão em sua indignação e há múltiplas indignações, múltiplas. Se alguém pretende fazer um programa de governo com a soma de todas as indignações, não sairá”.

González reconheceu, ainda, que o mundo vive uma crise de lideranças políticas e intelectuais, morais e econômicas. “Vivemos uma situação bastante líquida e difícil de assegurar. Mas não deixa de ser apaixonante”, disse parafraseando o sociólogo polonês Zygmunt Bauman.

O ex-primeiro ministro, entretanto, não acredita que a resolução da crise de lideranças seja resolvida apenas pelas mudanças no jogo das comunicações.

“[Governar] não digo que é menos que a arte, é uma arte! A arte de governar o espaço público que compartilhamos. É governar sobre a diversidade de sentimentos de direitos, governar sobre múltiplas ideias contrapostas e governar sobre interesses contrapostos, apresentando um projeto de país que aceite todo mundo, mesmo que haja contradições”.  

Logo, na visão de González, os governos devem trabalhar em cima da transparência de suas ações, se utilizando de softwares para incrementar a disponibilidade de dados e ações do poder público para a população.

União Europeia

González identificou que um dos problemas do bloco foi realizar a união monetária, deixando de lado a unidade econômica e fiscal. Nessas condições, em momentos de crise, países mais desiguais acabam enfrentando um ônus maior para se reestabelecer.  

Por outro lado, ele criticou a Grécia por manter gastos elevados na defesa, em meio à crise econômica interna. “Enquanto a Espanha gasta 1% do seu PIB em defesa, a Grécia investe 4,3%. Tem que haver cortes nesse sentido, não há nenhum perigo iminente que justifique a Grécia preferir cortar as aposentadorias”, avaliou.

Apensar de ser um defensor da União Europeia, González reconheceu que um dos grandes erros do Banco Central do bloco foi a demora para criar um plano de investimentos em infraestrutura e desenvolvimento tecnológico que só há poucos meses foi posto em marcha.

“Por isso, as políticas europeias fizeram com que, por exemplo, um país como a Grécia que tinha uma dívida de 120%, em 2010, tenha hoje uma dívida de 190% do seu Produto Interno Bruto”.

Acompanhe a seguir a entrevista na íntegra, concedida ao apresentador Luis Nassif. 

https://www.youtube.com/watch?v=WoaAcZLJp78 width:700

Redação

14 Comentários

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  1. Lembro do estado que esse

    Lembro do estado que esse cidadão deixou a Espanha depois de 14 anos de poder….mais de 20% de trabalhadores desempregados, déficit público de 5,5%, etc.

    Lembro que de socialista não tem nada, é assim tipo Roberto Freire, ou no máximo Hollandé, ou seja socialité..

    1. Completando o trabalho dele o

      Completando o trabalho dele o Zapatero transformou o PSOE em uma versão do PSDB espanhola, distruindo a visão socialista construida durante os anos de Franco. 

      Realmente estamos necessitando de uma nova esquerda, diferente desses infiltrados da pseudo esquerda que não tem nada a ver.

      Acho também estranho que tenham ressucitado esse infiltrado senil.

  2. Capitalismo, comunicação, informação e desinformação.

    Tirando a parte na qual ele tenta conciliar capitalismo e democracia, o que é impensável nos dias de hoje no mundo desenvolvido no qual a acumulação do capital chegou ao limite (no mundo subdesenvolvido é diferente pois o capitalismo ainda pode ser expandido pela infraestrutura, por exemplo, quase toda por fazer), gostei da parte na qual ele tenta diferenciar os usos da internet entre informação e desinformação. Nos dias de hoje, a informação está com as forças progressistas. A desinformação, os ruídos de comunicação, com os grupos de direita. É preciso muito esforço de militância, mas também muito profissionalismo, para não deixar a desinformação intoxicar a comunicação. Algo que a SECOM do PT parece ainda não ter entendido.

  3. Dilma já está na Rússia .

    Por que não surgiu nenhum reaça descerebrado para xingar a Presidenta Dilma lá na cidade de Ufá  ?

    Ah, como eu gostaria que um idiota feito um Igor Gilly aparecesse lá na Rússia !

    E a empregada dos Marinhos ? Será que ela vai indagar a Putin sobre a ocupação da Criméia ? 

    [video:https://youtu.be/kLzIByEW6b4%5D

  4. Quando observamos que o mesmo

    Quando observamos que o mesmo modus operandi da direita contra os governos eleitos democraticamente na América do Sul é que observamos a falta que o presidente Lula e o presidente Chavez fazem neste momento.

    O presidente Lula tratou de unir a Am´rica do Sul,Chavez incluído. Chavez,sempre ele,uniu seu país como nunca e,desta forma,foi a voz da Amáriaca do Sul contra a dominação ianque.

    O presidente Chavez infelizmente se foi. A América do Sul está acuada. O presidente Lula continua a ser uma voz forte no mundo todo em defesa dos pobres e da democracia.

    Está na hora do presidente Lula,uma das poucas lideranças políticas com magnitude mundial começar a abrir a boca contra a bestialidade  que afronta o povo mais pobre do mundo ,sobrtudo,da América do Sul.

  5. Só os cientistas políticos
    Só os cientistas políticos não enxergam que o debate público está centralizado e rebaixado pelos veículos de comunicação social.
    As pessoas e as populações não interagem com os políticos nem com os partidos: interagem com a imprensa… E ficam reverberando suas impressões nas “redes sociais”. Até os políticos falam alguma coisa e correm pra ver o que a mídia editou.
    Repetindo: só os cientistas políticos não enxergam isso.

  6. Crises

    E pra piorar, além dessas deficiências, o Brasil vive uma crise de craques de futebol, aí não dá pra aguentar tanta crise. rsrsrs brincadeirinha gente.

  7. Coisa de malandro. Ao invés

    Coisa de malandro. Ao invés disso, deveria se juntar ao resto do mundo que acha Lula o maior lider mundial para propor o governo único universal

     

  8. “O relevante hoje é como

    “O relevante hoje é como alguém coordena a informação de maneira inteligente para conseguir objetivos. Como tira da informação a sobra que não faz mais do que estorvar e confundir”, considerou.”

    Quando o Brasil entra em crise os economistas, para esconder suas irresponsabilidades, expõem o problema de modo arcaico: É preciso fazer uma “reforma” política, “reforma” eleitoral, e “reforma” fiscal etc. para ajustar o que se fez no oculto.

    Como assim, querem que o país faça “reforma” se não existe a “forma” de práticas do dinheiro?… E ele nunca se constitui pela primeira vez?

    A “forma” do dinheiro compreende a contraposição da economia e, esta forma determinada, o papel do conteúdo interno dos países, porque sendo externa não pode extrair o conteúdo interno, mas apenas ser um lugar consciente das ideias de qualidade das relações para seus números e elementos de unidade contemporânea. Ora, o conteúdo se é mensurado pela forma significa que antes associou todos os fatores de diferenças de crescimento interno, praticamente reduzindo a crise ao valor não apreendido na realidade, porque políticas subjetivas não governaram manifestações relativas que faltam existir formalmente para termos de causas motoras (movimentos desconexos da economia e o mundo).

    Logo, forma e conteúdo do procedimento privado pré-constrói a cultura da razão de um “projeto de país para si”, e proporciona que toda riqueza seja analisada para substituir o preço do investimento externo por uma igual grandeza introdutória da realidade, de modo a justificar a parte de um método rigoroso, porquanto é sua potência de valor.

    Poderia vir a mente que esta extraordinária potência de valor é a que se move invisível no espaço pelo mundo real? – … revelando-se a tese de variação do dólar tratar-se de um apêndice supérfluo? – Claro que sim! Este mover invisível  é a convicção de que o passivo, ao inverso do fim, pode ser encerrado dentro de limites do método de começo dos tempos de espaço (o seu futuro); cuja forma apreende o mundo natural, para onde enchergaremos com as épocas que se completam – por projeção de realidade e reflexão externa – as concomitâncias simultâneas; demostrado-se sobre a metafísica que nas nuvens o país constrói causas imutáveis.

    Este conhecimento permite a vida passar a ciência do pensamnto abstrato para um mundo real (de tempos no espaço); inferir o valor exterior de atos (valor do trabalho) dos indivíduos, ao apropriar-se apenas da “forma de conteúdo” das riquezas, graças ao sistema em si (ciclo de remontar a produção social), considerando compreender a múltipla periodicidade de concomitância entre os fatores dos dois mundos simultâneos; necessários ao resultado dos mesmos pressupostos de todas as nações: “A Estrutura” ainda informe do dinheiro.

    A Estrutura, antes de vir a ser um software precedente ao atual emblema capitalista, é um sistema em si que identifica cada fator temporal da economia, adicionando consigo a aprovação fixa que leva a frente o passado, em que éramos incapazes de olhar além do que aconteceu, pois, de certa forma, é a memória simultânea que encherá de valor verdadeiro tudo aquilo que estava vazio.

    Decissões significativas precisam ser tomadas para fonte da nações: 1- A necessidade de reconhecer a cultura de origem da produção fortemente histórica, porque a razão não pode ser condicionada apenas à imagem digital da economia moderna para expresar políticas de governo. 2 – Os estudiosos descobrirem que a importância dos fenômenos foram mudadas pela presente publicação. 3 –  O debate jurídico e político poderá servir para referendar o objetiivo das descobertas ou admitir uma ciência do pensamento abstrato para o uso cibernético da economia.

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