EUA é contra renovação do Protocolo de Kyoto

Do Correio Braziliense

Os EUA contra todos

Max Milliano Melo

Representantes norte-americanos se opõem à renovação do Protocolo de Kyoto e tornam mais difícil um acordo durante a conferência da ONU sobre mudanças climáticas. Discussões avançam madrugada adentro em Doha, no Catar

A 18ª Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas (COP18), que ocorreu ao longo das duas últimas semanas, no Catar, foi marcada pela forte cisão entre os Estados Unidos, maior poluidor do planeta, e os demais países. Enquanto todos pareciam concordar sobre a necessidade de se prorrogar o Protocolo de Kyoto — mesmo com divergências em alguns detalhes — os americanos insistiam que o estabelecimento de metas paracombater as mudanças do clima não deveria ocorrer. Passada a hora prevista para o encerramento da cúpula realizada pela Organização das Nações Unidas, um documento que reunisse as principais conclusões do encontro parecia longe de ser finalizado.

A noite já avançava em Doha, cidade sede da COP18, quando ainda sobravam críticas e faltava ação. O vice-primeiro-ministro do Qatar, Abdullah al-Attiyah, presidente da conferência, foi irônico. “Eu não tenho pressa. Minha casa fica a apenas 10 minutos de carro”, disse, numa tentativa de chamar os 194 países presentes para o diálogo. “Desde esta manhã, não avançamos muito”, lamentou o ministro francês do Desenvolvimento, Pascal Canfin. O ministro alemão do Meio Ambiente, Peter Altmaier, previu que as negociações avançariam “noite adentro”. Ele estava certo. Até o fechamento desta edição, quando já eram 3h de hoje pelo horário do Catar, a tentativa de produzir um documento prosseguia, e o conteúdo final do que seria acordado era imprevisível.

No fim da tarde de ontem, ambientalistas passaram a compartilhar nas redes sociais a foto de um dos negociadores dos Estados Unidos acompanhada da frase: “Nós nos importamos com as mudanças climáticas. Mas não o suficiente para fazer algo para mudá-las”, já que os EUA, diferentemente de até mesmo os outros países ricos, eram contra a inclusão de termos como “compromissos” e “metas” no texto do acordo. O impasse sobre a terminologia foi um dos responsáveis pelo avanço das discussões.

O problema, como ocorreu nas conferências do clima anteriores, era chegar a um consenso que represente algum avanço e satisfaça os diversos lados, que têm interesses muitas vezes opostos. Desde o começo da COP18, a prorrogação de Kyoto era vista como um de seus principais objetivos, além da discussão sobre a ajuda financeira aos países mais pobres no combate às mudanças climáticas. A intenção era prorrogar o protocolo, que expira este mês, para que ele continue válido até 2017, dando tempo para que um novo acordo internacional fosse elaborado para entrar em vigor em 2020.

A medida, no entanto, é apontada como uma ação mais simbólica que prática, uma vez que, além dos EUA, que nunca ratificaram Kyoto, Canadá, Japão e Rússia já disseram não estar mais dispostos a segui-lo. Apenas a União Europeia e a Austrália mantêm-se no protocolo. Mesmo assim, muitos veem a extensão do acordo como algo fundamental para que o mundo não fique sem nenhum tipo de compromisso para frear o efeito estufa. “A extensão do único acordo climático obrigatório em vigência vai assegurar a continuidade de um sistema multilateral baseado em regras rígidas”, defendeu a ministra brasileira do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, em discurso proferido na quinta-feira.

Um outro complicador dificultava uma definição. O bloco de nações desenvolvidas que apoia a renovação não concordava com a adoção de metas vinculantes apenas para os ricos. Na opinião desses países, nações em desenvolvimento, mas que poluem muito, também deveriam assumircompromissos. O argumento contrário é de que a fatura deve ser paga por quem já poluiu, restando às nações pobres investirem para tirar sua população da miséria, tarefa cada vez mais difícil com as mudanças climáticas.

Economia
Do ponto de vista econômico, algumas notícias boas vieram de Doha. Nos últimos dias de encontro, diversas delegações da Europa decidiram ampliar a quantidade de recursos ofertados para ajudar as nações em desenvolvimento a preservar seus recursos naturais. O montante prometido por Alemanha, Reino Unido, França, Suécia, Holanda, Dinamarca e União Europeia totalizou mais de 6,85 bilhões de euros para os próximos dois anos, um valor superior ao arrecadado entre 2011 e 2012. “Na realidade, estaremos dando mais dinheiro no ano que vem e em 2014 do que nos dois últimos anos”, declarou a comissária europeia para o clima, Connie Hedegaard.

Apesar de elogiar a iniciativa, os países mais pobres e os ambientalistas esperavam mais. Cálculos mostram que o valor necessário para esse tipo de ação seria de pelo menos US$60 bilhões. “A União Europeia não pode aceitar um texto que contém um compromisso nesse valor, devido às restrições orçamentais em que vivemos”, ponderou o ministro francês Pascal Canfin.

A questão do financiamento é um ponto crucial, porque países ricos e pobres contribuem de maneira diferente, mas também sofrem de formas diferentes com os desastres climáticos. Enquanto as emissões que mais pesam nas mudanças ambientais vêm das nações ricas e mais industrializadas, os países em desenvolvimento são mais afetados por secas, furacões, inundações e o aumento do nível dos oceanos. Assim, nações da América Latina, da África e do Pacífico precisam de ajuda para financiar sua adaptação aos desastres cada vez mais frequentes.


Luis Nassif

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